segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Fernando Gabeira - Democracia brasileira, coitadinha

O Globo

Um relatório divulgado em Estocolmo pelo Idea (Instituto Internacional para a Democracia e a Assistência Eleitoral) aponta a decadência da democracia brasileira.

Na semana passada, escrevi um longo artigo sobre isso. Reconheço que Bolsonaro é um dos principais responsáveis, da gestão da pandemia aos ataques à imprensa e ao STF. No meu entender, contudo, Bolsonaro não inventou a decadência da democracia brasileira. Apenas aproveitou-se dela para aprofundá-la ainda mais com seus impulsos autoritários.

Gostaria de anotar alguns pontos que escapam ao radar dos grandes observadores internacionais, coisas miúdas do cotidiano, que, de certa maneira, são o dínamo da decadência, pois têm o poder de arruinar o apoio popular à democracia.

O clima de Brasília mudou nos últimos tempos. Formou-se uma frente bastante ampla de parlamentares, e até setores da Justiça, destinada a favorecer a impunidade.

Durante muito tempo, vigorou o orçamento secreto, uma aberração no sistema democrático. Em menos de dois meses, surgiram duas propostas de emenda constitucional com o mesmo apelido: PEC da Vingança. Uma delas visava ao Ministério Público; a outra, ao próprio STF. Nesta última, então, a vingança parecia mais explícita: queriam aposentar exatamente a ministra Rosa Weber, que bloqueou o orçamento secreto.

Demétrio Magnoli - A alma do PT

O Globo

A nota infame do PT que descreveu a “eleição” de Daniel Ortega como “grande manifestação popular e democrática” foi retirada do site para não provocar ruídos eleitorais no Brasil. Mas ela expressa a posição do partido — e o desprezo de dois ex-presidentes, Lula e Dilma, ao sistema democrático.

“Por que Angela Merkel pode estar no poder por 16 anos e Ortega não?”, indagou Lula em entrevista ao jornal El País, reativando um paralelismo cínico que mobiliza desde sempre. Diante da resposta singela da entrevistadora — “ela não encarcerava os opositores”—, o candidato favorito a 2022 simulou recuar, apenas para insistir na falácia de fundo: “Se Ortega detém opositores para que não concorram às eleições, como fizeram comigo, está equivocado”.

A democracia brasileira propiciou que um retirante nordestino, sindicalista metalúrgico, fundador de um partido de esquerda alcançasse a Presidência por dois mandatos. A ditadura de Ortega aboliu a alternância no poder, prendendo as lideranças concorrentes, inclusive os antigos companheiros de esquerda da Frente Sandinista. No Brasil democrático, Lula foi preso por corrupção, mas um Judiciário independente revisou o processo, declarou parcial o juiz que o sentenciou e anulou as condenações. Na tirania nicaraguense, os juízes fazem o que Ortega determina. Mas, segundo Lula, é tudo igual.

Bruno Carazza* - A esquerda que enxerga além

Valor Econômico

Movimentações atuais miram o futuro sem Lula

Na recém-lançada biografia Lula: Volume I, o jornalista Fernando Morais conta que, após deixar a cela da PF em Curitiba, o petista se dirigiu aos manifestantes que o acompanharam em vigília nos 581 dias de prisão. Depois do discurso inflamado, “Lula dá um beijo cinematográfico em Janja, desce a escadinha do palanque e, sem precisar anunciar a ninguém, pisa no chão como candidato a presidente do Brasil”.

Morais estava certo. A anulação dos processos contra Lula automaticamente definiu a escolha da esquerda para 2022. Líder com folga nas pesquisas, o recente périplo internacional mostra o apetite do petista por obter um terceiro mandato e, assim, terminar sua carreira política por cima.

O retorno de Lula reenergiza a militância e pode reverter a tendência de queda de votos nesse campo observada desde que ele passou a faixa para Dilma Rousseff, em 2011.

Computando os votos para deputado federal, verificamos que o conjunto de partidos inclinados à esquerda (PT, PSB, PDT, Psol, PV, Cidadania, PC do B, Rede, PCB, PSTU e PCO) viu seu eleitorado subir de 17,1 milhões de votos em 1998 para 31,3 milhões com a primeira vitória de Lula, em 2002.

Sergio Lamucci - O difícil ambiente para a economia em 2022

Valor Econômico

Com Bolsonaro empenhado em se reeleger e o Congresso em manter a captura de uma fatia expressiva do Orçamento, o panorama fiscal deve permanecer nublado

A economia brasileira está em marcha lenta, e as perspectivas para os próximos meses são desanimadoras. A inflação segue elevada e os juros vão continuar a subir, num ambiente em que a atividade já dá sinais claros de fraqueza, como mostraram os resultados da indústria, do comércio e dos serviços em setembro. A um ambiente interno repleto de incertezas, somam-se agora as dúvidas quanto a uma nova variante da covid-19, a ômicron. Há temores de que nova cepa seja mais transmissível e resistente às vacinas existentes. O medo de uma nova variante que acelere o contágio da doença, dando um tranco na economia mundial, aumentou com força a aversão global ao risco na sexta-feira.

