quinta-feira, 30 de julho de 2020

Fed vê perda de fôlego da economia americana – Editorial | Valor Econômico

O vírus tornou-se o “condutor principal” do desempenho econômico dos Estados Unidos

O Federal Reserve manteve a taxa de juros de 0 a 0,25% em sua reunião de ontem e prorrogou antes várias das bilionárias linhas de auxílio a empresas, governos estaduais, organizações não governamentais e consumidores para dar suporte à economia diante do choque da pandemia. No encontro anterior, o presidente do BC americano, Jerome Powell disse que o tamanho do arsenal utilizado estava de acordo com a incerteza muito alta sobre os efeitos da covid-19. Ontem, disse que o vírus tornou-se o “condutor principal” do desempenho econômico.

Os investidores não esperavam nada muito diferente do que o Fed fez ontem, até mesmo pelo radicalismo e diversidade das intervenções do BC já realizadas. Mas a situação econômica deu sinais de piora em relação ao cenário delineado pelo BC em junho. “Há um risco claro de que a economia tenha reduzido o seu ritmo de crescimento”, alertou Powell, com os dados a partir de meados de junho. Ele citou vários. Os investimentos continuam muito abaixo dos níveis pré-pandemia e os gastos de consumo, ainda que tenham reagido, estariam na metade do caminho até recuperarem o fôlego anterior.

Na semana passada, o número de pedidos de auxílio-desemprego voltou a subir, quebrando a trajetória descendente observada nos últimos três meses. “O mercado de trabalho tem um longo caminho a percorrer ainda”, afirmou Powell, com mais um argumento para a manutenção, sem prazo para terminar, dos mecanismos de apoio monetário e creditícios lançados preventivamente em março. Os indicadores de alta frequência, como o de gastos com cartões de crédito e débito deram um sinal de alerta de que houve enfraquecimento da demanda.

A inflação corrente justifica também a atenção do Fed. Houve pressão de alta nos alimentos, mas elas foram compensadas pela fraca demanda em vários ramos dos setores de serviços, como turismo, alojamento, restaurantes etc, o que manteve o índice de preços ainda distante da meta de 2% perseguida pelo Fed.

A elevação do contágio, especialmente nos Estados do Sul e do Oeste americano, e a reversão de medidas de abertura por vários governadores foram o motivo de o comunicado do banco apontar que “o rumo da economia vai depender significativamente da trajetória do vírus”. O dano econômico pode ser severo, embora Powell assevere que ainda é muito prematuro indicar “a magnitude e a duração” da reversão aparente do ritmo da economia registrada por alguns indicadores.

Estados que estão com uma taxa de reprodução do vírus acima de 1 são responsáveis por 95% do PIB americano, calcula Gavyn Davies (FT), da consultoria Fulcrum. Se houver lockdowns nos que têm taxa de contágio acima de 1,5%, e parciais nos entre 1 e 1,5% em movimentos que se estendam pelos próximos três meses o crescimento da economia poderá ser 2 pontos percentuais menor que o previsto.

A perspectiva menos otimista sobre o desempenho da economia americana, com a manutenção de enormes estímulos monetários, atingiram o dólar, que se desvalorizou 4% no mês diante de uma cesta de moedas e exibe as menores cotações em dois anos. O diferencial de juros em relação à Europa e Japão tornou-se ínfimo e, por enquanto, os índices sugerem que a retomada na zona do euro parece mais vigorosa que o projetado. Mas o cenário é instável. O vírus ressurgiu com força em alguns lugares da Europa, em especial na Espanha, e mesmo governos que pareciam tê-lo vencido, como China, Coreia e Hong Kong estão se desdobrando para que os novos focos não resultem em contágios de grandes dimensões.

O Fed prorrogou de setembro até o fim do ano as 11 linhas de empréstimos para empresas, consumidores e Estados que expirariam em setembro. Estendeu ao término do primeiro trimestre de 2021 as linhas de swap de dólares para seis bancos centrais (Brasil incluso) de US$ 60 bilhões, e de US$ 30 bilhões para outros três. Essas linhas regularizaram as transações com dólar nos mercados internacionais e a prorrogação não é sinal de problemas adicionais. “A pandemia não acabou e é importante que todos saibam que os recursos estão lá”, disse Powell.

Todos os instrumentos colocados em ação pelo Fed seguirão ativos pelo tempo que for necessário, disse o presidente do Fed, e repetiu: “Não estamos nem pensando em quando eles serão desativados”.

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