segunda-feira, 5 de outubro de 2020

Há 32 anos, foi promulgada a Constituição Cidadã (‘Estatuto do Homem, da Liberdade, da Democracia’)


Discurso de Ulysses Guimarães, presidente da Assembleia Nacional Constituinte, por ocasião da promulgação da constituição federal, 05 de outubro de 1988 

“Exmo. Sr. Presidente da República, José Sarney; Exmo. Sr. Presidente do Senado Federal, Humberto Lucena; Exmo. Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Rafael Mayer; Srs. membros da Mesa da Assembleia Nacional Constituinte; eminente Relator Bernardo Cabral; preclaros Chefes do Poder Legislativo de nações amigas; insignes Embaixadores, saudados no decano D. Carlo Furno; Exmos. Srs. Ministros de Estado; Exmos. Srs. Governadores de Estado; Exmos. Srs. Presidentes de Assembleias Legislativas; dignos Líderes partidários; autoridades civis, militares e religiosas, registrando o comparecimento do Cardeal D. José Freire Falcão, Arcebispo de Brasília, e de D. Luciano Mendes de Almeida, Presidente da CNBB; prestigiosos Srs. Presidentes de confederações, Sras. e Srs. Constituintes; minhas senhoras e meus senhores:

Estatuto do Homem, da Liberdade, da Democracia.

Dois de fevereiro de 1987: “Ecoam nesta sala as reivindicações das ruas. A Nação quer mudar, a Nação deve mudar, a Nação vai mudar.” São palavras constantes do discurso de posse como Presidente da Assembleia Nacional Constituinte.

Hoje, 5 de outubro de 1988, no que tange à Constituição, a Nação mudou.

A Constituição mudou na sua elaboração, mudou na definição dos poderes, mudou restaurando a Federação, mudou quando quer mudar o homem em cidadão, e só é cidadão quem ganha justo e suficiente salário, lê e escreve, mora, tem hospital e remédio, lazer quando descansa. Num país de 30.401.000 analfabetos, afrontosos 25% da população, cabe advertir: a cidadania começa com o alfabeto.

Chegamos! Esperamos a Constituição como o vigia espera a aurora. Bem-aventurados os que chegam. Não nos desencaminhamos na longa marcha, não nos desmoralizamos capitulando ante pressões aliciadoras e comprometedoras, não desertamos, não caímos no caminho. Alguns a fatalidade derrubou: Virgílio Távora, Alair Ferreira, Fábio Lucena, Antonio Farias e Norberto Schwantes. Pronunciamos seus nomes queridos com saudade e orgulho: cumpriram com o seu dever.

A Nação nos mandou executar um serviço. Nós o fizemos com amor, aplicação e sem medo. A Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa, ao admitir a reforma. Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca. Traidor da Constituição é traidor da Pátria. Conhecemos o caminho maldito: rasgar a Constituição, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o exílio, o cemitério.

A persistência da Constituição é a sobrevivência da democracia. Quando, após tantos anos de lutas e sacrifícios, promulgamos o estatuto do homem, da liberdade e da democracia, bradamos por imposição de sua honra: temos ódio à ditadura. Ódio e nojo.

Amaldiçoamos a tirania onde quer que ela desgrace homens e nações, principalmente na América Latina.

Assinalarei algumas marcas da Constituição que passará a comandar esta grande Nação.

A primeira é a coragem.

A coragem é a matéria-prima da civilização. Sem ela, o dever e as instituições perecem. Sem a coragem, as demais virtudes sucumbem na hora do perigo. Sem ela, não haveria a cruz, nem os evangelhos. A Assembleia Nacional Constituinte rompeu contra o establishment, investiu contra a inércia, desafiou tabus. Não ouviu o refrão saudosista do velho do Restelo, no genial canto de Camões.

Suportou a ira e perigosa campanha mercenária dos que se atreveram na tentativa de aviltar legisladores em guardas de suas burras abarrotadas com o ouro de seus privilégios e especulações.

Foi de audácia inovadora a arquitetura da Constituinte, recusando anteprojeto forâneo ou de elaboração interna. O enorme esforço é dimensionado pelas 61.020 emendas, além de 122 emendas populares, algumas com mais de 1 milhão de assinaturas, que foram apresentadas, publicadas, distribuídas, relatadas e votadas, no longo trajeto das subcomissões à redação final. A participação foi também pela presença, pois diariamente cerca de 10 mil postulantes franquearam, livremente, as 11 entradas do enorme complexo arquitetônico do Parlamento, na procura dos gabinetes, comissões, galeria e salões.

