terça-feira, 1 de outubro de 2019

Opinião do dia - Luiz Werneck Vianna*

A Carta de 1988 teve a pretensão de sepultar as possibilidades de retorno do autoritarismo político afirmando uma forte adesão ao liberalismo e ao sistema da representação, e robustecendo de modo inédito o poder judicial por meio de novos institutos como o mandato de injunção, e com a recriação do papel do Ministério Público que será deslocado do eixo estatal, conforme antiga tradição, para o da sociedade civil, a quem foi confiado, entre outras, a missão de defesa da ordem jurídica e do regime democrático, figura inexistente no direito comparado

Com a ressalva do PT, já um importante partido, influente no sindicalismo e com a auréola portada por seus dirigentes de ter conduzido greves vitoriosas no regime militar, a nova Carta encontrou recepção positiva na sociedade. Estava aberta uma via real para a internalização da democracia política entre nós. As instituições eram propícias e o cenário internacional favorável, faltava a ação humana capaz de portar uma política que soubesse se aproveitar dos bons ventos da fortuna que a tinham levado a seus êxitos contra o regime militar. Vargas Llosa, nas primeiras páginas de Conversa na Catedral, clássico da literatura latino-americana, indaga, amargando a história do seu país, o Peru, quando foi que ele se ha hodido. No nosso caso talvez resposta a uma questão desse tipo esteja no momento em que se abre a conjuntura da primeira sucessão presidencial do novo regime democrático institucionalizado com a Carta de 88. Aqui o que faltou não foi a fortuna, que nos sorria, mas o ator que, com suas ações desastradas malbaratou as oportunidades de que dispunha.


*Luiz Werneck Vianna, sociólogo, PUC-Rio. ‘O Desencontro trágico entre a fortuna e o ator na experiência brasileira’. Texto apresentado ao 19º Congresso da SBS, Blog Democracia Política e novo Reformismo, 10/7/2019

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