domingo, 9 de maio de 2021

Merval Pereira - Paradoxos da regressão

- O Globo

O formidável Tim Maia eternizou uma máxima brasileira que demonstra como, entre nós, o paradoxal acaba sendo normalizado, às vezes em decorrência de uma afabilidade presumida. “Prostituta tem orgasmo, traficante cheira e cafetão se apaixona”, repetia às gargalhadas. Eram tempos outros, em que ainda se acreditava que o país era abençoado por Deus. Bonito por natureza continua sendo, mas com um governo que não sossega enquanto não torná-lo feio, degradado, desesperançado.

André Trigueiro, meu colega da Globonews especialista em meio-ambiente, cunhou uma dessas frases que refletem o estado das coisas, com a amargura que a frase de Tim Maia não tinha. “Funai intimida indígenas. Fundação Palmares rechaça movimento negro. Ministério do Meio Ambiente intimida fiscais do Ibama”. É um retrato do país hoje, quando se distorce a função na medida dos interesses regressivos de setores da sociedade que não querem se enquadrar nos códigos modernizantes que regem o mundo ocidental.

No caso do desmatamento, o país, que já teve voz importante na questão, hoje é tido como vilão contra o meio-ambiente, a ponto de as exportações brasileiras estarem em xeque. Delegado da Polícia Federal no Amazonas, Alexandre Saraiva, que apreendeu toneladas de troncos arrancados ilegalmente, acabou sendo afastado da função, e a carga liberada.

Eliane Cantanhêde - Um ri, os outros choram

- O Estado de S. Paulo

Quebra de patentes ajusta política externa, mas não cura Bolsonaro

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, fez uma espetacular jogada de marketing ao aderir à tese de quebra de patentes das vacinas em meio à pandemia de covid-19, o que não só consolida a imagem de Biden como marca a volta dos EUA à liderança mundial das grandes causas, como meio ambiente e combate ao vírus.

O mundo desenvolvido e civilizado aplaude e se move na mesma direção, chacoalhando a Organização Mundial do Comércio (OMC), a Organização Mundial da Saúde (OMS) e, com elas, o multilateralismo, tão achincalhado na era Donald Trump. Tudo muito bom, tudo muito bem, mas, do marketing a resultados, da intenção à ação, é que são elas.

Não é simples, nem rápido, uma guinada dessa magnitude, muito menos com o mundo em frangalhos pelo efeito do coronavírus nas pessoas, nos sistemas de saúde, nos países, nas empresas, nos empregos. É uma emergência, mas a teia de interesses é imensa – e poderosa. Quebra de patentes pode demorar anos, e a pandemia exige resultados já.

João Doria* - O governo da esperança é ambiental e social

- O Globo

O mundo que virá depois da pandemia tornará o governo Bolsonaro ainda mais anacrônico. A ascensão da China, o projeto de investimentos do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e a emergência climática prenunciam uma agenda muito diferente da que vivemos nestes dois anos no Brasil. Para se alinhar com o desenvolvimento mundial, não basta ser uma economia de mercado, com instituições democráticas, liberdades públicas, responsabilidade fiscal e programas mínimos de proteção social. Esses pilares continuam sendo fundamentais. Mas novas prioridades e políticas públicas são necessárias. É o caso das iniciativas derivadas do conceito ASG: Ambiental, Social e Governança, novo padrão adotado pelas maiores empresas do planeta.

Para que o Brasil mude de patamar e se torne uma nação efetivamente desenvolvida, é preciso deflagrar, imediatamente, uma governança ambientalmente sustentável, socialmente responsável e de reconhecido padrão ético. Construir as bases do conceito ASG significa reinserir o Brasil no cenário mundial.

Grandes transformações acontecerão rapidamente, nos próximos dez anos, na indústria, na agricultura, no consumo das famílias e nas cidades. Temos a oportunidade de nos antecipar a esse choque de cultura. O Brasil não pode seguir repetindo os mesmos erros, sob pena de permanecermos cada vez mais distantes do desenvolvimento mundial.

