sexta-feira, 9 de outubro de 2020

O que a mídia pensa – Opiniões / Editoriais

A reputação e o currículo – Opinião | O Estado de S. Paulo

Esclarecimentos podem e devem ser dados por Kassio Marques, mas o currículo do desembargador não contribui para sua reputação.

 Além de notável saber jurídico, a Constituição exige dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) reputação ilibada. Trata-se de uma condição exigente. Não basta, por exemplo, que a pessoa não tenha sido condenada criminalmente. É preciso que a reputação dos cidadãos escolhidos para compor a mais alta Corte do País seja límpida, intacta, sem mancha, sem sombra, sem nenhuma suspeita.

Longe de ser expressão de algum tosco moralismo, o requisito relativo à reputação dos indicados para a Suprema Corte representa indispensável proteção do próprio STF. Não basta que as decisões sejam tecnicamente perfeitas. Para que o Supremo seja capaz de realizar sua missão institucional, não deve pairar dúvida a respeito da lisura de seus integrantes. A ilibada reputação possibilita, assim, que as decisões do STF alcancem plena efetividade, também em relação à pacificação social. A Corte e seus ministros necessitam de autoridade.

Para que tudo isso não seja mera formalidade, a Constituição estabelece a sabatina no Senado. “Os ministros do STF serão nomeados pelo presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal”, diz a Constituição.

Se sempre é necessário recordar a responsabilidade dos senadores na aferição das qualidades de quem é indicado para integrar o STF, o tema adquire relevância especial quando, por exemplo, surgem – como ocorreu recentemente – inconsistências no currículo da pessoa indicada pelo presidente da República. Por certo, a sabatina não é uma prova de títulos. Mas é, assim prevê a Constituição, uma avaliação sobre a reputação da pessoa indicada.

O desembargador Kassio Marques deverá ser sabatinado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado no dia 21 de outubro. Nessa sabatina, seria muito oportuno esclarecer, por exemplo, a razão pela qual a dissertação de mestrado que Kassio Marques apresentou à Universidade Autônoma de Lisboa contenha trechos idênticos – até os erros de digitação são os mesmos – a três artigos acadêmicos do advogado Saul Tourinho Leal. Segundo levantamento feito pelo Estado, ao menos 13% do que o desembargador do TRF-1 entregou é igual ao que Tourinho escreveu anos antes.

Após as semelhanças entre os textos virem a público, Kassio Marques e Saul Tourinho Leal disseram que trabalharam juntos em algumas ideias e que a dissertação de Marques e os artigos de Tourinho chegam a conclusões diferentes. Na sabatina na CCJ, será possível questionar a razão pela qual essa realidade autoral não foi devidamente expressa nos textos.

Cientes do seu dever constitucional de aferir a reputação e o saber jurídico do indicado ao Supremo pelo presidente da República, os senadores também não devem deixar de inquirir o desembargador Kassio Marques sobre a menção em seu currículo à pós-graduação em “Contratación Pública” pela Universidad de La Coruña. 

Nesse caso, segundo a instituição espanhola informou ao Estado, não é que Marques não tenha feito a pós-graduação. O curso simplesmente não existe, constando apenas que o desembargador cursou atividade de cinco dias na instituição. Depois dessa revelação, Kassio Marques negou que tenha tentado melhorar o currículo ou que tenha dado uma interpretação mais ampla às atividades acadêmicas das quais participou. Segundo o indicado pelo presidente Bolsonaro para o Supremo, houve apenas um “erro de tradução” e que em nenhum momento ele quis se referir à pós-graduação.

No currículo do desembargador, consta ainda “pós-doutorado em Direito Constitucional pela Universidade Federal de Messina, Itália”. Confrontado sobre essa titulação, Kassio Marques declarou ter participado de cinco dias de aula, em formato “intensivo”. Na sabatina, seria oportuno saber se houve eventualmente algum erro de tradução a respeito desses termos acadêmicos.

Esclarecimentos podem e devem ser dados por Kassio Marques, mas o fato é que o currículo do desembargador não está contribuindo para sua reputação. A régua da Constituição é alta.

