terça-feira, 13 de julho de 2021

Eliane Cantanhêde – Se não, o quê?

O Estado de S. Paulo

Dez entre dez oficiais da ativa dizem o mesmo: não contem com as Forças Armadas para golpes

Os militares da ativa podem reclamar do Supremo daqui, criticar o Congresso dali, mas dez entre dez oficiais da ativa rebatem firmemente qualquer possibilidade de as Forças Armadas participarem de algum tipo de golpe, como impedir as eleições. “Isso é coisa do Bolsonaro, não tem nada a ver conosco”, dizem todos, com a mesma convicção.

O comandante do Exército, general Paulo Sérgio Oliveira, está numa situação delicada, entre o Planalto e a Defesa, de um lado, e o Alto Comando, do outro. Enquanto o presidente Jair Bolsonaro e o ministro, general Walter Braga Netto, sobem o tom, os generais de quatro estrelas que compõem o Alto Comando veem com clareza o que milhões de brasileiros veem e também criticam Bolsonaro. Eles também são cidadãos, ouvem, veem, leem. E acham um absurdo os ataques do presidente a vacinas e máscaras, por exemplo.

Braga Netto, ex-chefe da Casa Civil, é considerado “cada vez mais bolsonarista” e identificado com o discurso belicoso do presidente, assim como os oficiais da reserva, apelidados ironicamente de VIP (valentões, inteligentes patriotas). Mas não encontram eco entre os quatro estrelas da ativa, que não querem confronto com o Planalto, até porque podem estar de olho numa boa embaixada ou uma gorda estatal quando passarem para a reserva, mas sem essa de golpes.

A ele, Braga Netto, a Bolsonaro e aos generais do Planalto é atribuída a nota contra o presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz, construída num pingue-pongue entre as três forças e a Defesa e entre a Defesa e o Planalto. As versões mais amenas, do Exército e da Marinha, foram esquentadas no Planalto, que queria uma ameaça até mais dura contra Aziz. No fim, a nota é um desastre e termina enigmaticamente: “As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às instituições”. Se não, o quê?

O general Paulo Sérgio também agiu como bombeiro no dia seguinte, ao ligar para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, logo após o próprio Braga Netto, e dizer que a intenção não era atacar o Congresso. Na outra ponta, o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Carlos Almeida Baptista Jr., em entrevista ao jornal O Globo, disse que “homem armado não ameaça” e definiu a nota: “É um alerta. Nós não enviaremos 50 notas para ele (Omar Aziz), é apenas essa.”

Soou assim: militares não ameaçam, agem. E o “alerta” pareceu coisa de pai bravo: “Não vou avisar de novo. Da próxima vez, você vai ver”. Uma forma autoritária e inadequada de se referir a um senador, presidente de uma CPI e que, aliás, não agrediu as Forças Armadas coisa nenhuma. Só citou um fato: há militares envolvidos em erros e outros em mutretas com as vacinas. O comandante da Marinha avalizou a entrevista no twitter. O do Exército ficou na dele, não tocou no assunto.

Braga Netto era da Casa Civil até 29 de março e dava ordens a Pazuello e a seu secretário executivo, o coronel da reserva Elcio Franco. Em 6 de março, Franco pediu à empresa Precisa mais 50 milhões de doses da Covaxin, além dos 20 milhões já negociados. A Precisa tem má reputação, a Covaxin não é autorizada pela Anvisa até hoje e – apesar de tudo – era a vacina mais cara no alvo da Saúde. Mais 50 milhões de doses?!

Quem faz mal à imagem das Forças Armadas não são Aziz e a CPI, mas Pazuello e seus militares, que se meteram onde não deviam. O Datafolha mostra que 58% dos entrevistados são contra militares da ativa em funções civis e uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) proibindo pode entrar em pauta nesta semana. Os militares ganham extras e a sensação de poder, mas a instituição sofre as consequências e, quando a coisa complica, ataca o presidente da CPI, em vez de advertir os da “banda podre”.

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