sábado, 26 de junho de 2021

Só uma frente democrática amplíssima pode levar a “República bolsonarista” à lona. Algumas análises

A seguir, o sociólogo Luiz Werneck Vianna, o pesquisador Roberto Andrés e o cientista social Rudá Ricci comentam os desdobramentos da crise política

Enquanto estivermos nessa coisa pendular Bolsonaro versus Lula, não avançaremos bem. Não se trata de repor o passado. Trata-se de cavar o caminho do futuro - Luiz Werneck Vianna.

As denúncias do servidor público Luis Ricardo Miranda, chefe da divisão de importação do Ministério da Saúde, ao Ministério Público Federal, de ter sofrido "pressão" para assinar o contrato da compra da vacina indiana Covaxin, e as farpas trocadas entre seu irmão, o deputado federal Luis Claudio Miranda (DEM-DF), e o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), tensionam ainda mais a crise política e reacendem a discussão sobre a possibilidade de impeachment do presidente Bolsonaro, caso as irregularidades nos contratos da compra da Covaxin sejam comprovadas.

Na avaliação do sociólogo Luiz Werneck Vianna, os acontecimentos recentes deixaram o governo “mais débil”. Entretanto, afirma, “não estou vendo risco imediato de impeachment”. Na entrevista a seguir, concedida por telefone ao Instituto Humanitas Unisinos - IHU, ele diz que o governo ainda tem chances de vencer as eleições presidenciais de 2022, mas não conseguirá se reproduzir além disso. O mais urgente no momento, pontua, é a construção de uma “frente amplíssima”, capaz de “organizar, reaglutinar e apaixonar a população em torno de uma ação comum”. As ruas são uma via, sugere: “A última manifestação teve um caráter amplo, não foi partidária, mostra por onde se pode ir e por onde se deve avançar”.

Roberto Andrés ressalta que "para o governo cair há grandes rochedos a serem transpostos. O maior deles é o grande apoio parlamentar que o governo conquistou na Câmara, através da farta distribuição de orçamento (e de orçamento secreto, o Bolsolão) para deputados da velha direita fisiológica, o grupo chamado de Centrão". Em entrevista concedida por e-mail, ele observa que a "retomada econômica pode beneficiar Bolsonaro", que "mesmo no pior momento da pandemia, não perdeu seus 25% de apoio (o que é bastante, indicando um piso alto)". Apesar de as manifestações do dia 19 de junho terem sido maiores e mais diversas do que a realizada no mês passado, Andrés destaca que "ainda não é ‘todo mundo contra Bolsonaro’", mas "manter-se nas ruas e na ofensiva contra o governo, ainda que não for para derrubá-lo, pode ser fundamental para buscar evitar que a parte volátil do eleitorado – o terço intermediário – passe a apoiar Bolsonaro em um contexto de melhora econômica após o fim da pandemia".

Rudá Ricci, em entrevista concedida por mensagens de texto via WhatsApp, reconhece o peso das movimentações da semana, mas ainda acha cedo para embarcar nessa ideia de ‘queda da República’ bolsonarista. “Porque as principais forças oposicionistas não desejam passar o bastão para Mourão. Se o vice-presidente assume, retira parte do potencial da candidatura de Lula”, justifica. Para ele, “vivemos uma espécie de movimento circular: as mobilizações de rua exigem o “Fora Bolsonaro”, o campo lulista procura se apresentar como portador da procuração das ruas, empresários procuram viabilizar a terceira via e Arthur Lira mata no peito e procura retirar mais vantagens do governo federal, chantageando com a possível abertura da apreciação do pedido de impeachment”. E por isso sugere que, depois das mobilizações das ruas, chega a hora da negociação. “A partir de agora, as lideranças dessas mobilizações precisam vir a campo para negociar a mudança do país. Sem isso, podemos retornar à situação de 2013 em que tantos saíram às ruas e nada foi negociado”, pontua.

