quarta-feira, 14 de outubro de 2020

O que a mídia pensa – Opiniões / Editoriais

A lei não é o problema – Opinião | O Estado de S. Paulo

Soltura de André do Rap, homem forte do PCC, é responsabilidade de quem não cumpriu a lei

A concessão de habeas corpus em favor de André Oliveira Macedo, o André do Rap, um dos homens fortes do Primeiro Comando da Capital (PCC), suscitou críticas contra a legislação em vigor sobre prisão preventiva – na qual o ministro Marco Aurélio baseou sua decisão –, como se o problema fosse a lei. As disposições legais vigentes não são apenas corretas, como essenciais para assegurar a liberdade de todos os cidadãos. A soltura de André do Rap é responsabilidade de quem não cumpriu as exigências da lei.

O Código de Processo Penal (CPP) estabelece: “Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal” (art. 316, § único). Introduzida pela Lei 13.964/2019 (o Pacote Anticrime), a previsão legal de que a prisão preventiva seja revista a cada 90 dias é uma medida de elementar prudência para verificar se as circunstâncias e condições que motivaram a prisão continuam persistindo.

Na decisão, o ministro Marco Aurélio reconheceu a “participação do paciente em grupo criminoso voltado ao tráfico internacional de drogas e a apreensão de quase 4 toneladas de cocaína. O Tribunal de Justiça, no julgamento da apelação, concluiu persistirem os motivos que ensejaram a custódia. O quadro indica em jogo a preservação da ordem pública e a aplicação da lei penal. Sem prejuízo do princípio constitucional da não culpabilidade, a prisão mostrou-se viável, ante a periculosidade, ao menos sinalizada”.

Ao mesmo tempo, o atual decano do STF reconheceu a exigência do artigo 316 do Código de Processo Penal. “Apresentada motivação suficiente à manutenção, desde que levado em conta o lapso de 90 dias entre os pronunciamentos judiciais, fica afastado constrangimento ilegal”, disse. No entanto – e aqui está o principal problema do caso concreto –, não houve a renovação da prisão e de seus fundamentos, o que tornava a prisão ilegal.

A nova lei não é um retrocesso, como se agora fosse necessário reformá-la. Em plena conformidade com as garantias e liberdades constitucionais, a Lei 13.964/2019 veio assegurar que a regra é a liberdade e a exceção, a prisão. Nesse ponto, o Pacote Anticrime exige um funcionamento mais diligente dos órgãos do sistema de Justiça. E essa diligência nada mais é que o respeito ao cidadão e às suas liberdades, o que é muito positivo.

Mais do que impor obrigações burocráticas e prazos aos órgãos públicos, as novas regras da Lei 13.964/2019 – em relação à prisão em flagrante, por exemplo, “a não realização de audiência de custódia sem motivação idônea ensejará também a ilegalidade da prisão” – exigem por parte do Estado uma nova cultura, de mais respeito à liberdade. É precisamente isso o que precisa ser mudado e aperfeiçoado no funcionamento do sistema de Justiça, e não a lei.

Num caso como o de André do Rap – em que são evidentes os motivos que ensejam a prisão preventiva –, é relativamente fácil criticar o ministro Marco Aurélio, como se ele tivesse o dever de matizar as exigências da lei, buscando um modo para que a ausência de renovação da prisão preventiva não produzisse os efeitos previstos no CPP. Também é fácil pedir a mudança da lei para que “bandido não seja solto”. Difícil mesmo é fazer com que o sistema de Justiça atue dentro da lei, sem continuamente buscar desculpas por não aplicar as medidas e instrumentos que favoreçam a liberdade.

O clamor contra a soltura de André do Rap não pode ser motivo para mudar a nova lei, que simplesmente faz valer as garantias constitucionais. Toda a atenção despertada pelo caso deve ser ocasião para, reconhecendo o avanço legislativo promovido pelo Congresso no ano passado, exigir que os órgãos do Estado atuem em plena conformidade com a lei. A ineficiência estatal não pode ser causa para redução das liberdades. Antes, o respeito às liberdades deve ser a grande razão para a diligência estatal – e é isso o que a Lei 13.964/2019 exige.