Ricardo Noblat - Depoimento de Wajngarten à CPI irrita Ramos e assusta Pazuello

- Blog do Noblat / Metrópoles

Ex-secretário de Comunicação Social do governo Bolsonaro vai depor como suspeito de ter feito lobby pela vacina da Pfizer

É tal a irritação do general Luiz Eduardo Ramos, chefe da Casa Civil, com o publicitário Fabio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação do governo, que a ele só se refere como “idiota, imbecil”. Mesmo assim, quando de bom humor. De mal então…

Ramos não perdoa o ex-secretário por ter concedido uma barulhenta entrevista à VEJA onde criticou o general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, e quis parecer mais importante do que foi no combate à pandemia da Covid-19.

O comando da CPI que investiga os erros do governo está convencido de que Wajngarten quis faturar alguns milhões de reais como lobista da vacina da Pfizer. É justamente por isso que o convocou para depor nesta quarta-feira.

Poderá pedir a quebra dos seus sigilos bancário e telefônico para comprovar as denúncias que recebeu. De sua parte, Pazuello está certo de que o depoimento do ex-secretário servirá para complicar ainda mais sua situação, deixando o governo de fora.

Cristovam Buarque* - Bolsonaro dá sinais de epidemia mental

- Blog do Noblat / Metrópoles

A fala do presidente sobre a China só tem como explicação uma mente desequilibrada

O deputado Fausto Pinato, do bloco de apoio ao Presidente, escreveu publicamente que Bolsonaro sofre de grave doença mental. Segundo ele, não há outra explicação para suas posições em relação à China.

De fato, são gestos de insanidade, o presidente do Brasil, sem qualquer razão, ofender e provocar a potência chinesa, que marcha para ter a maior economia do mundo, com a maior população e alguns dos mais avançados setores em tecnologia. Só isto bastaria para indicar sinais de insanidade.

Mais grave é que a China é o maior parceiro comercial do Brasil e o principal fornecedor de vacinas contra a covid. Basta o governo chinês se impacientar, para a economia brasileira sofrer um revés de tamanho catastrófico, e nossa situação sanitária sofrer consequências ainda mais graves. Se a China deixar de comprar nossa proteína vegetal e animal, a perda econômica não será apenas por alguns anos, poderá ser por décadas ou definitiva.

Míriam Leitão - Falsos remédios e muitos venenos

- O Globo

Cloroquina é o símbolo deste governo que sempre tem falsos remédios com efeitos tóxicos para os problemas do país. O Brasil está diante de um devastador retrocesso na educação por causa da pandemia, e a proposta pela qual o governo Bolsonaro se bate é o homeschooling . O país vive uma grave crise na democracia, em parte criada por este governo, mas Bolsonaro exige a volta do voto impresso e por ele ameaça até a realização das eleições. Em vez de uma política de segurança, o projeto que tem sido posto em prática é a liberação das armas. Para o trânsito, o projeto, felizmente atenuado no Congresso, foi o da menor punição para infratores e o fim da cadeirinha das crianças. Em cada área pode-se encontrar a solução “cloroquina”, um falso remédio, que é, na verdade, um veneno.

Bernardo Mello Franco - A polícia não mata sozinha

- O Globo

Uma operação com blindados e helicópteros aterrorizou o Jacarezinho e deixou 28 mortos no maior massacre da história do Rio. Na manhã seguinte, a Polícia Civil só havia identificado a vítima que usava farda. Sem conhecer as outras 27, o vice-presidente Hamilton Mourão sentenciou: “Tudo bandido”.

O general está afinado com a tropa no poder. O governador Cláudio Castro, aliado do Planalto, classificou a matança como fruto de um “detalhado trabalho de inteligência”. O vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente, fez piada com o relato de uma viúva. Há poucos dias, seu pai ergueu um cartaz com a inscrição “CPF cancelado”. O capitão é um velho defensor de milícias e grupos de extermínio.