Para o jornalista Moisés Mendes, “Bolsonaro derreteu”. “O Centrão saltará fora quando se sentir em prejuízo por apoiar um governo perto do fim, e os militares são imprevisíveis e inconfiáveis. Os empresários e o que se chama genericamente de mercado, mesmo silenciosos, dão sinais de que já saltaram fora”, observa, em entrevista concedida por e-mail ao Instituto Humanitas Unisinos, ontem à noite, ainda quando acompanhava a sessão da CPI no Senado. Além disso, observa que “Bolsonaro não tem apoio explícito do poder econômico, é inimigo da grande imprensa, perdeu boa parte do que seria sua base social de raiz (especialmente os ricos e ressentidos de classe média e boa parte dos evangélicos) e aparece muito mal nas pesquisas”.

Além disso, Moisés ressalta que as manifestações de rua parecem estar ganhando peso. “É possível derrubar um governo fazendo um ato por mês? Claro que não. O Brasil tenta retomar as manifestações de rua como país retardatário”, sopesa. “O dado relevante é que as duas manifestações de maio e junho tiveram ampla participação dos jovens. Mas o que explica a apatia nas universidades? As novas manifestações marcadas para 24 de julho podem dizer se avançaremos em quantidade e vitalidade ou se continuaremos no mesmo patamar”, acrescenta.

Luiz Werneck Vianna é professor-pesquisador na Pontifícia Universidade Católica - PUC-Rio.

Roberto Andrés é professor na Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG e doutorando em História das Cidades na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAU-USP.

Rudá Ricci é graduado em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUCSP, mestre em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas - Unicamp e doutor em Ciências Sociais pela mesma instituição. 

Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre, escreve para os jornais Extra Classe, DCM e Brasil 247. É autor do livro de crônicas Todos querem ser Mujica (Porto Alegre: Editora Diadorim, 2016). Foi colunista e editor especial do jornal Zero Hora, no Rio Grande do Sul.

Confira a entrevista.

Marco Aurélio Nogueira* - Do prestígio, da responsabilidade e além

O Estado de S. Paulo

Só os democratas poderão evitar o avanço da erosão que hoje afeta o Estado brasileiro

Os militares sempre foram importantes agentes políticos e cumpriram funções decisivas na vida nacional. Para recordar: fizeram a República em 1889, foram reformadores com o tenentismo e a Coluna Prestes nos anos 1920-1930, foram admirados e temidos, ganharam prestígio e densidade institucional. Com o golpe militar de 1964, ajudaram a que o País ingressasse num ciclo ditatorial que teve alto custo social e político, prejudicando grandemente a imagem das Forças Armadas. Durante os anos de chumbo, os militares foram vistos com temor, sem a admiração acumulada ao longo da História.

Com a redemocratização, os militares entraram numa fase de “neutralidade” e respeito constitucional. Voltaram a ser elogiados pela postura técnica e pela disciplina.

Os dias correntes trouxeram à tona um enigma: o que levou os militares a emprestarem seu prestígio e seus recursos ao governo Bolsonaro, um ex-militar sabidamente indisciplinado, ignorante, agressivo e sempre pronto a desafiar a corporação com atos e palavras?

Uma primeira hipótese já foi explorada: com o apoio ativo, os militares conseguiriam controlar o presidente e dar ao governo um suporte técnico adicional, que não viria do bolsonarismo, bastante conhecido por ser pobre de quadros e ideias. Não aconteceu.

Cristovam Buarque* - O bloco do avanço

Blog do Noblat / Metrópoles

Se não há esquerda e direita, também não há centro

Aqueles que aparecem na foto como representantes do “centro” costumam dizer que não há mais “esquerda” e “direita” no espectro político. Se não há esquerda e direita, também não há centro. Os conceitos das palavras esquerda e direita perderam seus significados tradicionais, no qual esquerda significava sintonia com avanços sociais, tecnológicos e econômicos, e direita significava conservadorismo contra avanços. Ao longo de décadas do século XX, as forças de esquerda empurraram reformas sociais em benefício de trabalhadoras e pobres, além de auxiliar no avanço econômico. A direita se manifestava contra as reformas até mesmo promovendo e dando sustentação a golpes autoritários.

