sexta-feira, 18 de junho de 2021

Vera Magalhães - Vacinas e liberdade

O Globo

Esta semana trouxe para a minha geração um sopro de esperança. Com a chegada da vez dos cinquentões na fila da vacina e a iminência de as pessoas de mais de 40 anos também começarem a ser contempladas (quarta-feira sou eu!), a sensação é de alívio, por ver irmãos, companheiros, primos, cunhados, amigos de infância, colegas de faculdade e outros contemporâneos finalmente a caminho de estarem mais protegidos contra o vírus que paralisou nossa vida há um ano e três meses, já.

Vacina é liberdade, pensei quando recebi a foto do meu marido tomando a primeira dose da vacina no braço esquerdo, no dia do seu aniversário.

E é por essa constatação básica, a que cada vez mais brasileiros chegarão à medida que a imunização avançar, que é mais criminosa a contraposição que Jair Bolsonaro, sempre ele, faz entre vacinação e liberdade.

A explicação (sic) dada pelo presidente no cercadinho dos horrores de seus seguidores para não sancionar, caso seja aprovado, o projeto em tramitação no Congresso que cria uma espécie de passaporte de imunidade é sem pé nem cabeça. Mal disfarça a real motivação de Bolsonaro: ele é, incorrigivelmente, um “antivax”. Continua a sabotar a vacinação mesmo quando estamos chegando a 500 mil mortos, e a CPI avança para responsabilizá-lo e a seu governo por essa matança.

Eliane Cantanhêde – De boiadas e jabutis

O Estado de S. Paulo

Com o foco na CPI, Congresso legisla em causa própria na MP da Eletrobrás e na Lei da Improbidade

Há algo errado quando, do PT ao PP, praticamente todos os partidos ficam do mesmo lado na Câmara e quando dez entre dez economistas liberais se manifestam contra o projeto pró-privatização da Eletrobrás da Câmara e do Senado. A explicação, porém, parece razoavelmente simples: com o foco na CPI da Covid, o Congresso corre para passar suas boiadas e jabutis. 

O pau come entre o PT e o bolsonarismo, mas lá, no escurinho da Câmara, reina a paz para legislar em causa própria. O deputado petista Carlos Zarattini (SP) apresentou um relatório substitutivo mudando drasticamente a Lei da Improbidade, de 1992, e o texto foi aprovado por 408 votos a 67 em plenário, com apoio de praticamente todos os partidos e patrocínio do bolsonarista Arthur Lira (PP-AL) – o presidente da Casa, alvo de processos por... improbidade. 

Para o procurador Roberto Livianu, do Instituto Não Aceito Corrupção, a Lei da Improbidade “é a mais importante lei anticorrupção em vigor no Brasil”. E ele cronometrou: o substitutivo de Zarattini foi apresentado às 17h10 de terça-feira, o pedido de urgência começou a ser votado às 17h11 e foi aprovado às 17h19. Nove minutos. No dia seguinte o plenário liquidou a fatura. 

Bernardo Mello Franco - A agonia da terceira via

O Globo

Luciano Huck desistiu de concorrer à Presidência. Preferiu assumir o lugar do Faustão. O animador estava indeciso entre governar o país e comandar um programa de auditório. Ao escolher a segunda opção, mostrou que não era a pessoa certa para a primeira.

A candidatura Huck já havia sido ensaiada antes da eleição de 2018. O clima era favorável a um outsider, mas ele não quis arriscar a fama no campo minado da política. Um deputado de sete mandatos se fantasiou de novidade e conseguiu chegar lá.

O novo recuo do apresentador expõe os problemas da direita liberal, que hoje reivindica o rótulo de “centro”. Com apoio do empresariado, o grupo tenta fabricar um presidenciável para concorrer com Lula e Jair Bolsonaro. A ideia já esbarrava na falta de votos. Agora começa a agonizar com a fuga de candidatos.

O ex-ministro Sergio Moro puxou a fila das desistências. Desgastado após romper com o capitão, mudou-se para os EUA e sumiu do debate político. A anulação de suas sentenças no Supremo parece ter sepultado de vez a hipótese de uma aventura eleitoral.

Na semana passada, foi a vez de João Amoêdo pular do barco. Sua pré-candidatura durou apenas nove dias. Foi bombardeada por deputados do Novo que viraram linha auxiliar do bolsonarismo.