“A polícia não mata sozinha. Esse tipo de discurso legitima a barbárie e a violência policial”, afirma o advogado Joel Luiz Costa, coordenador do Instituto de Defesa da População Negra. Criado no Jacarezinho, ele voltou à favela horas depois do banho de sangue. Percorreu as vielas, ouviu testemunhas e saiu convencido de que ocorreu uma chacina.

Dorrit Harazim - Fica para 2022

- O Globo

Era para ser um texto leve sobre o Dia das Mães — uma oportunidade rara neste espaço de saudar com delicadeza um domingo especial. Um domingo sem referências a desassossego, pandemia ou Bolsonaro. Era para ser um texto leve, também, em homenagem à radiação afetiva e contagiante de Paulo Gustavo, que deixou órfão um Brasil inteiro. Seu humor, humanidade, talento e coerência com a vida mereciam essa tentativa de leveza.

Mas não deu. Fica para outra vez.

A fuzilaria policial desencadeada quinta-feira na Favela do Jacarezinho, no Rio, nos faz retroceder com crueza ao cotidiano nacional. O horizonte ficou vermelho. Desta vez foram 28 os mortos (inclusive um policial civil) em operação planejada para eliminar alvos, não fazer prisioneiros. Assim, de uma só tacada, a série estatística sobre lei e ordem no estado, que já era estarrecedora, deu novo salto. Segundo levantamento do Instituto de Segurança Pública (ISP), 20.957 pessoas morreram em confronto com a polícia do Rio entre janeiro de 1998 e março de 2021. Descascando melhor a frieza dessa matança, O GLOBO deu uma recalculada para mais perto: ao longo dos últimos 23 anos, a polícia do Rio matou, em média, uma pessoa a cada 10 horas.

Impossível chamar a isto de sociedade, nem de civilização ou exercício da lei.

Pedro S. Malan* - Por quem os sinos dobram

- O Estado de S. Paulo

Pena que educação e saúde não pareçam ser áreas de interesse da liderança do País

Em seu fascínio por metáforas, Jorge Luís Borges escreveu: “Se não me engano, os chineses chamam o mundo de as dez mil coisas ou – e isso depende do gosto e da fantasia do tradutor – os dez mil seres”. Segundo uma extensão dessa metáfora, atribuída a Lao-tsé, “a natureza trata a miríade de seres como cães vadios”. Podem ser cruéis com “os seres” não só os movimentos das águas, dos ventos, da terra e do clima, como vem demonstrando ao mundo a covid-19.

Tem sido extraordinária a resposta da ciência aplicada a desenvolver vacinas eficazes, que reduzem mortes e a disseminação do vírus. Ainda assim, as consequências econômicas, sociais e políticas da pandemia estarão conosco por anos à frente, com particular relevância para países em desenvolvimento, como o Brasil, nas áreas de saúde pública e de educação. Desta trata este artigo, dadas suas relevância e urgência para evitar que nosso futuro seja, mais uma vez, adiado.

Em imperdível palestra (TEDx – Todos pela Educação), Priscila Cruz relata a frase, dura e entristecedora, que ouviu quando, como voluntária, ajudava alunos do ensino fundamental com dificuldades na aprendizagem: “Tia, estou indo embora, educação não é para mim”. A frase não surpreenderá quem tenha tomado conhecimento dos resultados da Avaliação Nacional de Alfabetização ou do Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional; ou dos testes do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), ou ainda do desempenho de alunos brasileiros nos testes do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) da OCDE.

