sexta-feira, 10 de abril de 2020

Merval Pereira - Combate virtual

- O Globo

Ministros e políticos montaram seus próprios esquemas digitais para se contraporem aos bolsonaristas

“Quem com ferro fere, com ferro será ferido”, uma citação bíblica tornada ditado popular, tão ao gosto do presidente Bolsonaro, pode explicar o que está acontecendo na disputa pelas redes sociais, fundamentais na estratégia política do presidente Bolsonaro, ou melhor, de seu filho 02, o vereador especialista digital Carlos Bolsonaro.

De tanto apanharem nas redes sociais da milícia digital dos Bolsonaro, comandados pelo “gabinete do ódio” que funciona dentro do Palácio do Planalto, ministros e políticos em geral resolveram montar seus próprios esquemas digitais para se contraporem à ação dos bolsonaristas.

Quando querem “fritar” algum ministro, eles começam pelas redes sociais, geralmente comandados pelo guru Olavo de Carvalho. Foi assim que caíram os ministros Gustavo Bebianno e Santos Cruz, que costuma chamar de “gangue digital” os seguidores de Bolsonaro que atuam nas redes sociais como verdadeiras milícias.

A ponto de terem criado mensagens fakes onde o então ministro criticava o presidente no WhattsApp. Santos Cruz provou que era uma montagem, mas já era tarde. O falecido Bebianno também caiu, depois de uma fritura intensa, por causa de uma discussão no WhattsApp.

O ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, depois de quase ter sido demitido pelo presidente no início da semana, ganhou cerca 100 mil seguidores no Twitter, Facebook e Instagram em um só dia, segundo dados da Bites Consultoria especializada nesse acompanhamento digital.

Bernardo Mello Franco - Freios ao capitão

- O Globo

Bolsonaro passou a sofrer derrotas em série no STF, cada vez mais acionado para conter seus desatinos. Fora dos autos, os ministros também têm avisado que ele não pode tudo

O isolamento político de Jair Bolsonaro não se reflete apenas em derrotas no Congresso. O presidente também tem apanhado no Supremo, cada vez mais acionado para conter seus desatinos na pandemia.

O capitão ameaçava derrubar medidas de governadores e prefeitos para restringir a circulação de pessoas. Antes que ele assinasse o decreto, o Supremo tirou a tinta da caneta. Na quarta-feira, o ministro Alexandre de Moraes proibiu Bolsonaro de atropelar estados e municípios. Ele ainda anotou que as divergências entre autoridades federais têm causado “insegurança, intranquilidade e justificado receio” na sociedade.

Não foi a primeira derrota relevante do Planalto. Na semana passada, o ministro Luís Roberto Barroso proibiu a Secom de torrar dinheiro público numa propaganda com o slogan “O Brasil não pode parar”. Ele escreveu que a campanha era “desinformativa”; não obedecia ao interesse público, deseducava a população e poderia favorecer a propagação do vírus.

Fora dos autos, o Supremo também tem dado recados de que o governo não pode tudo. O ministro Dias Toffoli, que às vezes parece um auxiliar de Bolsonaro, fez questão de declarar apoio ao titular da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. O ministro Gilmar Mendes foi mais direto. “A Constituição não permite que o presidente adote políticas genocidas”, afirmou.

Flávia Oliveira - Crise tem cor e gênero

- O Globo

Negros e mulheres enfrentam as maiores taxas de desemprego

Na derradeira aglomeração, antes de o coronavírus se impor como ameaça Brasil afora, estive com Nikole Hannah-Jones, jornalista negra que coordenou o Projeto 1619 do “New York Times”. A convite do IMS-SP, participamos no Festival Serrote da mesa em que ela relatou a experiência de contar a História dos EUA, a partir da chegada do primeiro navio com africanos escravizados, há 401 anos, em vez da versão que parte da Declaração de Independência, de 1776. No Brasil, o historiador Luiz Felipe de Alencastro identificou o primeiro desembarque de cativos em 1550, em Pernambuco; com o tráfico negreiro se estendendo até os anos 1850. Nos dois países, séculos de escravidão legaram aos afrodescendentes condições precárias de trabalho, habitação, níveis de renda e bem-estar. Era assim pré-pandemia; pós, assim será.

A última pergunta a Nikole foi sobre os efeitos na população negra americana da temporada de enfrentamento à Covid-19. “Não tenho ideia de qual será o impacto total, mas é algo previsível. Seremos os mais afetados, porque não há rede de proteção para quem não consegue ir ao trabalho; não tem creche, quando escolas fecham; perdem receitas, quando têm de cuidar de um ente amado. Ficará exposto como negros e negras, que mal estão se segurando no momento, serão empurrados abismo abaixo. As consequências vão ser mais devastadoras para eles”, sentenciou.

Três semanas depois, a primeira leva de estatísticas sobre a pandemia nos EUA, segundo o “NYT”, mostrou que no estado da Louisiana sete em cada dez mortos pela Covid-19 eram negros. Em Chicago (Illinois), afro-americanos compõem um terço da população, mas correspondiam a 72% dos óbitos. É desfecho que espreita o Brasil. Com o agravante de uma população muito mais numerosa, perto de 56% do total de habitantes.

