domingo, 8 de novembro de 2020

O que a mídia pensa – Opiniões / Editoriais

Espaço para Brasil de Bolsonaro fica estreito com Biden – Opinião | O Globo

Vitória do democrata reaproxima os EUA de antigos parceiros e cria dificuldades para o populismo

Não se sabe ainda como será a transição de poder nos Estados Unidos, mas a vitória de Joe Biden na eleição americana traz desafios particulares ao Brasil de Jair Bolsonaro. Na ditadura, o governo Geisel enfrentou percalços com o também democrata Jimmy Carter, pelo desrespeito aos direitos humanos. Agora, na democracia, o Brasil pagará o preço de Bolsonaro ter apostado abertamente em Donald Trump —e ter sido derrotado com ele.

Os momentos históricos distintos são unidos por um ponto comum: a necessidade de uma estratégia diplomática bem formulada e executada. Bolsonaro precisará da reconhecida experiência do velho Itamaraty, posta de escanteio pelo chanceler Ernesto Araújo. Mas não só. O próprio figurino ideológico do bolsonarismo enfrentará pressões.

No primeiro dos dois debates entre Biden e Trump, o democrata tocou num nervo exposto do bolsonarismo: o descaso com o meio ambiente. O futuro presidente americano acenou com um fundo de US$ 20 bilhões para ajudar na preservação da Amazônia e antecipou que baixará sanções econômicas caso tudo continue na mesma. Bolsonaro evocou os tempos de caserna, enrolou-se na bandeira e soltou um brado em defesa da “soberania nacional”. São palavras inócuas diante do desafio que Biden lhe trará.

Nenhuma das alterações no tabuleiro geopolítico depois da eleição joga a favor do Planalto. A Casa Branca de Biden se reaproximará dos aliados europeus tradicionais — como Alemanha e França — e, como anunciado, voltará ao Acordo do Clima de Paris, que Bolsonaro falou em abandonar em mais uma mímica de Trump. A defesa da preservação da Amazônia não é uma peça solta na política externa democrata. Servirá também para reerguer a Aliança Atlântica.

Liberdades democráticas, respeito aos direitos constitucionais, ao meio ambiente, defesa dos direitos humanos — temas relativizados, quando não desrespeitados pelo bolsonarismo — voltarão a servir de baliza para a diplomacia dos Estados Unidos. Também acabará o tempo de afagos americanos a autocratas como o húngaro Viktor Orbán (convidado de honra à posse de Bolsonaro) ou o russo Vladimir Putin. O governo brasileiro precisará se adaptar à nova realidade.

Nada será tão desafiador quanto a relação com a China, que ganhará novos contornos na gestão Biden. Para o Brasil, mesmo que possa haver mais espaço para uma decisão técnica sobre a telefonia celular de quinta geração (5G), persiste o desafio de, em nome do interesse nacional, equilibrar os acenos às duas superpotências, seus dois maiores parceiros comerciais. O choque entre elas continuará.

Se, com Trump, não recebemos benefícios especiais, agora será ainda mais difícil. O Brasil sob Bolsonaro já havia perdido importância na cena global. Para resgatá-la, será mais necessário ainda o trabalho profissional na política externa, que de nada valerá se o Planalto não souber se adaptar ao novo equilíbrio mundial.

Já vai tarde – Opinião | Folha de S. Paulo

Derrocada de Trump pune ataques à civilização e carrega lições para Bolsonaro

"Pelo que Donald Trump representa em termos de risco internacional, dados seu alarmante despreparo e a xenofobia beligerante de sua campanha, vê-lo derrotado não configura questão partidária, nem se reduz ao âmbito norte-americano, mas convém ao mundo inteiro”. Era final de julho de 2016, mas as palavras expressas neste espaço não poderiam ser mais atuais.

A derrota ansiada não ocorreu naquele escrutínio. Demorou mais quatro anos, suficientes para que a anomalia apontada em germe frutificasse e mostrasse seu poder de fazer estragos. Mas a estupidez, finalmente, cobrou o seu preço.

Foram tantas as investidas do republicano contra os pilares da civilização que a reação despertada, sob a forma de um comparecimento histórico às urnas, transformou-o num dos raros detentores do cargo nos Estados Unidos a quem foi negada a reeleição.

Por mais que o oportunismo cafajeste do republicano —reforçado na quinta (5) em discurso contra a democracia— tente minar o processo eleitoral, a vitória do democrata Joe Biden, até onde se pode enxergar, está legitimada. Respeite-se a soberania popular: ela diz que o desafiante prevaleceu.