 Riscos e fraquezas segundo o FMI – Opinião | O Estado de S. Paulo

Reação à crise foi boa, mas potencial produtivo segue baixo, avaliam os técnicos.

 Desemprego elevado, economia travada, baixo investimento e enorme dívida pública são projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) para o Brasil nos próximos cinco anos. O quadro será pior, se faltar confiança no manejo das contas públicas e o País afundar numa crise fiscal. A reação do governo à pandemia foi “rápida e substancial” e perdas maiores foram evitadas. Apesar disso, o Produto Interno Bruto (PIB) deve encolher 5,8% em 2020. A expansão de 2,8% estimada para 2021 será insuficiente, portanto, para a volta ao patamar anterior à crise. Pelo menos a política emergencial deste ano é descrita de forma positiva, na declaração recém-divulgada pela equipe técnica do Fundo. Os próximos anos são outra história.

Equipes do FMI visitam regularmente países-membros para examinar suas condições e perspectivas econômicas. O trabalho envolve contatos com fontes oficiais, do setor privado e da academia. Os governos autorizam, normalmente, a divulgação das conclusões.

É preciso levar a sério as avaliações, alertas e projeções contidos nesse novo documento, embora seja uma prévia de um relatório muito mais amplo. Os primeiros parágrafos são até generosos, ao descrever o Brasil, no começo de 2020, como um país em posição para decolagem.

Com a pandemia, as prioridades mudaram. A ação oficial é bem avaliada: evitou uma recessão mais profunda, estabilizou o setor financeiro e amorteceu os efeitos da crise sobre os mais vulneráveis. Mas as medidas emergenciais tiveram custo enorme e agravaram o desajuste das contas públicas. O estado de calamidade reconhecido pelo Congresso acabará, no entanto, em dezembro. Será preciso retomar a arrumação fiscal – e a partir de um quadro bem pior que o de antes da pandemia.

Encerrado o estímulo fiscal, o papel de reanimar a economia ficará para a política monetária. Haverá, segundo os técnicos do FMI, margem para novos cortes de juros, se a inflação e as expectativas de alta de preços continuarem abaixo da meta.

Também será essencial avançar na execução da pauta de reformas, cumprir o programa de privatizações e concessões, finalizar os acordos comerciais com a União Europeia e com outros parceiros e concluir a adesão ao acordo de compras governamentais da Organização Mundial do Comércio (OMC).

A lista de recomendações pode parecer muito razoável e até óbvia, mas falta saber se o presidente estará disposto a fazer o necessário para segui-la.

Acordos comerciais podem hoje implicar compromissos ambientais fora dos padrões do presidente Jair Bolsonaro. Isso explica os impasses com a União Europeia. Problemas semelhantes podem surgir em outras negociações.

Além disso, a diplomacia brasileira, incluída a comercial, tem sido moldada pelos interesses e padrões do presidente Donald Trump. Estarão as autoridades de Brasília preparadas para avaliar e talvez seguir a pauta sugerida pelo FMI?

Mas um tropeço pode ocorrer antes de se cuidar dessas questões de longo prazo. Um risco muito importante, segundo a equipe, é a “vulnerabilidade a choques de confiança” associados ao “nível elevado da dívida pública”. Segundo as projeções agora divulgadas, a dívida chegará neste ano a 99% do PIB, baterá em 100% em 2021 e ficará pouco acima disso nos anos seguintes.

A insegurança em relação à política fiscal e, portanto, à evolução da dívida, tem sido visível nas oscilações do dólar e dos juros futuros. As manobras do Executivo para ajustar o Orçamento de 2021 aos interesses eleitorais do presidente realimentam no dia a dia as desconfianças de investidores e analistas.

Outros números no fim do relatório também justificam inquietações. Segundo as projeções, o PIB crescerá 2,8% em 2021, 2,3% em 2022 e ficará no ritmo de 2,2% nos três anos seguintes. O investimento produtivo seguirá muito baixo. O detalhe mais importante, já presente em outras projeções do FMI, é o baixo potencial de crescimento percebido no Brasil e confirmado nos últimos anos. Não há, ainda, por que traçar uma perspectiva melhor – e esse é o grande recado dos números.

