quinta-feira, 2 de setembro de 2021

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

Estagnação, desemprego, inflação

O Estado de S. Paulo

O balanço econômico do primeiro semestre é mais uma façanha liderada por Jair Bolsonaro

Estagnação, desemprego elevado, inflação disparada e cinto apertado resumem o balanço econômico do primeiro semestre – mais uma façanha liderada pelo presidente Jair Bolsonaro. Os poucos sinais de vigor percebidos no começo do ano logo se esgotaram. Num país desgovernado e em tensão permanente, os negócios avançaram 1,2% no primeiro trimestre, recuaram 0,1% no segundo e ficaram apenas 1,1% acima do patamar dos três meses finais de 2020. Se o crescimento chegar perto de 5% neste ano, o País apenas sairá do buraco onde afundou no ano passado, quando foi atingido pelo primeiro choque da pandemia. Não há, por enquanto, como prever nada melhor que 2% em 2022, e até essa aposta já é considerada otimista por vários analistas do mercado.

Com crescimento zero, o consumo das famílias mostra de forma ostensiva a condição da maior parte dos brasileiros no segundo trimestre. Para aqueles em pior situação, o auxílio emergencial só foi retomado a partir de abril, depois de um mergulho na miséria no período de janeiro a março. O drama foi menor para quem conseguiu substituir produtos e recompor suas compras sem grande redução de bens essenciais. Nem todos conseguiram. Com orçamento curto e rígido, as pessoas mais pobres só podem mesmo cortar despesas, quando a cesta habitual de consumo se torna inacessível. O semestre terminou com 14,4 milhões de desempregados, inflação próxima de 9% em 12 meses e enormes aumentos acumulados nos preços da comida, do gás e da energia.

Dos três grandes setores, só o de serviços, o último a entrar em recuperação no ano passado, cresceu no segundo trimestre, com ganho de 0,7%. A produção da indústria recuou 0,2% e a da agropecuária diminuiu 2,8%, afetada pela estiagem mais severa em nove décadas. Especialistas atribuem a seca no Brasil e desastres meteorológicos em outras partes do mundo a mudanças causadas pela ação humana.

Governos discutem metas mais ambiciosas de combate ao aquecimento global e o assunto está na agenda de grandes empresas. O discurso antiecológico do presidente Bolsonaro e de seus ministros está mais contido, mas a política pró-devastação defendida por mais de dois anos continua produzindo efeitos. Grandes queimadas ainda se multiplicam, assustando o mundo e prejudicando a imagem do agronegócio brasileiro.

Apesar da quebra de safra de vários produtos, o agronegócio continua como principal pilar do superávit no comércio de mercadorias. As exportações do setor, juntamente com as da indústria mineral, sustentaram as vendas externas. Principalmente graças a isso as exportações de bens e serviços foram no segundo trimestre 9,4% maiores que no primeiro. É muito bom, obviamente, o País dispor de um agronegócio tão eficiente e competitivo, mas é muito ruim depender tanto desse setor.

A indústria de transformação andou muito mal nos últimos dez anos, perdeu poder de competição e se tornou menos importante no comércio exterior. Seus números só impressionam quando comparados com os de 2020, derrubados pela pandemia. O País precisa de uma política de revigoramento industrial, com modernização e ampliação da capacidade produtiva, mas isso envolve planejamento, algo estranho ao universo do presidente e de sua equipe econômica.

Condição essencial para o crescimento firme e duradouro, o investimento produtivo tem ido mal. No segundo trimestre, foi 3,6% menor que no primeiro e equivaleu a 18,2% do PIB. Essa relação raramente superou 20% desde o ano 2000. Uma taxa próxima de 25% e razoavelmente sustentada poderia proporcionar ao Brasil um crescimento típico de um emergente. Mas isso dependerá de um melhor manejo das finanças públicas, de uma participação maior e mais eficiente do capital privado na infraestrutura e de um ambiente mais favorável à expansão empresarial. Também seria preciso cuidar do capital humano, mas para isso seria indispensável uma política educacional de país civilizado, algo incompatível com os padrões bolsonarianos. Nas condições atuais, nada mais normal que uma economia medíocre ou abaixo disso.