Luiz Carlos Azedo - Lula esnoba o centro

Correio Braziliense

Tanto Lula quanto Bolsonaro têm interesse na fragmentação do eleitorado mais moderado e na dispersão de forças de centro-esquerda e centro-direita

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em entrevista ao Sistema Tribuna de Comunicação, ontem, em Natal, esnobou os sete partidos que se reuniram na quarta-feira para discutir uma candidatura de centro: “As pessoas esquecem que, quando disputei a eleição em 1989, disputei contra algumas das personalidades das mais extraordinárias do Brasil, com o doutor Ulysses, doutor Aureliano Chaves, doutor Brizola, tinha Mário Covas, Paulo Maluf, Afif. Era uma penca de candidatos de personalidades muito respeitadas, e fui para o segundo turno. Essas pessoas precisam compreender que eles não têm esse destaque que merecem porque eles não têm partido político”, disse.

Lula divide com o presidente Jair Bolsonaro as expectativas de poder e favoritismo nas eleições de 2022. O primeiro, porque vem se mantendo como candidato favorito, mesmo recém-saído da prisão e na oposição, enquanto o segundo, porque está no poder e tem direito à reeleição. Tanto Lula quanto Bolsonaro têm interesse na fragmentação do eleitorado mais moderado e na dispersão de forças de centro-esquerda e centro-direita, porque isso praticamente lhes garante um lugar no segundo turno da eleição. “As pessoas ficam preocupadas com a minha candidatura, com a candidatura à reeleição do presidente. Ora, eles podem lançar candidatos. Não têm que procurar um só, tem que procurar 10. Cada partido deve lançar um candidato, e o povo vai votar e escolher quem pode ser eleito”, avalia Lula.

Ricardo Noblat - O destino da democracia é o que estará em jogo ano que vem

Blog do Noblat / Metrópoles

O vírus do bolsonarismo despertou os instintos mais primitivos dos brasileiros e não há sinais de que haverá vacina contra ele

País onde padre chama homossexuais de veadinhos, rapaz vai às compras com uma suástica no antebraço, senador defende governo fascista desde que tenha “as mãos limpas” e casal branco suspeita de negro inocente no comando de uma bicicleta elétrica, por que um país como esse daria as costas ao presidente que tem?

Não será fácil derrotá-lo na eleição do ano que vem, é o que começam a admitir aos sussurros ou abertamente seus mais ferrenhos adversários. Não é para dissipar o clima do já ganhou que toma conta da parte desavisada da oposição que eles dizem isso, é porque de fato reconhecem que não será fácil mesmo.

O bolsonarismo era um vírus adormecido nas entranhas de uma parcela expressiva dos brasileiros de todas as classes sociais e de todos os pontos do país. O vírus despertou ao ouvir o discurso do ex-capitão indisciplinado que antes só falava às paredes do Congresso e a áreas do Estado que o alimentava com votos.

A rendição à pandemia que veio de fora pode ter enfraquecido o dono do discurso que perdeu apoio com a morte de quase 500 mil pessoas em pouco mais de um ano, sem falar dos mais de 17 milhões de infectados. Mas o discurso em si continua forte, sem que tenha diminuído o número dos que se sentem atraídos por ele.

Dora Kramer - Lira do delírio

Revista Veja

A agenda regressiva que o presidente da Câmara chama de reforma política

O Brasil enfrenta problemas graves para todo tipo de (des)gosto — sanitário, político, econômico, social e energético —, que requerem a mobilização de diversos setores. Uns com maior êxito e presença, outros com menor eficácia, menos visibilidade ou poder de influência, mas cada qual fazendo a sua parte na medida das respectivas possibilidades.

O Supremo Tribunal Federal num empenho diuturno para barrar ofensivas antidemocráticas, o Ministério Público e a Polícia Federal em luta contra interferências “de cima”, organizações sociais mobilizando-se para minorar a situação de brasileiros vulneráveis, governadores e prefeitos envolvidos numa saudável corrida em prol da vacinação, o Senado montando na CPI o quebra-cabeça do desmazelo governamental na gestão da pandemia e a oposição mergulhada nas articulações para enfrentar Jair Bolsonaro em 2022.