Fernando Gabeira - De costas para o gol

- O Globo

Há quem não veja o futuro e prefira soltar uma boiada para pisotear sonhos realizáveis

Desde o célebre livro de Stefan Zweig, e mesmo antes dele, o Brasil é reconhecido como o país do futuro. Às vezes, parece que o futuro chegou, e revistas estampam na capa um Cristo Redentor em forma de foguete subindo aos céus. Às vezes, a ideia toma a forma de um gigante que desperta e caminha com decisão. Para onde, José?

Apesar de toda essa fantasia, sinceramente não conheço um momento da história em que a possibilidade real de encontro com o futuro seja tão concreta.

A base dessa presunção é o fato de que a teoria econômica evoluiu no planeta. Não se acredita mais que o progresso é indissociável da destruição ambiental. A própria natureza deixou de ser vista como uma externalidade, um elemento passivo, um simples insumo. Agora, é vista como o centro da produção.

Nesse contexto, o Brasil não só emerge como uma potência ambiental, mas como o território onde mais se produz vida no planeta. As concepções mudam, e nada parece mais fora do lugar hoje do que a tese de que a conservação da natureza é um entrave ao progresso econômico.

Acaba de ser publicado o livro “Brasil, paraíso restaurável”, de Jorge Caldeira, Julia Marisa Sekula e Luana Schabib. Caldeira não é um idealista alheio às engrenagens reais da economia. Escreveu o livro “Mauá: empresário do Império” e também uma “História da riqueza no Brasil”, ampla e inteligentemente pesquisada.

O livro sobre o Brasil como potência ambiental é amparado em gráficos e mapas destinados a mostrar que a natureza preservada é o centro de criação do valor econômico.

Um dos capítulos do livro tem este título: “Queimar florestas é queimar dinheiro”. Nele é possível saber que os créditos de carbono no mundo hoje superam o volume das exportações brasileiras. Os créditos são dinheiro disponível para manter florestas em pé, retendo o carbono no subsolo.

Cacá Diegues - Um bom candidato

- O Globo

Tomara que Felipe Neto consiga influenciar os brasileiros

A revista “Time” elegeu Felipe Neto como uma das cem pessoas mais influentes do mundo. Tomara que eles tenham razão. Tomara que o jovem youtuber, com seus quase 40 milhões de seguidores, consiga influenciar os brasileiros com suas críticas ao populismo de direita no poder e à oposição em que “há somente o interesse pelo protagonismo”. Exemplos históricos nos mostram que só se vence um regime autoritário popular com sensata, tolerante e ampla frente política. Uma frente difícil de montar entre nós, graças ao estrelismo de líderes da oposição, que ainda vivem sob preconceitos, com a cabeça noutros tempos.

Fiel leitor das seções de cartas nos jornais que leio, encontrei outro dia essa preciosa mensagem de Nila Maria do Carmo Siqueira, no GLOBO: “Caetano Veloso só queria liberdade para cantar. Gerson King Combo, cantor de soul e funk, só queria liberdade para dançar. E por isso foram alvos da ditadura militar. Em pleno século XXI, só queremos liberdade para pensar. Quem nos perseguirá?”.

Demétrio Magnoli - Lei da vacina

- O Globo

No caso da Covid, o argumento para a obrigatoriedade legal é avassalador

A vacinação no Brasil é, teórica e parcialmente, obrigatória. O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece a obrigatoriedade para o conjunto de vacinas infantis recomendadas pelas autoridades sanitárias. Mas isso só em tese, pois inexistem penalidades definidas para os pais que violam a lei. O movimento antivacinal, ainda incipiente no país, tende a crescer sob o impulso do misticismo conspiratório bolsonarista. Há, portanto, boas razões para discutir a oportunidade de legislar penalidades efetivas. Mas, no caso específico da Covid-19, o Congresso tem o dever inadiável de impor a imunização geral compulsória.

Desde o outono do século 19, a vacinação em massa propiciou o controle de inúmeras doenças transmissíveis. A imunidade coletiva completa não exige a cobertura da totalidade da população, mas de algo em torno de 70%. Por isso, felizmente, as sociedades podem conviver com a presença de minorias significativas que não aderem aos programas de vacinação. Ironicamente, tais grupos beneficiam-se indiretamente da vacina aplicada à maioria dos cidadãos. Mas a saúde pública degrada-se, com a difusão de epidemias evitáveis, quando o universo de ignorantes, idiotas e místicos ultrapassa a marca dos 30%.