A urgência da prisão na 2ª instância – Opinião | O Globo

Não teria havido a libertação do traficante se a norma já tivesse sido estabelecida com clareza na lei

Até por questão de bom senso, um traficante condenado por duas vezes em segunda instância a 25 anos de prisão não pode ficar solto. Só por isso, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, acertou ao suspender no fim de semana o habeas corpus concedido pelo ministro Marco Aurélio Mello ao traficante André Oliveira Macedo, o André do Rap, e mais ainda ao levar o caso à apreciação do plenário da Corte. O episódio reforça a necessidade de o Congresso restabelecer com clareza na lei o cumprimento de penas depois da condenação por colegiado de juízes, jurisprudência que o Supremo reviu no final de 2019.

O dispositivo que permitiu a libertação de um traficante internacional é resultado de uma emenda feita no Congresso ao artigo 316 do Código de Processo Penal (CPP), estabelecendo que prisões preventivas precisam ser justificadas burocraticamente a cada 90 dias. Tudo foi feito a toque de caixa na Câmara, aproveitando o projeto da “lei anticrime” que o então ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, enviara ao Legislativo.

Embora a emenda tenha sido apresentada e aprovada num contexto em que os parlamentares desejavam dar o troco ao “juiz da Lava-Jato”, é acertada a preocupação com abusos nas prisões preventivas. Mas não haveria tanto abuso se o poder de coerção do CPP fosse maior. O recuo do Supremo na execução da sentença depois da condenação em segunda instância estimulou ainda mais os juízes a lançarem mão das prisões preventivas.

A pretensa solução para os abusos aprovada no Congresso, sob a inspiração de um sentimento de compadrio, deu no que deu. Os parlamentares acabaram por ajudar o crime organizado e o tráfico internacional. André do Rap saiu pela porta da frente do presídio de segurança máxima de Presidente Venceslau, no interior de São Paulo, embarcou num carro de luxo e partiu rumo a Maringá, interior do Paraná, onde um jatinho o esperava para provavelmente levá-lo ao Paraguai. Outros bandidos tentam usar o mesmo atalho jurídico. Daí a urgência na obstrução desta rota de fuga.

Na primeira fase da Lava-Jato, o ministro Teori Zavascki percebeu o risco quando mandou soltar o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, cuja delação premiada foi essencial para dar o primeiro impulso no desbaratamento do esquema na estatal. Teori reviu, ele mesmo, a decisão, preocupado com os reflexos que ela teria em processos contra traficantes, homicidas e organizações criminosas.

No caso de André do Rap, consumado o absurdo, começou o jogo de empurra: o ministro Marco Aurélio afirma que só cumpriu a lei; o Ministério Público aponta para os juízes; e os parlamentares responsabilizam o MP. O inconcebível é alguém imaginar que possa haver legislação capaz de distinção na execução penal. Qualquer tipo de leniência que beneficie corruptos beneficiará também o tráfico e o crime organizado. A prisão depois da condenação em segunda instância deveria valer para todo tipo de crime.

O mundo depois do tombo – Opinião | O Estado de S. Paulo

A economia global voltou a movimentar-se, mas dezenas de países chegarão ao fim de 2021 sem ter retornado ao patamar de 2019. O Brasil é um deles, segundo projeções.

Nem bilhões ou trilhões de dólares nem taxas de crescimento: a soma de mortos pela covid-19, mais de 1 milhão até agora, é a primeira referência numérica da recém-divulgada Perspectiva Econômica Mundial, o mais importante relatório periódico do Fundo Monetário Internacional (FMI). Ao falar sobre o documento, a economista-chefe do Fundo, Gita Gopinath, professora licenciada de Harvard, começou citando também aquele dado. Contraste: mortos foram raramente mencionados, até hoje, pelo presidente da maior economia do mundo, Donald Trump. Seu discípulo Jair Bolsonaro, presidente da maior economia latino-americana, também rejeitou o assunto. “Não sou coveiro”, respondeu, ao ser confrontado com o tema numa entrevista.

