sexta-feira, 25 de outubro de 2019

Luiz Carlos Azedo - O voto da Rosa

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“Não é improvável que o voto da ministra Rosa Weber vire o julgamento do Supremo a favor do “trânsito em julgado”, sendo acompanhando por Cármen Lúcia , Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli”

O 4 x 3 a favor da execução da pena após condenação em segunda instância na votação do Supremo Tribunal Federal (STF) mantém o suspense sobre o desfecho desse julgamento. Até agora, votaram a favor os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux; contra, Marco Aurélio, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski. O julgamento foi suspenso pelo presidente da Corte, Dias Toffoli. Não votaram ainda Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Celso de Mello e o próprio Dias Toffoli, que anunciou a retomada do julgamento para os dias 6 ou 7 de novembro.

Dos sete votos, o mais emblemático foi a da ministra Rosa Weber, pelo fato de ter reiterado uma posição de princípio anunciada em julgamento de habeas corpus no qual votou a favor da atual jurisprudência, que determina a execução da pena após condenação em segunda instância. Rosa se manifestou contra a possibilidade de prisão de condenados em segunda instância, defendeu a presunção de inocência como “garantia fundamental” prevista na Constituição: “Goste eu pessoalmente ou não, esta é a escolha político-civilizatória estabelecida pelo Constituinte. Não reconhecê-la, com a devida vênia, é reescrevê-la para que espelhe o que gostaríamos que dissesse.”

Rosa contextualizou o julgamento, que ocorre num momento de “desconfiança do povo em relação a seus representantes e o descrédito da atividade política”. Segundo ela, é preciso resistir à tentação de “uma interpretação do texto constitucional que subtraia garantias e proteções”. Os constituintes, na sua avaliação, fixaram “o trânsito em julgado como termo final da presunção de inocência”. Quanto a isso, há que se considerar o fato de que a Constituição de 1988 foi elaborada num contexto de transição à democracia, no qual os traumas do regime militar levaram os constituintes a atribuir ao Supremo o papel de poder moderador da República, que até então, desde a Proclamação da República, fora exercido de forma nefasta pelos militares.

“Vale lembrar que a história universal é farta de exemplos de que a erosão das instituições garantidoras da existência dos regimes democráticos, quando ocorre, lenta e gradual, normalmente tem origem na melhor das intenções: moralidade pública, eficiência do Estado, combate à corrupção e à impunidade”, advertiu Rosa, que votou a favor da execução da pena após condenação em segunda instância em 66 decisões individuais, mas sempre com a ressalva de que era contra a jurisprudência e votaria para mudá-la, quando a questão voltasse a ser debatida em ações declaratórias. Ou seja, seu voto foi absolutamente coerente.

As consequências
Como diria o Conselheiro Acácio, personagem antológico de Eça de Queiroz, muito citado pelo ex-vice-presidente Marco Maciel, “as consequências vêm depois”. Não é improvável que o voto de Rosa vire o julgamento, sendo acompanhando por Cármen, Gilmar, Celso e o próprio Toffoli, pois todos sinalizaram nessa mesma direção em decisões e manifestações anteriores. Se isso ocorrer, será um ponto de inflexão irreversível para a Operação Lava-Jato. Seu impacto imediato será a libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. É uma decisão desgastante para o Supremo, porque a opinião pública é amplamente favorável à prisão em segunda instância, e com potencial de inflamar o ambiente político do país.

Rosa sabe perfeitamente que seu voto é polêmico, mas nem por isso deixou de faze-lo conforme a sua consciência. Nesse aspecto, serve de exemplo. Entretanto, ninguém deve ser ingênuo de acreditar que a Corte não sofrerá pressões de toda sorte. A interrupção do julgamento ensejará a mobilização de “lavajatistas” e “garantistas”. Nesse sentido, como em toda radicalização, o maniqueísmo presta um grande desserviço. Por exemplo, a tese de que a decisão pode resultar na soltura de 190 mil presos comuns é uma forma alarmista de influenciar a opinião pública, e não tem base na realidade. Não haverá um indulto generalizado nem uma anistia geral.

O melhor é aguardar a decisão final da Corte, cujo nome já diz tudo: Supremo, que tem a palavra final sobre a aplicação da Constituição da República.

Nenhum comentário:

Postar um comentário