sexta-feira, 15 de outubro de 2021

Bruno Boghossian – O calibre e os alvos de Ciro

Folha de S. Paulo

Estratégia só funciona se pedetista mostrar que pode vencer rivais nos dois turnos

Ciro Gomes deu um passo determinante em sua estratégia para 2022. O pedetista percebeu que ganha mais atenção quando ataca Lula do que nas críticas que faz a Jair Bolsonaro. Ainda que tente encontrar um espaço no eleitorado entre os dois, ele já decidiu aumentar o calibre dos tiros disparados contra o petista.

Depois de protagonizar uma sequência de bate-bocas com Lula e Dilma Rousseff, Ciro disse que pretendia "alertar para o risco" que seria a volta do petista ao poder. Num vídeo divulgado nesta quinta (14), o ex-governador do Ceará afirmou que vai "combater os erros do PT e os erros de Bolsonaro", mas insinuou que Lula está a postos para reeditar escândalos de corrupção.

Os movimentos de Ciro são 50% táticos e 50% viscerais. O tom hostil a Lula reflete as mágoas acumuladas em décadas de relações turbulentas na esquerda, mas é também uma aposta do ex-governador para absorver um sentimento antipetista e desbancar Bolsonaro.

A dose da investida mais recente pode criar algumas dificuldades nesse caminho. Entre eleitores de esquerda, Lula não é uma divindade inatacável, mas o tom do pedetista certamente aumenta sua rejeição numa fatia considerável desse grupo, simpática ao ex-presidente.

Com isso, o potencial de crescimento de Ciro deve se concentrar cada vez mais num nicho de eleitores de direita e centro-direita, que pode ficar congestionado por nomes como João Doria ou Eduardo Leite, Sergio Moro e o próprio Bolsonaro.

Outro problema é que um embate com Bolsonaro e Lula pode não ser suficiente. Numa disputa peculiar, com líderes com altas taxas de conhecimento e rejeição, um terceiro candidato precisaria mostrar capacidade de derrotar ao menos um dos dois —algo que Ciro ainda não tem.

O pedetista só deve conquistar votos na esquerda se mostrar que pode ultrapassar Bolsonaro no primeiro turno e só deve ganhar eleitores na direita se convencê-los de que pode bater Lula no segundo. O espaço de Ciro ainda é estreito.

 

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