Também trágico foi o segundo número destacado no relatório: cerca de 90 milhões de pessoas devem afundar na miséria extrema por causa da pandemia. A economia global voltou a movimentar-se, depois do maior tombo em décadas, mas dezenas de países – avançados, emergentes e em desenvolvimento – chegarão ao fim de 2021 sem ter retornado ao patamar de 2019. Será uma ascensão longa, desigual e incerta, uma previsão inscrita no título da edição de outubro da Perspectiva.

O Brasil é um dos países condenados, segundo as projeções atuais, a terminar o próximo ano sem completar a recuperação. Em 2020, pelas novas contas, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro deve ser 5,8% menor que o do ano anterior. A contração estimada em junho era bem maior, 9,1%.

A reação econômica a partir do terceiro trimestre motivou a revisão. No Brasil, como em dezenas de outros países, fortes medidas de estímulo fiscal e monetário impediram um desastre maior e atenuaram o desemprego. Mas o cenário previsto para 2021 é outro.

O crescimento brasileiro estimado para o próximo ano foi reduzido de 3,6% para 2,8%. Estímulos fiscais aplicados neste ano – gastos emergenciais e alívio temporário de impostos e contribuições – serão abandonados em 2021, se o governo respeitar os limites fiscais, como o teto de gastos, lembrou a economista-chefe Gita Gopinath.

Se possível, será bom o governo evitar a retirada total dos estímulos, comentou o diretor adjunto da área econômica, Gian Maria Milesi-Ferretti. Mas as medidas de auxílio, acrescentou, deverão ter foco muito bem definido.

Foco definido, no entanto, é uma noção estranha à atual política fiscal brasileira, exceto por um detalhe: o presidente Jair Bolsonaro mantém-se focado, há muito tempo, na reeleição.

Já se discutiu, ainda sem resultado, a inclusão da Renda Cidadã, versão bolsonariana do Bolsa Família, no projeto de Orçamento de 2021. Outros membros do Executivo têm examinado, talvez mais modestamente, o prolongamento de estímulos emergenciais. O resultado, até agora, foi muito falatório, nenhuma definição e muitos sustos para o mercado financeiro.

Enquanto o Executivo e seus aliados se enrolam nessa discussão, mantém-se a insegurança quanto às contas federais. Os frequentes saltos do dólar são explicáveis principalmente por esse e por outros problemas – nacionais e internacionais – criados pelo Executivo.

Ao construir suas projeções, no entanto, os economistas do FMI pressupõem, como explicou Gopinath, o respeito ao teto de gastos e uma política monetária adequada a uma inflação compatível com as metas oficiais. Essa aposta, pelo menos formal, numa gestão ajuizada é o aspecto mais otimista das estimativas para o Brasil.

Mas otimismo tem limites. Quando se trata de perspectivas de médio e de longo prazos, é difícil apostar num desempenho acima de medíocre. Em 2025 a inflação poderá continuar controlada. O déficit nas contas externas poderá ser moderado. Mas o crescimento do PIB estará limitado a 2,2%, taxa bem inferior às da Colômbia (3,7%), Paraguai (4%), Peru (3,8%) e, é claro, dos emergentes mais dinâmicos, como China (5,5%), Índia (7,2%), Indonésia (5,1%) e Vietnã (6,6%). Como prever algo melhor, quando o investimento produtivo continua muito baixo e nenhum plano de governo sugere pelo menos um rumo?

Polícia precisa dar uma resposta à tragédia das balas perdidas no Rio – Opinião | O Globo

Em apenas três dias, uma criança morreu e um motorista foi atingido ao passar pela Avenida Brasil

O menino Leônidas Augusto da Silva de Oliveira, de 12 anos, é mais uma criança a entrar para uma estatística infame que o Rio não consegue conter. Morador da Favela Nova Holanda, no Complexo da Maré, ele estava acompanhando da avó, em frente a um supermercado na Avenida Brasil, na tarde de sexta-feira, quando foi atingido na cabeça por uma bala perdida. Após quase meia hora esperando por socorro na calçada, foi levado para o Hospital de Bonsucesso, onde morreu pouco depois.