Míriam Leitão - A economia no conflito político

- O Globo

Ministério da Economia e Câmara dos Deputados se desentendem até na matemática, em ambiente político envenenado

A guerra é política, mas as armas lançadas foram números. Uma divergência de mais de R$ 80 bilhões. A Câmara dos Deputados e o Ministério da Economia discordam sobre qual é o custo do programa de ajuda aos estados e municípios que está para ser votado na segunda-feira. O governo chama de “pauta bomba”, Rodrigo Maia nega e lembra, com razão, sua adesão à pauta fiscalista. Ele acha que há objetivo político de atacar o centro, enfraquecendo os governadores do Sudeste, principalmente.

O ambiente está envenenado faz tempo. A crise do coronavírus não permitiu a superação. Nem poderia, porque o próprio presidente Jair Bolsonaro passa o tempo todo atirando contra os governadores. Nunca soube liderar a federação. Prefere chefiar uma facção que tem cada vez menos apoio.

A origem do debate é o que fazer com o Plano Mansueto. Ele foi pensado como um projeto de ajuste dos estados com maior desequilíbrio fiscal, mas agora a situação é totalmente outra. Ele não inclui todos os estados, apenas os que estavam em pior situação, e traz uma lógica do ajuste fiscal, mas este é um momento de expansão de gastos para salvar vidas. O projeto deveria já ter sido votado há muito tempo e ficou parado no Congresso. Agora o momento é de criar estradas para a ida de recursos federais para as unidades da federação.

O projeto do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) propõe que sejam suspensas as dívidas dos entes federados com a Caixa e o BNDES. Isso custa R$ 9 bilhões. Propõe que o governo federal recomponha três meses de ICMS, que está caindo em torno de 30%. O custo seria de R$ 36 bi. Que a União compense também as perdas do ISS, que daria R$ 5 bi. Além disso, e aí veio a confusão, permite que estados elevem seu endividamento em até 8% da Receita Corrente Líquida, com aval do Tesouro. O custo para o Tesouro seria de R$ 50 bilhões caso todos dessem calote na dívida. Tudo somado daria R$ 100 bi, nessa hipótese extrema dos empréstimos não serem pagos.

Luiz Carlos Azedo - A cadeira e o homem

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“Ao estimular as pessoas a saírem do isolamento e voltarem ao trabalho, Bolsonaro não leva em conta o risco de colapso do sistema de saúde”

Dizem que a cadeira é uma invenção dos antigos egípcios, que adicionaram um encosto aos assentos. Faraós reinavam em cadeiras de madeira dourada, adornadas com ébano e marfim. Daí em diante, o trono seria a representação da ambição e do poder dos monarcas. Somente com a Revolução Industrial e o capitalismo passaram a ser produzidas em série, como as cadeiras Thonet, famosas pelo curvamento das madeiras, que foram as primeiras numeradas e vendidas por catálogos. No começo do século passado, o ferro passou a ser utilizado para reforçar as cadeiras, como no caso da Hil House de Charles R. Mackintosh, em 1928. Logo surgiram peças mais arrojadas, como a cadeira Wassily, de Marcel Breuer, inspirada nos tubos das bicicletas.

Com o modernismo, as escolas de Bauhaus e Milão passaram a dar o tom na produção do mobiliário mais arrojado. As cadeiras do Palácio da Alvorada, por exemplo, são peças autênticas do modernismo brasileiro, especialmente desenhadas a pedido do arquiteto Oscar Niemeyer. Foram recuperadas pouco antes de Jair Bolsonaro assumir o governo, por uma comissão cuja curadoria ficou a cargo da própria designer dos sofás, poltronas e cadeiras. Anna Maria Niemeyer cuidou pessoalmente da restauração e do posicionamento de móveis, quadros, tapetes, estátuas e outras obras de arte do acervo, que retornaram aos locais que ocupavam no projeto de interiores original, a partir de rigorosa pesquisa. A primeira coisa que o presidente Jair Bolsonaro fez ao chegar ao Alvorada foi mandar substituir as cadeiras vermelhas por cadeiras azuis da grande mesa do Salão de Estado, com 18 lugares.

Ricardo Noblat - Quem pagará a conta da desgraça do coronavírus

Blog do Noblat | Veja

À espera de semanas duríssimas

Jair Messias Bolsonaro, o comandante em chefe da luta contra o coronavírus, foi ontem tomar refrigerante em uma panificadora da Asa Norte, em Brasília. Juntou gente, nem tanto porque metade dos habitantes da cidade respeita o confinamento decretado pelo governador Ibaneis Rocha (PMDB), do Distrito Federal.

Apertou a mão dos que o cumprimentaram e se disseram seus devotos. Posou com alguns deles para fotos. Mas não demorou muito por ali porque, de repente, começou a ouvir o tilintar de panelas e os gritos de “fora, Bolsonaro”. Saiu de cara fechada. Em 2018, a Asa Norte lhe deu 51% dos seus votos no segundo turno.

