sexta-feira, 16 de julho de 2021

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

EDITORIAIS

Risco para a CPI da Covid é perda de foco

O Globo


É acertada a decisão do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), de autorizar a prorrogação da CPI da Covid por 90 dias. Instalada sob forte resistência do Planalto, a comissão comprova a máxima de que sempre se sabe como uma CPI começa, mas não como termina. Surgiu para investigar três temas principais: a crise em Manaus, em que pacientes morreram por falta de oxigênio, as omissões que atrasaram a compra de vacinas e o incentivo a drogas ineficazes contra a Covid-19. Por pressão do Executivo, ganhou mais um: a apuração sobre desvios nos recursos enviados aos estados para combate à pandemia. Já seria suficiente. Mas, no decorrer dos trabalhos, surgiu um quinto tema explosivo, que acabou se tornando preponderante: as negociações suspeitas para compra de vacinas e os contratos nebulosos que pairam sobre o Ministério da Saúde.

É natural que essas estranhas negociatas despertem a atenção da CPI. A demora do ministério para comprar vacinas da Pfizer e do Butantan (CoronaVac) é conhecida. Por isso mesmo, surpreende a pressa para adquirir doses da Covaxin, o imunizante mais caro entre todos os contratados — o governo empenhou R$ 1,6 bilhão por 20 milhões de doses. Diferentemente do que ocorrera noutros casos, a negociação foi feita com uma intermediária, a Precisa Medicamentos, cuja sócia já era processada por não ter cumprido um contrato de R$ 20 milhões com o ministério na gestão Ricardo Barros.

Em depoimento ontem à CPI, Cristiano Carvalho, que se diz representante da empresa americana Davati e afirma ter participado de tratativas para a venda de 400 milhões de doses da AstraZeneca, aumentou ainda mais a temperatura na comissão. Carvalho, que não tinha vínculo oficial com a Davati, muito menos com a AstraZeneca, chegou a se reunir com o então secretário executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, para tratar da proposta fantasiosa. O roteiro rocambolesco de uma compra inexequível — enquanto as ofertas oficiais da Pfizer aguardavam resposta — cita o reverendo Amilton Gomes de Paula, da ONG Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários, militares do governo e o Instituto Força Brasil.

O escândalo das vacinas pôs em xeque outros contratos do Ministério da Saúde. Um deles é da empresa VTC Log, que presta serviços de transporte e armazenamento de medicamentos. A VTC aumentou sua participação durante a gestão do ministro Ricardo Barros. No atual governo, fez acordo vantajoso com aval de Roberto Dias, ex-diretor de Logística do ministério.

Não faltam dúvidas a esclarecer nem mistérios a desvendar. Mas, ainda que tenha ganhado tempo, a CPI precisa ter em mente que o prazo é exíguo para examinar as ramificações que surgem a cada momento. Não adianta abrir novas frentes de investigação a toda hora. Compreende-se que, a cada fio que se puxe, apareçam outros. Mas a comissão não curará todos os males do país. Foi criada para investigar erros e omissões que levaram à morte quase 540 mil brasileiros, cujas famílias merecem uma resposta para uma tragédia que tem pouco de fatalidade e muito de negligência. Os senadores têm de começar este segundo tempo sabendo que não haverá prorrogação. É hora de deixar de lado detalhes irrelevantes para se concentrar nos pontos fundamentais. Como se dizia no primeiro dia de trabalho, a CPI precisa ter foco. Ou poderá se perder diante das tentações midiáticas.

Perigo inflacionário continua a exigir atenção redobrada do BC

O Globo

Na quarta-feira, o Ministério da Economia reconheceu pela primeira vez que a inflação deste ano ficará acima do teto da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional — algo que os principais agentes do mercado financeiro ouvidos pelo Banco Central (BC) já tinham percebido desde maio. O centro da meta previsto para 2021 é 3,75%, a inflação pode variar 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. Nas estimativas divulgadas no Boletim Macrofiscal da Secretaria de Política Econômica (SPE), a projeção é de uma alta de 5,9%.

