terça-feira, 14 de abril de 2020

Hélio Schwartsman - A avó de todas as vacinas

- Folha de S. Paulo

Corrida em busca de uma vacina contra a Covid-19 é notável

Nossa melhor esperança para uma volta à normalidade é o desenvolvimento de uma vacina contra a Covid-19. Há uma verdadeira corrida mundial por um imunizante. Apenas três meses após a identificação da doença, surgiram vários candidatos a vacina, alguns dos quais já estão sendo ministrados a humanos para testar a segurança e a intensidade da resposta imune.

É um feito notável, considerando que avanços em pesquisas de novas vacinas costumam medir-se em anos, não em meses. Ainda assim, não temos nenhuma segurança de que poderemos contar logo com um imunizante, se é que o Sars-Cov-2 é um vírus “vacinizável”. Nem todos são. Um prazo muito repetido na imprensa é o de um ano e meio a dois anos para um produto que possa ser usado em escala comercial.

Enquanto isso, na blogosfera nerd norte-americana, já há quem cogite apelar para a variolação. Para os muitos leitores que não devem estar familiarizados com o termo, a variolação é o ancestral das vacinações. Historicamente, consistiu em inocular pessoas com uma dose baixa do vírus da varíola, o que normalmente produzia uma infecção branda, mas que ainda assim proporcionava imunidade.

Da China medieval à África do século 20, foi praticada em diferentes épocas em várias partes do mundo. Caiu em desuso depois que Edward Jenner desenvolveu a primeira vacina de verdade contra a doença, no final do século 18.

A ideia de inocular propositalmente o Sars-Cov-2 em voluntários parece hoje maluca, mas, dependendo de como a epidemia evoluir, poderá deixar de ser. Meu receio, se a proposta dos passaportes de imunidade —que, diga-se, faz todo o sentido— prosperar, é que gente vulnerável que precisa desesperadamente trabalhar adote uma forma selvagem de variolação, expondo-se ao vírus sem preocupar-se com a dose no contágio nem com o necessário isolamento posterior, o que só agravaria a situação.

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