O presidente, à noite, fez sua tradicional live das quintas-feiras no Facebook. É o momento da semana onde sente-se mais à vontade. Não tem jornalistas à vista para incomodá-lo com perguntas embaraçosas. Fala o que quer e ninguém o contesta. Seus acompanhantes de ocasião sorriem de todas as suas tiradas.

Embora com ar sério, estava particularmente debochado. Sem citá-lo, debochou do ministro Luiz Henrique Mandetta, da Saúde, que costuma repetir que médico não abandona paciente. Quer dizer com isso que em meio a uma pandemia, por mais que seja hostilizado por Bolsonaro, não pedirá demissão.

A pretexto de defender mais uma vez o uso da cloroquina contra o coronavírus, Bolsonaro disse que “médico não abandona paciente, mas paciente troca de médico”. Touché! Mandetta preferiu responder à gravação de uma conversa onde o ministro Onyx Lorenzoni e o ex-ministro Osmar Terra defendem sua demissão.

Dora Kramer - A engenharia do Jair

- Revista Veja

O presidente causa um mal enorme ao país ao se posicionar como fator de instabilidade

É ilusão do presidente acreditar que o vírus que atormenta o mundo não o atingiu. Fez mais que isso, matou uma chance quase certa de reeleição e, dependendo da evolução de seus efeitos, poderá eliminar também as condições para a conclusão do mandato. O presidente imagina-se livre da gripezinha enquanto agoniza de um mal bem maior: a erosão do próprio poder. Principalmente, mas não só, em decorrência do posicionamento dele diante das urgências da pandemia.

Com a crise sanitária deu-se por completada a obra de desconstrução da força política, da influência social e da autoridade moral da Presidência da República, cujo engenheiro atende pelo nome de Jair Bolsonaro. Está certo quando enxerga uma onda gigantesca de rejeição a ele, mas demonstra não compreender a razão quando delira imaginando que isso ocorra por seus méritos, pois tal reação acontece devido à terra arrasada que semeou em torno de si neste um ano e poucos meses de atuação desgovernada.

A situação talvez não estivesse no estágio de degradação a que chegou se Bolsonaro não tivesse dizimado seu capital político e explodido pontes de convivência institucional com coisas inúteis. Gastou patrimônio antes do tempo e, hoje, em plena crise de saúde pública, quando mais precisaria de âncoras de sustentação, está zerado: isolado, sem diálogo, desmoralizado, desautorizado, desacreditado.

Bruno Boghossian – O fiasco dos profetas da negação

- Folha de S. Paulo

Previsões furadas, sem base científica, ameaçam levar país por caminho desastroso

No dia 22 de março, em plena campanha contra as autoridades de saúde, Jair Bolsonaro arriscou um palpite. Em entrevista na TV, ele disse que as mortes pelo novo coronavírus ficariam abaixo das 796 vítimas da gripe H1N1 no ano passado.

"A previsão é não chegar a essa quantidade de óbitos no tocante ao coronavírus", pressentiu, pedindo o fim das medidas de isolamento aplicadas para frear as contaminações.

O presidente não citou a origem dessa tentativa de adivinhação, mas foram necessárias menos de três semanas para desmoralizá-lo. Os mortos pela Covid-19 no Brasil já se aproximam de mil, e a curva de contaminações ainda aponta para cima.

Se não quisesse passar vergonha, bastava a Bolsonaro ter ouvido médicos e cientistas sérios. Ele preferiu liderar um time de profetas da negação, que conduzem um país inteiro por caminhos desastrosos.

Hélio Schwartsman - Covid-19, enfim uma boa notícia

- Folha de S. Paulo

Dados mostram que letalidade pode ser bem menor do que se apontava

Enfim uma boa notícia. Saíram os primeiros números do estudo epidemiológico feito por amostragem aleatória na cidade de Heinsberg, na Alemanha, e eles sugerem que o vírus infectou muito mais gente do que indicavam os registros oficiais, o que também significa que a moléstia é muito menos letal do que apontava a contabilidade.

Os dados divulgados nesta quinta-feira (9), relativos a uma amostra representativa da população de Gangelt, um distrito rural de Heinsberg, mostram que 15% dos residentes entraram em contato com o vírus e desenvolveram anticorpos, o que em tese os deixa imunes à moléstia pelo menos por alguns meses.

Com esse novo denominador, a letalidade da Covid-19 no distrito, um dos mais duramente atingidos do país, foi de 0,37% —menos de um quinto da letalidade nacional calculada a partir dos casos testados. E vale notar que a letalidade alemã já era uma das menores do mundo.

Ruy Castro* - Os bolsonaros da China

- Folha de S. Paulo

Um filme de 1936 antecipa a repressão sofrida pelo médico chinês que alertou para a pandemia

Na França de 1860, um médico vai sair para fazer um parto. Limpa a caspa das lapelas com as mãos, pega os instrumentos e, ao jogá-los na maleta, um deles cai ao chão. O médico o recolhe e o atira na maleta. Sua paciente morrerá ao dar à luz, vítima não da "febre do parto", como se dizia, mas dos germes provocados pela falta de higiene no procedimento. Os médicos da época sequer lavavam as mãos para trabalhar.