Diante disso, a Câmara dos Deputados faz o quê? Discute mudanças nas regras político-eleitorais, entre as quais a instituição do voto impresso para conferência do resultado obtido nas urnas eletrônicas. E esse é apenas um entre os vários itens de uma agenda regressiva que o presidente da Câmara, Arthur Lira — patrocinador maior da iniciativa —, chama de reforma política.

José Casado - Bolsonaro enfrenta consequências reais da realidade paralela


Revista Veja

Insistência na realidade alternativa já tem efeitos reais para o governo, acusado de manter estruturas paralelas na Saúde, na espionagem e no orçamento

Jair Bolsonaro é prova viva do conceito de “definição de situação”, formulado pelo sociólogo americano William Isaac Thomas no início do século passado: “Se os homens definem as situações como reais, elas são reais em suas consequências.”

Nos últimos 29 meses, Bolsonaro fomentou a percepção de que governa numa realidade paralela. Nela, por exemplo, o Brasil ocupa a “vanguarda” nas soluções para a vida sob pandemia, porque ele foi, como já disse, o único chefe de Estado do planeta que saiu em busca “do remédio” — no caso, a cloroquina.

Se a ilusão é percebida como algo real, mesmo não sendo, tem as mesmas consequências que a realidade — diz o teorema de Thomas.

Ontem no Palácio do Planalto começou a se espraiar o entendimento de que o governo está cada vez mais enredado na própria criação, a realidade paralela.

As consequências já estavam visíveis no prédio do outro lado da rua, no Senado, no acervo de 1,5 terabytes de documentos acumulados pela CPI da Pandemia em mês e meio de funcionamento.

Agora, também, começam a ganhar contornos definidos em outro prédio da Praça dos Três Poderes, o Supremo Tribunal Federal. Ontem à tarde, a juíza Rosa Weber escreveu: “A eventual existência de um Ministério da Saúde Paralelo, desvinculado da estrutura formal da Administração Pública, constitui fato gravíssimo.”

Alon Feuerwerker - Uma ponta não fecha

Revista Veja

Atitude racional de Bolsonaro seria concentrar esforços na vacina

Quem se debruça agora sobre a condução que Jair Bolsonaro vem dando aos desafios da pandemia conclui que o próprio presidente melhorou as condições para a emergência de uma ampla coalizão contra ele no ano que vem. Pelo menos no segundo turno da eleição.

Bolsonaro vem se orientando por um único parâmetro desde a chegada da Covid-19. É evidente que, na visão dele, os adversários só querem mesmo é usar a pandemia para provocar o colapso econômico, e assim impedir a sua vitória em 2022. Mas tem um detalhe, uma ponta que não fecha.

Qual seria, então, a atitude racional para confrontar essa estratégia inimiga? Concentrar esforços na obtenção de vacinas. Em paralelo, apoiar medidas simples, e economicamente pouco destrutivas, de proteção individual e social (máscaras, higienização etc.), até em contraponto ao radicalismo do “lockdown até a vitória final”. E isso independeria de acreditar, ou não, no efeito curativo dos fármacos que ele propagandeia para a doença.

Vinicius Torres Freire - Liberalismo nacional é uma negociata

Folha de S. Paulo

Lei de privatização da Eletrobras cria mais daqueles favores que emperram crescimento do país

Um motivo da relativa pobreza e do baixo crescimento do Brasil é o mau funcionamento da economia de mercado, se é que “tudo isso que está aí” pode ser chamado assim, de “economia de mercado”. A lei de privatização da Eletrobrás avacalha ainda mais essa geringonça nacional.

A aprovação dessa lei porca e dinheirista foi aplaudida por empresários beneficiados, por governos locais, pelo povo do mercado que tinham comprado ações da empresa e por Paulo Guedes, o tiozão do Whatsapp pinochetista que é a fantasia caricata de liberal do governo de Jair Bolsonaro. Liberal mesmo não tem aí nessa turma. É todo mundo mero negocista ou coisa pior.

 “Economia de mercado” é uma ideia abstrata, um modelo incompreensível ou que desinteressa a maioria das pessoas mesmo quando apresentado na sua versão mais simples. Trocando em miúdos muito grossos, o mercado não funciona ou talvez inexista por aqui porque muita decisão de investimento não é orientada pelo cálculo da rentabilidade do negócio em si, por preços livres e custos, pois tal decisão é influenciada de modo pesado pela “rentabilidade” decidida pelo governo.