Ricardo Noblat - Bolsonaro antecipa votos do ministro que nomeou para o Supremo

- Blog do Noblat | Veja

Jamais se viu isso

Nunca antes na história deste país um presidente da República revelou com antecedência como deverá votar ministro indicado por ele para o Supremo Tribunal Federal. Pois foi o que fez, ontem à noite, Jair Bolsonaro a pretexto de defender o desembargador Kássio Nunes Marques, que não foi sequer sabatinado ainda no Senado como manda a lei. Sua nomeação depende disso.

Em sua conta no Facebook, Bolsonaro irritou-se com o comentário de um leitor insatisfeito com a escolha de Kássio: “Presidente, próxima indicação ao STF indica o Lula”. Primeiro, ele respondeu assim: “Ele tem mais de 65 anos. Estude e se informe antes de acusar as pessoas”. Em seguida, para alegria do Centrão, disse que a nomeação de Kássio “é completamente sem volta”.

Acrescentou: “Kassio é contra o aborto (votará contra a ADPF 442 caso seja pautada). É pró-armas nos limites da lei (ele é CAC). Defende a família e as pautas econômicas (quem duvida que aguarde as votações). Resumindo, ele está 100% alinhado comigo”. A ADPF 442 é a ação que tramita no Supremo pedindo a descriminalização do aborto. CAC é colecionador de armas.

Faltou dizer como Kássio votará o pedido de suspeição de Sérgio Moro que, segundo a defesa de Lula, comportou-se de modo parcial no processo do tríplex do Guarujá; as ações contra a Lava Jato; e o caso do senador Flávio Bolsonaro denunciado pelo Ministério Público do Rio por lavagem de dinheiro, organização criminosa e expropriação do salário de servidores públicos.

Bolsonaro ocupou grande parte do seu domingo a oferecer explicações nas redes sociais para seus devotos que não engoliram a nomeação do novo ministro. Em maio do ano passado, o desembargador Kássio liberou uma licitação do Supremo para a compra de lagostas e vinhos caros, derrubando a decisão de uma juíza federal que a vetara. Um devoto escreveu:

– Péssima escolha. Está criando cobras que lhe darão o bote.

Bolsonaro retrucou: “Aguarde, outra mentira”. Outro devoto lembrou o voto de Kássio contra a extradição para a Itália do terrorista Cesare Battisti, acusado por quatro assassinatos e que agora cumpre prisão perpétua. Bolsonaro retrucou: “[Kássio] participou de julgamento que tratou exclusivamente de matéria processual e não emitiu opinião ou voto sobre a extradição”.

Marcus André Melo* - Populismo e autenticidade

- Folha de S. Paulo

Apenas a erosão da autenticidade poderá afetar a popularidade presidencial

O nexo entre populismo e autenticidade está bem estabelecido e é quase auto-evidente; justifica e até encoraja arroubos, impropérios e incivilidades por parte do(a) líder populista. Dizer em público o que se fala em privado sinaliza congruência entre representantes e representados; conexão direta sem filtros ou mediações com o eleitorado. Ao se comportar como um uomo qualunque o(a) líder sinaliza que é uma pessoa comum, inclusive na sua ingenuidade ou até ignorância.

Pode-se observar recentemente um aumento da importância da autenticidade como valor político, pari passu com um declínio da confiança nos políticos e da participação política (ex. comparecimento às urnas). Embora tenha se tornado o mais importante, a autenticidade não é o único fator que importa: competência e integridade completam o tripé do que os eleitores percebem como boa representação política.

Celso Rocha de Barros* - Trump vai radicalizar bolsonarismo?

- Folha de S. Paulo

Para quem está tentando moderar Bolsonaro, se não for possível que Trump vença fácil, talvez seja melhor que perca feio

Donald Trump foi internado com Covid-19. Ao que parece, ao menos nesse round, sua briga com os fatos terminou com vitória dos fatos. Trump está internado com uma doença cuja gravidade negou, e não está sendo tratado com o protocolo que seus puxa-sacos recomendaram para o grande público ao redor do mundo.

Tudo isso pode virar. Se tiver a forma leve da doença, Trump pode dizer, como Bolsonaro, que tinha razão em negar sua gravidade. Se ficar incapacitado ou morrer, seus adeptos podem radicalizar na teoria da conspiração e questionar a legitimidade da vitória de Biden, que já parecia bastante provável antes da internação.

Alguns analistas notaram a similaridade entre a internação de Trump e a facada em Bolsonaro em 2018. As primeiras pesquisas não indicam uma onda de simpatia por Trump, mas também foi assim em 2018 no Brasil. E Bolsonaro foi, sim, beneficiado por não precisar se expor na campanha, deixando que um país desesperado com a política projetasse nele o que queria ver.