Assim começa o filme "A História de Louis Pasteur", de 1936, do subestimado William Dieterle, que rendeu a Paul Muni o Oscar pela interpretação de Pasteur. Embora fosse um filme da Warner, especializada em gângsteres, as armas em cena eram os microscópios, não as metralhadoras. A história mostra Pasteur sofrendo dura oposição dos médicos, para quem sua teoria dos micróbios como causa das doenças era um delírio. Eles fazem o governo proibi-lo de pesquisar e só vão lhe dar razão 20 anos depois, quando a França já estava quase dizimada.

Reinaldo Azevedo – O mito da Caserna

- Folha de S. Paulo

Correção de caminho durante a pandemia será feita a um custo imenso

O ministro Luiz Henrique Mandetta, da Saúde, citou o Mito da Caverna no seu Dia do Fico Mais ou Menos (7). Platão é biscoito fino demais para a patuscada em curso. Se a gente quer chegar ao mundo inteligível, precisa pensar o desastre a que está nos conduzindo o Mito da Caserna. Não é um jogo de palavras, mas um erro de caminho. A correção, se vier, será feita a um custo imenso.

"Tenho certeza de que a grande maioria dos brasileiros quer voltar a trabalhar. Essa sempre foi minha orientação a todos os ministros, observadas as normas do Ministério da Saúde." É trecho do pronunciamento desta quarta do presidente Jair Bolsonaro. Uma coisa (voltar ao trabalho) exclui a outra ('normas' do ministério). É esperteza rasa.

É só um modo de tentar se distanciar da montanha de cadáveres. Aproveitou a fala para desfraldar a bandeira da cloroquina e assumir a paternidade das medidas compensatórias em curso. Nem horizonte nem direção. Nos estados, os leitos de UTI vão se apinhando, e a Covid-19 ainda mal visitou os pobres. Não obstante, os governadores são fustigados por milícias verdadeiramente criminosas nas redes sociais.

Como se chegou a esse ponto? Ora, Bolsonaro venceu porque teve mais votos. Fez-se um candidato viável com seu antipetismo estridente, em aliança informal com a Lava Jato, e dois trunfos ditos infalíveis: Paulo Guedes, a cloroquina do mundo das finanças, e o Partido Verde-Oliva.

Vinicius Torres Freire – Como o coronavírus parou o país

- Folha de S. Paulo

Coronavírus para o país, governo não tem plano racional de saída

O valor das compras com cartão, débito ou crédito, caiu 44% na semana passada, na comparação com dias equivalentes de fevereiro. Têm despiorado desde a primeira semana do isolamento: sai do buraco profundo do inferno para um degrau acima. Nesta semana, até quarta, caíam 35,5%, talvez com a ajuda da Páscoa. Os dados são da Cielo, para o varejo.

O valor das vendas com cartões equivale a cerca de 40% do que nas contas nacionais, no PIB, se chama de “consumo das famílias”. Equivale a uns 25% do PIB.

É uma catástrofe.

O consumo de energia elétrica caiu 8% de 18 de março a 3 de abril, na comparação com os dias de 1º a 17 de março. Na sexta-feira, 3 de abril, caiu 14% (na comparação com a média das sextas-feiras de março até dia 17, pré-isolamento). Os dados, os mais recentes, são da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica.

Em alguns setores, a devastação é quase total. No varejo de vestuário, a queda nas vendas está em quase 83% nesta semana (ainda na comparação com fevereiro). Nos restaurantes, de 72%. Nos serviços, em geral, 73,3%. Móveis, eletrodomésticos e lojas de departamento, 58,4%.

O varejo de bens não-duráveis, que inclui mercados e supermercados, sobe nesta semana, 4,7% (Páscoa?), mas caía 7,8% na semana passada.

Note-se que se trata de médias. As lojas de vestuário da rua estão sem vender nada, assim como o pessoal de serviços pessoais (salões de beleza, manicures, barbeiros) está sem trabalho. Muitos restaurantes estão fechados. Comércio e serviços demitem em massa. As medidas do governo, crédito para a folha e suplementação de salário não bastam. Não há como pagar salários um pouquinho maiores e outras contas, como aluguel.

Graciliano Ramos criou 'manual' do político irônico ao renunciar a prefeitura 90 anos atrás

Aquele que depois seria um renomado escritor foi prefeito da alagoana Palmeira dos Índios por dois anos

David Lucena | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Com a política tradicional mal avaliada por grande parcela da sociedade, caciques partidários buscam outsiders, de preferência com um discurso de exaltação da ética e do combate à corrupção, para disputar as eleições às prefeituras.

O cenário parece descrever as articulações para a última eleição e a deste ano, mas a estratégia é centenária na política brasileira. Foi assim que, há quase um século, um dos maiores escritores do país chegou à chefia do Executivo de um pequeno município alagoano.

O mandato que marcou o início da vida política de Graciliano Ramos (1892-1953) chegou ao fim há 90 anos. Em 10 de abril de 1930, aquele jornalista —filho de comerciante e depois autor de "Caetés" (1933) e outras referências da literatura— renunciava ao cargo de prefeito de Palmeira dos Índios.

