quarta-feira, 22 de abril de 2020

Ricardo Noblat - Bolsonaro paga o preço por ter afrontado a democracia

- Blog do Noblat | Veja

O troco da Justiça
Os generais Fernando Azevedo e Silva, ministro da Defesa, e Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria do Governo sabiam muito bem do que se tratava quando recusaram o convite para acompanhar o presidente Jair Bolsonaro à manifestação encomendada por ele aos seus devotos para celebrar, no último domingo em Brasília, o Dia do Exército.

Sabiam que ela aconteceria diante da sede do Quartel General do Exército no Setor Militar Urbano da cidade. Sabiam que ela atrairia os bolsonaristas mais radicais. E sabiam que por meio de faixas, cartazes e discursos feitos do alto de carros de som, eles pediriam o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) e a volta da ditadura.

Uma manifestação como aquela, não só por conta do local escolhido, seria uma afronta à democracia. Tanto maior porque estrelada pelo próprio presidente. Tudo isso os generais sabiam, e não somente eles empregados no governo. Terão aconselhado Bolsonaro a não comparecer? Não se sabe ainda. Terão mais tarde censurado seu comportamento?

Com delicadeza, medindo as palavras, é possível. Os dois são amigos de Bolsonaro desde a época em que os três serviam ao Exército como paraquedistas. O governo está repleto de paraquedistas. Formam uma patota. Há pelo menos mais quatro como titulares de ministérios. Outro ocupará a partir de hoje a secretaria-geral do Ministério da Saúde.

Augusto Aras, Procurador-Geral da República, pediu ao STF para investigar “atos contra a democracia” realizados no último fim de semana não apenas em Brasília como também em outras cidades. Quem os financiou e organizou? Os responsáveis serão ligados à azeitada máquina de distribuição de falsas notícias nas redes sociais para destruir reputações?

O pedido foi aceito pelo ministro Alexandre de Moraes que se referiu aos fatos como “gravíssimos” porque “atentam contra o Estado democrático de direito e suas instituições”. A Constituição, segundo o ministro, não permite o financiamento e a propagação “de ideias contrárias à ordem constitucional”, nem manifestações favoráveis ao retorno do arbítrio.

Bolsonaro não parece preocupado com a investigação. Preocupa-se, isto sim, com a ação impetrada por dois advogados junto ao STF que pede seu afastamento temporário e parcial da presidência. Logo nas mãos de quem foi parar a ação… Nas do ministro Celso de Mello, decano do tribunal, prestes a se aposentar e que não tem a menor simpatia por Bolsonaro.

Pelo contrário. Em outubro do ano passado, ao saber que Bolsonaro endossara uma manifestação de seus devotos contra o STF, Mello soltou uma nota onde dizia a certa altura: “Torna-se evidente que o atrevimento presidencial parece não encontrar limites na compostura que um Chefe de Estado deve demonstrar no exercício de suas altas funções”.

Em fevereiro último, diante de mais uma provocação de Bolsonaro ao STF, Mello foi direto na jugular dele: “Essa gravíssima conclamação revela a face sombria de um presidente que desconhece o valor da ordem constitucional, ignora o sentido da separação de poderes, e demonstra uma visão indigna de quem não está à altura do cargo que exerce”.

Aguenta o tranco, Bolsonaro! Você faz por merecer.

O que une o médico Nelson Teich à atriz Regina Duarte

Sem autonomia para quase nada
Se ainda não demonstrou coragem para criticar o isolamento social decretado por governadores e prefeitos em face da pandemia de coronavírus, o médico Nelson Teich, novo ministro da Saúde, já acenou com o fim dele desde que bem planejado, e na hora certa. Qual seria a hora certa?

Para o presidente Jair Bolsonaro, a hora certa já passou – embora a primeira grande onda da doença sequer tenha rebentado. E quando isso acontecer, levará tempo para que passe causando ainda maior destruição. E quando passar teme-se que venha uma segunda e até uma terceira.

Teich não veste saias, mas ficou parecido com a atriz Regina Duarte, secretária de Cultura, que anda desaparecida tanto como ele, e que não conseguiu até aqui montar sua própria equipe. Foi obrigada a manter nomes que queria trocar. Como Teich, obrigado a engolir nomes que ele não escolheu.

O ministro e a secretária são fortes candidatos a bonecos de ventríloquo.

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