segunda-feira, 15 de março de 2021

Alex Ribeiro - Copom deve agir com calma e tranquilidade

- Valor Econômico

Mercado pressiona por aperto monetário forte e acelerado

O mercado financeiro está pressionando o Banco Central para subir os juros com mais vigor em reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que começa amanhã. Os juros futuros fecharam com forte alta na sexta-feira, precificando quase 30% de chance de uma alta de 0,75 ponto percentual na Selic. Os ativos gritam para que o BC elimine rapidamente os estímulos monetários, levando a taxa para 6% ao ano.

A tese defendida por muitos no mercado é que uma alta forte e rápida da taxa Selic vai ter efeitos positivos na atividade econômica. Ou seja, com movimentos corajosos, o Banco Central vai convencer o mercado de que vai ser implacável com a inflação, fazendo com que a curva de juros fique menos inclinada, o dólar recue e as condições financeiras gerais da economia fiquem mais favoráveis - o que é bom para a economia.

 “É um argumento completamente maluco”, diz um experiente economista que deu aulas para muitos dos que operam hoje no mercado. “Quanto mais ‘hawk’ você age, mais ‘dove’ você fica. Isso não faz sentido”, afirma, usando o jargão dos economistas para banqueiros centrais inclinados ao aperto monetário (“hawk”, falcão em inglês) e inclinados a distensão (“dove”, ou pombo).

“O aperto monetário não é expansionista no curto prazo”, diz outro especialista, também ex-professor. “O Banco Central que é expansionista vai colher repercussões expansionista para a atividade, o que for contracionista vai ter repercussões contracionista.” Eventuais ganhos do bom manejo da política monetária só aparecem no médio e longo prazos. Um banqueiro central hábil, que sobe os juros no tempo certo e na medida certa, sem ser leniente nem exagerar na dose, colhe ganhos de credibilidade e consegue ancorar mais facilmente as expectativas. Isso, no longo prazo, reduz a taxa de sacrifício em termos de crescimento para cumprir as metas de inflação.

E qual é o ritmo correto de ajustar a política monetária? Os operadores do mercado, em geral, defendem rapidez. Eles tendem a olhar as repercussões de curto prazo das ações do BC nas telas dos terminais, em ativos como juros e câmbio. O perigo de agir de forma açodada é errar. Quando se está no mercado, isso pode ser corrigido fechando posições. Se os banqueiros centrais agirem assim, a economia real vai sofrer solavancos à toa.

Nós ultimos anos, houve pelo menos dois momentos em que os mercados pediram mais ação do BC e estavam errados. Em setembro de 2015, queriam que então presidente do BC, Alexandre Tombini, subisse os juros dos 14,25% ao ano então vigentes para perto de 20% ao ano. A economia já estava em recessão. Tombini disse numa entrevista que não iria sancionar os preços de mercado, e a curva de juros futuros caiu rapidamente.

Em 2018, foi a vez de Ilan Goldfajn ser pressionado a subir os juros fortemente, depois que a taxa de juros disparou, acompanhando o dólar. A economia, na época, crescia muito pouco, lembra um ex-integrante do colegiado. O BC de Ilan indicou que só reagiria se a alta do dólar ameaçasse as expectativas de inflação, o que nunca ocorreu.

Se Tombini e Ilan tivessem sucumbido às pressões do mercado, a economia teria sofrido ainda mais, e depois seria necessário mexer nos juros para desfazer o malfeito. “Existe um livrinho básico do economista Alan Blinder sobre bancos centrais que todos leem”, diz um especialista. “Nele, está escrito que o banco central deve ser independente não só do governo, mas também dos mercados financeiros.”

O ritmo certo de alta de juros depende da situação. Quando a economia sofre um grande choque, como foi a pandemia, faz-se um ajuste mais rápido para contrapô-lo. Foi o que aconteceu no ano passado. Nessas condições extremas, alguns membros do Copom defenderam fazer um ajuste de 1,5 ponto percentual de uma vez, mas ainda assim venceu a posição cautelosa de dois movimentos de baixa de 0,75 ponto. A boa prática diz que, uma vez feito o ajuste, segue vida normal. O princípio básico é fazer movimentos de juros aos poucos, porque a economia real é sempre cheia de incertezas.

Campos Neto fez carreira no mercado financeiro, mas, no último recado público que deu antes do período de silêncio do Copom, o estilo é de banqueiro central. “É importante manter a calma, a tranquilidade”, afirmou. “Temos uma meta de inflação de longo prazo e estamos olhando todas as variáveis, não só locais, como as internacionais.”

O costume do BC de Campos Neto tem sido seguir a retórica da reunião anterior do Copom. Em janeiro, havia consenso de que seria adequado retirar os estímulos monetários injetados durante a pandemia. A discussão foi sobre quando. Pelo menos três membros do comitê defenderam o início de “um processo de normalização parcial” em março. Ou seja, queriam subir de forma organizada (“um processo”) para os níveis de antes da pandemia (4,25%). Nada indicava um ritmo mais forte de subida de juros nem uma normalização completa. Já a maioria do comitê, antes de decidir, gostaria de ver mais dados sobre “a evolução da pandemia, da atividade econômica e da política fiscal”.

De lá para cá esses indicadores não evoluíram da melhor maneira possível, sobretudo a política fiscal. A visão otimista é que não houve ruptura, por isso o BC não precisa reagir com desespero. A visão pessimista é que o balanço de riscos ficou mais assimétrico, pendendo mais para o lado negativo. A inflação esperada subiu, e a alta de juros deve ser maior ou mais antecipada do que se previa em janeiro. Daí os economistas de mercado, que diferentemente dos operadores costumam pensar de forma parecida com o Banco Central, acreditarem em altas de 0,5 ponto percentual na Selic.

Mas uma incerteza importante é a evolução da pandemia. Há duas semanas apenas Campos Neto previa um “lockdown” ameno. “Se a gente tiver um maior lockdown que o esperado, não é o nosso cenário central, pode gerar um primeiro semestre um pouquinho pior”, disse. Alguns economistas acham que vale esperar para ver se o lockdown vai desacelerar a inflação. Outros acreditam que teremos uma estagflação.

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