quarta-feira, 7 de julho de 2021

Fernando Exman - O pós-pandemia da capital federal

Valor Econômico

A miséria está presente em todos os lados de “Brasilha”

Transmitidas para milhares de pessoas todas as semanas, as movimentadas sessões da CPI da Covid dão a sensação de que as atividades foram retomadas no Parlamento em sua plenitude. Ilusão. Os trabalhos dentro do Congresso, ainda semipresenciais, refletem o que ocorre no exterior de suas dependências. Brasília sente os efeitos da crise.

A notícia positiva é que há um plano em execução. Uma série de medidas tributárias já foi implementada, entre elas um agressivo Refis que negociou R$ 3,1 bilhões e, na visão da equipe econômica do GDF, é fundamental para impedir que ainda mais empresas fechem as portas. Outras iniciativas setoriais foram direcionadas para aqueles mais prejudicados pela pandemia, como salões de beleza, shopping centers, bares e restaurantes, academias, hotelaria e salões de beleza.

Discute-se o pós-pandemia. Sem grandes expectativas em relação à aprovação das reformas tributária ou administrativa, agora o governo distrital mira a construção de um conjunto de políticas públicas para reativar a economia. Nada que dependa de repasses federais adicionais.

Reuniões com representantes dos diversos segmentos empresariais já começaram a ser realizadas. O objetivo é pelo menos atenuar, o mais rápido possível, algumas das mudanças na paisagem que chamam a atenção de qualquer pessoa que transita pelas avenidas da capital.

Desde o início da crise sanitária, no Palácio do Planalto vigora a ordem não expressa de que máscara é apetrecho de opositor e cumprimento bom é pelo menos um aperto de mão. Nos demais Poderes, contudo, vê-se uma maior cautela. O mesmo ocorre em relação ao poder local.

O trabalho remoto alterou a rotina de autoridades e servidores. E isso, no geral, acabou contribuindo para a desaceleração da economia. Era o que precisava ser feito: o número de vítimas da covid-19 não parava de crescer e, ademais, em alguns momentos a escassez de leitos de UTI chegou a níveis críticos.

Não quer dizer que a produtividade dos parlamentares esteja mais baixa do que a habitual. Desde o início da pandemia, projetos importantes têm sido aprovados no regime de teletrabalho. Audiências públicas e votações passaram a ocorrer, inclusive, às segundas e sextas-feiras em ambiente virtual.

No entanto, reuniões presenciais ainda são exceção. Está distante o tempo em que 10 mil pessoas circulavam pela sede do Legislativo às terças, quartas e quintas-feiras - dias que sempre concentraram os trabalhos congressuais, para que deputados e senadores pudessem percorrer seus redutos eleitorais no restante da semana.

Sobram vagas de estacionamento pela Esplanada dos Ministérios. Sinal dos tempos.

Recentemente, o GDF divulgou um diagnóstico mais preciso da situação: no acumulado entre abril de 2020 e março de 2021 - o primeiro indicador a capturar quatro trimestres integralmente afetados pela pandemia - o desempenho econômico da capital federal apresentou variação negativa de 1,0%. É a maior queda da série histórica do indicador. Mesmo assim, um resultado melhor do que o observado em âmbito nacional, onde a variação negativa foi de 3,8% no mesmo período.

A manutenção da renda do funcionalismo contribuiu. Por outro lado, prova que o DF não é exatamente aquele lugar com uma dinâmica econômica própria, capaz de se descolar do território que o cerca, como muitos sempre consideraram. A miséria está presente por todos os lados de “Brasilha”.

Aliados do presidente Jair Bolsonaro chegaram a mencionar essa situação quando tentaram convencê-lo a prorrogar com celeridade o auxílio emergencial, o que acabou ocorrendo na segunda-feira. Entre integrantes da cúpula do MDB, partido do governador, espera-se uma ação social contundente das administrações sob a responsabilidade do partido. O mesmo se vê em relação à Prefeitura de São Paulo.

Na noite passada, aliás, quando o inverno seco do cerrado impôs a quem estivesse desabrigado uma temperatura de 8 ou 9 graus, 5 mil pessoas dormiram nas ruas do DF. Esse número assombroso faz parte de um censo encomendado pela Secretaria de Economia do governo distrital, que tem o desafio de atacar toda essa situação.

Explica o secretário André Clemente: “O isolamento fez com que as pessoas não viessem para os centros urbanos. Aquele consumo que acontecia no centro de Brasília foi redirecionado para mercados ou para atacadistas, lojas de materiais de construção, restaurantes vizinhos de onde as pessoas moram. Houve uma descentralização dos gastos”.

Bares e restaurantes foram imediatamente afetados. Sofreram também os empresários que atuam no comércio e com eventos.

“Cerca de 30% a 40% das empresas que estavam ativas fecharam imediatamente. Isso é desemprego, perda de arrecadação, por isso essas ações imediatas nossas, para dar fôlego para empresas”, diz o secretário, referindo-se ao conjunto de medidas que inclui prorrogação de prazos para pagamento de impostos, ampliação de isenções, parcelamentos e facilitação de crédito. Auxílios emergenciais também foram concedidos.

Por outro lado, mantiveram-se aquecidos o mercado imobiliário, a indústria farmacêutica e a área de tecnologia de informação.

Para o pós-pandemia, Brasília quer se consolidar como um importante centro logístico na América Latina. “Acreditamos que vamos resgatar esses serviços e voltar a crescer na área de infraestrutura aeroportuária”, diz André Clemente. “O fato de estarmos a no máximo a 2 mil quilômetros de qualquer capital da América Latina nos coloca numa situação muito privilegiada. O e-commerce é uma realidade aqui no Distrito Federal também, diante dessa facilidade de distribuir para qualquer local do país ou da América Latina.”

No início do mês, o governo distrital determinou o retorno dos servidores ao trabalho presencial. Entre parlamentares, cresce também a pressão para que as sessões tradicionais sejam retomadas. A engrenagem só deve voltar a rodar para valer quando avançar a vacinação.

 

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