Senado deve segurar nova flexibilização do Código Florestal por meio de uma MP modificada, que causaria erosão do prestígio do agronegócio
Salvo alguma improvável reviravolta, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), deve travar a marcha da medida provisória 867e seu rebanho de jabutis.
Não foi a primeira vez, e talvez não seja a última, em que setores retrógrados do agronegócio buscaram vitória que pode se revelar, no futuro, um estrondoso tiro no pé.
Foram 243 votos a favor na Câmara e 19 contrários. Ruralistas queriam passar com o trator, de novo, sobre o Código Florestal.
Cabe rememorar que as mudanças de 2012 nessa legislação, originalmente de 1934, já configurara uma conquista de proprietários de terras irregularmente desmatadas. Afinal, obtiveram com ela anistias e prazos generosos para se adequar às normas ambientais.
Vieram sucessivas prorrogações de datas para inscrição no cadastro ambiental rural, que implica reconhecimento de deficit de cobertura florestal, e para adesão ao programa de regularização (PRA), o compromisso de recompor matas.
A MP 867, editada no governo Michel Temer (MDB), adiava mais uma vez o PRA. Até certo ponto isso era inevitável, porque alguns estados se atrasaram em implantar sistemas para a regularização.
O novo Congresso, porém, lançou-se a encher o texto de penduricalhos —os jabutis, que não sobem sozinhos em árvores— para descaracterizar ainda mais o código.
Projeções estimam que as facilidades excluiriam da obrigação de recuperar áreas de preservação obrigatória um total de até 50 mil km², mais de 40% do compromisso brasileiro de recomposição florestal assumido no quadro do Acordo de Paris (120 mil km²).
Os grandes beneficiários são 4% de proprietários rurais que não se enquadraram nas regras. No longo prazo, contudo, todo o setor pode ser prejudicado, porque o desmatamento continuado tende a elevar a temperatura nas regiões de cultivo, como o cerrado, e a restringir a pluviosidade.
Não bastasse o dano físico potencial à lavoura e a perda de reputação do produto agrícola brasileiro no mercado mundial por iniciativa da bancada ruralista, outra frente de riscos se apresenta no Ministério do Meio Ambiente.
A investida do ministro Ricardo Salles contra a gestão do Fundo Amazônia põe em risco essa parceria com Noruega e Alemanha, que rendeu ao país mais de R$ 3 bilhões em recursos para reforçar o combate ao desmatamento.
Com o intento anunciado de deixar a MP perder a validade nesta segunda-feira (3), o Senado impede, por ora ao menos, que o trator ruralista prossiga em sua marcha a ré.
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