Mas as revoluções tecnológicas e geopolíticas das últimas décadas do século XX – globalização, limites ecológicos ao crescimento, automação, esgotamento fiscal, gerencial e ético do Estado – terminaram ameaçando ganhos das classes trabalhadoras e colocando as forças de esquerda na defesa dos interesses destes grupos, mesmo sacrificando o progresso ao se posicionar contra as reformas do interesse dos grupos que ficaram excluídos, principalmente os pobres e as gerações futuras. Por sua vez, a direita passou a defender reformas que beneficiam aos donos do capital. Necessárias ao avanço econômico, mas que não beneficiam aos pobres e ainda tiram direitos de trabalhadores. A direita continuou direita do ponto de vista social e ecológico. A esquerda passou a ser direita do ponto de vista tecnológico, social e ecológico, ao se posicionar contra reformas necessárias, no lugar de apontar na direção de reformas estruturais progressistas, em sintonia com o avanço técnico, o progresso econômico, a justiça social e a sustentabilidade ecológica e fiscal.

João Gabriel de Lima - A dose errada do remédio certo

O Estado de S. Paulo

Estudos sugerem que cruzadas contra a corrupção fazem mais mal do que bem à democracia

Duas suspeitas graves de corrupção, uma nova e uma antiga, movimentam o debate público brasileiro. A nova se refere a irregularidades na compra de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin. O Ministério Público Federal chamou atenção para o caso, em que pelo menos dois detalhes geram desconfiança. O Estadão revelou que o governo contratou as vacinas com um superfaturamento de 1.000%. E a compra, diferentemente do que ocorrera em operações similares, foi intermediada por um laboratório.

O deputado Luis Miranda, dos Democratas, disse ao Estadão que avisou Jair Bolsonaro de possíveis irregularidades na compra das vacinas, e mostrou uma troca de mensagens com um ajudante de ordens do presidente. Bolsonaro, até onde se sabe, não levou o caso à polícia. Cabe à CPI da Covid interrogar os envolvidos e apurar os fatos.

O caso antigo é o que levou à queda do ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles. Ele é suspeito de participar de um esquema de exportação ilegal de madeira. O Coaf registrou uma movimentação “extremamente atípica” de R$ 14,1 milhões na conta do escritório de advocacia em que o ex-ministro é sócio da mãe.

Centro enxerga ‘derretimento’ de Bolsonaro

Pesquisa Ipec mostra que apenas 13% do eleitorado rejeitam hoje votar tanto em Lula quanto no atual presidente

Pedro Venceslau, Caio Sartori, Marcelo de Moraes e Daniel Bramatti / O Estado de S. Paulo

pesquisa do instituto Ipec divulgada pelo Estadão indica o desafio para a viabilização de uma terceira via que seja alternativa ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ao presidente Jair Bolsonaro. Os partidos que dizem se opor aos dois candidatos mais bem colocados no levantamento apostam agora em um “derretimento” ainda maior de Bolsonaro – por essa avaliação, apenas o petista tem potencialmente vaga assegurada em um eventual segundo turno.

O Ipec mostrou que apenas 13% do eleitorado rejeita votar tanto em Lula quanto em Bolsonaro. Esses eleitores se distribuem entre os que hoje se mostram inclinados a votar em CiroDoria e Mandetta. A soma das intenções de voto no ex-presidente e no atual é de 72% – ou seja, quase três em cada quatro brasileiros têm como preferido um dos polos da disputa. São números que mostram pouco espaço para uma candidatura alternativa, ao menos neste momento.

Hélio Schwartsman - Por que ainda se receita cloroquina?

Folha de S. Paulo

É grave para um médico contemporâneo desprezar ou não saber usar o método científico

Por que alguns médicos insistem em prescrever cloroquina contra a Covid? A resposta está numa das facetas mais surpreendentes da arquitetura cerebral humana: a razão não evoluiu para nos aproximar da verdade, mas para nos tornar persuasivos.