Durante pouco mais de dois anos, deixou como legado dois relatórios de gestão publicados no Diário Oficial de Alagoas, que, fugindo à escrita burocrática e mais se aproximando de sua literatura social, podem ser uma espécie de manual político irônico para os prefeitos dos dias de hoje.

Os relatórios mostram as atitudes do prefeito ao assumir um município sem verba, com quadro de servidores inchado e corrupção sistêmica. Ao menos duas lições são louvadas por gestores que pregam a "nova política": combater o aparelhamento estatal e aumentar a produtividade.

"Dos funcionários que encontrei [...] restam poucos: saíram os que faziam política e os que não faziam coisa nenhuma", escreveu Graciliano, ao fim do primeiro ano de mandato, em relatório publicado em 24 de janeiro de 1929.

O enfrentamento do aparelhamento da máquina pública foi uma das primeiras medidas prometidas pela gestão Jair Bolsonaro em 2019. Então ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni falou, logo após assumir, que era preciso "fazer a despetização do governo".

Eliane Cantanhêde - Cloroquina sim ou não?

- O Estado de S.Paulo

Testes são importantes, mas o fundamental é isolamento, isolamento, isolamento

Enquanto o mundo vai chegando a cem mil mortos (cem mil!), a cloroquina vira o grande assunto nacional, dividindo opiniões de autoridades, médicos, estudiosos, pacientes e qualquer um que esteja acompanhando as notícias sobre a pandemia ao redor do mundo, sobretudo no Brasil: a dona Maria, o seu José, quem faz isolamento, quem não faz. Virou uma febre.

Então, aos fatos: desde que China e Estados Unidos passaram a falar publicamente no uso de cloroquina contra o coronavírus, isso entrou na pauta internacional e animou o Brasil. A primeira reação foi uma corrida às farmácias, esvaziando as prateleiras para quem tem malária, lúpus ou artrite e realmente precisa do medicamento. Até por isso a Anvisa decretou a exigência de receita médica. A compra ficou restrita, mas o debate disparou e cada um passou a ter suas próprias certezas. Um festival de achismos.

A cloroquina passou a ser associada a outros remédios para tentar salvar vidas de pacientes de covid-19 em estado crítico, depois para pessoas internadas e está perto de virar remedinho para gripezinhas e resfriadinhos, qualquer um toma. Não há, porém, trabalho científico e documento de órgão oficial de saúde atestando que ela efetivamente cura no caso de coronavírus. Como disse uma epidemiologista na TV, há muita suposição, nenhuma comprovação científica.

Simon Schwartzman - O século chinês

- O Estado de S.Paulo

Sairemos desta tragédia mais pobres e sofridos, mas, quem sabe, um pouco mais sábios...

Indústria Americana, o documentário produzido pela produtora de Michelle e Barack Obama que ganhou o Oscar da categoria este ano e pode ser visto na Netflix, conta a história tragicômica de um milionário chinês que decide transformar uma planta abandonada da General Motors nos Estados Unidos numa moderna fábrica de vidros de automóveis, com operários americanos trabalhando sob as ordens de gerentes chineses. Os chineses esforçam-se para entender a cultura individualista e a falta de disciplina dos americanos, levam americanos para a China para verem como uma fábrica deve funcionar e acabam trocando a maioria dos americanos por robôs, para que a fábrica finalmente possa dar lucro.

Vendo o filme, fica mais fácil entender o sucesso dos chineses em controlar a epidemia do coronavírus em Wuhan com um mínimo de mortes e impedindo que se alastrasse por sua imensa população, e a dificuldade dos americanos e europeus em fazer o mesmo. A explicação que geralmente se ouve é que a China é um Estado autoritário, com poderes para controlar sua população que seriam inimagináveis numa democracia. Há rumores de que não estão contando toda a história. Pode ser. Mas o a fato é que conseguiram estancar a hemorragia. Além da força bruta, outros dois fatores, a forte coesão social e o uso intensivo e competente de tecnologias avançadas, parecem ter sido muito mais importantes.

“Coesão social” refere-se ao grau em que as pessoas se sentem parte de uma comunidade e obedecem às normas de comportamento de seus grupos. Todos concordam que é uma coisa boa, mas discordam sobre quanto. No documentário, os americanos olham espantados como os operários chineses marcham sincronizados e gritam palavras de ordem, e como, numa festa da fábrica, as crianças dançam com precisão geométrica em louvor à eficiência e à produtividade, lembrando as gigantescas manifestações coreografadas na Coreia do Norte em homenagem ao Grande Líder. Os chineses trabalham muito mais horas por dia que os americanos, ganham muito menos e são muito mais produtivos.

Vendo isso, é difícil separar o que é coesão social do que é totalitarismo, mas outros países que também estão conseguindo controlar a epidemia são a Coreia do Sul, Cingapura, Taiwan e Japão, regimes democráticos com culturas semelhantes à chinesa. É a coesão social, mais do que o regime político, que os diferencia dos países ocidentais.