Linha de largada – Opinião | Folha de S. Paulo

Antes da campanha na TV, Datafolha mostra menor distância entre candidatos em SP

Num quadro em que as campanhas ainda ensaiam seus primeiros movimentos, a nova pesquisa Datafolha de intenção de voto para a Prefeitura de São Paulo mostra Celso Russomanno (Republicanos) na liderança (27%) à frente do atual prefeito, o tucano Bruno Covas (21%). Em terceiro lugar aparece Guilherme Boulos, do PSOL (12%).

O levantamento foi realizado nos dias 5 e 6 de outubro, antes, portanto, do horário gratuito de rádio e TV, cujo início está marcado para esta sexta-feira (9).

Além de personagem conhecido pela atuação televisiva, Russomanno apresenta-se pela terceira vez ao pleito, agora na esperança de que o apoio declarado pelo presidente Jair Bolsonaro possa lhe reservar melhor sorte. Em simulação de segundo turno, ele hoje bateria Covas por 46% a 40% dos votos.

Em que pese a fase inicial da disputa, algumas oscilações se fizeram notar em relação à pesquisa anterior, de 21 e 22 de setembro. Mesmo dentro da margem erro, de três pontos percentuais, a diferença entre o primeiro colocado e o segundo caiu de 9 para 6 pontos.

Já Boulos, o terceiro nas preferências, passou de 9% para 12% das intenções, ampliando sua vantagem em relação a Márcio França (PSB), que se manteve com 8%.

A oscilação positiva do postulante do PSOL veio acompanhada do aumento da parcela da população que diz conhecer seu nome —de 46%, em setembro, para 54% agora. A consolidar essa trajetória ascendente, Boulos poderá quebrar a tradicional hegemonia do PT entre as candidaturas de esquerda.

Jilmar Tatto, o nome petista, não obteve a adesão de apoiadores históricos do partido, que declararam votos no postulante do PSOL, e tem apenas 1% das intenções neste momento.

Com as ressalvas do que se observou na última eleição presidencial, quando o tempo de TV teve reduzida influência, será preciso aguardar o início da propaganda gratuita para juízos mais embasados. Tanto Covas como Tatto depositam parte de suas esperanças nesse período de exposição na mídia.

Não há dúvida, porém, de que outros fatores irão pesar, a começar pela relevância que a internet ganhou nos últimos tempos. Também os debates costumam ter influência no esclarecimento dos eleitores e na definição de tendências.

Infelizmente, não é certo que as principais redes de TV promoverão tais encontros —e, mesmo que isso venha a ocorrer, o candidato Celso Russomanno dá sinais de que pretende fugir dos confrontos.

Numa eleição excepcional, marcada pelas circunstâncias da pandemia do novo coronavírus, tem-se por ora apenas o retrato de uma linha de largada. Muito ainda poderá mudar ao longo da corrida.

Abaixo do mundo – Opinião | Folha de S. Paulo

PIB brasileiro deve crescer menos que o global em 2021; tragédia antecede vírus

Salvo exceções pontuais, o mundo não deverá se recuperar já no próximo ano das perdas econômicas provocadas pela pandemia do novo coronavírus. Nesse cenário de retomada incerta, a situação brasileira é particularmente precária.

Pelas projeções do Institute of International Finance (IIF), entidade que reúne 450 bancos e fundos de investimento, o Brasil amargará retração do Produto Interno Bruto de 5,9% neste ano e alta de 3,6% em 2021 —expansão inferior às esperadas para o mundo (5,3%), as economias avançadas (4,5%) e a América Latina (3,8%).

As estimativas locais para o impacto imediato da Covid-19 são ligeiramente menos pessimistas que as do IIF: calcula-se hoje encolhimento de 5% em 2020, conforme pesquisa do Banco Central. Em qualquer hipótese, trata-se do pior resultado anual já medido no país —e a continuidade de uma tragédia que antecede a pandemia.