Celso Rocha de Barros - Ladrões ameaçam STF com fascismo

Folha de S. Paulo

A direita quer reduzir a idade de aposentadoria dos ministros do Supremo para 70 anos, de modo a permitir que Bolsonaro indique mais dois integrantes do tribunal

A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou a proposta da militante de extrema-direita Bia Kicis (PSL-DF), presidente da comissão, que revoga a "PEC da Bengala".

"PEC da Bengala" foi uma das inúmeras falcatruas cometidas pela direita brasileira em 2015-2016. Para evitar que Dilma Rousseff exercesse seu direito de indicar mais ministros para o STF, o Congresso ampliou a idade de aposentadoria compulsória dos ministros para 75 anos. Agora que a direita governa o país, a turma quer reduzir de novo a idade de aposentadoria para 70, de modo a permitir que Bolsonaro indique mais dois ministros.

O objetivo de Kicis e Bolsonaro é claro: seguir, no Brasil, o roteiro de desmonte da democracia implementado pelos governos autoritários que os inspiram, como os da Hungria e da Polônia. Os "novos autoritários" já descobriram faz tempo que o caminho mais curto para desmontar a democracia é o aparelhamento da Suprema Corte. A Suprema Corte decide o que a Constituição diz, quem controla a Suprema Corte diz o que é a Constituição.

Marcus André Melo - Ministérios e corrupção

Folha de S. Paulo

O que impede que coalizões não degenerem em acordos escusos?

Duas manchetes —uma internacional, outra doméstica— dão o mote para uma coluna sobre a formação de governos em contextos multipartidários. A primeira: "Alemanha finalmente escolhe o sucessor de Merkel". Pela primeira vez o país terá uma "coalizão semáforo" com três partidos: SPD, Verdes e Liberais (FDP). A segunda: "Minha reeleição na Câmara não depende da reeleição de Bolsonaro, diz Lira".

Sob o parlamentarismo, a formação de governos tipicamente envolve acordos formais programáticos como também a divisão de pastas ministeriais, como mostrei neste espaço em 14/2. Nos casos em que não se formam maiorias, o governo continuará minoritário, mas alguns partidos fora da coalizão assinam acordo de não obstrução, garantindo a investidura.

Catarina Rochamonte - A quarta onda e a terceira via

Folha de S. Paulo

É imprescindível a convergência em torno de um bom projeto para o país

Mais uma vez, o mundo está em alerta devido à alta de casos de Covid-19 na Europa e à descoberta de uma nova variante do coronavírus, a ômicron, detectada na África do Sul. Em tempo de imprevisibilidade, tensão e medo como este no qual vivemos, ter à frente da nação uma liderança séria, sóbria, equilibrada e preparada é fundamental.

Os alemães, por exemplo, tiveram a sorte de atravessar as primeiras ondas da pandemia sob a liderança de Angela Merkel, enquanto nós, brasileiros, tivemos o infortúnio de atravessá-las sob a desorientação de Jair Bolsonaro; e corremos o risco de termos por presidente, nas próximas crises, alguém sem noção e autoritário o suficiente para equiparar essa grande estadista alemã ao ditador da Nicarágua.

Carlos Pereira – Não é só um problema moral

O Estado de S. Paulo

O debate sobre o combate à corrupção qualifica as eleições de 2022

Alguns têm argumentado que a entrada de Sérgio Moro na corrida presidencial traria novamente o tema do combate à corrupção para o centro do debate público, o que supostamente seria contraproducente, diante de problemas mais urgentes a serem enfrentados pelo Brasil, como desenvolvimento econômico, inflação e inclusão social.

É como se o combate à corrupção fosse eminentemente um problema moral e não houvesse correlação entre os resultados de políticas econômica e social e comportamentos predatórios de governantes.

Entretanto, como mostro no quarto capítulo do livro Making Brazil Work: Checking the President in a Multiparty System, governos que vivem em ambientes politicamente competitivos e sob fortes restrições de organizações de controle robustas e independentes apresentam melhor desempenho econômico e social do que governos não controlados.

Definição no PSDB cria ‘núcleo duro’ no centro com Doria, Ciro e Moro

Pedetista tem assegurado que não abre mão da disputa; unificação depende de entendimento entre governador e ex-juiz, que admitem a ideia de composição futura

Adriana Ferraz / O Estado de S. Paulo

O fim das prévias tucanas serviu para delimitar uma espécie de núcleo duro do centro político para a disputa presidencial de 2022. Expandido por mais sete pré-candidaturas, a chamada terceira via tem agora três postulantes que trabalham efetivamente para liderar uma candidatura: Ciro Gomes (PDT), Sérgio Moro (Podemos) e João Doria (PSDB).