É contraintuitivo, mas faz sentido. Nas savanas africanas em que nossa espécie se desenvolveu, era raro encontrar um problema matemático de cuja solução nossas vidas dependessem. Decisões vitais mais corriqueiras, como fugir do predador, não são tomadas com recurso a raciocínios, mas a programas automatizados que executamos “sem pensar”. Já vencer um debate, isto é, tornar-se uma pessoa influente no grupo, traz vantagens, inclusive reprodutivas.

Cristina Serra - O 'vacinagate' de Bolsonaro

Folha de S. Paulo

O escândalo da Covaxin está dentro do Palácio do Planalto, Bolsonaro sabe e isso explica seu descontrole

A veloz evolução dos acontecimentos na CPI da Covid abalou os nervos do contaminador-geral da República. Suas explosões perante repórteres são o que lhe restam diante dos questionamentos sobre o que já pode ser chamado de escândalo da Covaxin ou o “vacinagate” de Bolsonaro.

O fio da meada foi puxado por esta Folha, que revelou o depoimento do servidor do Ministério da Saúde Luís Ricardo Miranda ao Ministério Público Federal, sobre pressões para compra da Covaxin, do laboratório indiano Bharat Biotech. As tratativas ocorreram na gestão catastrófica do general Eduardo Pazuello no Ministério da Saúde e envolvem dirigentes da pasta indicados por ele. O irmão do servidor, deputado Luís Miranda (DEM-DF), disse que alertou Bolsonaro sobre o caso suspeito.

Alvaro Costa e Silva - Amém à corrupção

Folha de S. Paulo

Na compra de vacinas e até no Cristo Redentor

Ricardo Salles pediu demissão, mas o estrago foi feito e vai prosseguir. Ele deixou o caminho da boiada livre para o sucessor. Criou regras que dificultam a aplicação de multas, solapou os poderes da pasta ambiental limitando a atuação dos fiscais e os substituindo, favoreceu o trabalho de garimpeiros ilegais e grileiros de terras, bancou um esquema de contrabando de madeira. E comprou briga com a Polícia Federal —único erro na sua estratégia de destruição. Foi o maior predador da história da Amazônia debaixo do nariz do Exército.

Tudo isso só foi possível porque ele agiu com o amém de Bolsonaro, que agora o descarta para desviar a atenção do escândalo envolvendo a compra da vacina Covaxin. Salles tinha tanta liberdade que decidiu mandar no Cristo Redentor. Segundo o Ministério Público Federal, a gestão dele atuou para favorecer, sem licitação, o grupo Cataratas na exploração comercial do ponto turístico no alto do Corcovado.

Demétrio Magnoli – Pôr do sol, atrás das grades

Folha de S. Paulo

Na praça do Pôr do Sol, 'restrições sanitárias' revelam sua face, de restrições sociais

No lugar dos tapumes, nasceram cercas. Na icônica praça do Pôr do Sol, zona oeste de São Paulo, as "restrições sanitárias" revelaram sua verdadeira face, de restrições sociais. Lá, a prefeitura paulistana sintetizou sua própria identidade: assim como os comunistas definem-se por meio da foice e do martelo, o poder municipal encontrou seus símbolos nas grades e nos ferrolhos.

Tapumes interditaram a praça, em abril de 2020, "com o intuito de conscientizar e prevenir a população devido à pandemia do novo coronavírus, a fim de evitar aglomerações", segundo nota da Subprefeitura Pinheiros redigida em língua vagamente assemelhada ao português.

As duas reaberturas de parques e praças municipais, em julho de 2020 e em abril passado, não se estenderam à praça do Pôr do Sol. O advento da cerca evidenciou que a saúde pública não passava de álibi: a praça está fechada para evitar a circulação de "gente estranha".

Ricardo Noblat - Se crime não há, a corrupção foi liberada e não se fala mais nisso

Blog do Noblat / Metrópoles

Reze Bolsonaro para que seus devotos não juntem meio milhão de mortos com atraso na compra de vacinas e negócio sujo

O presidente Fernando Collor de Melo caiu porque um Fiat Elba foi comprado para seu uso com dinheiro de Caixa 2.

