quarta-feira, 28 de abril de 2021

Vera Magalhães - Caem todas as máscaras

- O Globo

Os ministros Paulo Guedes e Luiz Eduardo Ramos merecem ser convocados para depor na finalmente instalada CPI da Covid só com base nas declarações estarrecedoras que, sem saber que eram gravados, emitiram na reunião desta terça-feira do Conselho Nacional de Saúde Suplementar.

Num dos ataques verborrágicos que sempre tem e, depois de flagrado, diz ter sido mal interpretado, o ministro da Economia do Brasil diz, numa só tacada, que os chineses inventaram o coronavírus (teoria conspiratória sem comprovação), mas produziram vacinas ruins, piores que as dos americanos, para combatê-lo.

A vacina chinesa CoronaVac é uma das poucas de que os brasileiros dispõem para se proteger do vírus. Só está disponível por ação do governo de São Paulo e do Instituto Butantan, porque o governo a que Guedes serve boicotou sua aprovação e disse por muito tempo que não a compraria.

Bernardo Mello Franco - O primeiro milagre da CPI

- O Globo

A CPI da Covid já produziu seu primeiro milagre: transformou Flávio Bolsonaro num defensor do isolamento social. Ontem o senador tentou convencer os colegas a deixar a investigação para depois. “Por que não esperar todo mundo se vacinar?”, sugeriu.

A preocupação tardia com a doença não foi a única surpresa do discurso. Com a pele bronzeada pelas férias no Ceará, o primeiro-filho atacou o presidente do Senado, o relator da CPI e até a bancada feminina. O falatório não virou votos para o governo, mas escancarou o desespero do clã presidencial.

Pelo que se viu ontem, a família tem motivos para temer a comissão. Na sessão inaugural, a tropa bolsonarista levou um baile. Flávio ainda foi obrigado a engolir uma descompostura da senadora Eliziane Gama. Ela avisou que ali não era lugar para chute na porta e ironia machista. Só faltou dizer que o Zero Um não estava em Rio das Pedras.

Miguel Caballero – CPI é risco para Exército, e discurso de Renan testa fidelidade a Bolsonaro

- O Globo

Não faltaram recados e indiretas a Jair Bolsonaro, embora Renan Calheiros tenha evitado citar nominalmente o presidente da República. Em seu discurso na primeira sessão da CPI da Covid, o relator, porém, foi mais direto ao falar das Forças Armadas, botando o dedo diretamente na relação que é uma das principais bases de apoio do governo Bolsonaro.

Em dois anos e meio, os militares apoiaram o presidenciável Jair Bolsonaro, ocuparam muitos postos na administração federal e, em que pesem alguns estremecimentos e rompimento com os que foram demitidos do governo, os principais atritos entre o presidente e os militares se restringiram à preocupação manifestada fora dos microfones de que um mau desempenho do governo contamine a imagem das Forças Armadas. Esse ponto jamais esteve tão em risco como agora, e a CPI será um novo teste da solidez dessa aliança.

Luiz Carlos Azedo - Governo dispensa adversários

- Correio Braziliense

Guedes imprimiu as próprias digitais na resistência do governo à aquisição das vacinas durante o ano passado, prato cheio para a CPI da Covid.

No mesmo dia em que a CPI da Covid foi instalada no Senado, cerimônia na qual o seu relator, senador Renan Calheiros (MDB-AL), afirmou que seu trabalho será orientado pela ciência e não pelo negacionismo, doa a quem doer, o ministro da Economia, Paulo Guedes, em reunião do Conselho de Saúde Complementar, voltou a alimentar especulações de que o novo coronavírus é um produto de laboratório da China. De quebra, menosprezou a vacina produzida pelo Instituto Butantan, a CoronaVac, de origem chinesa, ao afirmar que a principal vacina utilizada para conter a pandemia no Brasil, aplicada em 80% dos imunizados até agora, é menos efetiva do que o imunizante da Pfizer, produzido nos Estados Unidos, embora ele próprio tenha utilizado a vacina chinesa.

