segunda-feira, 13 de julho de 2020

Delonga tributária – Editorial | Folha de S. Paulo

Atraso de Guedes na definição de reforma tumultua debate e alimenta incertezas

Já se tornaram objeto de pilhéria as recorrentes promessas grandiosas do ministro da Economia, Paulo Guedes, para algum futuro próximo que nunca se confirma.

Exemplo quase caricato —e particularmente lamentável— é o da delonga em torno da reforma tributária, motivo de sucessivos desencontros no Executivo. Em fevereiro último, Guedes anunciou que enviaria uma proposta ao Congresso em duas semanas. Cinco meses depois, não se notam mais que especulações em torno do texto.

Ora se fala em simplificação de impostos indiretos de responsabilidade federal (PIS, Confins e IPI), ora em desoneração das folhas de salários —e não parece sepultada a temerária ideia de um novo imposto sobre transações financeiras.

Na ausência de um encaminhamento efetivo, os riscos são o tumulto do debate e o aumento das incertezas, já enormes devido à complexidade do tema.

É o que se vê, no exemplo mais recente, com a decisão do Congresso de prorrogar até 2021 a desoneração de folha para 17 setores, que deveria vencer neste ano. A matéria foi vetada pelo presidente Jair Bolsonaro, mas parece elevada a possibilidade de derrubada do veto pelos parlamentares.

Na tentativa de evitar a derrota legislativa, o governo passou a acenar, como noticiou a Folha, com uma reforma ao menos parcial do sistema tributário, que promoveria uma desoneração mais ampla e sem distinção de setores.

Na teoria, de fato, tal caminho poderia ser mais vantajoso. A elevada taxação sobre o pagamento de salários no país dificulta a contratação formal de mão de obra, e uma norma geral definitiva é preferível a arranjos provisórios para o enfrentamento do problema.

Na prática, porém, inexiste uma alternativa concreta e formalizada —que precisaria dar conta, ainda, da preservação da receita de um governo em crise orçamentária.

Tal lacuna é injustificável a esta altura. Há amplo consenso de que o sistema nacional de impostos e contribuições sociais, por demais intrincado e disfuncional, constitui obstáculo à eficiência e ao crescimento da economia.

Já existe também, nos meios político e acadêmico, suficiente convergência em torno de diretrizes essenciais para reformas. De mais consensual, drástica simplificação —e desejável redução— da carga sobre bens e serviços; em paralelo, deve-se redesenhar o Imposto de Renda das pessoas físicas e jurídicas para maior progressividade.

Para o segundo objetivo devem concorrer a tributação de dividendos e a redução das deduções com educação e saúde que beneficiam as rendas mais altas. São providências já mencionadas por Guedes e sua equipe, mas cuja aceitação política precisará ser testada.

Tudo sugere que há boa vontade no Congresso para avançar, no mínimo, rumo à simplificação dos tributos. A tarefa depende, no entanto, de estratégia, liderança e coordenação de esforços, o que não se viu até agora no governo.

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