segunda-feira, 15 de julho de 2019

Celso Rocha de Barros*: A Vaza Jato até agora

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- Folha de S. Paulo


É hora de brigar por menos heróis, menos bodes expiatórios, e leis melhores

Na Festa Literária Internacional de Paraty, realizada na última semana, vagabundos bolsonaristas tentaram impedir a participação do jornalista Glenn Greenwald, ganhador do Pulitzer e editor do Intercept Brasil, em um dos debates. O evento aconteceu em meio aos protestos e, a crer nos relatos de quem assistiu, foi bem animado.

Os bolsonaristas prosseguem tentando soterrar a Vaza Jato com seu vazamento Samarco de notícias falsas e fraudes variadas, todas elas endossadas pelo presidente da República como forma de envolver Moro no submundo do crime virtual bolsonarista.

E há o risco de a versão fraudulenta acabar prevalecendo.

A Lava Jato conversou com aspirações muito fortes do povo brasileiro de combate à corrupção. As pessoas querem acreditar que a Vaza Jato não revelou nada de muito sério, e é compreensível que se sintam assim.

Por isso talvez valha a pena começar a compor o quadro geral revelado pelos vazamentos até agora. Como bem notou Elio Gaspari na Folha de domingo (14), os vazamentos parciais do Intercept Brasil podem “saturar ou confundir” quem não estiver acompanhando com atenção.

Sugiro classificar os vazamentos em dois grupos principais: os que têm consequências jurídicas graves, mas são difíceis de a população entender, e os que podem não ter grande impacto jurídico, mas indicam viés político que qualquer um entende.

De longe, os vazamentos mais graves são os do primeiro grupo. Já na primeira reportagem ficou claro que Moro atuava como líder da acusação, o que foi amplamente comprovado por reportagens posteriores.

Na última semana, novo vazamento mostrou Deltan Dallagnol comentando com os procuradores que o desembargador João Pedro Gebran Neto estaria insatisfeito com as provas em um caso. Ao menos em alguns casos importantes, não parece ter havido a devida separação entre juiz e promotor, nem entre primeira e segunda instância.

O último Datafolha mostra que grande parte da população entendeu que a coisa é séria, mesmo que conserve sua simpatia por Moro.

Um segundo grupo de mensagens sugere viés político da parte de Moro e Dallagnol. O caso mais flagrante, como lembrou Gaspari, foi a sugestão de Dallagnol para que fosse realizada operação de busca e apreensão na casa do coordenador da campanha de Fernando Haddad, o senador petista Jaques Wagner, na semana da eleição presidencial.

As dúvidas de Moro com relação a uma operação contra FHC que pudesse “melindrar um aliado importante” entram nesse grupo.

É muito difícil não conceder aos petistas o direito de se sentirem indignados com esse tipo de mensagem. Já disse aqui várias vezes: a reavaliação da Lava Jato diante da Vaza Jato é algo a ser feito com cuidado e sobriedade, qualidades que parecem ter faltado a Moro e Dallagnol em momentos importantes. Não se deve passar da demonização da política —a origem de nossos males atuais— para o desmonte do combate à corrupção.

Mas se alguém aparecer no seu WhatsApp com conversa de “Verdevaldo” ou “Pavão Azul”, ou com papo furado de que as denúncias da Vaza Jato não são importantes, cuidado: ou o sujeito é malandro de menos, ou é malandro demais.

É hora de brigar por menos heróis, menos bodes expiatórios, e leis melhores.

*Celso Rocha de Barros é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).

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