Ciro e o PDT têm assegurado que não abrem mão da disputa. O governador paulista e o ex-juiz da Lava Jato admitem a ideia de composição futura. Ambos, porém, esperam arregimentar apoios, demonstrando até o fim do primeiro trimestre do próximo ano que seus projetos possuem mais perspectiva de poder.

Entrevista | Doria: “Minha candidatura se posiciona frontalmente contra Lula e Bolsonaro”

Vencedor das prévias do PSBD diz que governo de SP é exemplo do que poderá ser sua gestão do país

Por Cristiano Romero / Valor Econômico

BRASÍLIAO governador de São Paulo, João Doria (PSDB), estreou na política há apenas cinco anos, mas não pode ser mais chamado nem de “novato” nem de “outsider”. Em meia década, foi eleito para administrar, respectivamente, o terceiro e o segundo maior orçamento do país. No sábado, foi eleito por seu partido, o PSDB, numa disputa renhida, para concorrer em 2022 ao cargo máximo da República, responsável por gerir um dos maiores orçamentos públicos do planeta.

Na prévia concluída no sábado, como ocorreu na escolha do candidato à prefeitura de São Paulo em 2016 e ao governo paulista dois anos depois, tucanos históricos se uniram para tentar impedir a escolha de Doria. Com poucas exceções - uma delas, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, apoiador do governador -, esse grupo trabalhou intensamente para eleger o jovem governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite.

É uma narrativa falsa, de que não sou agregador; temos 13 partidos na base aliada de apoio ao governo na Assembleia”

Doria se recusa a se auto-definir como o candidato da ‘terceira via’, caminho com o qual setores da sociedade contam para tirar o incumbente do cargo - o presidente Jair Bolsonaro, candidato à reeleição - e evitar a volta ao poder de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), atual líder das pesquisas. Mas, nesta entrevista ao Valor, Doria se lança como o candidato posicionado frontalmente contra Bolsonaro e Lula. É provável que a partir de hoje o governador seja considerado por analistas a terceira via.

Dentro do PSDB, a principal crítica dirigida a Doria seria a de que ele não é um político agregador. O governador não gosta de falar sobre isso, mas, no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo de São Paulo e da residência oficial do governador, sabe-se que ele considera essa a mais falsa das teses que seus colegas de partido criam para defini-lo de maneira pejorativa.

“Como alguém pode não ser agregador e ter Henrique Meirelles, que é de outro partido, no seu governo? Rodrigo Maia, por exemplo? E Rossieli Soares, que veio para o governo assumir a área de educação? Sérgio Sá Leitão veio para cultura. O Vinicius Lumertz, que era de outro partido, e veio cuidar da área de turismo? O vice-governador Rodrigo Garcia era do DEM, mas transferiu-se para o PSDB. É candidatíssimo à sucessão em São Paulo”, desabafa Doria.

“Para complementar, temos 13 partidos na base aliada de apoio ao governo na assembleia legislativa de São Paulo, incluindo o PL, o PP e o Republicanos. E não tem nada de espúrio, até porque se houvesse a mídia já saberia, os tribunais de contas saberiam, o Ministério Público, o Tribunal de Justiça etc. Foram três anos de governo sem nenhum escândalo, nenhuma investigação, nada. É possível fazer a política de pratos limpos, a política republicana”, diz Doria. 

A seguir, os principais trechos da entrevista.

César Felício - João competidor

Valor Econômico

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), é, acima de tudo, um competidor. Nunca foi um homem da composição política e provavelmente nunca será. Assim conseguiu se tornar prefeito de São Paulo, governador do Estado e agora candidato do PSDB à presidência: com embate duro contra colegas de partido, rupturas com aliados, enfrentamento com adversários.

Em processo de eleições internas, mobilização é a palavra chave. Quem tem cadastro atualizado, organização, equipe para chegar até a base, leva vantagem. E Doria tem expertise no assunto.

Ele ignora os caciques e vai direto à base. Não é à toa que os mestres em composição construíram as regras das prévias de modo a estabelecer travas na entrada hostil de Doria em currais eleitorais alheios. Criaram um complexo sistema com cinco grupos de eleitores, divididos em quatro colégios eleitorais, de forma a realçar o peso da cúpula.

"Tempo da corrupção, da incompetência e do negacionismo precisa ficar para trás", diz Doria

Pré-candidato tucano criticou não só o governo do presidente Jair Bolsonaro, como também os petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff

Por Edna Simão e Rafael Walendorff / Valor Econômico

BRASÍLIA- O vencedor das prévias do PSDB para a disputa da Presidência da República no ano que vem, João Doria, ressaltou que o tempo da corrupção, da incompetência, do negacionismo, da irresponsabilidade fiscal, da regulação da mídia e dos ataques às instituições democráticas precisa ficar para trás.