A economia nacional acaba de experimentar uma recessão meteórica, concentrada nos meses de março e abril, antes mesmo de ter se recobrado dos efeitos da recessão anterior, longa e brutal, no período de 2014 a 2016.

Fecharemos a década com crescimento acumulado próximo de zero, um desempenho impensável para um país de renda média e enorme desigualdade social.

Não é de hoje, nem desta década, que o Brasil progride menos que o restante do mundo. Estatísticas do Fundo Monetário Internacional (FMI) apontam que o país representava 4,4% da economia global em 1980; de lá para cá, a cifra caiu gradualmente a 2,4%.

A debilidade não se mostra apenas circunstancial, portanto, embora o momento atual apresente diversos problemas agravados.

A crise financeira global de 2008 apanhou o país em situação orçamentária relativamente confortável, o que permitiu ao governo atenuar os efeitos recessivos e acelerar a retomada por meio da expansão das despesas públicas.

Como a gastança não foi interrompida, entretanto, as contas do Tesouro já se encontravam em estado calamitoso quando foi necessário enfrentar a pandemia com uma escalada inédita de desembolsos.

Se o colapso momentâneo da atividade justificou a correta atuação emergencial do poder público, os patamares anômalos do déficit e da dívida pública tornam imperativo o retorno em breve ao ajuste fiscal —sob pena de não deixar para trás uma década perdida.

O futuro da Lava-Jato no Supremo de Fux – Opinião | O Globo

STF ganha muito em legitimidade com a decisão que transfere ao plenário julgamentos da operação

Numa de suas frases de muito efeito e pouco lustro, o presidente Jair Bolsonaro disse que acabou “com a Lava-Jato porque não tem mais corrupção no país”. Foi quase um ato falho, pois confirma implicitamente que o procurador-geral Augusto Aras, nomeado por Bolsonaro, tem como missão esvaziar a operação responsável pelo maior avanço no combate à corrupção na história brasileira.

É verdade que não têm sido poucos os reveses da operação nos últimos tempos: encolhimento do ex-ministro e ex-juiz Sergio Moro, saída do procurador Deltan Dallagnol, extinção das forças-tarefas — e uma série de decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que dificultam a punição de acusados contra os quais há evidências robustas. É nesse contexto que deve ser entendida outra decisão, tomada na primeira reunião administrativa sob o novo presidente, ministro Luiz Fux, de retirar os processos penais das duas turmas do STF e transferi-los ao plenário.

A medida confirma a preocupação de Fux com as derrotas que denúncias da Lava-Jato vêm sofrendo na Segunda Turma, depois da saída do ministro Celso de Mello. Sem ele, o empate entre os votos de Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, pró-réus, e os de Edson Fachin e Cármen Lúcia, contrários, passou a assegurar a absolvição. A maior expectativa cerca a decisão sobre a reclamação em que o ex-presidente Lula acusa Moro de parcialidade. Por ser recurso, não será transferida da turma — e pouco muda no caso.

Seria equívoco grave, contudo, confundir as conquistas da Lava-Jato com o resultado de processos específicos ou o destino de políticos individuais. Nos últimos seis anos, o Judiciário passou a contar com um arsenal mais robusto no combate à corrupção. Dele, consta a Lei de Organizações Criminosas, que consolidou as delações premiadas. Entre os avanços institucionais, há projetos no Congresso para reinstituir por lei o cumprimento da pena na condenação em segunda instância. As forças-tarefas, por mais que Aras queira desmantelá-las, permanecem como recurso de eficácia comprovada.

Fux abre, na presidência do Supremo, uma trincheira de defesa da simbologia associada à operação: o combate sem trégua à corrupção. Pode ser até o prenúncio de desentendimentos com Bolsonaro, que se aproximara do antecessor dele, Dias Toffoli.

As turmas foram criadas em 2014, quando a Corte submergia sob uma montanha de processos. Agora, em virtude do próprio amadurecimento institucional (com processos enviados a instâncias inferiores) e de avanços administrativos, o volume ficou menor. A soma das duas turmas tornará mais representativo o choque entre “garantismo” e “punitivismo”, linhas jurídicas antagônicas, mas dotadas de argumentos razoáveis, dependendo da situação.

