segunda-feira, 8 de julho de 2019

Quando o próprio governo cria insegurança: Editorial / Valor Econômico

Menos de 24 horas depois de aprovado o parecer do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) sobre a reforma da Previdência Social, na comissão especial da Câmara dos Deputados, o presidente Jair Bolsonaro anunciou que pretende corrigir "equívocos" no texto. O presidente fez referência direta à aposentadoria especial para os policiais. Em seguida, ele disse que "pouca coisa tem que ser mexida" no projeto, que deve ser discutido agora pelo plenário da Câmara.

Na quarta-feira, quando tentou que os deputados da comissão especial aprovassem regras mais suaves de aposentadoria para os policiais, o presidente foi chamado de "ingênuo" pelo seu ministro da Economia, Paulo Guedes. O ministro julgou que Bolsonaro não tinha entendido que a bola agora está com o Congresso, que é quem vai decidir a questão, por se tratar de emenda constitucional.

Em sua entrevista na sexta-feira, o presidente mostrou ingenuidade, novamente, pois acredita que conseguirá, com o apoio do que se convencionou chamar de "bancada da bala", incluir no texto da reforma apenas regras mais favoráveis para os policiais federais. Ou seja, circunscrever a criação de privilégios somente para esta categoria de servidores.

Há várias emendas ao texto, a serem votadas pelo plenário da Câmara, que estendem a outras categorias as mesmas regalias reivindicadas pelos policiais. E o que os policiais desejam não é pouco.

Querem ter o direito a se aposentar com 100% da última remuneração do cargo efetivo que ocupam, benefício que é conhecido como integralidade. Querem também ter direito, quando estiverem aposentados, a receber os mesmos aumentos que os seus colegas da ativa, o que é conhecido como paridade. Mas não é só isso. Eles não querem ter idade mínima para requer aposentadoria. Apenas o prazo de contribuição de 30 anos.

É bom lembrar que a emenda constitucional 41/2003, de iniciativa do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acabou com a integralidade e com a paridade. Apenas aqueles que ingressaram no serviço público antes da promulgação desta emenda continuaram a ter direito aos dois benefícios. Ninguém que entrou na administração pública a partir de 2004 tem direito à integralidade e à paridade. E estão submetidos à exigência de idade mínima para querer aposentadoria, que é de 60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher.

Mesmo aqueles que ingressaram no serviço público até o fim de 2003, com direito aos benefícios da integralidade e paridade, foram penalizados pela atual reforma. Só poderão se aposentar ao completarem 65 anos, se homens, ou 62 anos, se mulheres. Ou, então, terão que cumprir pedágio de 100% do tempo de contribuição que faltar na data de promulgação da emenda constitucional. Além disso, precisam ter 60 anos de idade, se homem, ou 57 anos, se mulher.

Os princípios fundamentais da atual reforma da previdência, anunciados largamente pelo governo, são os de acabar com os atuais privilégios e igualar as regras aplicadas aos servidores às aplicadas aos trabalhadores da iniciativa privada. Além disso, para preservar o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema previdenciário, o governo propôs, o que foi aceito pela comissão especial da Câmara, uma idade mínima para requerer aposentadoria para todos os servidores e trabalhadores.

Os policiais, alegando peculiaridades da profissão, não aceitam a idade mínima para requer aposentadoria e querem a integralidade e a paridade. Ou seja, desejam retornar à situação anterior à emenda constitucional 41/2003.

Os riscos de morte e de agressões a que os policiais estão sujeitos em seu dia a dia devem, sem dúvida, ser levados em consideração quando se estabelecem regras de aposentadoria. E foram. Eles terão direito a tratamento especial, se o parecer do relator for aprovado pelo Congresso. Poderão se aposentar aos 55 anos, tanto homens quanto mulheres, com 30 anos de contribuição. Além disso, a pensão por morte, devida ao cônjuge do policial, será vitalícia e corresponderá à remuneração do cargo.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, alertou que será difícil aprovar a reforma sem os 60 a 70 votos da bancada da bala. Mas se os benefícios forem concedidos a policiais federais, o que impedirá que juízes, procuradores, servidores da Receita Federal, por exemplo, reivindiquem o mesmo?

A insegurança sobre o desfecho da reforma no plenário da Câmara foi criada por quem menos se esperava, o próprio presidente da República, Jair Bolsonaro.

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