quinta-feira, 25 de junho de 2020

FMI prevê a recessão maior e contágio volta a crescer nos EUA – Editorial | Valor Econômico

Com o segundo maior déficit no mundo em 2020, a dívida pública bruta subirá para 102,3% do PIB, bem distante dos 63,1% da média dos países emergentes

A devastação social e econômica provocada pelo novo coronavírus foi muito maior do que a prevista - e a possibilidade de uma segunda onda ameaça fazer mais estragos. O Fundo Monetário Internacional mostrou-se ainda mais pessimista do que em abril e indicou ontem que a recessão global será mais profunda, com queda do PIB de 4,9% (antes, -3%). Os investidores que consideraram a previsão do Fed, de retração de 6,5% do PIB, terão de rever suas projeções. O PIB americano encolherá 8% este ano, um choque de grandes proporções que, no entanto, será igual à média das economias avançadas. O contágio voltou a aumentar em duas dezenas de Estados americanos, a primeira onda ainda deixa muitos mortos na América Latina; a Alemanha cerca distrito infectado e a China usa rigor para evitar o espraiamento do vírus em Pequim. São maus augúrios que as previsões do FMI aprofundaram. Os mercados acionários desabaram ontem.

A economia de guerra contra a covid-19 revelou-se mais do que uma metáfora. O déficit fiscal nos países desenvolvidos será de 16% do PIB neste ano, um esforço até mesmo superior ao de conflitos mundiais. Nos EUA, o rombo orçamentário atingirá 23% do maior PIB do mundo (US$ 21,5 trilhões). Os países emergentes terão déficit de 10,5% do PIB na média, com o Brasil mais uma vez em dissonância, com resultado negativo de 16% do PIB, o maior do planeta após o americano.

O cenário traçado pelo FMI está cercado de incertezas, especialmente pela ressurgência do novo coronavírus nas economias que finalmente foram reabertas. Para o Fundo, é provável que isso aconteça no início de 2021, no inverno no Hemisfério Norte, mas as estatísticas indicam que possa já estar ocorrendo, pelo menos nos EUA.

Com 35 mil novos casos na terça-feira, principalmente nos Estados do Sul e do Oeste, e entre os primeiros a relaxarem o isolamento, como Flórida e Texas, o país teve o maior número de infectados em dois meses. O sistema de saúde texano revive os dias terríveis da pandemia em Nova York. Nova York, New Jersey e Connecticut resolveram colocar em quarentena pessoas provenientes dos Estados onde o contágio está crescendo. Na Califórnia, houve 7 mil novos casos ontem.

A economia americana vinha se recuperando rapidamente, o que fez os mercados acionários avançarem à frente do que seria prudente diante dos desafios da pandemia. O presidente Donald Trump, que menosprezou o vírus, deu de ombros e disse que o aumento de casos decorria do aumento das testagens. Steven Mnuchin, o secretário do Tesouro, afirmou que a economia não poderá ser fechada novamente - entre os inconvenientes óbvios não mencionados está a redução das chances de reeleição de Trump. O presidente do Goldman Sachs, David Salomon, advertiu os investidores de que eles podem estar errando a mão nos preços dos ativos e subestimando as dificuldades de se conviver com a covid-19.

O fim mal planejado do distanciamento social, ou a falta de rigor exigida no isolamento se combinam para elevar o contágio e a mortalidade no Brasil, no México (6 mil novos casos por dia) e Índia (14,9 mil). Na China, há 246 casos em Pequim, onde a quarentena foi imposta em vários bairros. A covid-19 infectou até ontem 9,16 milhões de pessoas e matou 468,6 mil.

O balanço é assombroso, em número de vidas e destruição econômica. O FMI avaliou que a recessão global no segundo trimestre reduzirá tanto as horas trabalhadas que isso equivalerá a um corte de 130 milhões de empregos em tempo integral. O custo global de evitar um massacre social, calculado pelo Fundo, foi de US$ 11 trilhões em gastos oficiais desde o início da pandemia.

Caso o coronavírus volte à cena com vigor no início de 2021, o impacto econômico e nas condições financeiras será metade do que foi em 2020. Isso significa, porém, que a recuperação prevista, de 5,4%, será de apenas 0,5%, jogando para mais longe no calendário a volta ao nível anterior à covid-19.

A revisão do desempenho do Brasil foi uma das maiores. O PIB deve cair 9,1% (antes, -5,3%), e a recuperação deve ser só 0,7 ponto percentual maior, de 3,6% em 2021. Com o segundo maior déficit no mundo em 2020, a dívida pública bruta subirá para 102,3% do PIB, uma larga distância da média dos países emergentes, de 63,1% do PIB. Ainda assim, estará um pouco acima da média mundial, de 101,5% do PIB. O FMI indica que, pelo déficit primário estimado em 2021, de 5,9% do PIB, o Brasil deverá manter alguns dos programas de emergência em execução hoje.

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