sábado, 8 de fevereiro de 2020

O que a mídia pensa – Editoriais

Zelar pela retomada – Editorial | Folha de S. Paulo

Diante de sinais de fragilidade na economia, BC acerta em reduzir juros de novo

Apesar de resultados favoráveis ao final de 2019 e da perspectiva em geral positiva para este ano, permanecem sinais de fragilidade na economia. Em particular, a persistente letargia da indústria e das exportações sugere que a esperada aceleração do crescimento ainda se encontra sujeita a percalços.

A produção industrial encolheu 1,1% em 2019, interrompendo a tímida trajetória de expansão dos dois anos anteriores. A tragédia de Brumadinho contribuiu para tanto ao derrubar o setor extrativo em 10%, mas o resultado geral é ruim mesmo descontando tal efeito.

Setores fundamentais como metalurgia, automóveis e máquinas estão estagnados ou em queda.

Há uma coletânea de fatores que podem explicar o fenômeno, alguns de curto prazo e outros de natureza estrutural. A profunda recessão argentina, por exemplo, subtraiu 35% das exportações brasileiras para o pais vizinho, concentradas em manufaturados.

Entretanto o problema parece mais profundo. Em outras retomadas, a indústria sempre reagiu. Em que pese a baixa competitividade, a desvalorização cambial dos últimos anos deveria ter aberto algum espaço para a produção crescer, ao menos substituindo importações. Nem isso está ocorrendo.

Não por acaso, e também em decorrência do ambiente internacional mais adverso, as exportações caíram 6,3% no ano passado. Agora, o coronavírus leva mais incerteza ao cenário global.

Em compensação, a demanda interna ainda parece firme. Emprego e renda estão em alta, embora modesta. Nos últimos meses ganhou tração a abertura de vagas formais, o que pode sustentar o consumo e o crédito.

A construção civil dá sinais de vida, que podem se tornar mais vigorosos se o programa de concessões de infraestrutura deslanchar.

Tudo somado, o quadro aponta para crescimento perto ou talvez um pouco acima de 2% —os riscos, porém, são consideráveis.

Nesse sentido, é bem-vinda a decisão do Banco Central de cortar os juros em 0,25 ponto percentual, para a nova mínima histórica de 4,25% anuais. Com inflação estimada em 3,4% neste ano, a taxa para os próximos 12 meses está apenas 0,8% acima da inflação, patamar que, em tese ao menos, tende a impulsionar a economia.

Apesar da indicação do BC de que o ciclo de reduções está encerrado, não se veem sinais de aceleração dos preços, como se viu no IPCA de janeiro. Ao contrário, o BC deve se manter atento ao risco de uma nova frustração das expectativas de recuperação da atividade.

Epidemia confinada – Editorial | Folha de S. Paulo

Maioria de casos de pneumonia por coronavírus se concentra em província da China

À medida que transcorrem as semanas desde o surgimento do surto de pneumonia pelo novo coronavírus (2019-nCov) na China, em dezembro, fica mais e mais claro que o pior da epidemia se concentra nesse país asiático. Não com pouca gravidade, decerto, inclusive do ângulo econômico, mas sem o trauma de uma pandemia global.

Dos 31.530 casos confirmados até a tarde de sexta (7), 31.213 haviam sido registrados em território chinês. O total de 717 mortes, embora próximo dos 774 óbitos na esteira da Sars em 2003-4, tampouco justifica alarme desmesurado noutras nações, uma vez que a quase totalidade ocorreu na província de Hubei, onde fica a cidade de Wuhan.

Outros 27 países tiveram infecções confirmadas, a maioria de viajantes provenientes da China, com raros casos de transmissão local. Parecem surtir efeito as medidas de prevenção contra a globalização da epidemia, como retirada de estrangeiros seguida de quarentena.

O presidente Jair Bolsonaro de início se mostrou hesitante quanto a essa providência, precipitando-se mais uma vez sem dispor de informações confiáveis. “Não vamos colocar em risco nós aqui por uma família apenas”, chegou a dizer.

Em realidade, eram mais de 34 os brasileiros a evacuar de Wuhan, como mostrou vídeo suplicante que rapidamente se espalhou. Apesar da hesitação presidencial, o governo se mexeu e, com apoio do Congresso, aprovou em pouco tempo uma lei regulamentando a quarentena dos repatriados que devem desembarcar neste fim de semana.

Passageiros dos dois aviões da FAB ficarão confinados por 18 dias no hotel de trânsito da Aeronáutica em Anápolis (GO), assim como os tripulantes. Uma medida extrema de precaução a prejudicar algumas dezenas de brasileiros que tiveram a má sorte de se achar na região de Wuhan, mas justificável para proteger a saúde de multidões.