Na conta de luz, o preço da crise

O Estado de S. Paulo

Energia fica mais cara para conter consumo e reduzir risco de racionamento

O aumento da conta de luz, com a criação de uma taxa extra chamada de “bandeira escassez hídrica”, acompanhado de novos apelos das autoridades para que a população adote medidas de redução do consumo de energia elétrica, é a primeira providência de maior efeito decidida pelo governo federal para tentar reduzir o risco de racionamento. A medida está na linha sugerida pelos especialistas para o enfrentamento da crise energética decorrente da redução recorde dos níveis dos reservatórios das usinas hidrelétricas por causa da pior crise hídrica enfrentada pelo País em 91 anos. Mas terá outras consequências além das esperadas pelas autoridades no abastecimento de energia. Alimentará uma inflação já alta e pressionará os orçamentos das famílias. A pressão será tanto maior quanto menor a renda familiar.

Espera-se que, embora obviamente tardia, a medida produza o impacto previsto pelas autoridades, especialmente alguma redução do consumo, o que reduziria os riscos de racionamento ou até de apagões – que, alertam os especialistas, não estão afastados. A melhor solução, infelizmente, não depende mais de ações de autoridades e consumidores em geral, domésticos ou empresariais. Depende da normalização do regime de chuvas nas principais regiões produtoras.

O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) – responsável pela coordenação e controle da operação das instalações de geração e transmissão de energia elétrica no Sistema Interligado Nacional (SIN) e também dos sistemas isolados – já admitiu que o risco de ocorrência de apagões pontuais aumentará se não houver oferta adicional de energia a partir deste mês.

A nova bandeira tarifária resultará em aumento a ser pago pelo consumidor. Desde a última quarta-feira, o custo adicional embutido nas contas de luz, que era de R$ 9,49, é de R$ 14,20 a cada 100 quilowatts-hora (kWh) consumidos. O aumento vigorará até 30 de abril e, nos cálculos do Ministério de Minas e Energia, resultará em aumento médio de 6,78% para consumidores residenciais e pequenas indústrias.

Calcula-se que, apesar de oneroso para os consumidores, o valor da nova bandeira é menor do que muitos calculavam como necessário para enfrentar os novos custos, decorrentes do uso de energia mais cara, gerada em usinas termoelétricas. Há advertências de que o que se deixou de aumentar agora – com impactos sobre uma inflação que já é estimada em 8% no ano – terá de ser compensado em 2022, o que estenderia o impacto da crise atual.

O anúncio do aumento veio acompanhado de outro, de um programa de incentivo à redução do consumo para os consumidores atendidos pelas distribuidoras de energia, que são basicamente os residenciais. Aquele que economizar entre 10% e 20% nos próximos meses terá desconto de R$ 0,50 por kWh consumido. Quem economizar menos que 10% não terá bônus e quem reduzir o consumo em mais de 20% não receberá prêmio adicional. Como mostrou reportagem do Estado, no entanto, o bônus de um consumidor será coberto na conta de luz dos demais.

Para as indústrias, já está em vigor o programa de incentivo do deslocamento voluntário da produção para fora do horário de pico.

O valor do benefício para os consumidores talvez seja insuficiente para produzir resultados significativos. Mais importante talvez seja informar o consumidor da gravidade do quadro de geração de energia elétrica e convencê-lo a tomar medidas que reduzam o consumo, não apenas para reduzir suas despesas, como, sobretudo, para afastar o risco de racionamento e de apagões.

O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, em pronunciamento por rede obrigatória de TV, observou que, “para aumentar a segurança energética e afastar o risco de falta de energia no horário de maior consumo, é necessário que a administração e o consumidor participem de um esforço inadiável de redução de consumo”. Ou seja, o esforço deve ser coletivo.

O triste fim da ‘guerra interminável’

O Estado de S. Paulo

Planos de vencer o jihadismo com diplomacia e inteligência parecem 'wishful thinking'

Após 20 anos, a guerra mais longa dos EUA chegou ao fim. A contragosto, os aliados dos americanos cumpriram o prazo imposto por Joe Biden (a “linha vermelha” do Taleban). No dia 30, uma a uma as últimas aeronaves de França, Alemanha, Reino Unido e finalmente dos EUA decolaram de Cabul, deixando para trás um Afeganistão sob o controle do Taleban – exceto por uma pequena força de resistência no norte e insurgentes do Estado Islâmico.

A Casa Branca insiste que não tinha opção e que a evacuação foi um sucesso. Ambas as afirmações são desonestas.