Guedes não sabia que a reunião estava sendo gravada, mas isso não atenua a gravidade do que falou, pela importância do cargo que ocupa e pelo fato de que a China é o principal parceiro comercial do Brasil e o nosso maior fornecedor de insumos para produção de vacinas: “O chinês inventou o vírus, e a vacina dele é menos efetiva do que a americana. O americano tem 100 anos de investimento em pesquisa. Então, os caras falam: ‘Qual é o vírus? É esse? Tá bom, decodifica’. Tá aqui a vacina da Pfizer. É melhor do que as outras”, disse Guedes. Sua declaração ocorre num momento delicadíssimo, em que o Brasil precisa desesperadamente de insumos chineses para produzir tanto a vacina do Butantan quanto a que está sendo fabricada pela Fiocruz, a AstraZeneca.

Carlos Melo* - Fragilidade política e ruas definirão jogo

- O Estado de S. Paulo

CPI é território em disputa: a oposição quer enfraquecer e, se puder, derrubar o governo; governistas agem na contenção de desgastes do Executivo. As condições iniciais tampouco independem de circunstâncias mais gerais, localizadas no governo e no país. Ao final, serão as condições de contorno – a insatisfação popular e a fragilidade política – que definirão o jogo.

Sempre houve abuso na utilização de CPIS. Oposições sem projeto e oportunismo fisiológico as usaram descoladas do contexto mais amplo. Normalmente, “deu em nada”. Mas, o oposto também se deu: a “CPI do PC Farias” derrubou Collor; a “CPI dos Correios” resultou no mensalão e destroçou promissoras lideranças do PT. Nos dois casos, a insatisfação geral se dava para além do objeto da CPI.

Rosângela Bittar - Sinfonia em meio à barbárie

- O Estado de S. Paulo

Livro de Aldo Rebelo transforma releitura da história política em instantâneo da atualidade.

No capítulo 12 do seu livro O Quinto Movimento – propostas para uma construção inacabada, a ser lançado nos próximos dias, o ex-ministro da Defesa Aldo Rebelo transforma o que seria uma releitura da história política brasileira em um instantâneo da atualidade. Sua visão sobre os desafios impostos à democracia revela que não tem sido fácil mantê-la sob Jair Bolsonaro.

Sem citá-lo nominalmente, traça um retrato da ameaça à República exercida pelo comandante supremo das Forças Armadas, o presidente. As instituições democráticas, na sua avaliação, perdem prestí- gio, identidade e substância.

Ricardo Noblat - CPI da Covid-19 decola e ameaça abater o governo que voa baixo

- Blog do Noblat / Veja

Um bando de amadores

Sem querer ofender os pets, 27 de abril de 2021 ficará marcado como mais um dia de cão para o presidente Jair Bolsonaro e seus filhotes. Tudo aconteceu no período da manhã, a saber:

1) O Senado instala a CPI da Covid-19 com Renan Calheiros (MDB-AL) como relator e o governo em minoria;

2) O general Luiz Eduardo Ramos, chefe da Casa Civil, confessa que se vacinou às escondidas para que não pegasse mal para ele;

3) O ministro Paulo Guedes, da Economia, diz que o vírus é chinês e que a vacina americana é melhor do que a vacina chinesa.

Enquanto isso, distraído, Bolsonaro confraternizava bem humorado com devotos nos jardins do Palácio da Alvorada e plantava mais uma notícia falsa, desta vez contra o PT.

Segundo ele, há um vídeo que mostra Lula, Dilma, Haddad, e atrás deles, dois homens se beijando. “Beijo de língua”, garantiu, “coisa que nem homem e mulher fazem em público”.

Fernando Exman - O receituário do diversionismo

- Valor Econômico

Agenda positiva visa proteger imagem de um governo acossado

Acossado por uma comissão parlamentar de inquérito, em tensão permanente com os outros Poderes e em meio a dificuldades para combater tanto a pandemia quanto seus efeitos econômicos, o governo fará de tudo para lançar, dia após dia, notícias que busquem desviar a atenção dos problemas que acometem o país.