O reconhecimento do governo veio um mês depois da elevação da Selic, a taxa básica de juro, de 3,50% para 4,25%. A medida foi tomada de olho em 2022, já que não havia mais condição de atingir a meta neste ano. A alta da Selic afetou positivamente a expectativa do mercado. Desde o anúncio, as previsões para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA) entre janeiro e dezembro de 2022 começaram um movimento de queda. Como a inflação é, antes de tudo, resultado de expectativas, foi uma ótima notícia.

Apesar do acerto, ainda há preocupação com a trajetória da inflação. Em evento virtual, Bruno Serra, diretor de Política Monetária do BC, disse que o “momento é perigoso” em termos inflacionários. A grande questão é saber como a economia se comportará no pós-pandemia — dúvida que assola outras autoridades monetárias no planeta, dado o ineditismo da situação.

Não está claro como se dará a dinâmica de retomada no consumo de bens e serviços. Serra deu um exemplo das incertezas ao citar o mercado de trabalho. O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que mede o desempenho do mercado formal, aponta uma recuperação mais forte. Mas a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), que inclui o mercado informal, revela um movimento mais lento. Ler esses sinais do modo correto é a chave para que o BC mantenha a promessa de deixar a Selic num patamar neutro, sem acelerar nem desacelerar a economia.

Como se as incertezas internas não bastassem, há também dúvidas quanto ao cenário externo. A alta de preços nos mercados emergentes nos 12 meses até abril foi de 3,9%. Em maio, a inflação chegou a 4,5%. Nos Estados Unidos, os preços ao consumidor subiram 5,4% nos 12 meses encerrados em junho, a maior alta desde agosto de 2008. O anúncio pôs mais pressão sobre o Federal Reserve (Fed), o banco central americano, que tem defendido a tese de que a inflação alta é passageira. Economistas ouvidos pelo Wall Street Journal preveem índices elevados até 2023 se nada mudar na política monetária.

Na eventualidade de o Fed decidir reduzir estímulos ou subir os juros de forma mais acelerada, o BC talvez seja forçado a também antecipar a alta por aqui, com efeito imediato no ritmo de retomada. Será preciso manter um olho no mercado local, outro nos anúncios do Fed.

O papel da CPI

Folha de S. Paulo

Comissão mantém pressão sobre Bolsonaro, mas precisa juntar pontas da apuração

Não é desprezível o impacto produzido até aqui pela Comissão Parlamentar de Inquérito criada pelo Senado para investigar a atuação do governo Jair Bolsonaro no enfrentamento da crise sanitária.

A negligência do presidente e de seus auxiliares já era patente antes do início dos trabalhos, há três meses. Desde então, depoimentos e documentos reunidos pela CPI trouxeram detalhes chocantes da inépcia com que foram conduzidas as negociações para aquisição de vacinas contra a Covid-19.

Fabricantes como a Pfizer ficaram meses à espera de resposta das autoridades para suas ofertas. Um parecer jurídico chegou a apontar o desconhecimento da língua inglesa como desculpa para a demora nas tratativas com um consórcio liderado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

O trabalho da CPI explorou a extensão das atividades do gabinete paralelo formado por Bolsonaro com ministros, charlatães e apaniguados para difundir tratamentos ineficazes e minar os esforços de médicos e cientistas na linha de frente do combate ao coronavírus.

Nas últimas semanas, descobriu-se também que atravessadores, militares da reserva e um pastor evangélico encontravam as portas do Ministério da Saúde abertas para negociar imunizantes e comissões, mesmo sem exibir qualquer prova de que tinham como entregar as doses prometidas.

Ainda resta muito a esclarecer sobre a atuação desses aventureiros e suas conexões com os partidos políticos que sustentam o governo Bolsonaro no Congresso, mas surgiram novos elementos para avaliar a ruinosa gestão do general Eduardo Pazuello na pasta da Saúde.

Prorrogada por mais 90 dias, a comissão deverá continuar fazendo barulho no segundo semestre. É essencial, porém, que aproveite o período para juntar as pontas soltas de sua investigação sem perder a visão de conjunto que dará sentido ao seu trabalho.

