sexta-feira, 24 de abril de 2020

Nelson Motta - Chavismo de direita

- O Globo

Parece um método chavista cercar-se de generais

Tempo de horror em que os dois únicos assuntos nacionais são coronavírus e Bolsonaro. Parece que nada mais interessa. Está chato. Todo mundo escreve sobre as mesmas coisas. Desculpem, mas...

Lembrei-me de um filme de Kurosawa chamado “Homem mau dorme bem”, um grande ataque do mestre ao capitalismo. É sabido que Bolsonaro dorme pouco e mal, com um revólver na cabeceira, é natural que acorde cansado e mal-humorado. É quando fala suas maiores besteiras.

Depende do que tenha sonhado. Qual é o seu pior pesadelo? Ser impichado, o Queiroz contar tudo e Flávio ser preso, ou a depressão econômica? Ele é do tipo que não hesitaria em provocar uma guerra civil para se manter no poder, ou salvar um filho da cadeia. Mas o Exército o conhece bem, desde que o expulsou por planejar botar bombas em quartéis. Não pela democracia, por aumento de salário.

Pior é se fazer de louco, achando que todo mundo é burro, dizendo que não precisa dar um golpe porque já está no poder, fingindo que não existe o autogolpe, o parlamentar, e o golpe gradual de Hugo Chávez, o pior exemplo possível, que deu no que deu. Parece um método chavista cercar-se de generais, que não só o ajudariam como subordinados, mas também botariam as tropas na rua num eventual impeachment.

O próximo passo seria transformar suas milícias virtuais em armadas, como as chavistas, para “defender a democracia”? A coragem em um teclado não é a mesma diante de um fuzil. Robôs não usam fuzis, são virtuais, uma forma de autoengano em que quem paga sabe que as milhões de mensagens de apoio não são verdadeiras e estão pregando para convertidos. Só servem para espalhar fake news, terrorismo digital.

Todo dia ele diz que representa 57 milhões de pessoas que votaram nele, “nós somos a maioria”. Eram. Hoje mais de 10 milhões de seus eleitores se dizem arrependidos. E seu governo tem só 33% de apoio. Um terço não é a maioria. Não basta para ganhar nada, mas pode convulsionar o país. Quantos votariam nele hoje? E, mais importante, contra quem?

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