terça-feira, 1 de setembro de 2020

É o Orçamento, ora – Editorial | Folha de S. Paulo

Governo prevê gasto de 19,8% do PIB em 2021, o que não é arrocho

O governo Jair Bolsonaro não conseguiu chegar a um entendimento interno para uma desejada —e desejável— ampliação ambiciosa do Bolsa Família no projeto de Orçamento de 2021, apresentado nesta segunda-feira (31).

Haverá alguma despesa adicional, porque se projeta que o número de famílias pobres necessitadas do benefício subirá de 13,2 milhões para 15,2 milhões. Mas, ao menos de acordo com o Ministério da Economia, não se tem ainda um novo desenho do programa.

Isso não significa, claro, que o Renda Brasil, como foi batizada a nova versão do mecanismo de transferência de renda, esteja inviabilizado no próximo ano. Executivo e Congresso terão tempo, nos próximos meses, para debater meios de viabilizar a expansão da assistência social.

Há alternativas para encaixar a iniciativa nos limites orçamentários, dados pelo teto dos gastos federais inscrito na Constituição. Algumas delas, como usar verbas de programas menos eficazes no combate à pobreza, foram cogitadas pelo Ministério da Economia, mas infelizmente rejeitadas de modo peremptório por Bolsonaro.

O abono salarial, por exemplo, atende aos trabalhadores formais com renda até dois salários mínimos e conta com quase R$ 20 bilhões neste ano, enquanto o Bolsa Família tem pouco mais de R$ 30 bilhões para os mais vulneráveis.

Se não quiser tirar dos pobres para dar aos paupérrimos, como disse sobre a proposta, o presidente pode cancelar adicionais concedidos aos militares, que custam algo como R$ 5 bilhões anuais; privatizar estatais que sobrevivem à custa do Tesouro Nacional; buscar no Congresso a regulamentação do teto salarial do serviço público.

O projeto de Orçamento de 2021 prevê gastos não financeiros equivalentes a 19,8% do Produto Interno Bruto. Trata-se de patamar muito semelhante ao de 2016 (19,9% do PIB), quando o teto das despesas foi instituído. Não há como afirmar, portanto, que se trata de algum arrocho fiscal devastador.

O ajuste é, isso sim, mal distribuído, porque os maiores grupos de desembolsos, Previdência e pessoal, permaneceram em alta nos últimos anos. Das aposentadorias, governo e Congresso já trataram no ano passado; falta uma reforma administrativa que normalize, com o tempo, a folha de salários.

Desastroso será imaginar que os conflitos políticos se resolverão com mais aumentos de verbas para todos os setores. A boa governança pressupõe escolhas de prioridades por meio do debate democrático —e a adequação delas aos recursos disponíveis. É para isso que serve o Orçamento público.

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