Os indícios de corrupção que se tornaram o foco principal da atenção da CPI precisam ser elucidados, mas tornaram-se evidentes também as limitações dos senadores para desenvolver o tipo de trabalho investigativo metódico capaz de desfiar o novelo à sua frente.

Dada a omissão subserviente do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do procurador-geral da República, Augusto Aras, diante dos desmandos do chefe do Executivo, coube à comissão parlamentar oferecer um contraponto veemente ao negacionismo e à desfaçatez.

Mas a CPI só cumprirá bem sua tarefa se ao final oferecer um relatório capaz de esclarecer a verdade e definir responsabilidades, abrindo caminho para a aplicação das punições que a lei reserva aos que traíram a confiança da sociedade em meio à tragédia.

Cultura bolsonarista

Folha de S. Paulo

Parecer sobre festival dá mais uma mostra do aparelhamento ideológico da pasta

Embora o governo tenha recentemente se livrado de algumas de suas figuras mais esdrúxulas, como os ex-ministros Ricardo Salles e Ernesto Araújo, os bolsões ideológicos do bolsonarismo mantêm-se ainda vivos e atuantes no topo da administração federal, como se testemunha na área da cultura.

Uma nova amostra de tacanhez da secretaria comandada pelo ator Mario Frias veio a lume nesta semana. Aquilo que deveria constituir uma mera análise técnica e rotineira de um documento converteu-se numa tosca peça de perseguição, pedantismo vazio e descabido apelo religioso.

O alvo foi o Festival de Jazz do Capão, na Chapada Diamantina (BA), que havia entrado com um pedido de captação de recursos por meio da Lei de Incentivo à Cultura, a antiga Rouanet —diploma que, vale lembrar, é alvo das mistificações de Jair Bolsonaro e seus apoiadores mais fiéis desde a campanha.

No tragicômico parecer que negou a demanda, produzido no âmbito da Fundação Nacional das Artes, combinam-se citações de gosto duvidoso, versos em latim e frases como “o objetivo e finalidade maior de toda música não deveria ser nenhum outro além da glória de Deus e a renovação da alma”.

Como se o ridículo fosse pouco, o fato de o evento ter-se declarado “antifascista e pela democracia” no ano passado tornou-se um argumento contrário ao projeto no parecer, que terminou por concluir que ele traria “desvio de objeto, risco à malversação do recurso público incentivado com propositura de indevido uso do mesmo”.

O obscurantismo burocrático foi seguido por tentativas de intimidação. Críticas à condução da política cultural e ao parecer da Funarte feitas nas redes sociais foram respondidas por Frias com ameaças de processos —atitude na qual, aliás, o secretário é reincidente.

Ao menos o Ministério Público Federal se moveu, instaurando um inquérito civil para apurar “violação aos princípios da legalidade, impessoalidade e do Estado laico, bem como desvio de finalidade no indeferimento do projeto”.

Nada, por óbvio, obrigava à aprovação do pedido feito pelo festival de música baiano. Da maneira como foi engendrada, entretanto, sua rejeição é mais um sinal do estado de indigência em que se encontra a gestão cultural do país, submetida a aparelhamento ideológico e incompetência técnica.

Uma dose de alento e outra de cautela

O Estado de S. Paulo

A nova edição do Boletim Observatório Covid-19 da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), publicada na quarta-feira passada, traz um dado muito alentador. As quedas dos números de casos e óbitos decorrentes da doença e da taxa de ocupação de leitos de UTI observadas nas últimas semanas epidemiológicas indicam que o País está em “processo de arrefecimento mais duradouro da pandemia nos próximos meses”. Hoje, nenhum Estado registra taxa de ocupação de leitos de UTI para covid-19 acima de 90%, algo que não acontecia desde dezembro de 2020. Em São Paulo, esta taxa é de 66,2%. Na Região Metropolitana, 60,9%.