Ignácio de Loyola Brandão - Louco da caneta

- O Estado de S.Paulo

Ah! Figura nova, veio do longínquo 2020, hoje muito popular nos manicômios

Em um hospício do futuro, dois enfermeiros conversam:

“Quem é aquele enfezadinho, naquele cercadinho, que anda com uma grossa caneta na mão, dizendo te demito?”.

“Ah! Figura nova, veio do longínquo 2020, hoje muito popular nos manicômios. Antigamente existia o Napoleão. Agora é o pô, sou presidente. Com a caneta, ameaça demitir todos os psiquiatras, visitantes e residentes.”

Em casa, desafio Marcia, minha mulher:

“Sem olhar no celular diga que dia é hoje?”.

Marcia pensa, arrisca:

“Sexta-feira”.

“Como acertou?”

“Semana passada, fiz compras para uma semana e era sexta-feira. Então? E amanhã então é sábado, maravilha.”

“Maravilha por quê.”

“Não teremos o que fazer.”

“Mas faz 15 dias que não temos o que fazer, o que fazemos é por nossa conta, você dá retoques em um projeto, eu esboço um texto, você vê um filme, eu mergulho em A Balada do Café Triste, de Carson McCullers, além do lindo livro de Marina Colasanti, que acabou de sair, Mais Longa Vida. Sem esquecer Wisnik, Dentro do Nevoeiro. Belo título para os dias de hoje.

Wisnik, vejam só, décadas atrás, eu um insensato, tive um arranca-rabo injusto com ele, que até hoje me envergonha. Não ter o que fazer? Loucura. É só querer que tem. Na verdade, temos feito muito, mas achamos que não estamos “fazendo” nada. Põe a mesa, tira a mesa. Faxina no quarto, no banheiro. Mais tarde na sala e no quarto. Leva o lixo para baixo. Você acaba de arrumar cozinha, já tem outra à espera. E as roupas para lavar. Passar? Para quê? Não vamos sair. Amassado é moda, assim como jovens andam rasgados. E minha mãe que não me deixava sair de casa, aos 20 anos, se o vinco da calça não estivesse perfeito? Hoje, ao menos, não têm mais meias para cerzir. Falando em meias, e o comovente gesto de Liliana Aufiero, convocando todos os funcionários da Lupo e adaptando máquinas para fazer máscaras e doar? Eta Araraquara! E os Trajanos, do Magazine Luiza, dizendo: “Temos dinheiro para aguentar a crise”, enquanto muitos choram e mamam? Eta! E tira o pó, e tira o pó, e faz e repete, faz e repete, faz e repete, bate uma vitamina, bate um bolo, faz um mexidinho, e lava e desinfeta, lava e desinfeta. Maçanetas, trincos, botões de elevador, tudo que é tocado pela mão humana se torna maldito.

José de Souza Martins* - A irrupção comunitária

- Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

O governo nem sabe onde estão e quem são os que carecem de socorro, que agora se tornaram objeto de interesse só porque são ameaça aterradora ao futuro do capitalismo consumista

Mais rápidas do que outras iniciativas para contornar socialmente a disseminação e os danos da covid-19 têm sido as iniciativas comunitárias. Comunidade é um dos conceitos científicos banalizados nos últimos anos, no Brasil. Mas, o fato de que muitos grupos vicinais e empresas estejam dando às suas ações humanitárias o nome de ações de comunidade, não deve ser menosprezado.

Comunidade e sociedade são dois tipos de organização e de conduta sociais. Em meados dos anos 1950, sobretudo por influência americana, houve uma tendência no sentido de depreciar o modo comunitário de vida e valorizar o modo societário, o decorrente da urbanização, da individualização da conduta e da secularização das concepções sociais. A comunitária seria um tipo atrasado de sociabilidade.

Os estudos de comunidade, que os antropólogos americanos realizaram e difundiram na América Latina, não obstante a subjacente depreciação ideológica do comunitário, possibilitaram descobertas importantes sobre a realidade social.

Ricas e significativas concepções comunitárias sobre a reciprocidade, a ajuda mútua, o parentesco, os critérios de distância social, o saudável e o doentio, a medicina popular, a religião e a morte e até o dinheiro foram identificadas e descritas cientificamente.

Fernando Abrucio* - O conceito de público precisa ser reconstruído

- Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

A sociedade sairá da crise muito mais desconfiada do consenso neoliberal anterior, demandando mais governo e políticas públicas de qualidade

Nunca estivemos tão sós e, ao mesmo tempo, tão dependentes uns dos outros. A covid-19 nos isolou drasticamente de uma forma inédita no mundo moderno, mas também reforçou o peso da coletividade, seja para coibir o alastramento do vírus, seja para garantir a solidariedade necessária para ajudar as populações mais vulneráveis.

Esses tempos difíceis podem ser longos e, com certeza, não serão resolvidos pelas visões individualistas predominantes na economia e na política. Para sairmos dessa enorme crise será preciso reconstruir e fortalecer o conceito de público, tão vilipendiado e esquecido nos tempos mais recentes.