Acabam, assim, as cartas marcadas nos julgamentos previsíveis da Segunda Turma em favor dos réus. O STF ganha muito em legitimidade. Quer sob o guarda-chuva da Lava-Jato, quer estabilizando as conquistas que a operação legou ao país, o combate à corrupção não pode parar nem retroceder.

Projeto que anistia PMs expulsos precisa ser rejeitado pela Alerj – Opinião | O Globo

Polícia Militar diz que a proposta, aprovada em primeira discussão, fere a ética da corporação

Mais afinada com os interesses de corporações e nichos eleitorais que com os anseios da sociedade, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) discute um projeto de lei que propõe anistiar ex-policiais militares expulsos da corporação por desvios de conduta. Alguns dos beneficiados têm perigosas ligações com milícias. O PL 1.326/19, assinado por mais de 20 deputados, já foi aprovado em primeira discussão.

Como mostrou reportagem do GLOBO, de 25 pedidos de reintegração em análise na comissão da Polícia Militar (PM) que julga recursos administrativos de agentes expulsos, dez seriam beneficiados pelo projeto, que prevê reintegrar apenas policiais que não tenham sido condenados na Justiça pelo mesmo desvio que motivou a expulsão. Nesses casos, porém, condenações são raras, em virtude de falta de provas. Absolvição não equivale a inocência. Em pelo menos três casos, os policiais beneficiados são suspeitos de ligações com grupos paramilitares. Um deles envolve um PM absolvido na Justiça por crime de desacato. Após deixar a corporação, ele foi condenado por homicídio e acusado de integrar um grupo de extermínio em Macaé, no Norte Fluminense.

Não é a primeira vez que a Alerj se move para anistiar PMs. Em 2018, a Casa reintegrou militares que tinham participado de uma greve em 2012. Desta vez, a anistia valeria para o período de 2007 a 2018, nos governos de Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão, quando cerca de 2 mil PMs foram expulsos numa tentativa de limpeza da corporação. A ideia é tão escandalosa que a própria PM se manifestou nas redes sociais contra a proposta: “O projeto fere a dimensão ética da corporação, podendo ocasionar reflexos negativos na qualidade do serviço prestado”.

O Ministério Público estadual também criticou a iniciativa. Em ofício enviado ao presidente da Alerj, André Ceciliano (PT), o procurador-geral de Justiça, Eduardo Gussem, recomenda a rejeição do projeto. Argumenta que, além de inconstitucional, ele “usurpa iniciativa reservada ao governador do estado, autoridade máxima responsável pela gestão da segurança pública”. A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados expressou preocupação com a proposta, diante de uma polícia com altas taxas de letalidade.

Não faz sentido readmitir policiais expulsos em razão de malfeitos. Se tiver havido alguma injustiça, cabe à comissão encarregada de julgar os processos repará-la. O projeto absurdo de anistia precisa ser rejeitado na Alerj. Um dos maiores inimigos da PM está dentro dos quartéis. É o bandido travestido de policial, letal não só para a sociedade, mas para a própria PM.

Fux pode tolher manobras políticas de Bolsonaro – Opinião | Valor Econômico

Ao deter o controle da pauta do STF, Luiz Fux, coloca-se como obstáculo sério aos livres movimentos do Planalto

A decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, de colocar ações criminais em curso na Corte nas mãos do plenário e não mais nas das duas turmas do tribunal, tem efeitos que vão bem além dos processuais. Ela põe uma cunha em uma cadeia de manobras do presidente Jair Bolsonaro para ampliar sua influência sobre o STF, colocar aliados no comando do Congresso e blindar Flavio Bolsonaro de encrencas com a Justiça. Bolsonaro mudou sua estratégia política, aliou-se ao Centrão, depois de demitir o paladino da Lava-Jato, Sergio Moro e disse que a operação acabou porque “não há corrupção” em seu governo. Fux é um defensor da Lava-Jato.