A notícia é um bálsamo para a Nação, enlutada que está pela morte de quase 540 mil de seus cidadãos no curso desta peste sem precedentes. Trata-se, no dizer da Fiocruz, de “uma nova fase da pandemia no Brasil, em que a vacinação tem feito a diferença”.

Como o bom senso, a experiência histórica e os reiterados alertas de especialistas já apontavam, o avanço da vacinação da população era absolutamente determinante para que o País controlasse a disseminação do coronavírus. A bem da verdade, o Brasil ainda está longe de atingir o patamar de cidadãos imunizados que permita pôr fim à pandemia. Apenas 15,17% da população está completamente imunizada contra o coronavírus, ou seja, já recebeu as duas doses das vacinas do Butantan, da Fiocruz ou da Pfizer ou a vacina da Janssen, de dose única. A segurança plena virá quando aquele porcentual subir para, aproximadamente, 70% dos brasileiros. Mas fato é que a aplicação da primeira dose daqueles três primeiros imunizantes já garante algum grau de proteção contra a forma grave da doença. E 41% dos brasileiros já receberam ao menos uma dose da vacina.

Os dados do Boletim Observatório Covid-19, portanto, permitem chegar a duas conclusões. A primeira, óbvia, é que os governos, em suas três esferas, devem empreender todos os esforços para vacinar totalmente ainda mais brasileiros no menor tempo possível.

Vacinas salvam vidas, e isto precisa ser dito de forma clara porque a politização do tema tem levado muitos brasileiros a questionar a segurança e a eficácia dos imunizantes. A segunda conclusão é que, a despeito do avanço da vacinação no País, os cuidados pessoais ainda se fazem rigorosamente necessários. Em que pesem as boas-novas vindas da Fiocruz, nada está resolvido. Ainda há riscos não desprezíveis, sobretudo o risco de disseminação comunitária da variante Delta do coronavírus, de recrudescimento do atual quadro sanitário.

De acordo com o Datafolha, pela primeira vez desde o início desta crise sanitária, a maioria dos brasileiros (58%) entende que a pandemia está sob controle no País. Mais pessoas têm sido vacinadas e os números de casos, mortes e a taxa de ocupação de leitos de UTI, como já observado, estão em queda. O alívio e a percepção de controle são justificados, mas de forma alguma devem se traduzir em comportamentos pouco cuidadosos por parte dos cidadãos, mesmo os que já foram vacinados. Ainda que percebida como controlada pela maioria dos brasileiros, a covid-19 ainda mata diariamente, em média, 1,2 mil de nossos concidadãos. É lastimável.

É fundamental, pois, que os cidadãos, quando chegar a sua vez, tomem a vacina que estiver disponível. É imperiosa a observância aos cuidados pessoais preconizados pelas autoridades sanitárias. E, de uma vez por todas, é necessário abandonar elixires absolutamente ineficazes contra a covid-19, como o famigerado “kit covid”. Com longuíssimo atraso, o Ministério da Saúde, antes uma plataforma de desinformação, enviou documento à CPI da Pandemia contraindicando o uso dos medicamentos contidos no tal “kit” para “tratamento precoce” da doença. “Alguns medicamentos foram testados e não mostraram benefícios clínicos na população de pacientes hospitalizados, não devendo ser utilizados, sendo eles: hidroxicloroquina ou cloroquina, azitromicina, lopinavir, ritonavir, colchicina e plasma convalescente.”

Agora resta investigar quem enriqueceu ilicitamente com a fabricação e distribuição destes medicamentos à custa da saúde e da vida de milhares de brasileiros.

O desapreço de Lula pela democracia

O Estado de S. Paulo

Lula inventa as mais estapafúrdias histórias para justificar a corrupção do PT

Em entrevista ao jornal chinês Guancha, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mostrou que não tem nenhum pudor em inventar as mais estapafúrdias histórias para justificar os escândalos de corrupção envolvendo o PT e que continua submetendo tudo a seus interesses políticos. Com esse peculiar modo de agir, não se constrange em manifestar apoio a regime antidemocrático, se assim lhe for conveniente. Continua o Lula de sempre.