Bruno Boghossian - Bolsonaro e os paupérrimos

Folha de S. Paulo

Presidente usa caneta para tirar espaço de Lula em segmento que deve definir eleição em 2022

No meio da semana, Jair Bolsonaro anunciou um aumento de 50% no valor do Bolsa Família. Dias depois, ele se reuniu com donos de supermercados e pediu que eles segurassem os preços dos produtos da cesta básica. Os dois movimentos mostram que o presidente enxerga sua sobrevivência política nas mãos da população mais pobre.

Bolsonaro tenta conter um desgaste que pode custar sua reeleição. Em 2018, ele recebeu um impulso inicial dos brasileiros mais ricos, mas só conseguiu chegar ao Planalto porque conquistou espaço em outras faixas. Números do Datafolha indicam que um de cada quatro votos que ele teve no primeiro turno veio do segmento renda mais baixa.

Ruy Castro - Esbofeteados por Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Quantos de seus eleitores não pegaram Covid e ainda estão lutando contra as seqüelas da gripezinha?

No momento em que você estiver lendo este texto, a Covid terá atingido perto de 18 milhões de brasileiros. Desses, quase meio milhão já perderam a vida, e essa estatística está longe do fim. Mais de 1 milhão estão “em acompanhamento” —na fila por um leito, respirando por uma máquina ou inconscientes numa UTI— e 16 milhões se recuperaram. Dos que morreram ou estão lutando pela vida, só os seus médicos e familiares saberão dizer. Mas, pelos relatórios dos sobreviventes, podemos calcular o que representou para eles ter o inimigo dentro de si.

Imagino que mesmo para os assintomáticos houve certa apreensão ao serem informados de que o teste dera positivo. Quero crer que até os seguidores de Jair Bolsonaro entre eles terão acusado um susto —porque, ainda que convencidos de que a Covid era uma “gripezinha”, como adivinhar como ela se desenvolveria? Claro que, tratados com cloroquina, Coca-Cola e Gatorade, e tendo o vírus cedido espontaneamente, tais infectados se jactaram da eficácia de seu tratamento.

Reinaldo Azevedo - ‘Nem-nem’ é o erro essencial da 3ª via

Folha de S. Paulo

500 mil mortos impõem primeira clivagem ética, e propostas vêm depois

Por que é tão difícil surgir o tal candidato de centro, embora existam políticos qualificados para tanto? A indagação não tem caráter metafísico, e eu não acredito na existência de uma maioria silenciosa à espera de Godot. Até porque o dito-cujo não aparece, certo? Um terceiro nome só se tornará viável se conquistar votos entre eleitores que já falam nas pesquisas —são eles a maioria.

A eleição de 2022 será, sim, fundamental para o futuro do Brasil. Trata-se de saber se a democracia vai ou não sobreviver. Não há risco de um golpe à moda antiga. Há outras formas, algumas já em curso, de pôr a tropa na rua. A milicianização das polícias é um exemplo eloquente do inferno que nos espreita. Que seja esconjurado.

A disputa define, pois, o futuro, mas também é um eco do passado. Vivemos as consequências de uma intervenção no processo eleitoral de 2018 que conduziu a uma artificialização da vida pública. Pouco depois de recuperar seus direitos políticos —que lhe foram arrancados por meio de instrumentos ilegítimos, de legalidade viciada —, Lula passou a ser o favorito na disputa. Seria competitivo ainda que Bolsonaro se comportasse como um estadista.

José de Souza Martins* - O povo brasileiro é objeto do deboche de Bolsonaro

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Somos tratados como inimigos do brasileiro que ele pensa que é, cidadão de quartel

O presidente Alberto Fernández, no dia 9 de junho, reunia-se com o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, que lhe levara apoio na renegociação da dívida milionária da Argentina com o FMI e o Clube de Paris. Por meio de uma gracinha antidiplomática, quis bajular o chanceler espanhol: “Os mexicanos vieram dos índios, os brasileiros vieram da selva, mas nós, os argentinos, viemos dos barcos. E eram barcos que vinham da Europa”.

A desinformação de Fernández contraria a reputação argentina de país culto, que por muito tempo teve alto padrão de educação, interrompido pela ditadura militar. Um país que tem cinco prêmios Nobel.