Rolf Kuntz* - Desemprego, inflação e mais de 400 mil mortos

- O Estado de S. Paulo

Além de combinar estagnação e inflação, o governo falhou no combate à pandemia

Combinar desemprego e inflação foi a maior façanha econômica do presidente Jair Bolsonaro, em quase dois anos e meio de mandato. Bolsos vazios dificilmente convivem com preços em alta, mas esse raro conúbio foi promovido pelo atual desgoverno. Multidões em busca de vagas formaram filas no começo do ano e continuam formando. Os desocupados eram 14,4 milhões no trimestre móvel encerrado em fevereiro – o maior número da série iniciada em 2012. Projeção do Banco Central (BC) aponta inflação de 5,1% no fim de 2021, quase estourando o teto da meta, fixado em 5,25%. Em 12 meses os preços ao consumidor já subiram 6,17%, segundo a prévia da inflação de abril, o IPCA-15. O alerta é claro, mas o risco permanece, enquanto a equipe econômica se perde em confusões e o presidente fala mal da China e ameaça editar decretos autoritários. As incertezas criadas pelo presidente favorecem a alta do dólar, um dos fatores inflacionários.

O Brasil continua estagnado, enquanto outros países voltam a crescer e a criar empregos. Também sofrem com novas ondas de covid, mas avançam na vacinação e seguem rumos bem definidos. No Brasil, a imunização, já atrasada, tem sido interrompida por escassez de vacinas. Nos negócios, a retomada é lenta e insegura. No primeiro trimestre a indústria produziu 1% menos que nos três meses finais de 2020. A comparação dos volumes produzidos em 12 meses mostra um recuo de 3,1%.

Samuel Pessôa* - Qual inflação?

- Folha de S. Paulo

Choques de preço serão revertidos nos próximos 3 anos, e haverá pressão desinflacionária

A inflação tem subido. Tenho escrito sobre o tema desde a coluna de 3 de outubro último.

Em abril deixou de vigorar no Brasil o mecanismo equilibrador entre movimentos de commodities e do câmbio.

Desde a implantação do regime de câmbio flutuante, como somos um grande produtor e exportador de commodities, sempre que o preço das matérias-primas no mercado mundial sobe, nossa moeda se aprecia, e vice-versa.

A gangorra dos movimentos do câmbio e das commodities insula a economia brasileira dos efeitos inflacionários da subida dos preços das matérias-primas.

Minha interpretação é que a elevação do risco fiscal, com os gastos da pandemia e a falta de clareza do presidente Bolsonaro sobre o ajuste das contas públicas, tem produzido seguidas pressões sobre o câmbio que impedem o mecanismo equilibrador.

No entanto, faltou nas colunas passadas melhor compreensão dos fatores que explicam a subida das matérias-primas.

O movimento das commodities parece ter duas origens. Primeiro, foi a recomposição do rebanho suíno na China em 2020, após a redução de 40% em 2019 em razão da gripe suína africana, que castigou pesadamente a suinocultura chinesa.

Os maiores problemas sanitários ocorreram na produção doméstica de suínos alimentados por restos de alimentos, a famosa lavagem. A reconstituição do rebanho suíno ocorreu preferencialmente em modernas granjas. Houve a elevação permanente da demanda por ração, isto é, soja e milho.

Janio de Freitas - Fuga do general Eduardo Pazuello é covardia

- Folha de S. Paulo

Mesma covardia que o impediu de repelir ordens contrárias ao dever do cargo e à vida de milhares

Se a balbúrdia na CPI da Covid continuar como nas primeiras sessões de interrogatórios e proposições, pode-se esperar que traga contribuição importante, apesar de não se pressentir qual seja. O tumulto dá a medida da fragilidade e do medo bolsonaristas diante da cobrança por sua associação à voracidade letal da pandemia.

Mas a clarinada do “não me toques”, protetora de militares acusados ou suspeitos de qualquer impropriedade, não resolverá o caso Pazuello. Militares valendo-se do Exército para fugir da responsabilidade por seus atos, convenhamos, até parece parte da concepção de ética militar. Os generais que mantiveram a ditadura de Getúlio, os do golpe de 64, do golpe de 68, os oficiais da tortura e dos assassinatos, os do Riocentro, esses e muitos outros construíram a praxe.