Até aqui só houve suspeitas descartadas no país, com o total remanescente reduzido a oito.

Pouco se pode fazer em Brasília, contudo, contra os efeitos colaterais do coronavírus na economia. Projeta-se que a epidemia possa ceifar até um ponto percentual do crescimento do PIB chinês, com óbvios reflexos em países como o Brasil, que tem na China o principal destino de suas exportações.

É uma incógnita também o impacto político do 2019-nCov sobre o governo de Xi Jinping. Há grande descontentamento com a administração do surto por Pequim, começando pela letargia interessada na ocultação, seguida por medidas impopulares como o confinamento de milhões de pessoas.

Menos inflação e mais expansão – Editorial | O Estado de S. Paulo

Crescimento maior da economia, com geração mais fácil de empregos, poderá ser um dos bons efeitos do recuo da inflação, depois do salto registrado no fim do ano. O primeiro efeito positivo é obviamente o alívio no orçamento da maior parte das famílias, embora alguns preços importantes, como os de habitação e transportes, ainda tenham incomodado. Mas a tendência de normalização parece inegável, depois de alguns meses difíceis. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiu 0,21% em janeiro, na menor variação para esse mês desde o início do Plano Real em 1994. Em dezembro, a alta havia sido de 1,15%. Com esse recuo, o aumento acumulado em 12 meses passou de 4,31% para 4,19%. Esse número ainda é superior à meta oficial deste ano (4%, com tolerância de 1,5 ponto para mais ou para menos), mas a acomodação gradual nos próximos meses parece uma aposta muito segura.

Esse detalhe aponta o segundo grande benefício. Com a inflação contida e no rumo da meta deste e do próximo ano, o Banco Central (BC) provavelmente poderá manter por um bom tempo a taxa básica de juros, diminuída de 4,50% para 4,25% na quarta-feira passada. Prevê-se no mercado um novo aperto da política monetária a partir do próximo ano, ou do fim de 2020, mas o panorama por enquanto é de calmaria nos preços. Pressões para alta de juros, se ocorrerem, virão mais provavelmente do exterior. Neste momento, no entanto, os juros nas principais economias são propícios à manutenção da política brasileira.

Mantida essa política, a oferta de dinheiro em condições mais favoráveis poderá estimular o consumo, a dinamização dos negócios e, um pouco mais longe, a criação mais rápida de empregos. Além disso, o corte dos juros tem diminuído o custo da dívida pública, baseado parcialmente na taxa básica, a Selic. A redução dos custos financeiros do Tesouro poderá apressar a arrumação das contas públicas, se o governo conseguir avançar em outras tarefas, como a conquista de maior eficiência na programação e gestão das despesas.

A acomodação dos preços de alimentação e bebidas facilitou, como se esperava, o retorno da inflação a um ritmo mais moderado. O item comida e bebidas ainda subiu 0,39% e teve um impacto de 0,07 ponto na formação do índice geral, mas seu comportamento foi muito mais favorável que nos meses finais do ano passado.

Em dezembro, esse item ainda aumentou 3,38% e seu impacto, de 0,83 ponto porcentual, foi o mais importante na composição do IPCA.

Em janeiro, vários grupos de preços avançaram menos que os da alimentação, ou chegaram mesmo a diminuir, mas seu peso, em muitos casos, é bem menor no resultado geral.

Especialmente bem-vindo foi o recuo do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), calculado com base nas despesas de famílias com rendimento monetário de 1 a 5 salários mínimos (o universo do IPCA é o das famílias com ganho mensal até 40 mínimos). A alta do INPC passou de 1,22% em dezembro para 0,19% em janeiro, menor variação para o mês desde a implantação do Plano Real. A alta em 12 meses passou de 4,48% para 4,30%. Os preços da comida aumentaram 0,45%, depois de terem subido 3,66% em dezembro. Esse recuo foi, de longe, o mais importante para a desaceleração do INPC.

A perda de impulso da inflação foi mostrada também pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), por meio de seu Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI), formado por três grandes componentes. A alta do indicador geral passou de 1,74% em dezembro para 0,09% em janeiro. A dos preços ao consumidor foi de 0,77% para 0,59%. A dos preços por atacado recuou de 2,34% para 0,13%, num sinal de menor pressão sobre o varejo. A do custo da construção subiu de 0,21% para 0,38%.