O programa de governo deu lugar a um plano de sobrevivência política. Este, por sua vez, permanece a reboque das turbulências que a própria administração Jair Bolsonaro cria.

Adriana Fernandes – Com trocas. Guedes quer melhorar diálogo com o Congresso

- O Estado de S. Paulo

A formação de um novo trio na linha de frente da política fiscal é a aposta do Ministério da Economia para melhorar o diálogo com o Congresso.

Apossibilidade de formação de um novo trio na linha de frente da política fiscal – Bruno Funchal, Jefferson Bittencourt e Ariosto Antunes Culau –é a aposta do Ministério da Economia para melhorar o diálogo com o Congresso, a Esplanada dos Ministérios, o mercado e também a sociedade.

Os três têm em comum o fato de serem técnicos com robusto conhecimento na área fiscal, mas também contam com experiência de diálogo – habilidade que faltava ao secretário Especial de Fazenda, Waldery Rodrigues.

Waldery deixará o cargo em mais uma reformulação da equipe econômica, na sequência da saída de vários secretários que integraram o time original, formado na transição de governo no final de 2018.

Cristiano Romero - Construção: no meio do caminho tinha uma pedra

- Valor Econômico

Oligopólios jogam preços nas alturas e freiam setor

Responsável por cinco a 6% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, a construção civil foi o setor que mais gerou empregos formais no ano passado - 106 mil. Considerando toda a cadeia produtiva da construção, o setor representa 10% de tudo o que economia brasileira produz. Em 2014, quando se verificou o pico recente do setor, chegou a 11,5%.

A participação da cadeia da construção no PIB só é menor que a da agroindústria. Outro dado relevante é a fatia do setor na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), isto é, na taxa de investimento da economia em bens de capital (máquinas e equipamentos) e construção: 50%, segundo a média histórica.

O setor de construção, como se sabe, é o que mais gera empregos no país: 12,5 milhões no total. Seu efeito multiplicador na economia é formidável. Estima-se que cada R$ 1,00 investido na construção civil gere R$ 1,88 na atividade. Para cada 10 empregos diretos gerados no setor, são gerados outros cinco indiretos. Embora seja um setor pouco importador de materiais e serviços, é exportador de bens e serviços.

Nilson Teixeira - Avanço rápido das reformas é improvável

- Valor Econômico

Desgastes na imagem do governo dificultam a conquista da maioria necessária para aprovar seus projetos

O resultado dos embates para a sanção do orçamento federal de 2021 foi negativo. Como em 2020, o governo precisou redefinir as regras do resultado primário, do teto dos gastos e de ouro - “veda que os ingressos financeiros oriundos do endividamento sejam superiores ao conjunto de investimentos, inversões financeiras e amortização da dívida”.

As despesas relativas à pandemia superiores a R$ 100 bilhões (1,3% do PIB) retiradas do cálculo das regras fiscais incluem: o Auxílio Emergencial de R$ 44 bilhões; os gastos em saúde com a pandemia; o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm) - transferências em contrapartida aos acordos para manutenção do vínculo de emprego em caso de suspensão temporária do contrato de trabalho e de redução da jornada e do salário; e o Programa Nacional de Apoio aos Microempreendedores e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) - financiamento para investimentos ou capital de giro por 36 meses à taxa Selic mais 1,25% ao ano para empresas no Simples com renda anual de até R$ 4,8 milhões.

Elio Gaspari - O caos de Bolsonaro

- Folha de S. Paulo / O Globo

No Brasil, ao padecimento sanitário juntou-se um governo negacionista e caótico

Outro dia, o capitão perguntou:

— O que eu me preparo?

E respondeu:

— Não vou entrar em detalhes, um caos no Brasil.

Em março do ano passado, Bolsonaro reclamava da “histeria” diante do vírus, levantava o estandarte do Apocalipse, com uma frase que explica seu comportamento diante da pandemia:

— Vai ter um caos muito maior se a economia afundar. Se a economia afundar, afunda o Brasil. (...) Se acabar a economia, acaba qualquer governo. Acaba o meu governo.