Nisso há distinção. Os escapismos que recaem na reputação do Exército cabem, antes de tudo, à corporação, à oficialidade, não à instituição. É a deseducação cívica em atos. A fuga de Eduardo Pazuello vai além: não vem da arrogância infundada, ou de uso do Exército para se imaginar acobertado por conveniência da instituição. É covardia, a mesma covardia que o impediu de repelir ordens contrárias ao bom senso, ao dever do cargo e à vida de milhares.

Hélio Schwartsman - Ciência sem brincadeira

- Folha de S. Paulo

Livro mostra que ganha espaço discurso assentado em bases filosoficamente frágeis

Helen Pluckrose e James Lindsay são traquinas. Em 2017 e 2018, eles escreveram, com Peter Boghossian, uma dúzia de artigos sem pé nem cabeça envelopados em jargão acadêmico pós-estruturalista e os enviaram a periódicos de humanidades com revisão por pares.

Eram textos verdadeiramente loucos, como um que defendia a tese de que o pênis é uma construção social concebida para oprimir mulheres e é um dos operadores conceituais da mudança climática.

Como o leitor já deve ter adivinhado, várias dessas peças foram aceitas e publicadas. O megatrote rende boas risadas, mas não prova muita coisa. Experimentos semelhantes já foram feitos com periódicos de "ciências duras", produzindo resultados semelhantes.

Vinicius Torres Freire – Por que o pobre não larga Bolsonaro?

- Folha de S. Paulo

Mortos de fome, de Covid, a bala, pobres se decepcionam menos com o presidente  

Pouco antes do segundo turno de 2018, o Datafolha perguntou qual era o candidato a presidente que mais defendia os ricos. Deu Jair Bolsonaro com 55% e Fernando Haddad (PT) com 22%.

Quem mais defendia os pobres? Haddad, 54%, Bolsonaro, 31%. Os mais pobres, com renda familiar de menos de dois salários mínimos, eram algo mais estritos na definição de classe: Bolsonaro defendia os mais ricos para 59%, Haddad defendia os mais pobres para 60%.

“Tudo bandido”, disse Hamilton Mourão sobre os mortos do bairro pobríssimo e apartado do Jacarezinho (“apartado” também no sentido de “apartheid”).

No que interessa aqui, tanto faz qual era a situação jurídica das vítimas do massacre: tanto fazia para Mourão. No universo mental bolsonariano atira-se primeiro, esquece-se depois. Os pobres e apartados em geral são “tudo bandido”, filho de porteiro que tira zero, empregada que viaja para fora, filho desajustado de mãe solteira, quilombola gordo imprestável etc. Tudo isso é mui sabido, inclusive o autoritarismo da turma: naquele Datafolha, Bolsonaro era o mais autoritário para 75%.

José Eduardo Faria* - Os direitos, os vouchers e a dignidade da condição humana

- Estado da Arte – revista de cultura, artes e ideias

Ao afirmar que em matéria de eficiência e controle dos gastos seria melhor distribuir vouchers à população pobre do que manter creches, escolas e hospitais públicos, o ministro Paulo Guedes recolocou na agenda um tema já conhecido: a política de conditional cash transfers, que, em princípio, asseguraria as necessidades básicas dos pobres e desvalidos.

Esse tema se relaciona com os programas de renda mínima e foi desenvolvido pelo liberalismo extremado que há algumas décadas orienta o curso de economia da Universidade de Chicago, onde o ministro fez a pós-graduação. Esses programas também foram defendidos por organismos multilaterais, como o Banco Mundial, sob a justificativa de “dar aos pobres condições para que se tornem advogados mais efetivos dos seus próprios interesses”. A polêmica que essa política implica não é nova[*]. Ela decorre do fato de que, se do ponto de vista do gasto público propicia uma economia de recursos que garantiria o equilíbrio fiscal, do ponto de vista das conquistas civilizatórias envolve uma progressiva substituição da ideia de universalização dos direitos por programas de focalização. São programas que tendem a concentrar os gastos sociais num público-alvo bem definido e selecionado em situação-limite de sobrevivência e pobreza, com o objetivo de garantir a maximização da eficiência alocativa de recursos escassos.

