quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

Bernardo Mello Franco: Alianças e botinadas

O Globo

Em setembro de 2018, Geraldo Alckmin jurou que nunca se aliaria ao PT. “Jamais terão meu apoio para voltar à cena do crime”, atacou. Três anos depois, ele parece ter mudado de ideia. Quer ser candidato a vice-presidente na chapa de Lula.

O petista já ensaia o discurso em defesa da dobradinha. “Não importa se no passado fomos adversários, se trocamos algumas botinadas, se no calor da hora dissemos o que não deveríamos ter dito”, penitenciou-se, na noite de domingo.

Lula custou a aceitar que não chegaria ao Planalto só com os votos da esquerda. Depois de três derrotas seguidas, mudou a estratégia e se juntou a um grande empresário. A guinada abriu caminho para a vitória de 2002.

No poder, ele se aproximou de velhos desafetos, como José Sarney e Fernando Collor. Na disputa municipal de 2012, radicalizou de vez no pragmatismo. Foi à casa de Paulo Maluf e tirou a célebre foto em troca do apoio a Fernando Haddad.

Alianças heterodoxas fazem parte da política. A chapa com José Alencar irritou setores da esquerda, mas ajudou Lula a subir a rampa. A foto com Maluf teve saldo mais controverso. Haddad ganhou um minuto e meio de TV, mas passou a campanha inteira explicando as novas companhias.

Alckmin não é Maluf. Nunca bajulou a ditadura nem enriqueceu nos cargos que ocupou. Ainda assim, as botinadas do passado voltarão à tona nos próximos meses. Lembrá-las é dever da imprensa e direito do eleitor — se isso desagradar aos novos aliados, pior para eles.

O ex-governador já se prepara para justificar a aliança com o antigo rival. No domingo, ele disse que o país precisa de “união” e “grandeza política”. É um argumento razoável. Na última eleição, os democratas se dividiram e a extrema direita chegou ao poder.

O bolsonarismo sabe que a formação de uma frente ampla pode ajudar Lula a vencer no primeiro turno. Por isso, já começou a torpedear a união com Alckmin. O problema é que o capitão está sem moral para atacar alianças alheias. Em 2018, ele definia o Centrão como a “escória da política”. Em 2022, vai reunir a turma toda em seu palanque.

 

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