Mas a inflação contida ainda é, em boa parte, efeito do desemprego da capacidade ociosa das empresas. Mover a economia deve ser a prioridade. Conter a inflação poderá ser mais trabalhoso, mas o desafio será muito bem-vindo.

O bendito teto – Editorial | O Estado de S. Paulo

Em 2019, sete dos oito órgãos que compõem o Poder Judiciário e os dois que constituem o Ministério Público romperam o teto de gastos em R$ 2,450 bilhões. A infração não acarretará sanções, já que o excedente foi compensado pelo Executivo, mas revela a falta de compromisso do Poder Judiciário e do Ministério Público em relação ao equilíbrio das contas públicas. A partir deste ano, contudo, esse compromisso terá de ser assumido a gosto ou contragosto, uma vez que os demais Poderes não poderão contar com o Executivo para cobrir seus excessos.

O Poder Judiciário executou R$ 2,36 bilhões acima do teto. O maior estouro foi o da Justiça do Trabalho, que gastou R$ 1,63 bilhão além do seu limite. Em seguida vieram a Justiça Federal (R$ 514 milhões), Justiça Militar (R$ 97 milhões), Justiça do Distrito Federal (R$ 80 milhões), Supremo Tribunal Federal (R$ 70 milhões), Justiça Militar da União (R$ 6,62 milhões) e Conselho Nacional de Justiça (R$ 3,8 milhões). Além disso, o Ministério Público da União ultrapassou o teto em R$ 90,05 milhões.

Os tetos foram estabelecidos em 2016 pela Emenda Constitucional 95, que prevê os limites de gastos para os próximos 20 anos. Nos últimos três anos eles foram sistematicamente rompidos. Ocorre que a Emenda previu uma regra de transição, pela qual o Executivo poderia compensar os excessos até 2019. A partir deste ano, contudo, os Poderes precisarão se enquadrar aos seus respectivos tetos, caso contrário serão proibidos de conceder reajustes, criar cargos, alterar estruturas de carreira, contratar pessoal e realizar concursos públicos.

Em média, 85% dos gastos desses órgãos são com pessoal e seus benefícios (auxílio-saúde, moradia, alimentação, etc.). Tudo somado, as despesas obrigatórias perfazem 89% dos gastos. Os 11% restantes cobrem infraestrutura (luz, limpeza, manutenção, etc.), além de investimentos em inovação e outras despesas discricionárias. É sobre elas que recairão os cortes, com o risco de prejudicar a prestação de serviços à população.

Segundo projeções da Instituição Fiscal Independente do Senado, em 2020 o Ministério Público precisará reduzir cerca de 10% dos seus gastos discricionários e o Judiciário quase 6%. Mas alguns órgãos precisam realizar cortes particularmente dramáticos. A Justiça do Trabalho, por exemplo, precisa reduzir em quase 40% seus gastos não obrigatórios. Como essas estimativas foram feitas em meados de 2019, quando a expectativa de quebra do teto era menor, os cortes devem ser ainda maiores. Para ter uma ideia, à época previa-se que a Justiça do Trabalho estouraria o teto em R$ 1,119 bilhão. Na prática, o estouro foi de R$ 1,63 bilhão.

Este desrespeito sistemático da Justiça em relação aos limites impostos pela Constituição evidencia a necessidade de reformar amplamente a máquina pública. A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 186/19, não à toa denominada PEC Emergencial, é essencial para se garantir o cumprimento dos dois principais dispositivos constitucionais de equilíbrio fiscal: o teto de gastos e a “regra de ouro”, segundo a qual o governo não pode “realizar operações de crédito que excedam o montante de despesas de capital” (art. 167, III). A PEC, em tramitação no Congresso, autoriza o corte de despesas obrigatórias, a principal ameaça ao cumprimento do teto, sempre que a despesa corrente superar 95% da receita corrente.

Além disso, é indispensável para a sustentabilidade do Estado a implementação de reformas administrativas que adaptem o serviço público às necessidades e contingências do tempo presente, a começar pela eliminação de privilégios, em especial os acumulados pela sua elite, justamente o Judiciário e o Ministério Público. Entre 2013 e 2018, enquanto a massa salarial dos empregados do setor privado encolhia 0,7%, os vencimentos e benefícios dos agentes públicos cresceram 12%. Em boa hora vem se impor sobre suas cabeças este teto, forçando-os a pôr os pés no chão.

