domingo, 6 de outubro de 2019

Oded Grajew* - O Brasil na contramão

- Folha de S. Paulo

Avanços nos países nórdicos partiram de consensos

Vários países atingiram um grau de desenvolvimento que, certamente, provocam a inveja dos que acreditam que o nível de desenvolvimento de uma nação se mede pelo bem-estar de seu povo. Os escandinavos (Finlândia, Noruega, Dinamarca e Suécia), por exemplo, estão sempre entre os primeiros colocados em todas as classificações sociais, ambientais e econômicas mundiais. Eram os países mais pobres da Europa no começo do século passado. Acredito que seria bastante útil saber o que fizeram para chegar onde chegaram. Isso nos daria uma ideia se estamos no caminho certo.

Fui convidado recentemente para visitar a Suécia, quando pude entender o processo que levou o país ao estado atual. O caminho começou a ser trilhado a partir do momento em que chegaram a alguns consensos. Em primeiro lugar, acordaram que para que o país desse certo é fundamental que haja relações harmoniosas entre os cidadãos. E que, para isso, seria fundamental que houvesse sentimento de justiça, solidariedade e confiança entre as pessoas.

Todos deveriam ser incluídos na sociedade; nenhuma pessoa ou grupo deveria ser marginalizado ou discriminado. Tolerância e respeito entre os diferentes deveriam ser praticados, e a diversidade, valorizada.

O sentimento de justiça depende dos menores índices de desigualdades possíveis. Para isso, é fundamental oferecer educação púbica gratuita e de qualidade para todos —e isso vale para educação básica, superior, pesquisa e desenvolvimento científico. Seria uma maneira de dar oportunidades iguais de crescimento para todos, e o conhecimento ofereceria melhores condições de competitividade.

As políticas públicas deveriam ser instrumentos para reduzir as desigualdades. A participação da sociedade, incentivada e apoiada. É fundamental que organizações e entidades sociais participem em inúmeros conselhos temáticos e institucionais junto aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e em nível municipal, estadual e nacional.

Seria uma maneira de aperfeiçoar as políticas públicas, garantir a transparência e assegurar que as decisões possam promover a justiça social e atender ao interesse público.

A composição dos quadros políticos também deve ser um espelho da própria sociedade para que as decisões possam beneficiar a todos e, principalmente, os mais necessitados. A participação de 50% das mulheres nos cargos públicos e a criação de um órgão técnico independente, com autonomia para dar parecer sobre todas as decisões do governo do ponto de vista das desigualdades, são exemplos de regras e políticas públicas que visam contribuir para uma sociedade mais justa e sustentável.

Para estabelecer relações de confiança, a regra é transparência total. Todos os dados e informações governamentais e de empresas e indivíduos que são de interesse da sociedade são públicos. Os salários e benefícios dos políticos e dos servidores dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário são transparentes e absolutamente modestos, compatíveis com a renda da população e com as verdadeiras necessidades do exercício dos cargos.

Finalmente, os cuidados e a valorização do meio ambiente garantiriam a preservação dos recursos naturais e da vida, evitando escassez, conflitos, mitigando os efeitos das mudanças climáticas e em solidariedade às futuras gerações.

A partir desses consensos, o desenvolvimento gerou países onde, do nascimento até a morte do indivíduo, o Estado garante saúde, licença-maternidade, educação, renda mínima, seguro-desemprego, aposentadoria e outros direitos.

Os indicadores de desigualdade e criminalidade dos nórdicos são os menores do mundo. A Noruega é o país líder mundial em prosperidade e com melhor IDH do planeta; a Dinamarca é considerada a nação menos corrupta e líder mundial em performance ambiental; e a Suécia é um dos líderes globais em inovação e competitividade.

Você, leitora e leitor, acha que o Brasil está no caminho certo?

*Oded Grajew, presidente do Conselho Deliberativo da Oxfam Brasil, presidente emérito do Instituto Ethos e conselheiro da Rede Nossa São Paulo e do programa Cidades Sustentáveis

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