domingo, 9 de janeiro de 2022

Eliane Cantanhêde: Taras e tarados

O Estado de S. Paulo.

O que é mais grave e realmente perigoso: ser tarado por vacina ou tarado contra vacina?

Pense rápido: o que é pior, ser “tarado por vacina” ou tarado contra vacina? O presidente da República, Jair Bolsonaro, tenta insistentemente dividir o País entre os dois grupos, mas não dá certo, porque ele fala, fala, fala contra a imunização de adultos e agora de crianças, mas ninguém lhe dá ouvidos. Os brasileiros sabem que a questão não é ideológica, mas de vida ou morte.

“Ninguém” talvez seja exagero, porque há tarados que dão de ombros para a ciência e seguem tudo o que seu mestre, ou seu mito, mandar. É triste, talvez doentio. Bolsonaro já proibiu a compra da Coronavac, a “vachina do Doria”, e disse que quem se vacina vira jacaré, as duas doses causam aids na Inglaterra e que tão poucas crianças morrem de covid... Pra que vacinar?

Perguntem aos pais, mães, avós, tios, irmãos, primos, amigos e médicos dos 308 mortos pela doença entre 5 e 11 anos e dos 2.500 abaixo dos 19 anos, que teriam sido salvos com vacinas. E dá um arrepio pensar em quantos ainda podem ser contaminados, internados e... até as doses chegarem.

Ao tentar dividir a população entre tarados pró e contra vacina, Bolsonaro também racha seu governo e sua base aliada. Enquanto ele ataca as vacinas, a nova propaganda oficial badala o índice de imunizados no Brasil e o Exército reforça suas diretrizes pró vacina e contra fake news na pandemia. Vale para o comandante em chefe?

Médicos criticam o estúpido negacionismo do presidente e pediram investigação do ministro Marcelo Queiroga no Conselho Federal de Medicina por desvios ético-profissionais, a Sociedade de Imunização também se rebela e a Sociedade de Pediatria diz em nota que desestimular os pais a imunizarem seus filhos é “lamentável e irresponsável e pode custar vidas”.

O que dizer da deputada Bia Kicis, que jogou no WhatsApp e dali para as matilhas bolsonaristas da internet dados pessoais e profissionais de três médicos que defenderam vacinas para crianças na tal audiência pública? Replicou Bolsonaro, que queria a lista dos técnicos da Anvisa que autorizaram a vacinação infantil. Certamente, para “ripar” a reputação deles, já que não pode demiti-los, como no Iphan, Inep, Inmetro, PF...

E é gravíssimo, além de indigno, o presidente acusar a Anvisa de ter “interesses por trás” ao tomar decisões em prol do Brasil, das crianças, das vacinas, do Butantã e da Fiocruz, que produz uma vacina 100% nacional. Ele não entende nada, nem a tara por vacinas que salvam de poliomielite, sarampo, tétano, coqueluche... e covid-19. Parabéns, Fiocruz! Solidariedade, Anvisa e doutores tarados pela vida!

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