Leônidas não estava em área conflagrada, mas naquela que é a maior e uma das mais importantes avenidas do Rio, por onde circulam diariamente cerca de 250 mil veículos. Segundo a versão da polícia, um motorista parou o carro em frente a uma equipe da PM para informar que era perseguido por dois veículos. Pouco depois, homens passaram pelo local atirando. A PM alega que não revidou. Além de Leônidas, os disparos atingiram uma mulher que estava no ponto de ônibus (ela só teve ferimentos leves).

Não se passaram 72 horas, e o Rio já estava às voltas com outro caso de bala perdida. Na manhã de segunda-feira, o motorista Ismael Souza do Nascimento foi atingido na cabeça, na mesma Avenida Brasil, durante um tiroteio entre policiais e bandidos em Guadalupe, na Zona Norte. Ismael foi levado ao Hospital Getúlio Vargas, na Penha, onde permanecia internado em estado grave ontem à tarde. No mesmo episódio, o sargento PM Cirio Damasceno Santos, de 51 anos, morreu baleado.

O Rio não é o estado mais letal do país. Segundo o Atlas da Violência 2020, em 2018 apresentava taxa de 37,6 homicídios por cem mil habitantes. Doze estados tinham números piores, quase todos no Norte ou Nordeste. Mas nenhum tem essa “fábrica” de balas perdidas. Trata-se de um problema crônico que o Rio não consegue resolver.

Na anomia em que vivem o estado e a capital, o cidadão fluminense se vê refém de situações inadmissíveis, não só em relação às balas perdidas. Na segunda-feira, um ambulante morreu atingido por um botijão de gás jogado do 12º andar de um prédio em Copacabana.

As chances de esses crimes ficarem impunes são enormes. O estado tem a menor taxa de elucidação de homicídios em todo o país, segundo levantamento do Instituto Sou da Paz — apenas um em cada dez é esclarecido. A própria sociedade deixa de cobrar das autoridades, não por indiferença, mas porque histórias como a de Leônidas são rapidamente suplantadas por outras, não menos chocantes. E o ciclo nefasto não para. A polícia precisa se debruçar sobre esses casos, esclarecê-los, punir os responsáveis e criar estratégias para interromper essa tragédia que envergonha o Rio.

Vacinas para todos – Opinião | Folha de S. Paulo

População mantém apoio à imunização, base do sucesso do SUS contra epidemias

O programa de vacinação mantido pelo Sistema Único de Saúde se destacou no cenário internacional como exemplo de sucesso. Mesmo com o quinto maior território, em que não faltam rincões de difícil acesso, e com a sexta população do mundo em 2019, o Brasil alcança níveis de cobertura superiores até aos de países ricos.

Perante tal retrospecto, não surpreende a pesquisa Datafolha que mostrou haver 75% de habitantes em quatro capitais populosas declarando a intenção de imunizar-se contra o coronavírus. Tendo em vista que nenhuma vacina demonstrou ainda ser segura e eficaz, o percentual indica alto grau de confiança nas autoridades sanitárias.

Foram entrevistados moradores de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Recife, cidades que figuram entre as maiores do país e somam cerca de 28 milhões de pessoas. Mesmo não sendo esse contingente estatisticamente representativo da população nacional, oferece um indicativo robusto da inclinação dos brasileiros.

A receptividade a futuras vacinas contra a Covid-19 já fora atestada noutra pesquisa Datafolha, em agosto, esta sim de alcance nacional (2.065 entrevistados em todas as regiões). Nada menos que 89% afirmavam então pretender vacinar-se, maioria tão clara que felizmente tornaria dispensável até declarar obrigatória a vacinação.

Tal hipótese, aliás, conta com taxas de apoio acima de 70% nas capitais pesquisadas pelo Datafolha.

Há quase duas centenas de imunizantes contra o vírus Sars-CoV-2 em desenvolvimento, 11 deles na terceira e conclusiva fase de testes em seres humanos. Instituições do Brasil participam diretamente de 4 desses ensaios clínicos.

