quinta-feira, 4 de julho de 2019

Ricardo Noblat: Bolsonaro planta e colhe outra derrota

- Blog do Noblat / Veja

De messias a traidor

Era irresistível para um presidente acidental como ele. Distante nos últimos seis meses da proposta de reforma da Previdência, agora quando parecia que ela caminhava muito bem, o capitão Jair Bolsonaro resolveu meter-se onde não era mais chamado. Ao fazê-lo, poderá ter contribuído para que a reforma fique para ser votada no Congresso só a partir de agosto.

A interferência súbita e, como sempre, atabalhoada, se deu porque o capitão foi vaiado e acusado de traidor por policiais civis e militares insatisfeitos com o preço a pagar pela reforma. Eles cobram o tratamento especial que Bolsonaro lhes prometera antes e depois de eleito. E Bolsonaro, sem consulta ao ministro Paulo Guedes, seu ex-Posto Ipiranga, decidiu atendê-los.

“Vou resolver o caso de vocês, viu?” – anunciou Bolsonaro a um grupo de PMs. Bem que tentou. Disparou ligações para o deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), relator da reforma na Câmara, e para líderes de partidos até concluir que seu desejo não seria satisfeito. Para variar, colheu mais uma derrota e deu munição aos interessados em torpedear a aprovação da reforma.

Como uma reforma que acabará com os privilégios, a acreditar-se nos seus patrocinadores, poderia conviver com mais um privilégio a ser mantido? Por que só os que vestem ou vestiram fardas merecem ser premiados na hora em que se exigem sacrifícios de todo mundo? Já não basta a desidratação da reforma que deixará de fora Estados e Municípios? Corre-se o risco de a montanha parir mais um rato.

Para Bolsonaro, pouco se lhe dá. Seu negócio é tentar segurar ao seu lado os que o elegeram, não importa o quanto isso possa custar ao país. O inferno para ele são os outros, os que lhe negaram o voto. Quando candidato, disse que apresentaria proposta de emenda à Constituição para acabar com a reeleição de presidente, governadores e prefeitos. Eleito, lançou-se candidato à reeleição.

Segue o baile, sob o comando do presidente mais desconexo que o país já conheceu.

Taokey?

Pense bem

Um juiz não pode atuar em parceria com acusação ou defesa. Os livros de Direito ensinam que não pode. A Constituição diz que não pode. Juiz deve ser neutro. É assim nos países democráticos.

Agora, releia as conversas do ex-juiz Sérgio Moro com procuradores da Lava Jato publicadas pelo site The Intercept. Faça de conta que ele conversava com os advogados de Lula.

E aí? Sinceramente, estaria tudo bem? Nada a reclamar?

Você viu Juan Guaidó por aí?

E a ditadura de Maduro não caiu de podre

Entre janeiro e abril só deu Juan Guaidó. O autoproclamado presidente da Venezuela ocupou grande parte do noticiário internacional aqui, na América Latina, nos Estados Unidos e na Europa como o homem que seria capaz de pôr a baixo sem disparar um único tiro a ditadura de Nicolás Maduro, o infeliz herdeiro do coronel Hugo Chávez.

Se fosse preciso atirar, ele também seria capaz de realizar tal façanha com o apoio dos governos de Donald Trump e de Jair Messias Bolsonaro. Era o que se dizia. Foi o que o próprio Guaidó admitiu. Dizia-se ainda que a ditadura de Maduro tinha seus dias contados porque o Exército venezuelano acabaria por abandoná-la. Quem vivesse haveria de ver.

O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) chegou a anunciar seu deslocamento para a fronteira do Brasil com a Venezuela porque desejava assistir de perto o que estava prestes a acontecer. Nem mesmo a patuscada do envio frustrado de duas camionetes com alimentos para socorrer venezuelanos famintos demoveu o Zero Três do seu propósito bélico.

Tudo deu em nada como se vê. Trump, agora, acusa seu assessor especial John Bolson de tê-lo enganado na condução da crise venezuelana. Bolson é aquele bigodudo que tomou café da manhã com Bolsonaro no Rio e que se encantou por ele. O governo brasileiro simplesmente esqueceu o assunto. E os militares tupiniquins, enfim, suspiraram aliviados.

Reconheça-se: eles jamais acreditaram que só faltasse um sopro para que Maduro desabasse. E jamais defenderam uma intervenção armada na Venezuela. Sabiam muito bem que nossas Forças Armadas carecem de poderio suficiente para arriscar-se numa aventura de tamanho porte. O assunto está vencido, e vencido permanecerá. Até que… E sabe-se lá até quando…

Talvez até quando Trump concluir que mais uma prensa na ditadura venezuelana reforçará outra vez suas chances de se reeleger. Então acionará Bolsonaro que o venera só abaixo de Deus e do Brasil. E tudo recomeçará. Ontem à noite, na embaixada americana, durante a cerimônia de celebração da independência dos Estados Unidos, Bolsonaro voltou a falar sobre a Venezuela:

– Temos um problema aqui ao norte do Brasil e não queremos que outros países enveredem para esse lado.

Trump e Bolsonaro são políticos que só sobrevivem à custa de conflitos.

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