Mesmo antes do avanço Taleban, Biden insistiu em uma saída rápida, completa e incondicional, apesar das recomendações de estrategistas de manter uma força residual; insistiu em abandonar a base de Bagram, de onde as forças aéreas poderiam reprimir o avanço Taleban, garantir zonas e corredores de segurança e coordenar uma evacuação mais segura. Segundo o Washington Post, às portas de Cabul, o Taleban teria oferecido aos EUA a possibilidade de fornecer segurança na cidade, mas Biden disse que o aeroporto era suficiente.

O resultado foi não só a morte de 13 militares americanos e dezenas de afegãos em um atentado terrorista do Estado Islâmico local, mas, como o Pentágono admite, centenas de americanos (há quem fale em milhares) e dezenas de milhares de aliados afegãos deixados para trás, à mercê do Taleban.

Até o momento, ninguém na sua administração admitiu qualquer erro, muito menos se desculpou. Durante a evacuação, as lideranças americanas seguiram dizendo que haveria tempo para avaliar responsabilidades. Esse tempo chegou.

A evacuação é alvo de críticas de republicanos e muitos democratas. “Não se termina uma guerra se rendendo”, disse a deputada republicana Liz Cheney, resumindo o sentimento de muitos americanos. “Não se torna os EUA seguros deixando americanos atrás das linhas inimigas, traindo nossos aliados e empoderando nossos inimigos. Isso não é terminar uma guerra. Isso é perdê-la.”

O fracasso, é verdade, foi resultado de escolhas erradas de múltiplos titulares da Casa Branca e de ambos os partidos, baseadas na falsa premissa de que a única escolha era entre o controle total do Afeganistão ou uma retirada total.

Em alguns aspectos a situação é semelhante à dos anos 90. A retirada dos soviéticos e depois dos americanos foi seguida por uma guerra civil e a ascensão do Taleban, que transformou o país em um santuário para grupos jihadistas como a Al-Qaeda. Mas em alguns aspectos é pior: o Taleban controla mais territórios, está mais bem armado (sobretudo com mais de US$ 80 bilhões em arsenal americano) e surgiram antagonistas ainda mais extremistas, como o Estado Islâmico. Como advertiu o conselheiro de segurança paquistanês Moeed Yusuf, o resultado pode ser mais ondas de refugiados, outro vácuo de segurança a ser explorado por terroristas e mais uma crise humanitária.

O Taleban faz acenos de moderação. Diz que permitirá àqueles com vistos internacionais deixarem o país, que respeitará os direitos das mulheres e que não retaliará os aliados. Acredita quem quer. Desconfia quem tem juízo.

Neste momento, jihadistas do Iêmen à Somália, do Paquistão à Nigéria celebram a derrota da aliança ocidental e planejam a tomada do poder em seus países. Ante o fracasso dos militares americanos de prever a curtíssimo prazo o colapso do regime afegão, seus planos de vencer o jihadismo a longo prazo com um misto de diplomacia e inteligência contraterrorista parecem puro wishful thinking. Os aliados estão desapontados; os adversários, encorajados; e o mundo, confuso. Ninguém esperava que as “guerras intermináveis” se encerrassem com uma “paz interminável”, mas ninguém imaginava que terminariam assim: com uma teocracia selvagem com plenos poderes e a restauração do Afeganistão como uma potencial incubadora de terroristas. 

A guerra, que começou com um atentado contra os americanos em Nova York, terminou com um atentado contra os americanos em Cabul. É um tétrico presságio de que as “guerras intermináveis” estão longe de acabar.

País estagnado

Folha de S. Paulo

Como atestam números do PIB, economia prossegue entre recessão e mediocridade

estagnação mostrada pela economia brasileira no segundo trimestre não altera em demasia o quadro esperado para o restante deste 2021. Ainda é provável que o Produto Interno Bruto, depois de cair 0,1% entre abril e junho, feche o ano com expansão próxima a 5%, o que consolidará a recuperação das perdas da pandemia.

Nessa métrica restrita, o país não destoa tanto do padrão mundial, mas uma abordagem mais ampla, levando em conta as perdas de emprego e renda, põe em evidência enormes dificuldades e incertezas.

O resultado pífio do trimestre não ficou muito abaixo das expectativas. Esperava-se a retração na agropecuária, que chegou a 2,8%, em decorrência do impacto do clima adverso em safras importantes como milho, cana e café.

Depois de um desempenho favorável no ano passado, a produção manufatureira também caiu (2,2%), em parte por causa de percalços notáveis em algumas cadeias produtivas, caso do setor automotivo.