Catarina Rochamonte* - STF, lagosta e tubaína

- Folha de S. Paulo

Monitorado pelo centrão, Bolsonaro mostra subserviência ao establishment que dizia combater

Jair Bolsonaro surpreendeu em relação ao critério para escolha do novo ministro do STF. Frustrando aqueles que contavam com o pré-requisito, já heterodoxo, de ter que ser “terrivelmente evangélico”, preferiu a condição de alguém que já tivesse tomado Tubaína com ele.

Foi com essa explicação que o presidente tentou desanuviar seus eleitores em relação à inesperada indicação do desembargador Kassio Nunes, o mesmo que, em plantão do TRF-1, reverteu a decisão que desautorizava a licitação indecente do STF para uma farra gastronômica de mais de um milhão de reais: aquele famoso cardápio no qual se exigia as mais caras marcas de vinhos e as iguarias mais sofisticadas, como a insuperável lagosta servida com molho de manteiga queimada.

Carlos Pereira - Maldição ou virtude?

- O Estado de S. Paulo

Virtude governativa emerge de instituições de controle fortes e independentes

Nos últimos anos, cinco dos ex-governadores do Rio de Janeiro (Moreira Franco, Antony Garotinho, Rosinha Garotinho, Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão) já foram ou ainda estão presos. Por ampla maioria, o Superior Tribunal de Justiça manteve o afastamento do governador Wilson Witzel.

A Assembleia Legislativa acaba de aprovar, por 69 votos a zero, a continuidade do processo de impeachment do governador por crime de responsabilidade. O prefeito da capital, Marcelo Crivella, foi condenado pelo Tribunal Regional Eleitoral por abuso de poder político e está inelegível por 8 anos.

O que esses eventos recentes dizem do que de fato está acontecendo no Rio de Janeiro? Estaria o Rio de Janeiro condenado à maldição de maus governantes?

O sistema democrático não nasceu necessariamente para gerar eficiência ou resultados consistentes com as nossas preferências. Mas para garantir liberdade competitiva à população na escolha de seus representantes e proporcionar resolução pacífica de conflitos sociais a partir da representação/inclusão dos mais variados interesses no jogo político. Raramente a democracia seleciona os melhores governantes. E mesmo quando o faz, não demora muito para que os eleitos frustrem as expectativas dos eleitores.

Fareed Zakaria* – Vendo Trump como ele realmente é

- The Washington Post / O Estado de S. Paulo

Assistir ao debate sem som torna evidente a imagem de um presidente torpe e raivoso diante de um opositor de coração gentil

Esqueça a política por um momento. Trump é um homem de mau caráter

Ao desligar o som da TV, o debate presidencial mostrava as maiores forças de Joe Biden e a gigantesca fraqueza de Donald Trump.

Se você quiser entender quem ganhou o debate presidencial desta semana, tenha em mente um momento de nosso passado político que chamo de “Epifania de Stahl”. Durante a campanha presidencial de 1984, a repórter da CBS Lesley Stahl elaborou uma crítica dura e implacável das políticas de Ronald Reagan para o país, concentrando-se particularmente na disjunção entre o que Reagan dizia e o que fazia. A reportagem mostrava imagens de Reagan homenageando atletas paraolímpicos e inaugurando uma nova casa de repouso, mas a narração de Stahl revelava que, na verdade, seu governo tentara cortar fundos para os deficientes físicos e os programas habitacionais subsidiados.

Bruno Carazza* - Como as economias morrem

- Valor Econômico

Depois do teto, próxima vítima poderá ser a autonomia do Bacen

As ambições de um político o tornam capaz de passar por cima de anos de amizade e a desprezar laços de parentesco mesmo em momentos difíceis de saúde - o que dirá em relação a compromissos com a estabilidade econômica do país.

Em 1959, Lucas Lopes era o ministro da Fazenda do presidente Juscelino Kubitschek. Companheiro fiel desde os tempos da campanha de JK para o governo de Minas, o engenheiro foi o cérebro por trás da criação da Cemig - polo indutor da industrialização mineira, que catapultou JK ao primeiro plano da política nacional - e idealizador do famoso Plano de Metas, o programa desenvolvimentista que prometeu entregar “50 anos em 5”. JK e Lucas Lopes eram tão próximos que seus filhos vieram a se casar.

