sábado, 2 de março de 2019

Criticada por bolsonaristas decide deixar outro conselho

Um dia depois de ser destituída de colegiado, Ilona Szabó anunciou que deixará órgão de segurança pública

Renata Mariz e Jailton de Carvalho / O Globo

BRASÍLIA - Um dia depois de ser excluída do Conselho Nacional de Política Criminale Penitenciária (CNPCP) por determinação do presidente Jair Bolsonaro, a cientista política Ilona Szabó, do Instituto Igarapé, anunciou ontem que vai deixar o Conselho Nacional de Segurança Pública, presidido pelo ministro da Justiça, Sergio Moro. Ilona foi afastada do colegiado 24 horas após ser nomeada para o cargo. Ela é defensora do Estatuto do Desarmamento e sua indicação foi criticada nas redes sociais por apoiadores do presidente.

— Sair de um (conselho) não implicaria sair de outro, mas nesse momento não há condições reais de troca e colaboração. Espero que isso mude ao longo desse governo —disse Ilona. O Conselho Nacional de Segurança Pública faz parte do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) e tem, entre suas atribuições, supervisionar a implementação do Plano Nacional de Segurança Pública. Já o CNPCP é uma instância de caráter consultivo e tem como principal atividade a elaboração das regras do decreto de indulto de Natal. As sugestões podem ou não serem acolhidas pelo ministro da Justiça e pelo presidente da República.

O presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, criticou o recuo de Moro em relação à nomeação de Ilona. Logo depois da saída de Ilona, Lima também pediu para se desligar do Conselho Nacional de Segurança Pública em solidariedade à colega.

— A carta branca dada ao superministro foi revogada. Ele não consegue escolher nem um suplente do Conselho Nacional de Política Criminal? Alguma coisa está errada —disse Lima.

SEM MULHERES
A promotora Mônica Barroso, do Ministério Público da Bahia, também pediu demissão do Conselho Nacional de Política Criminal na quinta-feira. Ela diz que a decisão é anterior à saída de Ilona, mas também lamentou o afastamento da colega. Com a exclusão de Ilona, logo depois da saída de Mônica, o Conselho Nacional não terá mais mulheres entre seus integrantes. —Acho uma pena que uma representação da sociedade civil com tanto preparo na área da segurança pública não esteja presente no conselho. Enriqueceria muito os debates —disse a promotora.

Com a saída de três integrantes, o CNPC ficou com 15 membros. O conselho, presidido pelo desembargador Cesar Mecchi Morales, é formado majoritariamente por magistrados e advogados, quase todos de linha conservadora, boa parte deles ligado ao ex-ministro da Justiça Alexandre de Moraes. Da recente composição, Ilona, Mônica Barroso e Pedro Eurico, secretário de Justiça e Direitos Humanos de Pernambuco, são conhecidos por uma atuação mais voltada pela defesa dos direitos humanos.

Com as mudanças, a tendência é que Pedro Eurico se torne uma voz isolada. O mandato do secretário se encerra em 20 de novembro.

Advogado de 65 anos de idade, Eurico iniciou sua carreira política como militante da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Olinda, que teve forte atuação de resistência à ditadura. Nesse período, Eurico defendeu presos políticos e denunciou práticas de tortura e perseguição política de adversários do governo militar. Ontem, O GLOBO tentou, sem sucesso, falar com o secretário.

Apesar do desgaste que o episódio provocou para Moro, esta não é a primeira vez que a saída de conselheiros provoca barulho. No governo Temer, o Conselho Nacional de Política Criminal também sofreu uma debandada. Em retaliação ao então ministro da Justiça Alexandre de Moraes, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), sete membros pediram demissão do colegiado. Eles alegaram manipulação de Moraes para controlar o conselho.

O ministro tinha criado oito vagas de suplente a serem indicadas por ele. Antes, o CNPC tinha 13 titulares e cinco suplentes, todos designados pelo ministro. Com a portaria baixada por Moraes, o número de suplências se igualou ao de titulares. Ele indicou apoiadores das ações que o governo vinha tomando para debelar uma crise iniciada por massacres em presídios do país, e também para darem suporte ao Plano Nacional de Segurança Pública formulado em sua gestão.

Os integrantes que saíram do conselho, para o qual haviam sido indicados na gestão do PT, alegaram que Moraes buscava impor um “papel de subserviência” ao colegiado e que vinha demonstrando “notório desprezo” a suas recomendações. Uma delas foi o texto do indulto natalino sugerido no fim de 2016, que não foi usado por Moraes. Ele optou por uma redação mais dura que a do conselho.

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