terça-feira, 1 de dezembro de 2020

Míriam Leitão - Recomeço ou nova direção

- O Globo

Os prefeitos eleitos terão que começar a trabalhar imediatamente, mesmo antes da posse. Há desafios enormes. A boa notícia é que a situação das contas públicas das cidades está melhor do que se imagina. Houve muita transferências do governo federal neste ano, as cidades são menos endividadas do que os estados e há prefeitura com dinheiro em caixa. O erro será usar isso para aumentar gastos que não sejam os destinados às muitas urgências do momento. Na educação, serão dois anos em um, na saúde há a pressão da pandemia, na arrecadação, o imposto sobre serviços não vai se recuperar facilmente.

Eleição sempre renova as esperanças de que os problemas sejam resolvidos mais facilmente pelo gestor reeleito por causa de uma administração bem avaliada ou pela eleição de um novo gestor que resgate a cidade de erros passados. Aqui na coluna conversamos com alguns economistas que falam sobre a situação municipal. Giovanna Victer é presidente do Fórum Nacional de Secretários Municipais de Fazenda, e ela mesma é secretária de Niterói, onde o prefeito Rodrigo Neves, do PDT, elegeu seu sucessor Axel Grael no primeiro turno.

— Houve um aumento significativo do volume de transferências da União para os municípios. O critério foi o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e sem relação com a pandemia. Então houve cidade que teve mais receita do que gasto com saúde e o contrário também aconteceu — diz.

Normalmente, cidades menores ou de regiões mais pobres têm um repasse relativamente maior pelo critério de distribuição. Houve também outra forma de socorro aos estados e municípios, que em alguns casos cobriu a queda de arrecadação.

O ex-secretário do Tesouro Mansueto Almeida também diz que essas transferências feitas via FPM, ou o socorro para a pandemia, fizeram com que em muitas cidades o ano esteja fechando bem, e com dinheiro em caixa para investir em 2021. Além disso, houve as remessas em 2019 e começo de 2020, por causa da cessão onerosa.

No ano passado, os 4.958 municípios acompanhados pelo Tesouro fecharam com superávit de R$ 32 bilhões. Mas em algumas cidades os gastos precisam ser ajustados. O Rio de Janeiro tem uma despesa bruta alta de 79% da Receita Corrente Líquida. E é também o município com o maior serviço da dívida, que chega quase a 9% da Receita Corrente Líquida. As despesas com pessoal saíram de 48% do gasto total em 2016 para 60% em 2019. Há situações bem diferentes entre as cidades.

— Haverá município pequeno em que o novo prefeito vai encontrar dinheiro em caixa. Minha preocupação é que esses prefeitos avancem sobre esses recursos e contratem despesas permanentes — diz Giovanna.

O problema é que esse caixa é “fictício”, como ela diz, porque vem dessas transferências especiais. Mansueto também alerta que os recursos da cessão onerosa não vão se repetir.

O dinheiro que sustenta as grandes cidades é altamente dependente da atividade econômica, como por exemplo o que vem do Imposto sobre Serviços. O setor tem segmentos que não voltaram à normalidade. E dificilmente conseguirão no curto prazo. E há muito a fazer no curto prazo:

— Precisamos retomar as políticas habitacionais, porque isso cria emprego e são muitos anos sem ter política de habitação. Tem impacto social importante. Vamos ter urgências sociais, como a de trazer as crianças de volta às escolas, há muitas abandonando as aulas, principalmente no Fundamental II. Precisamos de logística para a vacinação. E temos o desafio da retomada econômica que depende das políticas nacionais — explica Giovanna Victer.

Ela acha que a prefeitura do Rio não está quebrada, ainda que tenha despesa corrente maior do que a receita. Giovanna acredita que o Rio poderá aumentar a arrecadação se suspender subsídios e se reorganizar a prefeitura com um freio de arrumação.

No resto do país, Mansueto lembra que 684 municípios têm nota A de crédito e 809 têm nota B. Podem pegar empréstimo com o aval do Tesouro. Mesmo assim, prefeitos preferem procurar linhas da Caixa que são muito mais caras, mas mais rápidas. O Rio, por exemplo, pegou cinco empréstimos em 2017 e 2018, quatro na Caixa e um no Santander. Todos sem garantia da União. Mas em geral os municípios estão em situação melhor do que os estados e têm espaço para recomeçar com boa gestão.

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