Entre as duas referências de Bolsonaro ao caos, morreram perto de 400 mil pessoas, e a população aguentou o tranco com sofrimento e paciência.

Hélio Schwartsman - A CPI da Covid será um sucesso?

- Folha de S. Paulo

Se fixarmos o objetivo no impeachment, receio que a resposta seja não

Com o passar dos anos, tornei-me cético em relação a CPIs. Há tempos que eu não vejo uma delas produzindo bons resultados.

Uma das razões para isso é que investigar é uma tarefa técnica, que requer uma expertise só raramente encontrada entre parlamentares. O ambiente escancaradamente público e politicamente carregado do Parlamento tampouco ajuda em apurações, que costumam avançar mais quando conduzidas com discrição e objetividade.

CPI da Covid, porém, é diferente. E é diferente porque a investigação já está pronta. Aliás, dizer "está pronta" é um eufemismo. Tanto o TCU como o MPF já analisaram a atuação do governo na pandemia e produziram documentos pouco abonadores à conduta das autoridades do Executivo. A imprensa também fornece boas peças.

Carol Pires - Deixaremos Bolsonaro impune?

- Folha de S. Paulo

Impeachment é a primeira vacina para nossa saúde democrática

O governo de Jair Bolsonaro tem sido fatal para muitos brasileiros. Seu desvario já motivou 116 pedidos de impeachment —hoje parados pela cumplicidade do presidente da Câmara, Arthur Lira, que diz não ver razão em 95% deles. Os outros 5% nos bastam, deputado.

Agora está no forno um super pedido de impeachment articulado por uma frente outrora impensável, que vai de Joice Hasselmann a Talíria Petrone. Dizer ainda que não há clima político para processá-lo é impor pré-requisito para se fazer justiça.

Ruy Castro - Quem com ferro ferra

- Folha de S. Paulo

Ferrar, diz o Aurélio, significa aplicar ferraduras. É o que Bolsonaro faz com seus aliados

Os generais, quando longe dos olhos e ouvidos dos paisanos, dispensam-se os beija-mãos da farda. Daí que, há pouco, em Brasília, um irritado Edson Pujol, ex-comandante do Exército, ao encontrar-se com um abestado Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, fulminou-o: "Pô, Pazuello, quando o Bolsonaro lhe proibiu de comprar as vacinas você devia ter pedido demissão. Obedecendo, você se ferrou e nos ferrou junto!". Por "junto" referia-se ao Exército.

Modéstia do general Pujol. O Exército já está ferrado desde que Jair Bolsonaro fez dele avalista, sócio e cúmplice de seu governo, ao presentear milhares de fardados com funções no Estado para as quais não tinham nenhum preparo. Com isso, Bolsonaro deu um colorido verde-oliva ao seu conceito particular de mamata e, em troca, pode proclamar que vai chamar o Exército para ajudá-lo a acabar de ferrar o Brasil. Claro, o Exército é "dele".

Roberto DaMatta - Somos todos pacientes

- O Globo

Para José Paulo Cavalcanti, Merval Pereira, Carlos Alberto Sardenberg e Joaquim Falcão

O dicionário “Aurélio” revela o amplo significado da palavra “paciente”. Uma palavra fundamental por sua capacidade de desmontar bate-bocas, inibir impaciências em filas, adiar vinganças e apaziguar minha angústia diante deste claro endoidecimento do Brasil.

Somos todos pacientes porque haja paciência para suportar o hospício desta psicose jurídico-política. De um lado, um enorme ressentimento porque o “povo”, que já foi puro e sagrado, teve motivos para eleger um presidente querelante, sabotador e autoritário; do outro, um surto suicida incapaz de apaziguar um sistema obsessivamente legalista em que a forma pode valer mais que o “objeto” ou substância (falando francamente: que o crime).

A palavra paciente é parte do linguajar jurídico, mas creio que seria absurdo ou despropositado chamar assassinos, genocidas e ladrões — gente como Capone, Eichmann, Goebbels, Stálin, os torturadores do regime militar, os assassinos do menino Henry, os larápios confessos da Operação Lava-Jato e Derek Chauvin, o policial que matou com óbvio viés racista George Floyd — de “pacientes”.