A alta modesta dos serviços (0,7%), por sua vez, está associada a restrições decorrentes do agravamento da crise sanitária.

Pela ótica da demanda, houve parada do consumo e queda expressiva dos investimentos. As transações com o exterior, impulsionadas pelas exportações de matérias-primas, evitaram o pior.

Com o relaxamento de quarentenas e limites ao comércio e a outras atividades, espera-se aceleração no segundo semestre, com consequências positivas para a geração de emprego e a renda das famílias.

A esse respeito, de fato, o dado mais recente apontou queda na taxa de desocupação (para 14% no trimestre encerrado em junho, com ajuste para a sazonalidade, ante 14,3% na leitura de um mês antes).

Mesmo assim, a massa salarial ainda permanece 6% abaixo do patamar anterior à pandemia, enquanto a inflação —que deve chegar a ao menos 8% neste ano— castiga sobretudo os mais pobres, dada a concentração em itens de consumo essencial como alimentos, combustíveis e energia.

Pior, com o agravamento das incertezas sobre o rumo da política econômica, que tem reforçado a escalada da inflação e dos juros, e da crise hídrica que ameaça o fornecimento de energia, as projeções para 2022 têm piorado e já caem abaixo de 2% —antes mesmo que se possam quantificar os impactos advindos dos ataques às instituições por parte de Jair Bolsonaro.

Não surpreende nesse quadro caótico que consumidores e empresas se retraiam, afastando o otimismo que poderia derivar do avanço da vacinação nas últimas semanas.

Por novos e velhos motivos, o país prossegue entre a recessão e a mediocridade econômica, como ocorre já há uma década.

A saída da estadista

Folha de S. Paulo

Alemanha prepara sucessão de Angela Merkel, após gestão bem-sucedida de 16 anos

Se há um líder político que se consagrou como estadista nos últimos anos, esse líder é a chanceler alemã Angela Merkel. Ela soube como ninguém conciliar o pragmatismo com o respeito a princípios civilizacionais, como se viu na crise dos refugiados de 2015-16.

Enfrentou a Covid-19 com competência e transparência, recorrendo sempre à abordagem científica, com a qual, na condição de química quântica, está plenamente familiarizada. Até pela ausência de concorrentes à altura, tornou-se a principal líder da União Europeia.

Ao longo de 16 anos no poder, foi capaz de capitalizar tudo isso em prestígio pessoal. Trata-se de uma política incomumente popular, não apenas na Alemanha como em vários outros países europeus.

Paradoxalmente, é considerável a probabilidade de Merkel ver sua agremiação, a aliança conservadora CDU/CSU, naufragar nas eleições marcadas para o próximo dia 26.

Que a chanceler deixaria o cargo já era sabido. Faz um bom tempo que a líder anunciou a intenção de aposentar-se ao término do atual mandato, mas, diante do sucesso que é sua administração, pretendia entregar o posto a um sucessor de seu próprio partido.

Armin Laschet, o candidato designado, contudo, vem caindo nas pesquisas. Divisões internas na aliança e uma forte propensão a cometer gafes contribuem para isso.

Quem ganha pontos é o candidato do SPD, o partido de centro-esquerda, Olaf Scholz. A esta altura, só se pode prever que a Alemanha terá um governo de coalizão.

Uma eventual vitória de Scholz não chegaria a configurar uma derrota pessoal para Merkel. O social-democrata não é, afinal, um oposicionista radical que vive de fustigar a imagem da chanceler.

Muito pelo contrário, parte do prestígio de Scholz advém do fato de ele integrar a atual coalizão governista, na qual ocupa o posto de vice-chanceler e ministro das Finanças. Seu plano de resposta à pandemia, que atenuou os efeitos do desemprego e da recessão, é visto como um caso de sucesso com bom apelo eleitoral.

Qualquer que seja o resultado do pleito, a Alemanha, diferentemente de outros países ocidentais, não corre maiores riscos de sucumbir ao populismo radical.

Não se espera que o partido de extrema direita, a Alternativa para a Alemanha (AfD), tenha uma grande votação, e são praticamente nulos os riscos de que venha a ser convidado para integrar o governo.

