segunda-feira, 21 de junho de 2021

Washington Olivetto - O que a CPI da Covid revelou

O Globo

A CPI da Covid é um Big Brother da política, que mistura nomes ilustres com nomes desconhecidos, produzindo desconhecidos ilustres.

Nesse programa da TV Senado, amplamente divulgado pela mídia e comentado nas redes sociais, a grande estrela é o relator Renan Calheiros (MDB-AL), que se comporta com a experiência de quem está no Senado há mais de 26 anos, já foi quatro vezes o presidente da Casa e é pai do governador de Alagoas.

Mas o presidente da comissão de inquérito, Omar Aziz (PSD-AM), e o vice-presidente, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), também não são nada bobos: um já foi governador do Amazonas, e o outro é o senador mais votado da história do Amapá.

Renan, Omar e Randolfe protagonizam seus papéis individuais nesse reality show, mas, quando juntos, se transformam numa espécie de Tiago Leifert, coordenando a participação dos brothers, que, de brothers, não têm nada.

Entre os senadores, alguns se mostram mais atuantes, como Otto Alencar (PSD-BA), que faz questão de deixar claros seus conhecimentos sobre medicina, ou como Luis Carlos Heinze (PP-RS), que fez questão de deixar claros seus desconhecimentos sobre esse assunto. Numa sessão, ele exaltou o microbiologista francês Didier Raoult, defensor da cloroquina e vencedor do prêmio Rusty Razor. Fez isso sem saber que, em português, rusty razor quer dizer “navalha enferrujada” e que esse prêmio foi criado pela revista britânica “The Skeptic” para desmoralizar os cultores da pseudociência.

Outra figura presente na CPI é a senadora Leila Barros (PSB-DF), a Leila do Vôlei, muitas vezes elogiada por suas sacadas, levantadas e cortadas, que na verdade aconteciam quando ela ainda estava nas quadras.

Entre os depoentes, tivemos personagens como o ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo, que garantiu que o fato de ter escrito que o coronavírus é o comunavírus não atrapalhou em nada a relação com os chineses na compra de vacinas. E que não sabia dizer por que o Brasil rejeitou o oxigênio que os venezuelanos ofereceram mandar para as vítimas de Manaus.

Dos outros depoentes, um dos mais evasivos foi o ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten, que, durante horas, disse nada sobre coisa alguma.

E os dois mais afirmativos foram os presidentes da Pfizer na América Latina, Carlos Murillo, e da Anvisa, Antonio Barra Torres. O presidente da Pfizer contou as inúmeras cartas sobre vacinas que a empresa mandou ao governo brasileiro, sem obter nenhuma resposta. E o da Anvisa comentou que o governo brasileiro queria bulir na bula da cloroquina.

Quem não soube falar desses fatos foi o ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, que, estratégico que é, se manteve camuflado, apesar de à paisana.

Destacou-se também a doutora Nise Yamaguchi, com ideias tão desencontradas quanto seus cabelos.

Aconteceram ainda, na CPI, novos depoimentos do ministro Queiroga, investigações sobre um possível gabinete de saúde paralelo e até conversas sobre futebol, discutindo se o Brasil devia ou não devia sediar a Copa América.

Enfim, polêmicas, estapafurdices e discussões são uma tradição das CPIs.

Mas, desta vez, tivemos pelo menos uma grande revelação: a médica infectologista Luana Araújo. Jovem, aprendeu a ler aos 2 anos de idade. Fez mestrado em saúde pública na Universidade Johns Hopkins, nos EUA, e foi a primeira brasileira a ganhar a prestigiada Bolsa Sommer. Luana disse o certo com as palavras certas: “Discussão sobre tratamento precoce é delirante, esdrúxula, anacrônica e contraproducente. É como se a gente estivesse escolhendo de que borda da Terra plana vai pular”.

Seu depoimento foi bem definido por Tutty Vasques: “O Brasil está dividido: metade aplaude entusiasticamente a lucidez da infectologista Luana Araújo. A outra metade quer casar com ela!”.

Neste momento tão polarizado, quando muitos sonham com uma terceira via, periga Luana Araújo virar candidata a presidente.

Como, além dos seus méritos profissionais, ela também toca piano, canta bem e gosta da Nina Simone, sua eventual candidatura é música para os ouvidos de quem não aguenta mais ouvir tanta besteira.

 

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