Para o ex-presidente petista, só os ditadores de direita merecem reprovação. “A direita, que ocupa um espaço muito grande, é radical há muito tempo. O comportamento de Trump nos Estados Unidos e o comportamento do presidente Bolsonaro no Brasil são mais ou menos como o surgimento do fascismo na Itália e do nazismo na Alemanha. Esses ditadores não querem discutir com pessoas que têm ideias diferentes das suas e não acreditam em seu próprio poder”, disse.

Lula, no entanto, não fez nenhuma reprovação do cerceamento das liberdades na China. A respeito do regime chinês, suas palavras foram de elogio e admiração. “A China é capaz de lutar contra o coronavírus tão rapidamente porque tem um partido político forte e um governo forte, porque o governo tem controle e poder de comando”, disse.

Como se vê, Lula é capaz de ignorar a falta de eleições livres num país. Sua defesa da democracia depende das circunstâncias. O líder petista elogiou ao jornal chinês o retorno da esquerda ao poder na América Latina. Mas, ao tratar da China, esqueceu-se da importância da alternância do poder.

Com Lula, tudo ganha um estranho relativismo. Ele denuncia o radicalismo de direita, mas ignora o radicalismo de seu próprio partido. Por exemplo, o PT votou contra a Constituição de 1988, justamente o marco jurídico que veio restaurar o Estado Democrático de Direito no País. “Votamos contra porque queríamos algo mais radical”, disse o líder petista nos 25 anos da Carta de 1988.

Lula não é um bom defensor da democracia e da moderação, como também não é um bom narrador dos fatos. Sua versão sobre os escândalos de corrupção envolvendo o PT é simplesmente grotesca, sem nenhuma correspondência com a realidade.

“Provamos que a promotoria (da Lava Jato) estava servindo ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos naquela época, e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos pretendia minar nossas leis para regulamentar a Petrobrás”, disse Lula na entrevista ao jornal chinês.

Em vez de reconhecer a conivência das administrações petistas com a corrupção, Lula preferiu, na entrevista ao Guancha, recorrer a teorias da conspiração. “A única explicação que consigo encontrar para isso (a suposta interferência dos Estados Unidos na Lava Jato) é porque o Brasil estava se tornando um importante player internacional”, disse Lula. Eis o nível de comprometimento do líder petista com os fatos.

Segundo Lula, o PT não fez nada de errado. “Essa é a explicação que encontrei para o impeachment da presidente Dilma Rousseff, minha prisão e as várias mentiras fabricadas contra o PT. A única explicação que posso encontrar é esta. Os Estados Unidos estão sempre intervindo na política latino-americana, são os responsáveis pelos golpes no Brasil, Chile, Uruguai e Argentina”, disse Lula ao Guancha.

Lula desrespeita a memória da população quando trata os escândalos de corrupção dos governos petistas como “as várias mentiras fabricadas contra o PT”. Em vez de pedir desculpas pela gestão da coisa pública tão indiferente à lei e à ética, o líder petista coloca-se como vítima de perseguição política, promovida pelos Estados Unidos.

Além disso, ao distorcer os fatos nesse patamar, Lula manifesta seu desapreço pelo regime democrático, regime este que pressupõe responsabilidade dos governantes. O líder petista não apenas distorce a história quando diz que o impeachment de Dilma Rousseff foi resultado de uma conspiração norte-americana. Lula tenta excluir sua responsabilidade pelo que o PT fez com o País, confirmando que continua sem merecer, sob nenhuma hipótese, a confiança do eleitor.

Ataque à Federação e ao vale-refeição

O Estado de S. Paulo

Estados, municípios e assalariados também perdem com a reforma tributária

Quem acha ruim a reforma tributária em discussão no Congresso pode estar sendo otimista. Sua opinião poderá ser ainda mais negativa, hoje ou amanhã, quando novos detalhes forem separados e expostos a todos, como tem ocorrido nos últimos dias. O relator do projeto, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), pode ter corrigido excessos da proposta do governo – por exemplo, recalibrando a taxação prevista para os lucros e dividendos distribuídos. O ministro da Economia, Paulo Guedes, acabou reconhecendo erros na “dosimetria” das alíquotas. Mas o resultado geral se mostra mais feio a cada dia, e para isso tem contribuído o trabalho do relator.

