terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

Pablo Ortellado* - Lição de Porto Alegre

- Folha de S. Paulo

Pacote concede tarifa zero a trabalhadores formais e tarifa social a demais usuários

A Prefeitura de Porto Alegre apresentou à Câmara de Vereadores um ambicioso pacote de mobilidade urbana que pode revolucionar o financiamento do transporte público. O conjunto de medidas concede tarifa zero para os trabalhadores com carteira assinada e estabelece uma tarifa social de menos de R$ 2 para o restante da população (e menos de R$ 1 para os estudantes).

A iniciativa de maior impacto é a introdução de uma taxa de mobilidade urbana que substituiria o vale-transporte. Os trabalhadores não teriam mais descontados 6% do salário, e as empresas pagariam à prefeitura uma taxa mensal por empregado menor do que gastam hoje com o vale-transporte (mas a base de arrecadação seria maior, porque empresas com empregados mais bem remunerados que optam por não ter vale-transporte passariam a pagar).

A medida daria tarifa zero para qualquer viagem de ônibus dos trabalhadores formais (aproximadamente metade da força de trabalho). Além disso, a tarifa teria uma redução de R$ 2,35, e o fim do desconto do vale-transporte daria aos trabalhadores mais pobres um acréscimo de 6% na renda.

A segunda medida mais impactante seria a introdução de uma taxa sobre as viagens em aplicativos de transporte, como a que existe em São Paulo. Essa taxa cobraria R$ 0,28 por km rodado de todas as viagens por aplicativo. Uma viagem de 3 km, por exemplo, teria um acréscimo de R$ 0,84 no preço final. Em contrapartida, as passagens de ônibus teriam uma redução de R$ 0,70.

A prefeitura também propõe a extinção de uma taxa de gestão do sistema que reduziria a tarifa em outros R$ 0,15.

O pacote tem duas medidas mais controversas. Uma delas é a eliminação gradual dos cobradores, que reduziria a tarifa em R$ 0,05. Os cobradores não seriam demitidos, mas aposentadorias, mortes e demissões por justa causa não seriam repostas. Quando a função deixasse de existir, a redução da tarifa poderia ser de R$ 0,90.

A segunda medida mais controversa é a introdução de um pedágio urbano para carros de fora da cidade, no valor de uma passagem de ônibus (que reduziria a tarifa em outros R$ 0,50).

O conjunto de ações tem forte efeito distributivo, amplia o acesso à cidade, melhora o trânsito e diminui a emissão de poluentes.

Se o pacote for aprovado, Porto Alegre estabelecerá um novo paradigma para o financiamento do transporte público, elevando o subsídio para um patamar europeu e colocando a cidade na vanguarda das experiências mundiais com a tarifa zero.

O PSDB de São Paulo tem muito a aprender com seu colega do Sul.

*Pablo Ortellado, professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia

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