Biden, que serviu oito anos como vice de Barack Obama, consagra a aposta do seu partido na moderação, no diálogo e no exercício diligente da política. Ao longo das prévias, foram descartadas candidaturas que prometiam combater o rufião da direita com radicalização à esquerda. A escolha da companheira de chapa, a senadora Kamala Harris, coroou esse processo.

A pandemia de coronavírus, com impacto colossal na saúde e na economia, retirou do adversário a sua maior bandeira eleitoral, o baixo desemprego. Também ofereceu aos EUA e ao mundo a oportunidade de conhecer a fundo a capacidade destrutiva de um bravateiro populista alçado ao poder.

Sabotador de primeira hora das melhores práticas sanitárias e disseminador de falsidades sobre origens do vírus e recursos terapêuticos, o presidente concorreu para transformar o seu país num exemplo de descontrole da epidemia.

Perdeu apoio de eleitores mais velhos e viu a infecção espalhar-se por seus redutos conforme o pleito se aproximava. Como se fosse pouco, ajudou, com provocações e afagos a grupos supremacistas, a mobilizar massas urbanas contrariadas com o abuso recorrente da força policial contra negros.

Num período curto e dramático da sua administração, ficou estampada e condensada grande parte das características que fazem da passagem de Donald Trump pela Casa Branca uma ameaça aos valores que, ao longo dos séculos e mediante duras batalhas, construíram a democracia ocidental.

Para compor a personagem do playboy senil convergiram a arrogância dos plutocratas, o ódio dos supremacistas, a pequenez dos isolacionistas, a covardia dos machistas, a ignorância dos obscurantistas, a desfaçatez dos mitômanos e a intolerância dos messiânicos.

Não se trata de idealizar Biden. É saudável a possibilidade de que o novo presidente exerça o poder restrito por uma maioria republicana do Senado, o que ajudará a bloquear projetos temerários como o de manipular a composição da Suprema Corte do país.

Mas o dissenso partidário e o entrechoque institucional tendem a ocorrer, sob Joe Biden, numa frequência distante da algazarra febril e do atropelo de protocolos que marcaram a gestão Trump.

Nesse retorno a uma relativa normalidade, o concerto internacional para lidar com questões que afetam toda a humanidade —como a pobreza, as migrações, o comércio e as ameaças sanitárias, ambientais, financeiras e de segurança— deverá ser resgatado do limbo pelo novo líder da maior potência global.

As nações que quiserem se comportar como párias, condição que parece encher de orgulho o delirante chanceler brasileiro, incorrerão em mais riscos e perderão o grande aliado na irresponsabilidade.

A derrocada de Trump, aliás, está carregada de lições para o presidente Jair Bolsonaro, bajulador e imitador canastrão do americano.

A mais importante delas é que há um preço a pagar na afronta sistemática às boas práticas de governo e de comportamento político. A fatura pode demorar, mas chega.

Há tempo de o presidente brasileiro completar o ajuste necessário em sua administração para navegar as novas águas com menos sacolejos. Sinal crucial de que sua administração ruma à razoabilidade seria mudar a orientação da política ambiental, o que passa pela saída do ministro Ricardo Salles.

Outra providência é Bolsonaro reconciliar-se depressa com a ciência e a prudência na condução do combate à pandemia. Fazer politicagem com vacinas e colocar, pela negligência, ainda mais vidas de brasileiros em perigo é caminho seguro para a punição eleitoral.

O mundo é um lugar melhor desde o momento em que uma maioria de votos se formou para abater o voo populista nos EUA. Que no Brasil as lideranças saibam captar o espírito do tempo —ou feneçam, como Trump, que já vai tarde.

Alívio – Opinião | O Estado de S. Paulo

A maioria dos norte-americanos decidiu impedir pelo voto que Donald Trump completasse sua obra – a destruição da democracia nos Estados Unidos

O restabelecimento da política e do respeito às instituições como centro da vida democrática é o primeiro e mais significativo resultado da eleição do democrata Joe Biden à presidência dos Estados Unidos, confirmada neste sábado. Política pressupõe diálogo, mesmo, ou talvez principalmente, entre adversários figadais. Numa democracia digna do nome, não há divergência que não possa ser superada pela negociação civilizada e baseada no senso comum. Minorias devem ser ouvidas e a oposição deve ser respeitada, sob o signo da Constituição.

Assim, o desfecho da campanha presidencial norte-americana não é trivial em muitos aspectos. Não é apenas uma troca de governo, normal numa democracia. É a superação de um pesadelo, representado pela desvairada presidência de Donald Trump.

