terça-feira, 23 de novembro de 2021

Fabio Graner - A queda de braço sobre o PIB de 2022

Valor Econômico

Juro maior restringe investimento, diz Rafaela Vitória

O Ministério da Economia está em uma verdadeira batalha de expectativas com o mercado em torno do cenário para o Produto Interno Bruto (PIB) para o ano que vem. Enquanto o time do ministro Paulo Guedes fez uma tímida revisão em sua previsão de crescimento, de 2,5% para 2,1% em 2022, a mediana coletada no Focus já caiu para 0,7% e muitos enxergam risco de recessão no ano eleitoral.

O momento lembra o que ocorreu em meados do ano passado, quando o boletim Focus migrou para projeções de quedas maiores que 6%, enquanto o bloco P da Esplanada dos Ministérios sustentava que a queda seria de 4,7%. A área econômica levou a melhor e o PIB fechou 2020 com recuo de 4,1%.

É notório que o nível de atividade está perdendo ritmo. Assim, a questão é o tamanho da desaceleração daqui para frente e se haverá recessão. A resposta certa vale muito, mas ninguém sabe com certeza o que vem adiante.

No Ministério da Economia, o cenário positivo é baseado em três fatores. O principal deles é a expectativa de que, como a pandemia está ficando para trás no Brasil, há tendência de retomada da economia informal, sobretudo no setor de serviços, que representa 63% do PIB.

Subsecretário de Política Econômica, Fausto Vieira destacou à coluna que a taxa de participação no mercado de trabalho (quantas pessoas trabalham ou procuram emprego) está bem abaixo da média histórica, por causa do choque pandêmico. Na visão dele, como o Brasil é um país relativamente pobre, o cenário básico é de que esse indicador deve ir se normalizando e ajudando a aumentar o PIB.

“Esse é um dos motores que estamos vendo. Mesmo com produtividade mais baixa que o formal, a retomada do emprego informal significa aumento de produção”, afirmou Vieira, reforçando a projeção de que nos próximos 12 meses serão criados 3,5 milhões de postos informais e mais 1,5 milhão de formais.

Outro fator que o governo aposta é o aumento nos investimentos, por fatores como concessões de saneamento e outras de infraestrutura, leilão de 5G, entre outros. O ministério, no entanto, não diz qual o volume de investimentos esperados para o ano que vem, que é o que afetará o PIB. O terceiro fator é o bom desempenho da balança comercial, reflexo de um cenário externo ainda positivo.

Ainda que reconheça a incerteza que há no cenário e fatores que jogam contra o crescimento, Vieira não acredita na hipótese de recessão no resultado do ano nem mesmo a “recessão técnica”, marcada por dois trimestres consecutivos de queda, como algumas casas no mercado já sinalizam. “Temos fatores favoráveis, amarras estão sendo retiradas. Além disso, o mundo deve crescer 4%, como a gente cresce zero? Não faz sentido”, disse.

Outra fonte do alto escalão da Economia destaca que a visão de crescimento da pasta já leva em conta o aperto de juros e a alta da inflação, que prejudicam a atividade no curto prazo. Sem isso, no entender dessa fonte, a economia poderia rodar acima de 3% no ano que vem, dado o nível de ociosidade.

A economista-chefe do Banco Inter, Rafaela Vitória, reconhece que o ambiente é de elevada incerteza. “É difícil falar quem está certo e quem está errado”, disse. Para ela, os números do governo soam como muito otimistas até para quem tem viés mais positivo. Ela trabalha com uma alta do PIB de 0,5% e concorda que o mercado de trabalho, por meio do setor de serviços, é um dos principais motores de expansão.

Além disso, destaca a demanda global robusta, que, se por um lado mantém a pressão na inflação, por outro acaba impulsionando a economia local.

Segundo Rafaela, o principal motivo de cautela é a trajetória dos investimentos. Ainda que alguns setores devam ter boa performance, já começa a haver postergação de projetos com o quadro macroeconômico mais adverso, devido à alta dos juros. “O juro maior vai restringir o investimento e em parte o consumo das famílias, por mais que a renda tenha recuperação com o mercado de trabalho.”

Ela pondera ainda que, mesmo com algum crescimento, a “sensação térmica” no país tende a ser mais negativa, pois enquanto setores como serviços devem crescer, indústria, varejo e outros devem cair.

O presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon) e professor da PUC-SP, Antônio Corrêa de Lacerda, trabalha com um resultado zero para o PIB de 2022. “Apesar dos argumentos da equipe econômica, não há vetores para a economia crescer”, disse, destacando a fraqueza do mercado de trabalho, com inflação alta e queda na renda.

“Nos investimentos, a subida dos juros complica mais o cenário”, afirmou, lembrando que ainda há fechamentos de empresas, encarecimento do crédito e outros problemas. “Há também um quadro de grande incerteza, com crise institucional e confusão de declarações. Tudo isso limita o crescimento da economia, que também não terá ajuda de efeito estatístico como ocorreu em 2021”, completou. Ele lembra também que o setor público não vai ajudar, com os investimentos nas mínimas.

Professor da Universidade Federal do ABC, Fabio Terra considera que a previsão de alta do PIB pelo governo mostra um excesso de otimismo que não tem correspondência, em especial pelo lado da demanda. Ele lembra que a renda da população está fragilizada e boa parte só consegue dinheiro por transferências do Estado, o que prejudica o consumo.

Para ele, a expectativa de criação de 5 milhões de postos de trabalho soa exagerada. “Dificilmente o país consegue fazer isso só pela melhora na capacidade de oferta [com a abertura do pós-pandemia]. Além disso, mesmo que haja esse aumento de oferta de serviços, é preciso que seja validado pela demanda”, disse, listando outras dificuldades, como o aumento no custo do crédito.

O economista também aponta que os investimentos são prejudicados pela forte alta dos juros, além de fatores como a incerteza eleitoral e discussões ainda indefinidas, como o Auxílio Brasil. “Acho que a economia caminha para alguma estagnação e até ligeira recessão.”

Mesmo que as projeções da SPE estejam certas e os demais economistas errados, a realidade é de se lamentar. Um crescimento de 2,1% é insuficiente para um país mergulhado na pobreza e aquém da capacidade produtiva. Como melhorar essa situação e sustentar um desempenho mais forte do PIB por anos segue sendo o principal desafio do país.

 

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