terça-feira, 19 de maio de 2020

Andrea Jubé - E vai colocar quem no lugar?

- Valor Econômico

PEC impede vice de assumir Presidência em definitivo

Parlamentares que transitam na cúpula das duas Casas legislativas afastam um eventual impeachment alegando que a popularidade do presidente Jair Bolsonaro ainda é alta, não tem ambiente político, a economia claudica, mas ainda não tombou, e não tem povo na rua - até porque a pandemia da covid-19 impede aglomerações. Essas lideranças insistem que “precisa de povo na [Avenida] Paulista para derrubar presidente”.

Do rol de justificativas, o argumento cabal é a ausência de uma liderança nacional que traga estabilidade ao país. “Vamos tirar o Bolsonaro para colocar quem no lugar?” É a pergunta que todos se fazem e, invariavelmente, vem acompanhada de um silêncio e um suspiro. Um dirigente partidário observa, em tom pragmático, que “Bolsonaro é o que temos para o jantar”.

A leitura predominante entre parlamentares influentes nas duas Casas é a de que um impeachment neste momento só favorece o vice-presidente Hamilton Mourão e mais dois atores: o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB).

“E ninguém no Congresso gosta deles”, sublinha um senador experiente, sobre Moro e Doria. A menção a Mourão sugere outro verbo: não é gostar ou desgostar, trata-se de desconfiar.

Embora Moro tenha feito gestos de aproximação com o mundo político na passagem pelo governo, a maioria dos parlamentares ainda o vê como o “xerife” da Lava-Jato, que levou dezenas de deputados e senadores ao banco de réus.

Em março de 2017, a temida “Lista de Janot” - do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot - decorrente da Lava-Jato, resultou em 83 pedidos de abertura de inquérito para investigar políticos citados nas delações de executivos da Odebrecht. Um mês depois, o ministro Edson Fachin do Supremo Tribunal Federal autorizou a investigação de oito ministros, três governadores, 24 senadores e 39 deputados.

Em outra frente, João Doria não empolga os congressistas. No começo do ano, o tucano era candidato a se reeleger governador. Mas o acirramento da crise sanitária e o palanque alcançado pelo antagonismo a Bolsonaro lhe conferiram protagonismo nacional e o catapultaram de volta à corrida sucessória.

Apesar da visibilidade, Doria tem dificuldade em conter o avanço do coronavírus no Estado, que se consolidou como o epicentro da pandemia. Ontem, em um discurso veemente, o tucano prometeu reagir se ficar confirmado que o governo federal o estaria retaliando politicamente, por exemplo, ao não enviar respiradores para o Estado. “Espero que o governo federal não faça seletividade política dos brasileiros que podem ou não podem sobreviver”, advertiu.

Outra ressalva é a de que Doria não desperta empatia na bancada nordestina. “Como é que eu vou chegar com o Doria no Nordeste?”, questiona um veterano do Senado, observando que o paulista não tem apoio na região, assim como Bolsonaro.

Por fim, Doria não une nem o PSDB. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso não esconde a simpatia pelo projeto de Luciano Huck, embora há um mês tenha reconhecido em entrevista que Doria cresceu na crise, enquanto o apresentador encolheu. Além disso, uma ala dos tucanos prefere como presidenciável o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite.

A pesquisa XP/Ipespe realizada há um mês mostrou que Bolsonaro alcança 28% de ótimo e bom, e 44% de ruim e péssimo. Políticos do Centrão consideram esses números relevantes, se comparados aos índices dos presidentes que sofreram impeachment.

Quando o então presidente da Câmara Eduardo Cunha (ex-MDB) - hoje em prisão domiciliar, por causa da covid-19 - deflagrou o processo contra Dilma Rousseff em dezembro de 2015, a petista tinha 69% de ruim e péssimo segundo pesquisa CNI/ Ibope. Fernando Collor tinha 59% de ruim e péssimo em agosto de 1992, segundo a CNI/Ibope - em dezembro os senadores aprovaram o impeachment.
Deputados e senadores ouvidos pela coluna creditam, em parte, a popularidade de Bolsonaro ao auxílio emergencial de R$ 600 concedido a um terço da população, embora a proposta originária tenha partido da oposição. “Acabou se transformando no Bolsa Família dele”, observou um senador.

Mas a avaliação quase unânime desse grupo influente é que a crise em torno das denúncias de Sergio Moro, em tramitação no STF, tem a força de um traque. “Videozinho não derruba presidente, o que o derruba é a economia e povo na rua”, reforça este senador.

Para outra liderança do Senado, Moro puxou o gatilho e atingiu o presidente, mas ainda não foi a bala de prata. Segundo este parlamentar, o descontrole sobre a pandemia fulminará Bolsonaro, porque o Brasil ficará entre os dois países com o maior número de vítimas fatais da covid-19, e cada família brasileira poderá ter perdido um parente ou um amigo para o coronavírus.

Ao mesmo tempo, nesse cenário de luto nacional, milhares de empresas terão ido à falência e o número de desempregados terá se multiplicado. “Isso vai enterrar a popularidade dele e será a bala de prata”, concluiu o senador.

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Para neutralizar o “risco Mourão”, a oposição tenta convencer o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a criar uma comissão especial para votar a PEC 37 dos ex-líderes do PT Paulo Teixeira (SP) e Henrique Fontana (RS). A proposta impede o vice-presidente de assumir em definitivo a Presidência da República, na hipótese de vacância do cargo, e amplia a regra a governadores e prefeitos. No Amazonas, por exemplo, começou a tramitar o impeachment do governador Wilson Lima (PSC).

Segundo a emenda, vagando o cargo de presidente, será realizada eleição direta em 90 dias para escolha do sucessor. O texto também dispõe que “em nenhuma hipótese” o vice assumirá a chefia do Executivo em definitivo.

O relator da PEC é o deputado Felipe Francischini (PSL-PR), ex-aliado de Bolsonaro. A PEC teria efeito imediato. Para justificar, um petista evoca a PEC da reeleição de Fernando Henrique em 1997, que beneficiou o então titular do cargo.

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