Joe Biden certamente terá muitas dificuldades para governar, tendo em vista não apenas a expressiva votação de seu adversário, mas um Congresso potencialmente hostil. Talvez não consiga fazer tudo o que prometeu e certamente enfrentará muitas crises, pois não é fácil ser presidente da maior potência democrática do mundo. 

Nada disso, contudo, importa neste momento histórico. O que interessa é que a maioria dos norte-americanos decidiu impedir pelo voto que Donald Trump completasse sua obra – a destruição da democracia nos Estados Unidos – e entregar a um político tradicional e experiente a tarefa de liderar o país nesta hora de profunda crise. A mensagem é clara: chega de aventuras irresponsáveis, lideradas por um demagogo que não tem nenhum apreço pela política, pela lei e pela verdade.

Como era previsível, o presidente norte-americano informou que não aceita o resultado e que a eleição “está longe de acabar”. Prometeu brigar na Justiça para contestar a votação em seu adversário em vários Estados. “Não vou descansar até que o povo norte-americano tenha a contagem de votos honesta que ele merece e que a democracia exige”, disse Trump em nota, sem mostrar qualquer prova de fraude. E ainda tuitou: “Eu venci esta eleição, por muito!”. Considerando que Trump ainda será presidente por cerca de dois meses, com os poderes que o cargo lhe garante e outros que ele imagina ter, não é desprezível a possibilidade de muita confusão.

A esta altura, porém, a voz de Donald Trump, embora seja formalmente a do chefe de Estado, tende a ser ignorada, a começar por muitos de seus próprios correligionários, que há tempos tentam se desvincular do presidente doidivanas. Não foram poucos os próceres do Partido Republicano a cumprimentar publicamente Joe Biden e a lhe desejar um bom governo, como devem fazer os que respeitam a democracia, independentemente de desavenças políticas.

Joe Biden, de acordo com suas primeiras palavras como presidente eleito, parece consciente de que há um longo caminho para cauterizar as profundas feridas da sociedade norte-americana, tão bem exploradas pelos bandoleiros que tomaram a Casa Branca com a infeliz eleição de Donald Trump – que tomou as legítimas aspirações de milhões de norte-americanos como pretexto para seu empreendimento liberticida.

Lembrando que o comparecimento às urnas foi um dos maiores da história dos Estados Unidos, onde o voto não é obrigatório, o presidente eleito disse a seus compatriotas que vai trabalhar para unir o país. “Com o fim da campanha, é hora de superarmos o ódio e a retórica raivosa e nos unir como nação. É hora de os Estados Unidos se unirem e de curarem as feridas. Somos os Estados Unidos da América. Não há nada que não possamos fazer quando estamos unidos”, declarou Biden.

Essa poderosa mensagem será ouvida em todo o mundo, mas especialmente em países assolados pelo populismo selvagem inspirado por Donald Trump, como o Brasil. Restabelece a esperança de que a democracia, malgrado suas crises e seus impasses, tem mecanismos para sobreviver aos piores ataques e a seus mais ferozes inimigos, desde que se preservem seus pilares – império da lei, imprensa livre, cidadania ativa e, acima de tudo, liberdade.

Perspectivas do relacionamento Brasil-EUA

Há sólidas condições históricas e interesses mútuos para avançar em suas parcerias

Muito se tem especulado sobre o impacto das eleições norte-americanas na relação Brasil-EUA. Com justas razões: a deliberada propensão dos presidentes Donald Trump e Jair Bolsonaro a confundir questões de Estado com políticas de governo e interesses pessoais já causou muitos ruídos desnecessários que ainda podem se amplificar na futura administração. Mas um relatório do Serviço de Pesquisas do Congresso norte-americano mostra que, além das contingências ideológicas, hoje reciprocamente alimentadas, há sólidas condições históricas e interesses mútuos para que as duas nações avancem em suas parcerias comerciais e estratégicas.

O documento adverte para um padrão histórico de altas expectativas dando lugar a mútuas frustrações. Apesar disso, os políticos norte-americanos frequentemente apontam o Brasil como um parceiro natural em questões regionais e globais, dada a nossa condição de democracia multicultural.

Malgrado certas diferenças nas abordagens de políticas comerciais, as relações EUA-Brasil se aprofundaram nas últimas duas décadas. Ainda que em 2008 a China tenha ultrapassado os EUA como o maior parceiro comercial do Brasil, o comércio entre ambos mais do que dobrou desde 1999, especialmente nas indústrias energética e aeroespacial. O Brasil é o 19.º maior parceiro comercial dos EUA e o segundo maior latino-americano.

