sexta-feira, 10 de setembro de 2021

Claudia Safatle - De crise em crise até as eleições

Valor Econômico

Efeitos deletérios vão ocorrer sobre os investimentos, que estão sendo adiados à espera de mais estabilidade política

Não são esperados novos desdobramentos do 7 de Setembro, na visão de fontes oficiais, porque o presidente Jair Bolsonaro não vai mudar e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, alvo da ira do presidente, não vai renunciar. Ao PT de Lula, principal adversário de Bolsonaro nas eleições de 2022, não interessa o impeachment do presidente. O presidente da Câmara, Arthur Lira, também não está considerando, por enquanto, a solução via impeachment. Portanto, “não vai acontecer nada”, avaliam as fontes, referindo-se a um desfecho da crise, em que fiquem claro vencidos e vencedores.

“Iremos, de crise em crise, até as eleições”, sintetiza um experiente assessor. “Levando a economia do jeito que der”, completa. Os efeitos deletérios vão ocorrer sobre os investimentos, cuja expansão deveria sustentar taxas de crescimento mais robusta da atividade e melhorar as condições do mercado de trabalho, mas que estão sendo adiados à espera de períodos de maior estabilidade política.

Sem poder antever os próximos passos do embate entre Bolsonaro e o STF, e o impacto destes na economia, assessores do ministro Paulo Guedes trabalham com prognósticos para até onde a vista alcança. Nessa visão, as prioridades são a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional dos Precatórios e a votação do pacote do Imposto de Renda no Senado. Constam também a discussão da reforma tributária e avanços na tramitação da reforma administrativa.

O montante dos precatórios que deveria ser pago no ano que vem é de cerca de R$ 90 bilhões, alta de quase R$ 40 bilhões se comparado ao total dos precatórios pagos neste ano. A PEC propõe o parcelamento em dez anos dos valores superiores a R$ 66 milhões. Sem o parcelamento é praticamente impossível criar o Auxílio Brasil, sucedâneo do Bolsa Família, concebido para dar impulso à campanha de Bolsonaro pela reeleição no ano que vem. Na ausência de investimentos, o novo programa social seria um motor para dar algum alento (pelo lado do consumo) à economia no próximo exercício.

O Congresso estava buscando um entendimento com o STF para um endosso deste à PEC dos Precatórios, que, diante do contencioso criado por Bolsonaro com ministros da Suprema Corte, ficará mais difícil de sair.

Já o pacote do Imposto de Renda, aprovado na Câmara a despeito de tantos problemas apontados por especialistas em tributos, depende, agora, do Senado, que tem se mostrado mais interessado em uma proposta de reforma mais ampla dos impostos.

Ao convocar seus apoiadores para as ruas, no dia 7 de setembro, o presidente Bolsonaro radicalizou o discurso de enfrentamento do STF e enterrou a eventual possibilidade de avanço nas reformas econômicas. Isso não significa que a sociedade apoie o ministro Alexandre de Moraes, que tem se pautado mais como um delegado de polícia do que como um ministro da Suprema Corte do país.

Aliás, não é de hoje que vem se formando uma visão bastante crítica do desempenho do atual STF, em que 11 ministros decidem o futuro da nação e, não raro, em resoluções monocráticas.

O momento é ruim, estressante, complicado e, se prevalecer a ideia de que é possível viver ainda por 13 meses de crise em crise, à espera das eleições, é prudente ter um plano B. A economia, quando se destrambelha, não deixa pedra sobre pedra. Os investidores que ainda estão no país fogem, a taxa de câmbio vai para o espaço, a inflação sobe para patamares impensáveis, os juros vão às alturas e o caos se estabelece.

O Brasil viveu momentos muito difíceis em 2002, quando os mercados se conscientizaram de que Luiz Inácio Lula da Silva poderia ser o sucessor de Fernando Henrique Cardoso. Foram cerca de seis meses de intensas negociações que desaguaram em um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), importante porque na ocasião o país não tinha reservas cambiais, e em torno de uma carta em que o candidato se comprometia a respeitar contratos.

Hoje o país tem reservas cambiais de sobra para bancar as contas externas em momentos de tensão e tem colchão de liquidez para se ausentar do mercado de dívida pública nessas horas. Mas ainda estamos distantes das eleições e é inacreditável que passadas quase duas décadas da vitória de Lula estejamos vivendo em um embate em que o retorno do líder sindical do passado, hoje ex-presidiário, ou de Jair Bolsonaro esteja na raiz de tamanho receio.

A Lula interessa, de fato, concorrer com um Bolsonaro que se desmancha no ar. Como citou uma fonte oficial, o impeachment interessa aos que buscam uma terceira via. Esta seria de centro, democrática, capaz de tirar o país da polarização que só beneficia a ambos — Lula e Bolsonaro.

O Brasil precisa urgentemente de bons governos que, para começo de conversa, governem. Bolsonaro não mudou em nada seu jeito de atuar. Ele está sempre no palanque. Nunca assumiu a Presidência da República!

 

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