A presidente Dilma Rousseff caiu porque desrespeitou a Lei de Responsabilidade Fiscal gastando mais do que o permitido.

O presidente Jair Bolsonaro sabia ou ficou sabendo da roubalheira no Ministério da Saúde e nada fez para abortá-la.

Se esse for um crime menor comparado com os de Collor e Dilma, a corrupção está liberada e não se fala mais nisso.

Reze Bolsonaro para que seus devotos não saibam somar meio milhão de mortos + vacinas com atraso + corrupção.

Em breve irá para o lixo a história de que ele não cairá porque a pandemia esvaziou as ruas.

Já teve gente na rua pelo menos duas vezes nos últimos 30 dias. É tiro certo que haverá mais povo daqui para frente.

Pablo Ortellado - Uma corrida do bem?

O Globo

João Doria, Eduardo Paes e Flávio Dino estão se provocando no Twitter para ver quem vacina mais, no que chamam de uma “corrida do bem”. O esforço por imunizar mais gente, na leitura dos políticos, seria uma disputa saudável, pela vida. Mas, por trás da brincadeira, vemos uma briga por protagonismo político, de olho nas eleições, que está desorganizando ainda mais o planejamento nacional da vacinação.

O Ministério da Saúde distribui as vacinas aos estados em partes iguais, na proporção do público-alvo do Programa Nacional de Imunizações. Como é possível então que São Paulo já esteja imunizando quem tem 43 anos enquanto Minas Gerais, no critério de idade, parou na população acima de 60?

Há três possibilidades para explicar a diferença. A otimista, mas também a mais improvável, é que se trata de uma superioridade logística e operacional dos paulistas. São Paulo estaria distribuindo e aplicando as doses de maneira muito mais rápida que Minas. Mas a diferença é tão grande e a opacidade dos dados tamanha, que faz pensar que pelo menos uma de duas outras coisas está acontecendo.

Carlos Alberto Sardenberg - Vai liberar geral

O Globo

 ‘Sessão de psicanálise, você diz: sonhei com Fulano/a, e não foi um sonho erótico.

Danou-se. O/a analista já sabe: foi erótico.

É clássico.

Vários ministros do STF que votaram pela anulação das condenações de Lula imediatamente acrescentaram: atenção, não vale para os demais casos.

Ou seja, vale.’

Comecei assim a coluna de 17 de abril passado. Naquele momento, o caso de Lula estava no seguinte ponto: o ministro Fachin, relator, havia decidido que o foro adequado para o julgamento de todos os casos de Lula era Brasília, e não Curitiba, sede da Lava-Jato. Assim, os processos estavam cancelados e deveriam recomeçar da estaca zero.

Queria evitar, com essa manobra, que a Segunda Turma do STF julgasse a suspeição de Sergio Moro no caso do triplex do Guarujá.

Não funcionou. A Segunda Turma seguiu esse julgamento e, por 3 a 2, numa votação liderada por Gilmar Mendes, considerou Moro suspeito e anulou a condenação no caso do apartamento do Guarujá.

De novo, vieram com a lorota de que só valia para aquele caso. Mas o caso foi ao plenário do STF — e este decidiu, por 7 votos a 4, manter a decisão da Segunda Turma: que Moro havia sido parcial na condenação de Lula no caso do triplex. Só se tratou desse caso.

Ascânio Seleme - Não dá mais para disfarçar o cheiro de podre

O Globo

O autoritário, intolerante, reacionário, equivocado e hipócrita governo Bolsonaro terá de explicar agora o cheiro de podridão que exala do Palácio do Planalto

Se ainda havia alguma dúvida, ela desapareceu ontem. O autoritário, intolerante, reacionário, equivocado e hipócrita governo Bolsonaro terá de explicar agora o cheiro de podridão que exala do Palácio do Planalto. O presidente sabia que havia um esquema de desvio de verbas montado no Ministério da Saúde. A denúncia feita à CPI da Covid talvez seja a mais grave, pelo menos dentre os episódios que já se conhece, porque envolve vidas humanas. Segundo o deputado Luis Farias, Bolsonaro sabia que o deputado Ricardo Barros, seu líder no Congresso, estava envolvido na falcatrua da importação da vacina Covaxin.