Estados e municípios poderão perder entre R$ 23 bilhões e R$ 30 bilhões, segundo tributaristas consultados pelo Estado, como consequência de um dos ajustes incluídos no parecer do relator. Ao recalibrar a alíquota do Imposto de Renda (IR) sobre as empresas, ele sujeitou o Tesouro Nacional a uma perigosa perda de receita. Esse risco foi logo apontado por especialistas. Mas essa redução afetaria também as transferências para os cofres estaduais e municipais, previstas na Constituição, e esse foi o destaque seguinte do noticiário sobre a reforma. Seria um gesto de cortesia com chapéu alheio.

São Paulo perderá menos que outros Estados, porque já recebe uma fatia menor do Fundo de Participação nos tributos federais, mas nem por isso o secretário da Fazenda, Henrique Meirelles, deixou de criticar a proposta. Esse projeto, segundo ele, “é voltado para resolver o problema federal”. Não é, acrescentou, um projeto de reforma tributária.

Ao indicar possíveis compensações para a perda geral de receita do IR, inicialmente estimada em R$ 30 bilhões, o relator propôs o fim de isenções para 20 mil empresas. Mas o ganho fiscal, nesse caso, estará concentrado em tributos absorvidos unicamente pelo poder central, sem divisão com Estados e municípios.

“O relatório é um escândalo, tanto por desonerar a renda das empresas e pessoas mais ricas do País, num momento em que o mundo tenta avançar no sentido contrário, quanto por produzir um rombo de pelo menos R$ 30 bilhões nas contas públicas”, protestou a Confederação Nacional de Municípios (CNM). Segundo o presidente da entidade, Paulo Ziulkoski, a confederação tentará mobilizar sua base parlamentar contra essas distorções.

Mas a essas críticas logo se somou a reação a outra mudança proposta pelo relator, a extinção do incentivo fiscal ao Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). Sem o incentivo, empresas poderão deixar de conceder benefícios como o vale-refeição e o vale-alimentação. Segundo empresas fornecedoras de cartões, 20 milhões de trabalhadores poderão ser diretamente prejudicados, com perda de qualidade de vida. Mas também serão afetadas muitas empresas, incluído enorme número de restaurantes e lanchonetes muito dependentes dessa clientela, além de supermercados e armazéns.

Além de socialmente negativa e prejudicial a milhares de empresas, essa mudança pode prejudicar também o Tesouro. O benefício custa ao governo cerca de R$ 1,2 bilhão, mas o Tesouro recolhe o triplo desse valor em impostos pagos pelo setor de alimentação, argumenta o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes, Paulo Solmucci. “Não faz sentido. Como podem sugerir”, prosseguiu, “acabar com uma lei amplamente estudada e que passou por vários governos, sem discutir com a população, para cobrir um buraco deixado por uma proposta de reforma tributária mal elaborada?” Criado nos anos 1970, ainda no regime militar, o PAT foi mantido por todos os governos, até agora, com benefícios bem distribuídos entre empregados e empresas.

Mas o relator cuidou de outros interesses. Estava prevista no projeto original a tributação de lucros de empresas domiciliadas em paraísos fiscais e pertencentes a brasileiros, mesmo sem a transferência desses lucros para o Brasil. Essa inovação, em linha com a tendência da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), foi eliminada pelo relator.

Governo já sabe como irá financiar o novo Bolsa Família

Valor Econômico

É um problema contar apenas com a tributação dos dividendos para financiar o programa

O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse em live do Valor (14/7), que vai usar a arrecadação prevista com a tributação dos dividendos, incluída na proposta de novas regras do Imposto de Renda (IR), para financiar a ampliação do programa Bolsa Família. O governo prometeu incluir 3 milhões de famílias elevando o total de beneficiados para 17 milhões, com um alcance estimado de 68 milhões de pessoas. O valor médio do benefício, que está em R$ 189, deve subir para em torno de R$ 270. Os dois movimentos vão ampliar as despesas do governo com essa conta para R$ 53 bilhões, 51,4% do valor estimado para este ano.