Ao menos dois estudos já sofreram interrupções por força de efeitos adversos graves, ocorrência não infrequente na pesquisa de vacinas. Com tantas candidatas em teste, parece improvável que não surja uma com eficácia nos próximos meses, e os mais otimistas falam em começar a imunização já em dezembro próximo.

Ainda que não haja novos percalços, restará o desafio logístico de produzir e distribuir dezenas de milhões de doses, o que no Brasil levará talvez todo o ano de 2021.

Até lá, não há alternativa ao distanciamento social, nos seus diferentes graus, e ao uso de máscaras faciais para manter em queda o contágio, que já resultou em mais de 150 mil óbitos por aqui.

No pior cenário, o alívio com o declínio da curva de infecções pode erodir a de aceitação da futura vacina, ao se espraiar uma ilusória sensação de segurança. A incipiente politização do assunto arrisca também prejudicar a adesão.

Compete ao governo federal honrar essa história de sucesso.

EUA das Bananas – Opinião | Folha de S. Paulo

Trump e Biden dão péssimos exemplos para a democracia na reta final da eleição

Vinte anos atrás, o mundo prendeu a respiração durante um mês, enquanto uma batalha legal se desenrolava sobre a contagem dos votos da eleição presidencial americana na Flórida. Ao fim, ganhou o republicano George W. Bush, após polêmica decisão da Suprema Corte.

Já naquele momento muito se questionou sobre as qualidades bizantinas do processo eleitoral americano, no qual o vencedor não precisa ter o maior número de votos populares, como ocorreu com Donald Trump em 2016.

Não bastassem essas peculiaridades, o atual presidente decidiu colocar sob suspeição os votos antecipados no pleito do próximo dia 3.

Em repetidas ocasiões, sugeriu que não faria uma transição se perdesse a eleição, pois isso só poderia ocorrer por meio de fraude a favorecer o democrata Joe Biden.

A tese é estapafúrdia e, ainda que tensionado, o aparato institucional americano parece forte o suficiente para conter tal golpismo. Entretanto a ideia está no ar e contaminou até integrantes mais racionais de sua administração, com o vice-presidente, Mike Pence.

Em debate com a vice da chapa de Biden, Kamala Harris, o republicano foi menos assertivo, mas usou de evasivas para tratar da questão.

Para constranger mais o eleitor americano, há sinais inquietantes também do lado democrata.

Biden e Kamala estão em campanha contra a indicação à Suprema Corte de Amy Coney Barrett por Trump à vaga de Ruth Bader Ginsburg, morta mês passado. Se efetivada, a nomeação criará uma maioria de 6 votos conservadores entre os 9 membros do tribunal.

Os democratas alegam que a eleição já está em curso e que, por essa razão, apenas o próximo presidente teria mandato popular para fazer tal indicação.

Biden e Kamala passaram a ser acusados pelos republicanos de querer emular o que fez Hugo Chávez na Venezuela e o que já aventou Jair Bolsonaro por aqui: aumentar o número de juízes para alterar o balanço de poder na corte. No caso, em favor de magistrados alinhados aos democratas.

Ambos os postulantes, questionados, não negaram a hipótese casuística. Biden foi além, dizendo que só opinaria sobre o tema após o pleito, o que configura desrespeito autoritário com o eleitorado.

Durante décadas, os EUA foram o farol das democracias ocidentais. O comportamento de seus candidatos diz muito sobre o estado da regulagem de tal facho de luz.

Economia carregará o peso da pandemia por anos, diz FMI – Opinião | Valor Econômico

Os países avançados terão seu potencial de expansão 3,5% menor do que o previsto e os emergentes, 5,5%

O futuro não será brilhante para a economia global depois que a devastadora covid-19 deixar de ser uma ameaça relevante. Apesar da recuperação a curto prazo, esperada depois de estímulos fiscais e monetários formidáveis, a pandemia deixará marcas que demorarão a cicatrizar - o aumento da pobreza e da desigualdade, dívidas muito elevadas e destruição de capital humano são as mais evidentes. As projeções para o quinquênio, até 2025, feitas antes e depois do vírus, mostram um “severo revés no ritmo projetado de melhoria do nível de vida médio em todos os grupos de países”, aponta o Panorama Econômico Mundial divulgado pelo Fundo Monetário Internacional.

