quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Bruno Boghossian – O populismo à brasileira

- Folha de S. Paulo

Presidente e aliados seguem linha que apresenta democracia como entrave a mudanças

“Sem dúvidas, nem o Parlamento, nem o Poder Judiciário são hoje agentes de mudança, mas freios à transformação e ao progresso.” A frase está no texto em que Alberto Fujimori justificava o autogolpe que fechou o Congresso e desfigurou os tribunais do Peru, em 1992. Poderia ter saído também da caneta de qualquer político populista de 2019.

O tuíte em que Carlos Bolsonaro lamenta a demora no avanço do país “por vias democráticas” carrega a substância daquela mensagem. O vereador não anunciou a implantação de um regime autoritário, é verdade, mas reproduziu bem a doutrina bolsonarista contra as instituições.

Governantes incomodados com os contrapesos do poder costumam culpar as limitações impostas pela democracia. O argumento seguinte é o de que a vontade do povo só será cumprida se os líderes puderem remover todos os obstáculos.

Essa é a linha clássica do populismo. Não por acaso, Jair Bolsonaro e seus aliados têm o hábito de apresentar as instituições como entraves às tentativas de mudar o país e de implementar seu programa.

Quando declarou que, numa democracia, as transformações podem demorar, o filho do presidente parecia pedir calma a eleitores impacientes, mas também reforçou mais uma vez aquele desconforto.

Meses atrás, o pai já havia feito uma propaganda explícita desse incômodo com os freios da política. “Que poder, de fato, tem o presidente do Brasil? Até o momento, como todas as suas ações foram ou serão questionadas no Congresso e na Justiça, apostaria que o presidente não serve para nada”, dizia um texto divulgado por Bolsonaro, em maio.

Jogar a culpa no “sistema” pode ser só uma estratégia para ganhar tempo, mas também contribui para nutrir uma insatisfação generalizada com as instituições democráticas. Líderes que tentam restringir a atuação de outros órgãos gostam de apelar para esse sentimento. Há 27 anos, o desprestígio do parlamento peruano levou mais de 80% da população a apoiar o golpe de Fujimori.

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