Sergio Lamucci - As incertezas fiscais e o efeito sobre a retomada

- Valor Econômico

Se persistirem as incertezas fiscais, a recuperação da economia, que já terá desafios como a fraqueza do mercado de trabalho e o fim do auxílio emergencial, será ainda mais difícil

As incertezas em relação às contas públicas brasileiras em 2021 aumentaram ainda mais nos últimos dias, por causa da confusão quanto ao financiamento de um programa de transferência de renda mais amplo que o Bolsa Família e das rusgas entre os ministros Paulo Guedes e Rogério Marinho. Para completar, pioraram as perspectivas de avanço da reforma tributária e da administrativa. Se os juros futuros seguirem em alta e o câmbio continuar a se desvalorizar, como reflexo do agravamento dos riscos fiscais, a recuperação da economia poderá ser ameaçada, num quadro de deterioração das condições financeiras. Os juros básicos em níveis ineditamente baixos ficarão em xeque.

A Selic a 2% ao ano é um dos maiores trunfos para o pós-pandemia. A avaliação dominante é que a taxa poderá continuar nesse nível por alguns trimestres, apesar da alta forte dos preços dos alimentos, um reflexo da disparada da inflação no atacado, devido à desvalorização do câmbio e ao aumento das commodities. O ponto é que a ociosidade na economia é monstruosa, o que tem se traduzido em preços de serviços em níveis muito baixos, inferiores a 1% no acumulado em 12 meses.

Além disso, as expectativas de inflação estão sob controle. As previsões apontam para um IPCA abaixo das metas perseguidas pelo Banco Central (BC) em 2020 e 2021 e exatamente no alvo em 2022 e 2023.

O que a mídia pensa – Opiniões / Editoriais

A charada do crescimento – Opinião | O Estado de S. Paulo

Só o crescimento gera empregos de forma sustentável, mas o enorme desemprego ocasionado pela pandemia tende a frear o crescimento.

Só crescimento gera empregos de forma sustentável, mas o enorme desemprego ocasionado pela pandemia tende a frear o crescimento. O Brasil enfrenta de novo essa velha charada, sempre repetida, em todo o mundo, depois de uma grande crise. A desocupação chegou a 13,8% da força de trabalho, no trimestre maio-julho, com 13,1 milhões de pessoas procurando uma vaga. Se a esse grupo se juntarem os afastados por desalento e os muitos trabalhadores subutilizados, chega-se a um total de 32,9 milhões. É um contingente maior que a população do Peru, 32,5 milhões, incluídos velhinhos e criancinhas.

A reativação dos negócios, a partir de maio, foi puxada principalmente pelo consumo. O poder de compra das famílias foi em boa parte sustentado – e até ampliado, em alguns casos – pelo auxílio emergencial. O último levantamento oficial indicou 67,7 milhões de beneficiários. Esse auxílio foi reduzido de R$ 600 para R$ 300 a partir de setembro e será extinto em janeiro, se nenhuma forma de financiá-lo for encontrada pelas autoridades.

A crise devastou o poder de compra da população. O rendimento médio habitual até subiu 4,8% em relação aos três meses anteriores e 8,6% em relação a igual período de 2019. Nas mesmas comparações, no entanto, a massa de rendimento habitual de todos os trabalhos caiu 3,8% e 4,7% e foi reduzida a R$ 203 bilhões, com perda real de R$ 8 bilhões em três meses e de R$ 10 bilhões em um ano. A redução do emprego mais que anulou, no conjunto, o avanço registrado na média.

Poesia | Vladimir Maiakovski - A Esperança

Injeta sangue no meu coração, enche-me até o bordo das veias!
Mete-me no crânio pensamentos!
Não vivi até o fim o meu bocado terrestre ,
sobre a terra
não vivi o meu bocado de amor. Eu era gigante de porte, mas para que este tamanho?
Para tal trabalho basta uma polegada.
Com um toco de pena, eu rabiscava papel,
num canto do quarto, encolhido,
como um par de óculos dobrado dentro do estojo.
Mas tudo que quiserdes eu farei de graça:
esfregar,
lavar,
escovar,
flanar,
montar guarda.
Posso, se vos agradar, servir-vos de porteiro.
Há, entre vós, bastante porteiros?
Eu era um tipo alegre,
mas que fazer da alegria,
quando a dor é um rio sem vau?
Em nossos dias,
se os dentes vos mostrarem não é senão para vos morder ou dilacerar. O que quer que aconteça,
nas aflições,
pesar...
Chamai-me! Um sujeito engraçado pode ser útil. Eu vos proporei charadas, hipérboles e alegorias, malabares dar-vos-ei em versos. Eu amei... mas é melhor não mexer nisso. Te sentes mal?