sexta-feira, 10 de abril de 2020

Merval Pereira - Combate virtual

- O Globo

Ministros e políticos montaram seus próprios esquemas digitais para se contraporem aos bolsonaristas

“Quem com ferro fere, com ferro será ferido”, uma citação bíblica tornada ditado popular, tão ao gosto do presidente Bolsonaro, pode explicar o que está acontecendo na disputa pelas redes sociais, fundamentais na estratégia política do presidente Bolsonaro, ou melhor, de seu filho 02, o vereador especialista digital Carlos Bolsonaro.

De tanto apanharem nas redes sociais da milícia digital dos Bolsonaro, comandados pelo “gabinete do ódio” que funciona dentro do Palácio do Planalto, ministros e políticos em geral resolveram montar seus próprios esquemas digitais para se contraporem à ação dos bolsonaristas.

Quando querem “fritar” algum ministro, eles começam pelas redes sociais, geralmente comandados pelo guru Olavo de Carvalho. Foi assim que caíram os ministros Gustavo Bebianno e Santos Cruz, que costuma chamar de “gangue digital” os seguidores de Bolsonaro que atuam nas redes sociais como verdadeiras milícias.

A ponto de terem criado mensagens fakes onde o então ministro criticava o presidente no WhattsApp. Santos Cruz provou que era uma montagem, mas já era tarde. O falecido Bebianno também caiu, depois de uma fritura intensa, por causa de uma discussão no WhattsApp.

O ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, depois de quase ter sido demitido pelo presidente no início da semana, ganhou cerca 100 mil seguidores no Twitter, Facebook e Instagram em um só dia, segundo dados da Bites Consultoria especializada nesse acompanhamento digital.

Na quarta-feira, Mandetta participou de uma “live” da cantora sertaneja Marília Mendonça que chegou a ter mais de 3,2 milhões de visualizações ao mesmo tempo. No sábado anterior, atraindo a fúria do presidente Bolsonaro, Mandetta havia aparecido também na “live” de Jorge e Mateus, que teve 3,1 milhões.

No dia seguinte, Bolsonaro deu a declaração de que muitos ministros estão virando estrelas, e que o dia deles iria chegar. A mesma empresa Bites mostra que o número de tuítes em defesa do ministro chegou a quase 500 mil, enquanto os ataques nas redes sociais a ele foram compartilhados apenas 81 mil vezes.

O ministro Sérgio Moro, da Justiça e Segurança Pública, entrou no início do ano no Instagram, e hoje tem mais de 1 milhão de seguidores. No Twitter, ele ultrapassou 2 milhões de assinantes.“São instrumentos para divulgar as ações do Ministério da Justiça e da Segurança Pública e para colher opiniões a esse respeito”, alega, mas de fato as redes sociais têm servido de pára-raios em meio às crises.

Quando Bolsonaro foi a um ato contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal em frente ao Palácio do Planalto, em meio à pandemia do coronavírus, o número de opositores do presidente nas redes sociais superou o de apoiadores. Segundo a mesma consultoria Bites, 1,4 milhão de perfis do Twitter atacaram o presidente, enquanto 1,2 milhão o defendeu, em pesquisa realizada entre 15 e 26 de março.

Nesse período, o presidente intensificou críticas aos governadores, especialmente aos do Rio, Wilson Witzel e o de São Paulo João Dória. Em contraposição a Bolsonaro a partir da defesa do isolamento social, os governadores se fortaleceram nas redes sociais, aponta o levantamento.

A popularidade virtual dos governadores João Doria (PSDB-SP), Wilzon Witzel (PSC-RJ) aumentou, mesmo que Bolsonaro continue disparado no Índice de Popularidade Digital da consultoria Quaest, que agrega informações do Twitter, Facebook, Instagram e, mais recentemente, também analisa YouTube, Google Trends e acessos a Wikipedia.

Em março, Bolsonaro caiu de 83,1 para 69,1 (o IPD varia de 0 a 100) – queda de 16,8%. Mesmo em patamar abaixo do presidente, os governadores tiveram altas importantes: Doria cresceu 66,1% e Witzel, 39,6%. A posição dos governadores trouxe também vantagens na popularidade digital para os governadores do Maranhão, Flavio Dino, do Pará Helder Barbalho, Comandante Moisés de Santa Catarina, Camilo Santana. Do Ceará, entre outros. De vários partidos, mas unidos em torno do isolamento horizontal.

Segundo a consultoria Bites, o mais importante não é uma eventual queda do presidente Bolsonaro nas redes sociais, mas o crescimento de uma onda oposicionista sem liderança no universo digital, especialmente no Twitter.

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