Guedes não está preocupado com esse aumento. Disse que poderia usar a boa surpresa do crescimento de R$ 100 bilhões da arrecadação para cobrir a despesa. Com o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deste início de ano, a arrecadação do primeiro semestre, prevista em R$ 640 bilhões, acabou ficando em R$ 744 bilhões. Mas acredita que não será autorizado pelas regras da Lei de Responsabilidade Fiscal. Pretende então vincular a receita a ser obtida com a tributação dos dividendos para essa finalidade. “Dá para pagar tranquilamente os R$ 20 bilhões adicionais que o Bolsa Família precisa. Podia ser até mais, mas não vamos aumentar tanto assim. A restrição vai ser o teto, não a falta de recursos. Está indo para aí (R$ 50 bilhões com o Bolsa Família em 2022)”, disse na live do Valor.

A ampliação do Bolsa Família não deixa de ser uma boa notícia - e, sim, poderia ser maior. É evidente o interesse eleitoral do governo em melhorar sua popularidade com a medida. As mais recentes pesquisas mostram a queda da avaliação de Bolsonaro, com a administração desastrosa do enfrentamento da pandemia na frente sanitária e suspeitas de corrupção. A promessa de melhorar o Bolsa Família vem circulando há algum tempo. Só não foi colocada de pé pela dificuldade do governo de redesenhar o programa e saber como financiá-lo.

A demora em realizar essa tarefa obrigou o governo, como paliativo, a prorrogar a concessão ao auxílio emergencial, que chega a 39,3 milhões de pessoas e terminaria este mês. Agora o auxílio se estenderá até outubro, quando o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, prevê que a vacinação esteja bem adiantada. O novo Bolsa Família promete estar pronto nesse momento. A extensão do auxílio foi anunciada, não por coincidência, no dia em que estouraram acusações de envolvimento de Bolsonaro em esquema de rachadinha quando era deputado federal, feitas por uma ex-cunhada. A prorrogação era inevitável uma vez que o desemprego segue em patamar elevado, pouco abaixo de 15%, abatendo especialmente os trabalhadores informais; e a recuperação da economia ainda é errática.

O governo errou seriamente em janeiro quando deixou a população desamparada ao fim do programa de auxílio emergencial do ano passado. A FGV Social estima que o auxílio emergencial não deixou a taxa de pobreza do ano passado superar os 16,1% da população. Com o benefício, ela caiu para 13% e evitou a entrada de mais 6 milhões a 7 milhões de pessoas na pobreza. Desde 2014 a pobreza aumentou e o congelamento dos valores do Bolsa Família; e, mesmo com o auxílio emergencial, está no patamar mais elevado da década anterior à pandemia.

A retomada da economia pode ajudar a minorar o problema. Mas é necessária a correção dos valores do Bolsa Família. O efeito da inflação no auxílio emergencial, calculado pelo FGV Social, ilustra o problema. O valor do auxílio caiu da média de R$ 900 na fase inicial do ano passado para menos de um terço, atualmente, em termos nominais. Como a inflação acumulada em 12 meses até abril foi de 7,7% para os mais pobres, acima dos 5,2% da renda mais alta, em vista do peso maior dos alimentos e itens como energia e gás, o auxílio emergencial caiu para pouco mais de um quarto em termos reais.

Há quem diga que a reestruturação do Bolsa Família deveria ficar para o próximo governo, para escapar das pressões eleitorais, como defenderam os economistas Marcos Mendes e Vinícius Botelho, durante live do Valor (7/7). Essa revisão deve incluir uma necessária atualização do Cadastro Único, estreitar a inclusão financeira e aperfeiçoar os vínculos do programa com a educação das crianças e adolescentes dos grupos familiares beneficiados, além de sinalizar a tão esperada porta de saída. Outro problema a resolver é contar apenas com a tributação dos dividendos para financiar o programa. Essa receita pode ser bastante volátil.

 

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