quinta-feira, 5 de setembro de 2019

Bolsonaro ataca pai de Bachelet, torturado na ditadura Pinochet

Bolsonaro responde a críticas de Bachelet com ataque a pai torturado na ditadura Pinochet

Alberto Bachelet e Michelle estão entre as 32 mil pessoas torturadas e presas durante a ditadura no Chile

Matheus Lara, Rodrigo Turrer e Julia Lindner | O Estado de S.Paulo

Em resposta a críticas da ex-presidente do Chile Michelle Bachelet, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que a chilena "investe contra o Brasil na agenda de direitos humanos (de bandidos)" e atacou seu pai, Alberto Bachelet, torturado e morto pela ditadura de Augusto Pinochet no país. Alta Comissária para Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), ela disse em entrevista que o "espaço democrático" no Brasil estava encolhendo.

"Nos últimos meses, observamos (no Brasil) uma redução do espaço cívico e democrático, caracterizado por ataques contra defensores dos direitos humanos, restrições impostas ao trabalho da sociedade civil", afirmou Bachelet em uma entrevista coletiva em Genebra, na Suíça.
Em resposta, Bolsonaro disse que o Chile "só não é uma Cuba" devido ao golpe militar que derrubou o presidente Salvador Allende em 1973. Segundo o presidente, o golpe "deu um basta à esquerda" no país, "entre esses comunistas o seu pai, brigadeiro à época", se referindo a Alberto Bachelet.

"Seguindo a linha do (Emmanuel) Macron (presidente da França) em se intrometer nos assuntos internos e na soberania brasileira, (Michelle Bachelet) investe contra o Brasil na agenda de direitos humanos (de bandidos), atacando nossos valorosos policiais civis e militares", escreveu Bolsonaro em rede social.

"Diz ainda que o Brasil perde espaço democrático, mas se esquece que seu país só não é uma Cuba graças aos que tiveram a coragem de dar um basta à esquerda em 1973, entre esses comunistas o seu pai brigadeiro à época", concluiu, no Facebook.

Bolsonaro, que estará na Assembleia-Geral da ONU neste mês, publicou uma foto em que a ex-presidente chilena aparece ao lado de Dilma Rousseff e Cristina Kirchner, ex-presidentes de Brasil e Argentina. O ministro das Relações Exteriores endossou as críticas de Bolsonaro em seu Twitter.

Mais tarde, a jornalistas em Brasília, na manhã desta quarta, 4, ele reiterou as críticas. "Parece que quando tem gente que não tem o que fazer, como a senhora Michelle Bachelet, vai lá para cadeira de direitos humanos da ONU. Passar bem, dona Michelle". Bolsonaro ainda desejou "pêsames" para Bachelet. "A única coisa que tenho em comum com ela é a esposa que tem o mesmo nome. Fora isso, fora isso, meus pêsames a Michelle Bachelet", disse o presidente.

Alberto Bachelet
Alberto Bachelet, pai de Michelle, era general da Força Aérea e se opôs ao golpe dado por Augusto Pinochet em setembro de 1973. Bachelet foi preso três dias depois da queda de Salvador Allende e morreu, ainda no cárcere, em 12 de março de 1974, aos 50 anos.

Em 2012, a Justiça do Chile mandou prender os coronéis Benjamin Cevallos e Ramón Cáceres Jorquera, acusados de torturar e causar a morte do pai de Bachelet. Na ocasião, ela era candidata a presidente do país.

Foi a primeira vez em 38 anos que a Justiça se pronunciou sobre o caso do general Alberto Bachelet. A ordem foi dada após o Serviço Médico Legal determinar que a morte foi causada por problemas cardíacos decorrentes da tortura que ele sofreu na Academia de Guerra Aérea (AGA). À época, o órgão estava sob responsabilidade de Jorquera e Cevallos. “Há uma relação direta entre a morte da vítima e o seu último interrogatório”, escreveu o juiz.

Quando foi preso, o general chegou a enviar uma carta para sua mulher, Ângela Jeria, na qual relatava que o mais humilhante era que a tortura era praticada por seus companheiros de armas.

Alberto Bachellet e Michelle estão entre as 32 mil pessoas torturadas e presas durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990). A apuração dos crimes cometidos pelo Estado chileno durante a ditadura Pinochet levou a dezenas de condenações e prisões.

Fernando Santa Cruz
Não é a primeira vez que Bolsonaro se envolve em polêmica ao citar uma vítima de regimes ditatoriais. Em julho, ele respondeu a críticas do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, atacando a memória de seu pai, Fernando Santa Cruz, desaparecido durante a ditadura no País.

"Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, eu conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade", disse. O comentário teve repercussão imediata. Após a declaração, a Anistia Internacional emitiu uma nota de repúdio.

Felipe é filho de Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, integrante do grupo Ação Popular (AP), organização contrária ao regime militar. Ele foi preso pelo governo em 1974 e nunca mais foi visto. "Conto pra ele. Não é minha versão. É que a minha vivência me fez chegar nas conclusões naquele momento. O pai dele integrou a Ação Popular, o grupo mais sanguinário e violento da guerrilha lá de Pernambuco e veio desaparecer no Rio de Janeiro", disse Bolsonaro em coletiva de imprensa.

Além de Michelle Bachelet, Bolsonaro tem se desentendido com outros ex-presidentes e líderes mundiais, como Angela Merkel, chanceler alemã, Emmanuel Macron, presidente da França e a chapa formada por Cristina Kirchner e Alberto Fernández, na Argentina.

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