terça-feira, 30 de julho de 2019

Cargo impõe limites, afirma professor

Por Malu Delgado | Valo Econômico

SÃO PAULO - Acostumado a agir como deputado federal por quase três décadas, com a proteção da imunidade parlamentar, o presidente Jair Bolsonaro "teria que ter a clareza" de que, no exercício da Presidência da República, "há um conjunto de limitações ao modo como ele pode se expressar porque isso pode conspurcar a integridade do cargo", avalia Oscar Vilhena, professor de direito da Fundação Getulio Vargas. Para Vilhena, Bolsonaro será obrigado a prestar esclarecimentos sobre o que quis dizer e, caso se recuse, poderá responder por crime de responsabilidade. Se admitir que mentiu, o presidente corre o risco de ter que enfrentar um debate político sobre quebra de decoro.

"Presidente da República não tem imunidade parlamentar. Ele se comporta como deputado que está protegido por uma cláusula constitucional, que permite que não seja responsabilidade criminalmente por sua fala. O presidente não. Do ponto de visto civil, também pode também ser responsabilizado", explica o professor da FGV-Direito.

Vilhena salienta que presidentes da República "fazem juramento perante à Constituição e representam uma nação". Ele observa que por conta da Constituição e da Lei de Acesso à Informação (LAI), a Lei 12.527, de 2011, Bolsonaro deve sentir as consequências de suas declarações.

A LAI, em seu artigo 21, diz que "não poderá ser negado acesso à informação necessária à tutela judicial ou administrativa de direitos fundamentais". Caso essas informações "versem sobre condutas que impliquem violação dos direitos humanos praticada por agentes públicos ou a mando de autoridades públicas", a lei determina que "não poderão ser objeto de restrição de acesso".

Qualquer cidadão, informa Vilhena, que integra a Comissão Arns, de defesa dos direitos humanos, pode fazer o pedido de informações à Presidência, ou o próprio presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, que decidiu fazê-lo em interpelação no Supremo.

"A Lei de Acesso é peculiar porque faz proteção especial ao acesso a informações relativas a condutas que violem direitos humanos", enfatiza o professor. "Não são informações de domínio público e o presidente diz que tem as informações. Portanto, ele tem a obrigação de disponibilizar essas informações. Se ele se negar [a responder], aí sim pode haver ação judicial."

Caso Bolsonaro se negue a fornecer as informações, explica Vilhena, "estaria violando a lei, e isso é bastante grave". E se ele falar que não tem a informação, então ele vai confessar que estava mentindo. Aí é uma discussão um pouco mais complicada, se ele comete crime ao mentir." Na visão do professor não seria crime, mas "demonstra desonestidade e se pode falar em violação de decoro do cargo". Este debate, porém, ultrapassa o universo jurídico e entraria num julgamento político que dependeria do Senado.

Para o professor, se o presidente não confirmar as declarações vai "demonstrar que faz uso leviano da palavra", um "ato cruel com a família". "A família pode ajuizar ação civil, por danos morais, porque se sentiu ofendida, constrangida, teve sofrimento." As falas do presidente, diz, são ofensivas à memória da pessoa que morreu. "O presidente jura o respeito à Constituição. Tem obrigações em relação à preservação e à garantia dos direitos fundamentais."

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