Pioram as previsões de crescimento de 2022

Valor Econômico

Inflação e o aumento de juros refrearão o baixo desempenho vislumbrado, com sobressalto adicional de eleições polarizadas com um presidente que não aceita de antemão seu resultado

O Produto Interno Bruto teve o seu pior desempenho do ano no segundo trimestre, com queda de -0,1%. As previsões dos economistas não distavam muito disso (eram positivas em 0,2%) e o certo é que o comportamento da economia será melhor no resto do ano. Quanto melhor já é objeto de revisão, com as estimativas encolhendo de números acima de 5,5% para mais perto de 5%, ou algo ligeiramente abaixo disso. A principal mudança, porém, diz respeito a 2022. O patamar de 2% começa a ser erodido e as previsões caminham para 1,5% ou menos. Se estiverem certas, não haverá divergência com a tônica dominante pós-recessão de 2016: será mais um ano medíocre.

A perda de fôlego do segundo trimestre era amplamente esperada, após um vigoroso repique da covid-19 e um recorde de mortes diárias. Praticamente todos os segmentos tiveram pior comportamento. No caso da oferta, a reação dos serviços, impulsionada pelo aumento da vacinação, exibiu alta de 0,7%. Do lado da demanda, o consumo das famílias ficou estável pelo segundo trimestre. O consumo do governo, no entanto, subiu 0,7%.

As perspectivas para o resto do ano são desfavoráveis. A crise hídrica pode evoluir para um racionamento que atingiria todo o setor produtivo, além de piorar sobremaneira as condições para o cultivo agrícola e a recuperação das pastagens no fim do período seco. Ainda é uma incógnita os efeitos da variante Delta em uma população em que apenas 30% estão totalmente imunizados. No Rio de Janeiro, os hospitais voltaram a ficar totalmente ocupados, mas no restante do país a tendência é a de volta à normalidade.

A recuperação dos serviços, forte naqueles setores mais atingidos pela pandemia por depender de interação social - aumento de 2,1% contra o primeiro trimestre, nas outras atividades de serviços - deve continuar puxando o crescimento no caso da oferta.

A indústria de transformação, por outro lado, tem duros obstáculos pela frente. O setor recuou 2,2% no trimestre, acentuando um movimento negativo de 0,4% no primeiro. A interrupção das cadeias de produção globais inferniza a indústria automobilística e outros segmentos com a falta de semicondutores. A normalização do fornecimento demorará mais do que o inicialmente previsto e só será atingida em 2022. A alta das commodities trouxe simultaneamente à menor produção um aumento significativo de custos.

No caso da demanda, o consumo das famílias, com peso de quase dois terços no PIB, não reagiu com vigor. No ano nada cresceu e no acumulado de quatro trimestres contra idêntico período anterior amargou a quinta queda consecutiva. Há melhorias: o emprego formal e informal crescem - mais este que aquele - mas com remuneração em queda. Os salários de admissão encolheram e a inflação em alta atinge com intensidade os alimentos, o maior fator de gastos dos trabalhadores de baixa renda (um terço da mão de obra ganha até dois salários mínimos). Por outro lado, o auxílio emergencial deve acabar em breve e o plano do governo de ampliar o Bolsa Família ficou até agora no papel, por falta de dinheiro.

Um impulso positivo que tende a perdurar ao longo dos próximos meses vem das exportações líquidas. A megadesvalorização do dólar favoreceu os bens exportáveis e encareceu os importados - houve avanço de 9,4% nas vendas externas e queda de 0,6% nas compras. Há sinais de que o pico do crescimento das economias avançadas e da China podem ter ficado para trás. Ainda assim, como é o caso dos EUA, a economia continuará crescendo bem acima de sua tendência de longo prazo em 2022.

A covid-19 ainda pode pregar peças e talvez por isso a taxa de poupança siga aumentando - bateu o recorde, com 20,9%, salto de 5,2 pontos percentuais em relação ao primeiro trimestre. Ela somou R$ 447,3 bilhões, R$ 180 bilhões a mais do que no mesmo período de 2020. As incertezas econômicas continuam retendo o rumo desse dinheiro para o consumo.

Já os investimentos deram um salto menor, de 15,1% para 18,2%, ainda distante do pico da série, de 21,2% do PIB. A acumulação de estoques, que catapultou o PIB do primeiro trimestre, inverteu o movimento. A variação positiva de R$ 84 bilhões deu lugar a uma negativa de R$ 24,2 bilhões.

Com o crescimento do ano já dado pelo carregamento estatístico, a dúvida se transfere a 2022. Inflação e o aumento de juros refrearão o baixo desempenho vislumbrado, com sobressalto adicional de eleições polarizadas com um presidente que não aceita de antemão seu resultado. O cenário é ainda mais incerto.

 

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