A reeleição e a proteção a si e a seu clã passa pela Justiça e pelo Congresso, peças importantes para o xadrez de suas ambições. Bolsonaro “neutralizou” a cúpula da Polícia Federal com a saída de Moro, escolheu um procurador geral da República, Augusto Aras, cujo trabalho mais vistoso em um ano no cargo foi tentar desmontar a Lava-Jato e abriu mão do palavrório da franja mais direitista de seus apoiadores para escolher um candidato ao STF com trânsito político, discreto e no qual confia.

O primeiro ato da gestão de Fux tem consequências diretas sobre os efeitos esperados pelo Planalto da indicação de Kassio Nunes Marques, que pode passar pela sabatina no Senado, embora seu currículo, que parecia sólido, esteja se desmanchando no ar, e com ele a qualidade da escolha. Kassio poderia pousar diretamente na Segunda Turma do STF, no lugar de Celso de Mello, formando assim um trio “garantista” com Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que tem imposto derrotas seguidas à Lava-Jato.

Dois votos têm sido suficientes para livrar de apuros aqueles cujos processos caem com a Segunda Turma. Se Kassio não pousasse nela, Dias Toffoli, que se aproximou de Bolsonaro mais do que a liturgia do cargo de presidente do STF prescreve, o faria. Agora, 11 ministros terão a palavra, o que não impede, mas dificulta, a imposição de sentenças idiossincráticas de um par deles.

A escolha de um ministro do STF é prerrogativa do presidente, e sua aprovação, responsabilidade do Senado, mas o processo tem baixa institucionalidade republicana, transparência e impessoalidade. Bolsonaro, que não respeita essas coisas, seguiu os maus usos e costumes da política em Brasília. Levou seu indicado para apresentá-lo a Gilmar Mendes, relator do processo que terá de decidir se Flavio Bolsonaro tem direito ou não ao foro privilegiado na investigação sobre as “rachadinhas” na Assembleia Legislativa do Rio e Dias Toffoli, que no auge da escalada presidencial contra as instituições - isto é, antes da prisão de Fabrício Queiroz - propôs um esdrúxulo pacto entre Poderes. Se fosse apenas de uma deferência, a etiqueta sugere que Bolsonaro deveria acompanhá-lo até o gabinete da Presidência do STF.

A escolha de Kassio foi antecedida de movimentos ruidosos na PGR que provocaram fuga de procuradores da Lava-Jato de Curitiba, pedidos de demissão em massa na de São Paulo, que lida com um material aparentemente intratável - os escândalos de corrupção dos tucanos em São Paulo - e defecções em Brasília. Augusto Aras quis que os procuradores de Curitiba compartilhassem todos os arquivos de suas investigações e deixou claro que gostaria de unificar todas as operações. Aras declarou que a “Lava-Jato não tem dono”, mas se obtivesse seu intento ele próprio se tornaria um dos homens mais poderosos do país - e, teme-se, sob influência de Bolsonaro.

A terceira peça é mais complicada de mover. Unido aos perseguidos pela Justiça do Centrão, Bolsonaro precisa ter no comando do Congresso políticos aliados em um período crucial, o biênio eleitoral 2021-22. Seu favorito para a vaga de Rodrigo Maia é Arthur Lira, figurante de vários processos por corrupção, entre outros. Lira foi agraciado com algo raro: a PGR retirou denúncia contra ele alegando fragilidade das provas, após tê-lo denunciado asseverando que as acusações tinham provas “muito além das palavras dos colaboradores”.

Um complicador é o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que tem boas relações com Bolsonaro, e quer se manter na Presidência da Casa, em manobra flagrantemente inconstitucional, que também beneficiaria Maia. Bolsonaro prefere desalojar Maia, mas tem que se preparar para ambos desfechos, até que a Justiça lhe diga o que fazer.

Ao recompor a decisão colegiada e deter o controle da pauta do STF, Luiz Fux, coloca-se como obstáculo sério aos livres movimentos do Planalto. Mas, como lembrou-lhe Gilmar Mendes, “o presidente é um coordenador de iguais”.

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