Já o México é, provavelmente, o país mais culto da América Latina. Foram justamente os espanhóis que destruíram civilizações na extensa região de que o México era parte. Seus intelectuais são em boa parte mestiços.

Qualquer criança sabe que nós brasileiros não viemos só da selva. Quem dela veio, foi lá buscado e caçado. Somos originários da miscigenação de portugueses e espanhóis com indígenas e africanos. O Brasil de então esteve sob domínio da Espanha de 1580 a 1640.

Bolsonaro é até mais abundante nas gracinhas presidenciais desenxabidas. Só que ele elege como objeto do seu deboche, da sua política de pouco caso, o povo brasileiro. Para ele, nós brasileiros somos estrangeiros de anedota. Somos tratados como inimigos do brasileiro que ele pensa que é, cidadão de quartel.

Maria Cristina Fernandes - A escalada da retórica militar bolsonarista

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Em 30 meses, discurso bolsonarista passa do acerto de contas com a punição de que foi vítima como capitão à pregação ao Exército de que Pazuello deveria ser perdoado porque todos são “seres políticos”

Do acerto de contas com os militares que o puniram e o levaram a deixar o Exército, o presidente Jair Bolsonaro passou, ao longo de seu mandato, a cobrar, das Forças Armadas e policiais militares, a lealdade, acima da Constituição, aos votos que o elegeram. É o primeiro passo para cobrar a adesão dos militares à contestação dos resultados eleitorais de 2022.

É isso que mostra a análise dos discursos presidenciais. A página oficial do Palácio do Planalto na internet registra 64 pronunciamentos, mas nem todos estão lá arquivados, como, por exemplo, aquele dirigido a generais em encontro fechado em São Gabriel da Cachoeira (AM), no fim de maio deste ano. Um trecho desse discurso, porém, foi colocado pelo presidente em suas redes sociais.

De velado, o golpismo nos seus discursos passou a ser escancarado. Se, no início, a presença em cerimônias de formaturas militares lhe servia para lembrar aos jovens que sua indisciplina lhe havia permitido chegar à Presidência, nos últimos tempos Bolsonaro impôs sua versão para o valor da indisciplina aos próprios generais, quando chegou a dizer que todos “eram seres políticos”. Ao longo desse período, Bolsonaro, que chegou a enfatizar, na sua estreia, a importância dos demais Poderes para o equilíbrio constitucional, acabou por apelar, neste ano, ao respeito supremo “de nós, militares” ao povo.

A transição no discurso foi marcada pela aprovação da reforma da aposentadoria e carreira militares, em 2019, que, além de beneficiar mais os altos oficiais, cobrou-lhes uma fatura muito menor do que aquela imposta aos civis pela reforma da Previdência. E também pela elaboração de dois Orçamentos que preservaram o Ministério da Defesa frente à média dos cortes de gastos. A escalada foi marcada ainda por portarias e projetos que aumentaram a entrada, a posse e o porte de armas, além de decisões que diminuíram o poder do Exército no controle dos armamentos.

O que a mídia pensa: Opiniões/Editoriais

EDITORIAIS

Equilibrismo com os juros

O Estado de S. Paulo

Maldição para milhões de famílias, a inflação superou 8% em 12 meses, ameaça romper o teto da meta no fim do ano e parece ter corroído, finalmente, o otimismo do Banco Central (BC). Ao anunciar a nova alta dos juros básicos, desta vez para 4,25%, o Comitê de Política Monetária (Copom) reconheceu: “A persistência da pressão inflacionária revela-se maior que o esperado”, fato já percebido pelas donas de casa. Foi o terceiro aumento consecutivo da taxa básica. Nas três ocasiões o acréscimo foi de 0,75 ponto porcentual. Repetiu-se o degrau, mas a menção a “choques temporários” sumiu dos parágrafos iniciais da nota emitida depois da reunião. Também desapareceu a referência a uma normalização “parcial” dos juros, presente nos dois comunicados.

Mais um ajuste de 0,75 ponto poderá ocorrer na reunião de agosto, segundo o informe. Como sempre, a decisão dependerá, segundo se ressalva, de novas informações. Mas já se aposta, no mercado, numa alta de 1 ponto porcentual. A previsão de 6,25% no fim do ano, indicada pela pesquisa Focus, do BC, pode estar superada. Já se fala em 6,50%.