Ele elencou ainda, em discurso, medidas adotadas em seu governo no Estado de São Paulo, como trazer a vacina contra o novo coronavírus aos brasileiros, e criticou não só o governo do presidente Jair Bolsonaro, como também dos petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.

“Trouxemos a vacina para os brasileiros. Vacina negligenciada pelo governo federal. Mas que salvou milhões de vidas em todo Brasil e hoje nos permite vencer a pandemia e retomar a economia”, ressaltou.

O pré-candidato tucano afirmou que os governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff representaram a captura do Estado pelo maior esquema de corrupção do qual se tem notícia no país. “A moralidade convertida em roubalheira. Fazer políticas públicas para os mais pobres não dá direito, a quem quer que seja, de roubar o dinheiro público. Os fins não justificam os meios. A péssima gestão da economia com Dilma nos legou dois anos de recessão e desemprego”, frisou.

Mirtes Cordeiro* - Nossos Contos, o livro nº 37

Falou e Disse

Crianças aprendem lendo e escrevendo. Esse processo trabalhado desde o início, em que as crianças vão se acostumando a compreender o que leem e o que escrevem, torna-as capazes para aprender também a exercer o seu protagonismo na vida que têm pela frente.

Não importa os tropeços, se a letra é maiúscula ou cursiva, importa, sim, o conteúdo, a compreensão sobre a escrita e a forma como a criança se vê através das suas manifestações sobre esse processo, porque elas desenvolvem o seu próprio conhecimento.

Ao aprender, a criança vai construindo seu aprendizado a partir da sua linguagem e sua escrita.

Era uma tarde de verão e grande calor, mas a quadra da escola estava repleta de pais, avós, alguns tios e até irmãos dos que iam se formar no ABC, uma tradição nas nossas escolas brasileiras.

Concluir o ABC, numa referência histórica a aprender as primeiras letras, significa estar apto a entrar no ensino fundamental, dominando os princípios básicos da escrita, da leitura. Atualmente já se sabe que inclui também conhecimentos sobre matemática, história geografia e ciências.

As crianças das três turmas do Primeiro Ano Escolar da Escola Polichinelo, felizes e saltitantes, postaram-se em suas cadeiras para ouvir as professoras e a representante das turmas na leitura do seu pequeno texto de agradecimento. Todas entre 6 e 7 anos de idade.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

O estado da democracia

O Estado de S. Paulo.

País sofre abalos nos pilares democráticos desde a eleição de Jair Bolsonaro, mas está longe de ser um país autoritário

Uma democracia vigorosa se sustenta sobre um tripé formado por eleições limpas, liberdade de expressão e associação assegurada por lei e plena vigência do Estado de Direito. É o que o cientista político Tom Ginsburg e o jurista Aziz Huq, professores da faculdade de Direito da Universidade de Chicago, chamam de “predicados básicos da democracia”. Falar em retrocesso democrático, portanto, implica constatar que ao menos um dos elementos desta tríade não vai bem, deixando capenga todo um sistema de direitos e deveres finamente equilibrado.

De acordo com o relatório Estado da Democracia Global 2021, publicado recentemente pelo Instituto Internacional pela Democracia e Assistência Eleitoral (Idea, na sigla em inglês), o Brasil foi um dos países que registraram retrocesso democrático em 2020, ano marcado pela pandemia de covid-19. É preciso entender muito bem os eventos que contribuíram para esse resultado a fim de evitar uma erosão ainda maior dos pilares democráticos no País no futuro próximo.

O Idea avalia o estado da democracia em cerca de 160 países, nos cinco continentes, há décadas. Desde 2016, o Brasil é um dos países-membros da organização intergovernamental, sediada em Estocolmo. Para medir a higidez da democracia nos países avaliados, o Idea leva em consideração critérios como a legitimidade dos governantes, a participação da sociedade nas definições de políticas públicas, a impessoalidade da administração pública, a garantia de direitos fundamentais e o funcionamento do sistema de freios e contrapesos.

Poesia | Carlos Pena Filho - A Rosa, no íntimo

Entro em teu breve sono, onde os minutos

são três pássaros líquidos e enorme,

e descubro os gelados aquedutos
guardiães do silêncio, enquanto dormes.

Pouso a cabeça nos teus lábios sujos

de mundo e tempo, e vejo que possuis

em teus seios, dois bêbados marujos

desesperados, sós, raros, azuis.

Enfim, além (no além de tuas pernas

onde Deus repousou a sua face,

cansado de inventar coisas eternas)

desvendo, ao desespero de quem passe,

a rosa que és, a mística e sombria

a noturna e serena rosa fria.