O presidente está diretamente envolvido, no mínimo por prevaricação. Segundo a acusação do deputado Luis Miranda e de seu irmão Luis Ricardo, funcionário do Ministério da Saúde, os dois foram a Bolsonaro em 20 de março, um sábado, relatar que autoridades do ministério faziam pressão para o servidor aprovar uma importação de vacina com irregularidades evidentes. O presidente disse que tomaria providência, e citou o nome de Barros. Ele não tomou providências e só agora apareceu com a desculpa esfarrapada de que apresentou o caso ao ministro Pazuello (querem deixar a bomba no seu colo, general, abre o olho) e que este voltou depois dizendo que não havia nada.

Marcus Pestana* - Os caça-fantasmas e a assombração do comunismo

O Manifesto Comunista, de 1948, escrito por Marx e Engels, começa de forma dramática: “Um espectro ronda a Europa – o espectro do comunismo”. Marx não viveu para ver a fracassada experiência do “socialismo real” na URSS, no Leste Europeu, na China e em mais alguns poucos países. Hoje, uma verdadeira caricatura da ameaça comunista se tornou arma política nas mãos da extrema-direita mundial, para gerar o medo necessário à uma polarização extremada.

No último sábado, tinha rascunhado artigo sobre o tema, motivado pelas reações tresloucadas de muitos nas redes sociais aos convites para a comemoração dos 90 Anos do Presidente Fernando Henrique, segundo elas: “um comunista dissimulado e perigosíssimo”. Mas, como se acendeu mais uma polêmica inútil sobra a pandemia em relação à suposta notificação exagerada das mortes por COVID-19, como ex-secretário de saúde de Minas Gerais, me senti na obrigação de entrar na discussão emergencial. Como dito na música Certas Canções, de Milton e Tunai: “Certas canções que ouço, cabem tão dentro de mim. Que perguntar carece, como não fui eu que fiz?”. Eis que no mesmo sábado, 19 de junho, meu amigo, cientista político e diretor-geral da Fundação FHC, publicou, no jornal “O Estado de São Paulo”, o artigo “O bicho-papão do comunismo”. Reclamei com ele que tinha telepaticamente me roubado a ideia. Ele me estimulou a insistir no tema.

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

EDITORIAIS

Bolsonaro tem muito a explicar sobre a Covaxin

O Globo

São a cada dia mais frágeis os argumentos do governo para justificar o contrato de R$ 1,6 bilhão para importar a Covaxin, vacina mais cara entre todas as compradas pelo Brasil. Apesar do tumulto provocado pelos senadores governistas na sessão de ontem da CPI da Covid, o depoimento do servidor Luis Ricardo Miranda, chefe do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, e de seu irmão, o deputado Luis Claudio Miranda (DEM-DF), trouxe detalhes novos que confirmam as suspeitas. Apresentaram evidências de vários alertas ao presidente Jair Bolsonaro sobre as irregularidades, como Luis Ricardo denunciara em entrevista ao GLOBO. Ele reiterou que, em encontro no dia 20 de março no Alvorada, Bolsonaro se comprometeu a encaminhar o caso à PF.

Mesmo depois do encontro em que afirmaram ter denunciado as suspeitas ao presidente, a pressão sobre Luis Ricardo persistiu, segundo mensagens apresentadas. As evidências revelam um pedido de pagamento antecipado, fora do contrato, para importar três lotes com data próxima ao vencimento. Se tivesse sido assinado, a empresa poderia cobrar US$ 45 milhões adiantados. Depois de muito resistir, Luis Claudio disse que Bolsonaro atribuiu as irregularidades ao deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara. Luis Ricardo afirmou ter ficado sabendo da cobrança de propina por vacinas, mas não deu detalhes.