A reconstrução do conceito de público envolve três dimensões. A primeira tem a ver com as relações entre Estado e sociedade, mais especificamente sobre a confiança na atuação governamental. A segunda relaciona-se com as políticas públicas, em particular com aquelas que formam a base do Estado de bem-estar social. E a última delas refere-se à transformação dos valores hegemônicos, tanto em suas manifestações mais narcísicas, como em sua forma tribal e intolerante que tem crescido com as mídias sociais.

Quando surge uma grande crise, o síndico que é sempre chamado para resolver o problema chama-se Estado. Não seria diferente agora com essa enorme e imprevisível pandemia. Mas é importante que se saiba que por conta de terem sido tão desacreditados e enfraquecidos nos últimos anos, os governos estão menos preparados e capacitados para lidar com os efeitos perversos da covid-19. Essa lição é importante porque demoraremos mais para sair da atual situação, com grandes custos sociais e econômicos.

Sérgio Arouca - I Encontro de Saúde (PPS 2002)

PARTIDO POPULAR SOCIALISTA

I ENCONTRO DE SAÚDE

Brasília, 06/12/2002

COMPROMISSOS COM A SAÚDE

INTRODUÇÃO

Um espectro ronda o Brasil. O da exclusão social, com suas faces mais evidentes da miséria, violência, fome, desemprego, falta de moradia, educação insuficiente, baixos salários e falta de oportunidades para lutar pela vida

Dados do próprio governo apontam para 54 milhões de pessoas vivendo em situação precária onde a condição mínima para viver se transforma no máximo que um sistema social perverso pode oferecer.

As razões para os atuais indicadores sociais do país podem ser entendidas, mas jamais aceitas.

O sistema de saúde é apenas mais um componente desse sistema social iníquo, injusto e excludente. O papel da saúde no processo de desenvolvimento do país primou por privilegiar a recuperação da saúde da mão-de-obra empregada, não como insumo da sociedade ou mesmo como fator de capital, mas como instrumento de produção, de baixo investimento e menor risco.

Até o advento do SUS a atenção à saúde é assumida, em sua maior parte, apenas na sua função assistencial, destinada à conservação da mão-de-obra produtora, atribuindo-se ao estado a responsabilidade por essa função.

Esta observação ficava mais evidente quando comprovada pelo descaso com aqueles que se situavam fora do processo produtivo. Os velhos, os aposentados, crianças, deficientes, inválidos e incapacitados recebiam o suficiente, quando muito, para a sobrevivência, de modo a não onerar a relação custo-benefício. Por analogia: de cada um segundo sua capacidade, a cada um de acordo com sua produção. Portanto, dentro desta lógica capitalista, crianças e velhos que nada produzem pouco devem receber.

Todos os programas para estas categorias eram considerados como assistenciais; benesses e não direitos.

A Constituição de 88, ao criar o Sistema Único de Saúde - o SUS, e consagrar seus princípios de universalidade, equidade, integralidade, descentralização e hierarquização dos serviços e de participação social, veio trazer um sopro de vida e de esperança às necessidades de saúde da população. Entretanto o SUS não conseguiu acabar com as exclusões. Se logrou melhorar as condições para algumas categorias, para outras, como os adolescentes, a população adulta masculina e a classe média, de forma geral, não se pode dizer que teve muito sucesso.

Para uma parcela da população, os 34 milhões que dispõem de planos de saúde, a utilização de serviços do SUS quando dos atendimentos de emergência e de procedimentos de alto custo ou complexidade, acontece sem o devido ressarcimento, o que não contribui para melhorar a administração do sistema. Aproximadamente 20 milhões de pessoas, componentes da classe média, não se sentem incluídas no sistema público de saúde nem participam de planos de saúde.

Todo este contingente, excluído do SUS, deve ser objeto de ações específicas e de saúde pública e receber a atenção do Estado pois a ele contribui com seus impostos e produção.

Não resta dúvida que nestes catorze anos de SUS muito já foi feito, mas resta ainda um longo caminho a percorrer. É urgente que uma nova concepção, que sirva para revolucionar aos vigentes e exauridos modelos de atenção e de gestão, seja colocada em prática, baseada não no conceito de doença mas de saúde. É urgente que o enfoque de Promoção da Saúde seja acrescentado às políticas públicas, no mesmo nível que os de prevenção e tratamento de doenças.

Os recursos para o setor saúde são escassos perante tanto a magnitude das necessidades das comunidades como das demandas expressas, reprimidas e latentes da população. Sem contar com a participação conjunta, solidária e responsável dessa mesma população jamais estas necessidades e demandas serão minimamente satisfeitas.

Nunca fez tanto sentido a célebre frase de Marx: "Os filósofos apenas interpretaram o mundo. A tarefa real consiste em modificá-lo" Os participantes do I Encontro de Saúde do Partido Popular Socialista acreditam que este é o momento de propor e realizar as mudanças e reafirmam sua certeza que a saúde é, no desenvolvimento social, o recurso que cada pessoa dispõe para viver, produzir, participar, conhecer e reger sua existência.