Desencontros entre educação e trabalho – Editorial | O Estado de S. Paulo

O universo do trabalho vive transformações sem precedentes. Os avanços tecnológicos criam carreiras insuspeitadas com a mesma velocidade com que pulverizam ofícios tradicionais. Ao mesmo tempo, os jovens estudam mais tempo do que qualquer outra geração na história, e ingressam na vida profissional consideravelmente mais qualificados do que seus pais. Mas estão mais preparados para as ofertas e demandas do mercado de trabalho? Segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), após a análise de quase 20 anos do Programa para Avaliação Internacional de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês), o maior banco de dados educacional do mundo, a resposta é “Não”.

A pesquisa Emprego dos sonhos: as aspirações dos adolescentes e o futuro do trabalho mostra que as expectativas de carreira mudaram pouco em duas décadas. Na verdade, concentraram-se fortemente em poucas carreiras. Segundo o levantamento de 2018 do Pisa, feito com meio milhão de estudantes de 15 anos, 47% dos meninos e 53% das meninas de 41 países disseram que esperam trabalhar em uma de apenas 10 carreiras – um aumento de 8% para os meninos e 4% para as meninas desde o início do século.

“Causa preocupação que mais jovens do que antes parecem escolher seu trabalho dos sonhos de uma pequena lista dos ofícios mais populares e tradicionais, como professores, advogados ou administradores de empresas”, disse o diretor educacional da OCDE, Andreas Schleicher. “Muitos adolescentes ignoram os novos tipos de trabalho que estão surgindo, particularmente como resultado da digitalização.”

No Brasil, algo entre 66% e 75% dos estudantes expressam interesse por apenas 10 carreiras. Enquanto isso, em países com tradição de treinamento vocacional para professores, como a Alemanha ou a Suíça, este índice não chega a 40%, refletindo bem melhor os padrões atuais do mercado. “De muitas maneiras, parece que os sinais do mercado de trabalho não estão chegando aos jovens: trabalhos acessíveis, bem remunerados e com futuro não parecem capturar a atenção dos adolescentes”, disse Schleicher. No Japão e na Eslováquia, cerca de metade das carreiras antecipadas pelos jovens sofre risco de ser automatizada.

Essas discrepâncias entre aquilo que a sociedade e a economia exigem e aquilo que a educação fornece são preocupantes e revelam que mais educação não implica automaticamente melhores empregos e qualidade de vida.

A pesquisa mostra ainda o quanto as aspirações dos jovens podem ser distorcidas por sua origem social. Um em cada três adolescentes de classes baixas com alto desempenho no Pisa não aspira a um diploma universitário nem a um emprego para o qual o certificado é a porta de entrada. Isso significa que entre os jovens com alto desempenho os pobres têm quatro vezes menos chances de nutrir altas aspirações do que seus pares de classes mais privilegiadas. Por outro lado, um em cada cinco jovens dos países da OCDE está negativamente desajustado em relação ao objeto de suas expectativas, ou seja, o nível de educação e qualificação ao qual ele aspira é inferior ao exigido pela carreira de sua predileção.

O estudo evidencia uma fratura entre o mundo do trabalho e o da educação, e entre a realidade objetiva do mercado e a percepção subjetiva dos jovens, advertindo que os sistemas educacionais precisarão ir além dos métodos tradicionais. “A nova geração de cidadãos exige não só fortes habilidades acadêmicas, mas também curiosidade, imaginação, empatia, empreendedorismo e resiliência”, disse Charles Yidan, um dos responsáveis pela pesquisa. “Nunca antes”, conclui ele, “uma orientação eficaz de carreira foi tão importante e nunca antes foi tão grande a necessidade dos empregadores se engajarem em um trabalho com as escolas para ajudar os jovens a compreender os empregos e carreiras e para ajudar os professores a trazerem a educação para a vida.”

Informação é essencial em epidemias – Editorial | O Globo

Ministério da Saúde demonstra eficiência na comunicação, nos preparativos contra o coronavírus

O médico Li Wenliang teve a morte confirmada na noite de quinta, vítima do coronavírus. Se já era saudado nas redes sociais por ter sido o primeiro profissional de saúde a alertar para uma “doença misteriosa” de pacientes internados no seu hospital em Wuhan — parecida com a Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars), que também aparecera na China, há 16 anos —, Li transformou-se definitivamente em herói ao ser vítima do novo vírus. Sobre o qual chamara a atenção de outros médicos, e por isso foi acusado pelo governo chinês de “espalhar o pânico”.

Pequim agiu como uma ditadura que é. Da mesma forma que na Sars, tentou abafar. Mas, mesmo o regime que talvez seja no mundo o que mais vigia a população, não conseguiu impedir a circulação de notícias e comentários sobre a epidemia que já se espalhava.

Pelo menos, o presidente Xi Jinping recuou na insensatez. Medidas preventivas começaram a ser tomadas, e a população passou a ser informada.

