sábado, 8 de janeiro de 2022

Hélio Schwartsman: Sim, sou um tarado da vacina

Folha de S. Paulo

Fato raro, reconheci-me numa fala de Bolsonaro

Fato raro, reconheci-me numa fala de Bolsonaro. Sim, sou um dos tarados da vacina. E tenho motivos para sê-lo. Só três conquistas do engenho humano pouparam, cada uma, no acumulado dos anos, mais de 1 bilhão de vidas. São elas fertilizantes artificiais, esgotamento sanitário e vacinas. Outros "milagres" da ciência como antibióticos e a pasteurização salvaram "apenas" centenas de milhões. A anestesia, sem a qual Bolsonaro não teria sobrevivido a tantas intervenções cirúrgicas, fica na casa dos milhões. Se tivéssemos de escolher uma única tecnologia biomédica para conservar para o futuro, a imunização seria seriíssima candidata.

Ignorância não é crime —ninguém sabe tudo o que há de relevante para saber sobre um assunto—, mas militar em favor dela é. Especialmente o presidente da República precisa informar-se antes de propagar asneiras pelas ondas hertzianas. Não é verdade, por exemplo, que crianças não morrem de Covid-19. Pelas contas do acapachado Ministério da Saúde, até o dia 6 de dezembro, o Brasil registrava 301 óbitos pelo Sars-CoV-2 na faixa dos 5 aos 11 anos.

Essa foi a mais grave, mas nem de longe a única, tolice proferida por Bolsonaro. E ela basta para implodir o raciocínio antivacinal do capitão reformado. As vacinas para crianças só foram aprovadas, no Brasil e em todos os outros países que as homologaram, porque os dados mostram que os benefícios superam os riscos. É o requisito básico do licenciamento.

Muito se fala do prejuízo que a internet, com suas redes sociais, "fake news" e radicalização, traz para a democracia. Longe de mim contestar isso. Mas há um lado positivo da rede que não é destacado como deveria. Nunca as pessoas tiveram tanto acesso a fontes abalizadas. Qualquer cidadão está a poucas teclas dos melhores estudos, enciclopédias e textos de divulgação.

Basicamente, ninguém precisa ser tão néscio quanto o presidente da República.

 

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