O Estado de S. Paulo
Se Bolsonaro acena com golpe, Lula devia
dar um golpe de mestre: ser vice de união nacional
O presidente Jair
Bolsonaro está esfarelando e, se a eleição fosse hoje, o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estaria eleito no
primeiro turno, segundo o Datafolha. Lula, portanto, já é o grande vitorioso. É hora de
reagir à ameaça de golpe com um golpe de mestre espetacular, de enorme
grandeza, abrindo mão da cabeça de chapa e assumindo a vaga de vice numa chapa
de união e pacificação nacional. Um gesto para a história à altura da sua
biografia e do grande líder que ele é.
O que está em jogo não é apenas mais uma eleição, uma troca de presidentes, mas um verdadeiro movimento de reconstrução, diante de uma pandemia devastadora e do desmanche de Saúde, Educação, Meio Ambiente, Política Externa, Cultura... Além do esgarçamento das relações republicanas e institucionais das fricções e angústias no mundo militar.
Com Lula disputando a volta à Presidência,
e com grandes chances, aprofundam-se a polarização e esvaem-se as soluções. Com
Lula trocando a vaga na chapa pelo papel histórico de arquiteto e líder da
união nacional, ele mantém sua capacidade poderosa de atrair votos, mas
desanuvia-se o ambiente, tira-se a motivação de parte dos votos em Bolsonaro e
abre-se a porta para uma nova era, inclusive na economia.
Além de decisiva para o Brasil, a solução
pode ser conveniente para o próprio Lula. Ele tem milhares de motivos para
ressentimento, mas seu maior troco é a vitória, o reconhecimento, não a volta à
cadeira que ocupou por oito anos, colocando em risco o saldo de 2010 e trazendo
o fantasma da Lava Jato. A história mostra que a segunda vez nunca, ou
dificilmente, supera a primeira.
Lula terá 77 anos em 2022 e 81 em 2026.
Nada mal. Ele, porém, teve uma vida difícil e tem sérios problemas de saúde,
além de... viver um novo amor. O que ganharia assumindo a rotina de presidente,
com críticas, pedradas, cargos, reuniões e chateações? Não lhe convém mais o
papel de garantidor, de avalista para o mundo de que o Brasil está nos eixos da
democracia, busca estabilidade e quer avançar, não retroceder?
Não se trata só de Lula, mas do PT e da
grandeza dos líderes, homens e mulheres públicas deste País tão sofrido. O PT
teria de dar a própria cambalhota, já que jamais aderiu aos movimentos de união
nacional: eleição de Tancredo Neves, Constituinte, transição com Itamar Franco,
Plano Real. Agora, o inimigo é outro, as ameaças são difusas – por ora,
inalcançáveis – e a melhor comparação é com as Diretas Já, em que o PT marcou
forte presença, como deve marcar agora.
Ok. A questão é também, ou principalmente,
quem seria o cabeça de chapa nessa complexa construção política, mas isso é
para o próprio Lula e os líderes que o passado nos lega e o futuro já nos
oferece, nos três Poderes, nas organizações, na iniciativa privada. Cabe a
eles, e a elas, captarem a gravidade do que nós estamos vivendo e reagirem não
por interesses pessoais, eleitorais, partidários ou ideológicos, mas pelo bem
maior, o Brasil.
A situação é grave e o presidente não viaja
mais pelo País em campanha pela reeleição, mas em defesa do golpe, seja lá que
golpe ele tenha na cabeça, mas certamente ameaçando a realização de eleições em
2022. Reage com palavrão a uma carta da CPI da Covid, chama o presidente do TSE
de “imbecil”, dobra a aposta contra vacinas, máscaras e isolamento e volta a
atrair o seu vice, general Hamilton Mourão, para o centro da confusão.
Ou quer recorrer ao princípio da “lealdade”
e imobilizar Mourão se o risco de impeachment crescer, ou tenta unir as Forças
Armadas em torno de seus propósitos ainda não exatamente revelados. Fica o
recado de que vai cair atirando. As instituições e entidades já resistem.
Aguardam-se os grandes gestos dos grandes líderes.
Só pode ser piada né?
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