Terminou recebendo elogios de Trump e da Organização Mundial da Saúde (OMS), e ainda aproveitou o interesse despertado pelo coronavírus para fazer marketing da eficiência chinesa: a construção de hospitais em questão de dias passou a ser transmitida ao vivo para todo o mundo.

O ponto-chave é a necessidade de todos serem informados pelas autoridades de tudo o que acontece, e da forma mais rápida. É o que tem feito o Ministério da Saúde, em um dos raros bons exemplos administrativos no governo Bolsonaro até agora.

Entrevistas coletivas diárias passaram a ser dadas por secretários da pasta — como o de Vigilância em Saúde, Wanderson Kleber, e o secretário-executivo, João Gabbardo —, com estatísticas sobre o acompanhamento de possíveis casos de contaminação no Brasil e informações gerais acerca de prevenções e tudo o mais que os repórteres perguntem. Há, ainda, um cuidado especial com as fake news, que proliferam nessas situações. No site do Ministério há uma lista das mentiras eletrônicas e seus desmentidos.

Nesta semana, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e equipe se reuniram com os secretários estaduais da área em Brasília, para tratar de planos de contingência contra o vírus.

Parece inevitável que ele entre no país. Mas há fortes indícios de que o poder público, pelo menos o federal, se prepara com alguma eficiência para enfrentá-lo. Só aí este trabalho será testado.

A evolução dessa crise mundial de saúde pública define como essencial não apenas o fluxo constante e transparente de informações para a sociedade, mas também a interconexão da comunidade científica global, para o compartilhamento de avanços no trabalho de desenvolvimento de uma vacina contra o vírus. Também neste circuito atua a OMS.

Após debelada a epidemia, um balanço de como ela foi enfrentada deverá ajudar no aperfeiçoamento de protocolos que precisarão ser comuns a toda a comunidade internacional.


Dúvidas sobre o rumo do governo agravam o drama da Argentina – Editorial | O Globo

Indefinições se espraiam pela política econômica e já alcançam as negociações com credores da dívida

Em recente reunião com empresários na Alemanha, o presidente da Argentina, Alberto Fernández, afirmou que seu país se encontra “em terapia intensiva”. É o reconhecimento do óbvio.

Ao menos nesta etapa, porém, a resolução da agonia argentina depende mais de um acordo político dentro do próprio governo de Fernández do que, precisamente, de uma demonstração de “boa vontade” dos credores da dívida externa, que supera 70% do PIB.

A ambiguidade impede a distinção entre as fronteiras de poder de Fernández e da sua vice, Cristina Kirchner. E resulta em sinais contraditórios sobre o rumo do governo.

A moderação que o presidente tem feito questão de realçar contrasta, por exemplo, com a ação de brigadas kirchneristas de “fiscalização” de preços nas gôndolas dos supermercados de Córdoba. Assim como é incoerente com os sucessivos desafios da sua vice-presidente ao Poder Judiciário: com uma dezena de processos por corrupção, ela resolveu “visitar” as obras de hidrelétricas públicas que estão no centro das acusações judiciais de pagamento de propinas durante seu governo (2007-2015), na companhia dos empresários responsáveis e igualmente suspeitos.

Evidências da indefinição de rumos se espraiam, também, na política econômica e já alcançam as negociações com os credores da dívida.

De um lado, o presidente estimula o ministro da Economia, Martín Guzmán, a uma moratória pactuada com o Fundo Monetário Internacional e os detentores de títulos emitidos pelo país. De outro, a vice-presidente não oculta sua predileção por seu ex-ministro Axel Kicillof, atual governador de Buenos Aires, e concede-lhe espaço para fustigar estratégias de negociação de Guzmán.

O governador de Buenos Aires fracassou na primeira tentativa, ao apresentar aos credores uma proposta de calote diferente e mais radical em relação à do governo central. Viu-se obrigado a recuar e, por enquanto, manter pagamentos em dia.

A dicotomia se refletiu nas negociações do ministro Guzmán com os credores externos — nesta semana, apenas 10% reagiram favoravelmente à sua proposta. Em reação, ele lembrou o legado de Kicillof no comando da Economia do governo Cristina Kirchner: “A Argentina pagará taxas de juro de 9% da dívida em 2020 e 2021, e isso é insustentável.”

Ambiguidade no poder, geralmente, custa caro. O presidente Fernández parece consciente, pois, de passagem pelo Vaticano, comentou: “Se soubessem o quanto estamos próximos do precipício, alguns agiriam com mais responsabilidade.”

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