Mesmo o panorama do curto prazo é recheado de dúvidas. Para o FMI, o quarto trimestre mostra desaceleração do impulso ao crescimento, forte o suficiente no terceiro trimestre para que a instituição revisse a expansão global em 2020 para 4,4%, uma melhoria de 0,8 ponto percentual. No cenário de base, a projeção para 2021 é de 5,2%. Até agora, a produção industrial em vários países não voltou aos níveis pré-pandemia. A reação dos serviços, ao contrário de outras crises, é muito pior. “A escala da ruptura indica que, sem vacina e terapias efetivas, esse setor terá um caminho particularmente difícil para voltar a qualquer aparência de normalidade”, registra o Panorama.

O terceiro trimestre mostrou uma recuperação forte da atividade global como resposta a estímulos nunca vistos. Os países avançados gastaram 9% do PIB em medidas fiscais e 11% do PIB em apoio à liquidez, em média. O esforço dos emergentes foi, em geral, menor, com 3,5% e 2%, respectivamente. As despesas do Brasil foram superiores às deste grupo, perto de 9% do PIB%.

O cenário principal do Fundo contempla a descoberta de uma vacina ao longo de 2021, quando ainda estarão vigorando medidas de distanciamento social e lockdowns, e progressiva imunização que poderá garantir baixos níveis de contágio ao fim de 2022. Nesse ambiente, a recuperação só será vigorosa em relação à recessão de 2020. O crescimento previsto para EUA em 2021 (3,1%), Europa (5,2%) e América Latina (3,6%) será insuficiente para voltar ao nível anterior - -4,3%, -8,3% -8,1% respectivamente. O PIB brasileiro recuará 5,8% este ano e aumentará 2,8% no ano que vem, uma das reações mais fracas entre países relevantes.

O estado de saúde da economia global poderá ser melhor se o apoio fiscal for elevado, houver melhoria significativa da produtividade, ou se uma vacina se tornar efetiva antes do previsto. Os riscos de piora são mais numerosos, como a ressurgência do vírus, uma retirada abrupta dos estímulos, um aperto das condições financeiras motivada, por exemplo, por crises de dívida, aperto de liquidez decorrente de falências em série, tensões geopolíticas, incertezas sobre políticas comerciais e mesmo revoltas sociais.

Mas os países carregarão por muito tempo o peso da destruição provocada pelo coronavírus. Os países avançados, estima o FMI, terão seu potencial de expansão 3,5% menor do que o previsto antes da pandemia, com recuo ainda maior para os emergentes (-5,5%). Até 2025, o crescimento dos países desenvolvidos se estabilizará em torno de 1,7%, e o de emergentes, em 4,7% (5,6% na média 2000-2019).

As perdas para o Brasil são pesadas. Seu PIB per capita declinou 6,4% e só 2,2% dele será recuperado em 2021. O desemprego deve aumentar de 13,4% para 14,1%. O hiato do produto, de altos 5%, na média 2020-2021, cairá apenas à metade na média de 2022-2023.

Para países emergentes muito endividados, como o Brasil, que não é citado, o FMI deixou de lado seu receituário ortodoxo. O Fundo recomenda que gastos públicos ajudem a elevar o potencial de crescimento e a proteção aos vulneráveis. “A dívida adicional para financiá-los provavelmente se pagará por si mesma ao longo do caminho” com a recuperação da economia e aumento de impostos. E, em ressalva importante, indica que “mesmo que regras fiscais restrinjam essas ações, a suspensão temporária delas pode ser assegurada” se combinada ao compromisso de sua restauração a médio prazo. Há como arrumar recursos para essas finalidades, sugere o FMI, “reduzindo desperdícios com subsídios mal calibrados”. Se necessário, o aumento de impostos deve ser concentrado nas altas rendas, ganhos de capital e taxação sobre as empresas. Para fazer tudo isso, será preciso apresentar um plano crível de consolidação fiscal para quando a crise acabar.

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