Em outubro, os dois países concluíram um Protocolo de Regras Comerciais que reforça os compromissos do Brasil em favor de mais competitividade, reformas regulatórias e liberdade econômica, e acrescenta três anexos ao Acordo sobre Comércio e Cooperação Econômica de 2011: facilitação do comércio e administração aduaneira; práticas regulatórias similares à do Acordo EUA-México-Canadá (USMCA, na sigla em inglês); e compromissos anticorrupção. O protocolo não precisa da aprovação do Congresso americano, mas precisará ser aprovado pelo brasileiro.

“O Congresso deveria considerar explorar as perspectivas de um aprimoramento das relações econômicas e comerciais com o Brasil sob uma ‘abordagem de blocos de construção’ rumo a um eventual Acordo de Livre Comércio”, sugere o relatório. “Também deveria examinar um quadro para promover laços comerciais e abordar questões como propriedade intelectual e comércio digital.” Os capítulos do USMCA podem servir de modelos para acordos menores. O Brasil, por sua vez, precisará decidir se buscará um acordo junto com o Mercosul ou bilateralmente, o que exigiria mudanças nas regras do bloco.

Do ponto de vista dos EUA, o fortalecimento dos laços com o Brasil, entre outras razões econômicas e estratégicas, ajudará a promover seus interesses na América Latina ante a crescente presença da China. Nesse sentido, há um inequívoco alinhamento bipartidário. Sob a administração de Trump, o Brasil recebeu apoio para ser integrado à OCDE e foi designado como aliado prioritário extra-Otan. Não há razão para esses compromissos serem revertidos, mesmo sob uma administração de Joe Biden.

Contudo, o parecer aponta que muitos políticos (presumivelmente democratas) alegam que “o Brasil precisará promover avanços nos direitos humanos, meio ambiente, corrupção e reforma tributária antes que os dois países possam avançar em quaisquer negociações”. É uma evidente advertência à gestão de Jair Bolsonaro, que se soma àquelas da União Europeia e da OCDE. Mas nenhuma dessas exigências é antagônica aos interesses brasileiros. Muito ao contrário.

Ao fim e ao cabo, se as engrenagens diplomáticas do Itamaraty trabalharem segundo a sua melhor tradição, o Brasil poderá se beneficiar do melhor dos dois mundos: estreitamento das relações econômicas e estratégicas com os EUA, sem prejuízo da expansão das relações comerciais com o seu maior rival, a China. Mas isso dependerá da capacidade das instituições e da sociedade brasileiras de impor freios às idiossincrasias ideológicas de seu presidente. Do contrário, é perfeitamente possível que reste ao País o pior dos dois mundos: resistência do contingente democrata nos EUA e atritos contraproducentes com a China.

 

A democracia e o município – Opinião | O Estado de S. Paulo

São de grande relevância os estudos e análises que aportam luzes sobre a política na esfera local

A Fundação Konrad Adenauer Brasil lançou recentemente um novo número de sua série Cadernos Adenauer, com nove artigos dedicados às eleições municipais. Visto muitas vezes como algo de menor transcendência política e social, o pleito local é decisivo para a democracia. “Na minha experiência, a democracia é melhor ensinada nos municípios, pois ali o trabalho prático e o resultado de uma votação é imediatamente visível. Trabalhar a serviço da comunidade é, portanto, a melhor etapa preliminar para o trabalho no campo político em geral”, disse Konrad Adenauer que, antes de ser chanceler da Alemanha (1949-1963), foi prefeito de Colônia em duas ocasiões.

No artigo Eleições municipais legislativas: a porta de entrada na política e a mãe de todos os pleitos sob a realidade de 2020, Humberto Dantas e Bruno Souza da Silva registram que, “no anedotário político, o município sempre foi visto como o lugar de ausência de contestação (ausência de competição)”. No entanto, reconhecem que “as eleições municipais são competitivas (como é previsto num sistema democrático), partidos se alternam no poder e, de modo crescente, aumenta a oferta de candidatos à disposição dos eleitores”.

Em relação ao último tópico, o artigo traz números significativos. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nas eleições gerais de 2010 – que incluem a esfera central e a estadual – houve cerca de 22,5 mil candidaturas no País. Em 2014, 26 mil e em 2018, quase 30 mil. Já os números das eleições municipais são de outra ordem. Apenas para as câmaras municipais em 2008 houve 350 mil candidatos. Em 2012, 450 mil e em 2016, 460 mil.

Segundo Humberto Dantas e Bruno Souza da Silva, “o saldo verificado entre 2008 e 2012 está associado ao endurecimento da justiça em relação à interpretação da lei que obriga os partidos e coligações, vigentes em termos locais até 2016, a lançarem porcentuais mínimos de candidaturas do gênero minoritário na lista de postulantes, o que comumente está associado ao universo feminino. Essa decisão, sozinha, alterou significativamente o perfil dos candidatos, não só no que diz respeito ao gênero, mas também em termos de variáveis como estado civil e escolaridade”.

