Há duas semanas - mais precisamente em 11 de dezembro passado - o ex-ministro da Saúde, Luiz Mandetta, concedeu significativa entrevista à Globo News. Além de tê-la assistido e gostado do que ouvi, constatei a repercussão razoável e favorável que obteve, na imprensa escrita e em redes sociais, aquela parte, digamos, politicamente notável da entrevista. Mandetta foi contundente, preciso e didático na crítica à conduta e à atitude do capitão Bolsonaro, desde o início da pandemia do coronavírus. De certo modo, o ex-ministro fez chover em terreno enxarcado. Reiterou críticas já formalizadas em livro que lançou recentemente e que têm sido compartilhadas e fartamente veiculadas, através de diversos meios de comunicação, por vozes de diversos setores da sociedade e diferentes posições do espectro político do País. Mas o fez de um modo tão direto, objetivo e bem informado, que não se tratou de mais uma chuvinha contra a ideia de gripezinha. Foi um furacão de admoestações éticas e políticas ao Presidente da República, capaz de adubar o terreno em que se poderá, talvez, no futuro, plantar iniciativas políticas e jurídicas concretas para questionar, com propriedade, a sua permanência no cargo. Mereceu aplausos de quem sentiu a alma lavada, após tantos meses de desgoverno, vividos em meio à constatação de que Bolsonaro, malgrado o rol de irresponsabilidades e mesmo crimes em que incorreu e incorre, segue irremovível, no momento, seja por ter apoio parlamentar mínimo para se segurar no cargo, seja por contar com apoio popular relevante.
Feito
o registro do que reluz, passo ao que mais me impactou na entrevista e que tem
se mantido relativamente na penumbra, sem eco importante no noticiário e ainda
menos na análise de colunistas. Trata-se de duas constatações às quais aquela
fala de Mandetta nos induz, ambas com implicações lógicas diretas sobre o plano
político do “que fazer".
A primeira é que se não houver vacinação, em grau importante, já em fevereiro, estará armada a cena de uma tragédia sanitária maior que a atual. Isso porque março e abril são meses, lembra Mandetta, de sazonalidade de vírus. O sistema de saúde não dará conta de evitar centenas de mortes diárias remanescentes de falhas no combate à primeira onda, mais a contaminação da segunda onda (agora, sabemos, com adendo da mutação do vírus), e demandas da sazonalidade de outros vírus, também matadores de idosos não tratados. Em 2020 foi possível, ao Ministério da Saúde, coordenar ações com êxito, em março e abril, pois houve distanciamento e isolamento, hoje impraticáveis nos níveis em que se praticou naquele momento. Sem falar na ausência atual de capacidade e disposição coordenadora de um ministério marcado pela inépcia.