Carlos Góes - Falta de bom Censo

- O Globo

A transformação da pesquisa em batalha política pode levar ao risco de um levantamento com menor qualidade técnica

O Brasil é um dos países com melhor qualidade de suas estatísticas no mundo. Diversas instituições públicas mantêm bases de dados detalhadas sobre regiões, empresas e indivíduos que permitem revelar fatos desconhecidos sobre a realidade brasileira.

Os dados sobre vínculos formais de emprego identificados no nível da empresa e do trabalhador, mantidos pelo Ministério da Economia, são utilizados por pesquisadores do mundo inteiro para estimar os efeitos de políticas públicas sobre o mercado de trabalho.

 Foi com eles que Rafael Dix-Carneiro, brasileiro professor da Universidade Duke, pôde estudar a liberalização comercial dos anos 1990 e concluir que a mobilidade de trabalhadores entre regiões brasileiras é muito lenta.

Esses dados não são úteis somente para responder perguntas econômicas. Combinando dados de auditorias da Controladoria-Geral da União e da Justiça Eleitoral, o professor da Universidade da Colúmbia Britânica e meu colega nesta coluna Cláudio Ferraz demonstrou que prefeitos em primeiro mandato tendem a cometer menos atos de corrupção.

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

EDITORIAIS

A ralé virtual no poder

O Estado de S. Paulo

Absolutamente desqualificado para a vida pública, Jair Bolsonaro subordina-se, e a seu governo, ao “gabinete do ódio”

Os primeiros depoimentos na CPI da Pandemia confirmam que há uma espécie de “gabinete paralelo” no Palácio do Planalto, cuja influência sobre o presidente Jair Bolsonaro parece ser maior do que a exercida pelo gabinete de ministros.

Esse “poder paraestatal”, na definição do relator da CPI, senador Renan Calheiros, já era mais ou menos conhecido. O espantoso foi observar em detalhes sua imensa capacidade de determinar os atos e palavras do presidente da República.

Como informado pelo próprio Bolsonaro em discurso, o tal “gabinete paralelo”, chamado também de “gabinete do ódio” e qualificado pelo presidente como “gabinete da liberdade”, é liderado por Carlos Bolsonaro. O segundo filho do presidente, embora seja vereador no Rio de Janeiro, passa vários dias em Brasília assessorando o pai. Carlos Bolsonaro, sem cargo no governo, é na prática, o mais poderoso ministro de Bolsonaro, a julgar pelo que veio à luz na CPI.

Soube-se que Carlos Bolsonaro participou de várias reuniões do presidente com ministros, “tomando notas”, segundo informou o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta. Conforme o testemunho de Mandetta, isso fazia parte de “um assessoramento paralelo” – que, em resumo, confrontava as decisões técnicas do Ministério da Saúde e insistia na adoção formal da cloroquina como medicamento contra a covid-19, embora já houvesse evidências de que o remédio era ineficaz. A queda de dois ministros da Saúde, entre outras razões por sua resistência à cloroquina, mostra a força desse “poder paraestatal”.

Poesia | Bertold Brecht -Louvor ao estudo

Estuda o elementar: para aqueles

cuja hora chegou

não é nunca demasiado tarde.

Estuda o abc. Não basta, mas

estuda. Não te canses.

Começa. Tens de saber tudo.

Estás chamado a ser um dirigente.

 

Frequente a escola, desamparado!

Persegue o saber, morto de frio!

Empunha o livro, faminto! É uma arma!

Estás chamado á ser um dirigente.

Não temas perguntar, companheiro!

Não te deixes convencer!

Compreende tudo por ti mesmo.

O que não sabes por ti,

não o sabes.

Confere a conta.

 

tens de pagá-la.

Aponta com teu dedo a cada coisa

e pergunta: “Que é isto? e como é?”

Estás chamado a ser dirigente.