quinta-feira, 12 de agosto de 2021

Bruno Boghossian - O baile bolsonarista

Folha de S. Paulo

Com derrota do voto impresso, presidente mantém ataques e prova que não vai seguir regras mínimas

Às vésperas da votação que enterrou a proposta do voto impresso, o presidente da Câmara afirmava que os Poderes deveriam dançar "sem pisar no pé de ninguém". "Assim é um baile bom, assim é a vida", afirmou Arthur Lira, numa visão excessivamente otimista da harmonia entre o Congresso e o Palácio do Planalto.

Jair Bolsonaro já meteu o coturno nas canelas de meia República, mas continua sendo convidado para os arrasta-pés de Brasília. Desde o início deste mandato, o mundo político vende a versão de que é possível convencer o presidente a atuar dentro das regras mínimas da democracia. Ele mesmo, no entanto, faz questão de provar que não há a menor chance de isso ocorrer.

A decisão da Câmara de levar ao plenário o projeto do voto impresso é o exemplo acabado dessa farsa. Deputados diziam que seria possível encerrar a discussão ao rejeitar definitivamente a proposta. Circulou até a promessa de que Bolsonaro respeitaria o resultado da votação caso o texto fosse derrotado. Mas o espetáculo só serviu ao presidente.

Bolsonaro manipulou números da votação para cantar vitória. Disse que o apoio de 229 deputados era prova de que há desconfianças sobre as eleições e lançou novas suspeitas de fraude nas urnas eletrônicas, mesmo admitindo não ter evidências de nada. A Câmara deu um presente ao Planalto —e ainda fingiu que aquele era um gesto de firmeza.

Não é ingenuidade, mas interesse. Parlamentares já sabem que o presidente não vai se comportar de outra maneira e que seu único objetivo é o tumulto. Esses políticos, entretanto, preferem fingir que as pisadas no pé não doem e manter o arruaceiro no salão. Eles já se acostumaram à ideia de exercer seu poder com Bolsonaro no recinto.

O Congresso deveria prestar mais atenção nos sinais emitidos pelo próprio presidente. A cada vez que recebe a oportunidade de participar do jogo político, Bolsonaro demonstra que não está disposto a seguir nenhuma regra. Não será diferente daqui até 2022.

 

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