quarta-feira, 23 de junho de 2021

Poesia | Ascenso Ferreira -Noturno

Sozinho

nas ruas desertas

do velho Recife

que atrás do arruado

moderno ficou...

criança de novo

eu sinto que sou:

— Que diabo tu vieste fazer aqui, Ascenso?

O rio soturno,

tremendo de frio,

com os dentes batendo

nas pedras do cais,

tomado de susto

sem poder falar..

o rio tem coisas

para me dontar:

— Corrre senão o Pai-do-Poço te pega, condenado!

Das casas fechadas

e mal-assombradas

com as caras tisnadas

que o incêndio queimou

pelas janelas esburacadas

eu sinto, tremendo,

que um olho de fogo

medonho me olho:

– Olha que o Papa-Figo te agarra, desgraçado!

Dos brutos guindastes

de vultos enormes

ainda maiores

nessa escuridão...

os braços de ferro,

pesados e longos,

parece quererem

suster-me no chão!

Ai! Eu tenho medo dos guindastes,

Por causa daquele bicão!

Sozinho, de noite,

nas ruas desertas

do velho Recife

que atrás do arruado

moderno ficou...

criança de novo

eu sinto que sou:

— Larga de ser vagabundo, Ascenso!

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