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

1 - Estabelecer que a Saúde é parte da Reforma Democrática do Estado e deve ser compreendida como mudança de cultura de gestão e não apenas como descentralização. É uma forma de superar a fragmentação intrasetorial e a compartimentalização entre as várias áreas de governo, promovendo assim uma ação intersetorial;

2 - Garantir a defesa intransigente do SUS como um sistema público de saúde conquistado pela sociedade brasileira para atender ao texto constitucional que reza ser a Saúde um Direito do Cidadão e um Dever do Estado;

3 - Implementar os princípios básicos do SUS: equidade, universalização, integralidade das ações, descentralização e controle social;

4 - Considerar que Saúde é componente e indicador de nível de vida e de desenvolvimento humano e, portanto, está envolvida em questões relacionadas a renda, moradia, educação, alimentação, lazer, meio ambiente e cultura. As questões de saúde devem ser enfrentadas como ações intersetoriais e multidisciplinares. Saúde não é ação para um Ministério isolado, mas sim para o Governo, como um todo;

5 - Reduzir os desníveis regionais da mortalidade infantil e da morbimortalidade por agravos e condições específicas de maior relevância na saúde das pessoas, como a desnutrição, doenças de veiculação hídrica, infecções respiratórias, tuberculose, acidentes e violências, hipertensão arterial, diabetes, câncer, doenças infecciosas evitáveis pela imunização, doenças sexualmente transmissíveis e HIV/AIDS, aumentando a esperança e a qualidade de vida de todos os grupos sociais por meio de políticas públicas intersetoriais de saúde, saneamento, habitação, educação, trabalho, emprego e renda;

6 - Definir que a Saúde é componente fundamental na mudança do atual paradigma perverso de desenvolvimento para um novo modelo de crescimento e desenvolvimento mais humano, ambiental e economicamente sustentável;

7 - Garantir o enfoque da Promoção da Saúde em todas as políticas, planos, programas e atividades do Ministério da Saúde e do SUS, como paradigma e eixo da reforma do sistema que o PPS preconiza, envolvendo ações de saneamento, de educação, de planejamento urbano, de ações nos ambientes de trabalho e nas escolas, de medidas de prevenção e, principalmente, investindo nas atividades de informação, educação e comunicação em saúde (IEC), como instrumento de capacitação da população e das comunidades para reconhecerem e enfrentarem os riscos à saúde e participarem com os serviços de saúde na resolução dos problemas identificados;

8 - Adotar a atenção básica de saúde como eixo estruturante para a reorganização do SUS, com qualidade e resolutividade;

9 - Tornar mais eficiente os serviços de saúde que realizam a assistência aos agravos de saúde que exigem procedimentos de alta e média complexidade ou de alto custo.

10 - Entender o controle social como mecanismo democrático essencial no processo de reorganização e implementação do SUS dentro dos princípios da Reforma Sanitária.

O que a mídia pensa - Editoriais

• O radicalismo em xeque – Editorial | Veja

Se há um ensinamento que o coronavírus deixará para os políticos é este: a perda de vidas humanas não suporta irresponsabilidades nem descaso com a ciência

Entre os incontáveis — e muitas vezes devastadores — impactos da pandemia de Covid-19, o que se faz notar no âmbito da política é, paradoxalmente, positivo. Trata-se do abalo sísmico que o novo coronavírus vem provocando nos alicerces do radicalismo. O termo, que designa um movimento de ideias cujas raízes históricas se encontram na Europa da virada do século XVIII para o XIX, embute em suas características o descarte de propostas contemporizadoras na condução dos variados aspectos da vida social. A repulsa à negociação aproxima perigosamente o radicalismo do extremismo político que, em diversas oportunidades, provocou algumas das grandes tragédias da história da humanidade (nazismo, fascismo, comunismo…).

Radical, e frequentemente extremista, como se sabe, é o chamado “gabinete do ódio”, que assombra o governo de Jair Bolsonaro, tendo no presidente mesmo seu maior fiador. Com o objetivo de alimentar o confronto, e não o entendimento — marco de sua trajetória, não é de hoje —, o chefe do Executivo cria, de modo reiterado, obstáculos para o próprio governo, incluindo seus colaboradores mais competentes e equilibrados. E, para tanto, Bolsonaro não hesita em dar vez e voz a toda sorte de impropriedades (muitas delas baseadas em informações 100% falsas ou apenas parcialmente verdadeiras).

Poesia | Carlos Drummond de Andrade - Sentimento do mundo

Tenho apenas duas mãos
e o sentimento do mundo,
mas estou cheio de escravos,
minhas lembranças escorrem
e o corpo transige
na confluência do amor.
Quando me levantar, o céu
estará morto e saqueado,
eu mesmo estarei morto,
morto meu desejo, morto
o pântano sem acordes.
Os camaradas não disseram
que havia uma guerra
e era necessário
trazer fogo e alimento.
Sinto-me disperso,
anterior a fronteiras,
humildemente vos peço
que me perdoeis.
Quando os corpos passarem,
eu ficarei sozinho
desfiando a recordação
do sineiro, da viúva e do microscopista
que habitavam a barraca
e não foram encontrados
ao amanhecer
esse amanhecer
mais noite que a noite.