terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Andrea Jubé - Apoio do PSB implica “PAC do futuro”

Valor Econômico

Pacto de economia verde demandaria R$ 500 bi ao ano

Indicado ao Oscar de Melhor Documentário em 2011, “Lixo Extraordinário” apresentou ao mundo dois fenômenos: o trabalho do artista plástico Vik Muniz em um grande aterro sanitário na Baixada Fluminense; e o líder dos catadores de material reciclável do local, Sebastião Carlos dos Santos.

Conhecido como Tião Santos, ele fundou e se tornou o principal porta-voz da Associação de Catadores de Material Reciclável do Jardim Gramacho, em Duque de Caxias (RJ). Com a repercussão do filme, ele ganhou notoriedade, tornou-se consultor do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e palestrante na área de economia verde.

Onze anos depois da fama e na esteira dos debates da Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP-26), Santos não tem diploma de economista, mas sabe fazer contas, talvez mais do que muitos gestores.

“A gente gasta mais de R$ 100 bilhões pra enterrar R$ 20 bilhões”, denunciou. “São R$ 100 bilhões gastos com transporte, coleta e varrição e enterrar o material reciclável e R$ 20 bilhões é o que é enterrado: a gente gasta pra enterrar o que podia virar emprego e renda”, criticou.

Santos tornou-se um “player” a quem o governo deveria dar ouvidos. Para abrir espaço fiscal, o governo legalizou o adiamento das dívidas (precatórios). Em uma realidade (utópica?) de economia verde, o lixo seria tratado como investimento.

Segundo Santos, a cadeia produtiva da reciclagem gera quase dois milhões de postos de trabalho diretos e indiretos, reciclando apenas 2% dos resíduos sólidos. “Mas o potencial de reciclagem do Brasil é de 40%”, alertou, na semana passada, no ato em que assinou a ficha de filiação ao PSB.

A opção partidária de Tião Santos é uma derrota simbólica para o PT, já que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é o político com laços mais estreitos junto aos catadores, com os quais confraterniza todos os Natais. Santos tem afirmado, entretanto, que não pretende disputar cargo eletivo no ano que vem.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos, que previa o fim dos lixões no país até 2014, até agora fracassou. Mais da metade dos municípios brasileiros ainda descarta o lixo de forma irregular: 2.868 cidades (51,5%) ainda não regularizaram o serviço e 39,8% dos resíduos não têm destinação correta. Os dados são de 2020 e integram o Panorama Anual da Associação Brasileiras das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), antecipado ontem pelo Valor.

Incentivar e aprimorar a gestão dos resíduos sólidos é apenas uma das 30 ações a serem implementadas até 2030, contempladas no “Green New Deal Brasil”, idealizado pelo deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ) e elaborado com uma equipe de economistas, coordenada pelo professor de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Carlos Eduardo Young.

Segundo o estudo, eliminar 100% dos lixões e reabilitar essas áreas, implantando integralmente o Plano Nacional de Resíduos Sólidos, demandaria R$ 1,8 bilhão ao ano, nos próximos nove anos.

As 30 ações para transformar o Brasil em uma economia justa e sustentável são distribuídas em cinco eixos: infraestrutura, cidades, uso do solo e florestas, transição econômica e sustentável, mudanças políticas e normativas.

Contemplam, entre outras: elevar a participação das energias renováveis (salvo a hídrica) para 23% da matriz; recuperar e expandir as ferrovias; zerar o déficit habitacional com moradias sustentáveis; universalizar o acesso aos quatro serviços de saneamento (água, colega de esgoto, tratamento de resíduos e drenagem); promover a agropecuária de baixo carbono, elevando em quatro milhões de hectares a área sob sistema de integração lavoura-pecuária-florestas e restaurando 15 milhões de hectares de pastagens degradadas; garantir empregos verdes para os desempregados, oferecendo oportunidades pela execução das 30 ações.

Num contexto de pacto global pela redução climática, a implantação do pacote levaria o país a emitir 1 gigatonelada de gás carbônico equivalente a menos por ano. Isso equivale à metade do que o Brasil emitiu em 2020: 2.160.663.755 de gás carbônico equivalente.

A implantação das 30 ações também poderia gerar 9,5 milhões de postos de trabalho, sendo 5,4 milhões em postos formais, ao salário médio de R$ 26,6 mil por ano. Molon registra que na “economia cinza”, o salário médio nos postos formais é de R$ 22 mil.

A implementação plena do programa custaria cerca de R$ 500 bilhões, ou 6,9% do PIB.

“É um PAC do Futuro”, resume Molon, traduzindo a conta: custaria cerca de R$ 100 bilhões a mais que o investido por meio do PAC2, dos governos petistas, algo em torno de R$ 400 bilhões/ano. “Lá atrás, sustentabilidade era gasto, hoje é o caminho para quem quer ganhar dinheiro. O Brasil tem tudo para ser o líder mundial da economia verde”.

Molon, que integra a Executiva Nacional do PSB - está à frente da Secretaria de Relações Internacionais -, acrescenta que a plataforma é tão relevante que foi encampada como programa partidário. O presidenciável que desejar a aliança com o PSB em 2022 - por enquanto, o nome mais provável é Lula -, terá de se comprometer com a implantação do projeto.

O programa indicou potenciais fontes de financiamentos para a execução das 30 ações. Uma delas seria a aplicação do valor máximo da Cide sobre combustíveis fósseis, que poderia gerar R$ 100 bilhões.

Há questões sensíveis ao agronegócio, como o fim dos subsídios aos agrotóxicos, calculado em R$ 16 bilhões e a atualização da alíquota do ITR, estimada em R$ 18 bilhões.

Uma possível fonte, mas já descartada pelo relator da reforma do Imposto de Renda, senador Ângelo Coronel (PSD-BA), seria a tributação de lucros e dividendos, calculada em R$ 59 bilhões.

Embora Molon cite o potencial do Brasil para “líder em economia verde”, um estudo do banco suíço Lombard Odier, com a Universidade de Oxford, sobre países propensos à “reconstrução mais verde” de suas economias, mostrou que o Brasil caiu vários níveis nos índices de complexidade verde.

Andrea Jubé

 

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