Uma palavra que invoca neutralidade não deveria ser usada como sinônimo de quadrilheiros. Sobretudo de gente que traiu o seu voto. Mas cabe perguntar: quando um réu vira paciente? A resposta é clara: quando ele é importante!

Aylê-Salassié F. Quintão* - Plataformas de mentiras

O candidato levantou-se repentinamente do lugar, pegou o microfone e gritou:

- Ele mente! Ele mente! Ele mente!...

Cínicos, confortavelmente coniventes com a deturpação da verdade, um ou dois dos concorrentes, sem a mesma coragem, assistiam no fundo aquela cena escatológica de indignação.

Era o debate entre os candidatos à Presidência da República do Brasil na eleição de 2006. Um deles fazia a análise da realidade brasileira para os 80 milhões de telespectadores que assistiam ávidos aqueles que, como pretensos futuros chefe do Estado brasileiro, dissertavam sobre soluções para as angústias da população, apresentando retóricas plataformas de Governo.

Mesmo o Brasil sendo tratado como país emergente, a brasilidade parece alinhar-se ainda hoje mais com a enxurrada de mentiras que candidatos a cargos políticos apresentam, como verdades absolutas. São versões fantasiosas, parcializadas, distorções estatísticas e jeitinhos criativos, inclusive para as contas públicas. Desfigurar a verdade tornou-se tão comum, que tende a se transformar em uma teoria de desenvolvimento – uma ciência do engano – embora já sejam marcas do perfil irresponsável dos brasileiros: o uso pleno do direito de mentir, como previu Benjamin Constant.

Biden marca 100 dias de governo com pacote de US$ 1,8 trilhão que amplia rede de proteção social

Terceiro grande pacote do governo, que será anunciado hoje em discurso ao Congresso, promove acesso gratuito a faculdades comunitárias, universalização de creches e licença médica remunerada; ricos terão aumento no IR

André Duchiade / O Globo

Tendo atuado como senador por 36 anos, Joe Biden foi um dos políticos americanos que mais assistiu a discursos presidenciais em sessões conjuntas do Congresso. Na condição de vice, por oito anos ele acompanhou os pronunciamentos de Barack Obama aos congressistas. Nesta quarta-feira, antevéspera de completar o centésimo dia de mandato, Biden fala pela primeira vez a deputados e senadores reunidos, numa sessão em que pretende fazer um balanço do início de sua gestão e apresentar caminhos a seguir, com o anúncio de mais um pacote econômico, o terceiro que propõe, agora destinado a ampliar a rede de proteção social do país.

O discurso em sessão conjunta do Congresso no primeiro ano de mandato foi adotado pelos seis últimos presidentes americanos. A fala — que geralmente ocorre em fevereiro, mas foi adiada em função da pandemia — substitui o discurso sobre o Estado da União, e tem como propósito expor a agenda presidencial aos congressistas. Já o discurso do Estado da União, em janeiro dos anos seguintes, serve para que o mandatário faça um resumo de suas realizações.

O que a mídia pensa: Opiniões/Editoriais

EDITORIAIS

A CPI do óbvio

O Estado de S. Paulo

Os fatos estão claros para todos, restando à comissão o trabalho de organizá-los, para que o País entenda quais foram os erros e quem deve responder por isso.

Ohistórico das Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIS) mostra que o sucesso das investigações costuma depender do surgimento de alguma testemunha bombástica. No caso da recéminstalada CPI da Pandemia isso não será necessário: os fatos essenciais são abundantes e estão claros para todos, restando à comissão o duro trabalho de organizá-los, para que o País entenda quais foram os terríveis erros que resultaram em tantas mortes evitáveis e quem deve responder por isso.

Do ponto de vista estritamente institucional, a CPI terá cumprido seu papel se dela resultarem medidas legislativas destinadas a impedir que esses erros se repitam e, também, se encaminhar às autoridades competentes os elementos necessários para a responsabilização civil e criminal dos infratores.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade - Os ombros suportam o mundo

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.