O artigo de Luiz Eduardo Garcia da Silva analisa os possíveis efeitos da proibição das coligações nas eleições proporcionais, instituída pela Emenda Constitucional (EC) 97/2017. Em primeiro lugar, o autor reconhece que “o fim da possibilidade de partidos firmarem coligações nas disputas proporcionais não necessariamente representará o fim dos puxadores de voto” – que era um dos efeitos prometidos com a EC 97/2017. Ao mesmo tempo, admite que a medida pode ter efeitos positivos na dinâmica da representação política, seja melhorando a eficácia das escolhas eleitorais por parte dos eleitores seja propiciando maior coesão interna aos partidos, “que buscariam reforçar sua imagem e projetos comuns frente ao eleitorado”.

Quanto ao efeito da diminuição do número de legendas, Luiz Eduardo Garcia da Silva afirma que, “estruturalmente, prevemos uma redução gradual do número de partidos políticos especialmente no âmbito municipal”. Destaca também que o efeito da proibição das coligações sobre a fragmentação partidária pode ser ainda mais forte em função da cláusula de barreira para partidos que não alcancem determinado porcentual de votos. A cláusula prevista na EC 97/2017 entrará em vigor em 2022.

O artigo de Garcia da Silva sugere ainda outro efeito especialmente positivo para a qualidade da representação. Com o fim das coligações, “o peso eleitoral de cada legenda será melhor equalizado na contagem dos votos, o que facilita a percepção do eleitor e facilita a sua própria tomada de decisões”.

Poucas esferas do Estado têm tanto impacto direto sobre a vida do cidadão como o Executivo e o Legislativo municipais. Por isso, são de grande relevância todos os estudos e análises que aportam luzes sobre a política na esfera local. O município importa e o eleitor precisa estar consciente disso.

É inadmissível o apagão que afeta a população do Amapá – Opinião | O Globo

Moradores estão privados de serviços básicos. Sistema só deve ser normalizado em dez dias

O blecaute que atingiu o Amapá após um incêndio na subestação de energia da capital, Macapá, na noite de terça-feira, expôs uma situação inadmissível. Ao menos 13 dos 16 municípios do estado foram mergulhados num caos prolongado. Sem energia, serviços essenciais como comunicações e abastecimento de água ficaram comprometidos. Hospitais passaram a funcionar à base de geradores. Do ponto de vista da racionalidade, pode parecer inacreditável, mas estima-se que o fornecimento só será plenamente restabelecido dentro de dez dias.

Enquanto isso, cidadãos que trabalham e pagam seus impostos em dia são submetidos a situações insólitas, como lavar louça na calçada do reservatório local; buscar água com baldes diretamente nos rios; recorrer ao aeroporto ou a shoppings para carregar celulares; disputar preciosos galões de água mineral e sacos de gelo com uma multidão; e enfrentar longas filas nos postos de combustíveis que ainda permanecem abertos.

De acordo com as informações oficiais, o incêndio na subestação provocou o desligamento automático das linhas de transmissão Laranjal/Macapá e das hidrelétricas Coaracy Nunes e Ferreira Gomes. Na quinta-feira, o ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, esteve em Macapá — onde foi decretado estado de calamidade — para gerenciar a crise. Disse que o problema está sendo solucionado — ontem a energia foi retomada em alguns pontos —, mas que o sistema como um todo só deverá voltar ao normal em dez dias.

O apagão, que afeta cerca de 90% da população de 861 mil pessoas, foi aparentemente provocado por um raio que atingiu um dos transformadores da subestação de Macapá, a única do estado. O equipamento reserva, que poderia ser usado, está em manutenção desde dezembro.

 “Trata-se de um absurdo completo”, afirma o professor de planejamento energético da Coppe/UFRJ Luiz Pinguelli Rosa. “Tem que haver redundância. Não pode o estado inteiro ficar pendurado numa única subestação.” Embora a responsabilidade maior seja do estado, fica evidente para ele a falta de supervisão do setor pelo Ministério das Minas e Energia.

Não se pode admitir que quase todos os municípios de um estado mergulhem na escuridão sem perspectivas de uma solução num tempo razoável. Os governos estadual e federal precisam dar uma resposta às falhas que resultaram nesse cenário de caos — a população não tem nem sequer água para beber. É imprescindível criar redundâncias para suprir o fornecimento de energia em casos semelhantes e cuidar da manutenção dos equipamentos reservas. Nada garante que um raio não possa cair duas vezes no mesmo lugar.

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